3. Metamorfoses do ambiente econômico e político brasileiro
Nos últimos 30 anos, a economia brasileira sofreu profundas transformações oriundas da alteração no modelo de desenvolvimento, papel do Estado, abertura comercial e financeira entre outros que metamorfosearam o ambiente de atuação das firmas. Forçando as empresas e empresários a se adaptarem levando a novos comportamentos e soluções aos novos desafios. Assim, a presente seção busca delinear as principais alterações entre as décadas de 1980 e 2000. Parra isso a estrutura de argumentação está organizada em três itens. O primeiro proporciona uma visão sobre os fundamentos do capitalismo brasileira que tendem a permanecer ao longo do tempo e estão presentes na economia brasileira. O segundo identifica as alterações no modelo de desenvolvimento oriundas da crise dos anos 1980, seguida das reformas dos anos 1990. O terceiro e último aborda a consolidação do cenário ao longo da década de 2000 destacando as novas preocupações e fatores potencialmente que influem na economia empresarial.
3.1 Fundamentos do capitalismo brasileiro
O processo de industrialização brasileiro teve como impulso nos anos 1930 quando a Grande Depressão originada nos países centrais desarticulou a estrutura e integração econômica e política mundial. Internamente permitiu Getúlio Vargas trazendo consigo a força do movimento que se formava na sociedade desde o fim do século XIX de considerar a industrialização como sinônimo de modernidade e desenvolvimento. Para isso justificando a intervenção estatal e liderança do estado no processo de mudanças sociais e econômicas derivadas do desenvolvimento. Um modelo que apesar das metamorfoses ao longo dos anos se manteve persistente até a crise da década de 1980.
O modelo de desenvolvimento adotado pelo Brasil e prevalente nos demais países da América Latina era denominado genericamente de modelo de substituição de importações (ISI). O principio era de produzir internamente os bens importados dos países industrializados. Fomentando a construção de uma estrutura industrial e formação de um mercado interno criando uma dinâmica nacional que rompesse a relação de dependência entre centro e periferia. Ideias apresentadas são pertencentes ao escopo teórico Cepalino encontrados nos autores como Raul Prebisch (1944), Celso Furtado (2005) e Maria Conceição Tavares (1972). Ao mesmo tempo justificando o papel do Estado como líder do processo de mudança na economia e sociedade, bem como, a proteção e um rol de incentivos a indústria nascente.
Ao analisar a dinâmica envolvidos no modelo de desenvolvimento no Brasil, México e Argentina, Katz (2005) identifica a interação entre três atores: estado; empresas nacionais; e multinacionais. O Estado assume o papel de líder e gestor do processo fornecendo os parâmetros para direcionar os rumos da industrialização e suporte para a construção das novas firmas através do estabelecimento de empresas estatais em setores considerados estratégicos (energia, telecomunicações e mineração, por exemplo), proteção tarifária, empréstimos a custos mais baixos que o mercado. As empresas nacionais em grande parte familiares e de pequeno e médio porte se aproveitavam das condições oferecidas pelo estado e o crescimento da demanda interna para programarem projetos de expansão e fortalecimento da capacidade de competição. Por fim as multinacionais vindas a partir dos anos 1950 introduziram uma nova capacidade de produção ao colocar produtos no mercado que as empresas nacionais e estatais não tinham condições de oferecer, mesmo sendo fundamentais para construção de uma economia fechada.
Frequentemente, a organização do modelo de desenvolvimento baseado na ação do Estado, principalmente presente na visão dos autores cepalinos tendem a serem ligados ao um “keynesianismo caboclo”. Principalmente, derivados da defesa da intervenção estatal e questionamento do liberalismo. Entretanto, Fonseca (2000) contesta essa perspectiva ao ver a preocupação cepalina está em criar uma estrutura produtiva com intensificação tecnológica e formação de um mercado interno na perspectiva de crescimento de longo prazo. Enquanto Keynes foca em preocupações de curto prazo de como levar uma economia com excesso de oferta, capacidade produtiva e tecnologia constante a voltar ao pleno emprego. Fonseca admite a influência de Keynes como uma vertente derivada da onda que existia na época, mas com uma influência menor do que normalmente aparece na literatura.
Ao trazer a análise para a gênese da defesa da industrialização e ação estatal para o Brasil, Fonseca levanta tese de que desde o século XIX nos discursos das elites, imprensa, políticos e governo eram possíveis identificar o viés que justifica a proteção a indústria e maior poder do estado. Inclusive estando presente na Constituinte Republicana e ao longo da década de 1890 marcada pela instabilidade, sendo a industrialização apontada como saída para reduzir a dependência de bens importados. Sendo assim, o ambiente liberal e adequação a divisão internacional do trabalho não era visto como ideal para a realidade e futuro do país. Sendo fortalecidas ao longo do tempo e eclodindo com a grande Depressão dos anos 1930, desarticulação econômica e política mundial e interna.
A partir da hipótese expostas por Fonseca defende uma forma de capitalismo própria com características particulares que tendem manter a essência ao longo tempo. Elencando três elementos. O primeiro liberalismo de exceção que apresenta a ideia de que nem sempre o mercado fornece as melhores soluções. Podendo assim justificar diversas intervenções. O segundo positivismo de que o passado agrário e liberal representa o velho, enquanto a indústria e o antiliberalíssimo o novo. O terceiro apresenta as ideias de Friedrich List (1909) publicadas na obra “The National System of Political Economy”, publicado originalmente em 1841, sobre a necessidade de fomentar a industrialização alemã como forma de inserção proativa na economia mundial. Para isso quebrando a organização econômica mundial e liberalismo colocando um papel fundamental do estado, protecionismo é necessário; mercado interno garante o dinamismo da indústria; e construção da infraestrutura. Em que pese a grande semelhança na defesa e argumentos entre List e Brasil para justificar a industrialização.
A defesa da industrialização, justificativa a intervenção estatal e protecionismo estiveram presentes no processo de desenvolvimento brasileiro ao longo do século XX. Mesmo sofrendo uma quebra estrutural no modelo de substituição de importações advinda da crise dos anos 1980s dando lugar ao neoliberalismo e reformas pró-mercado, não alteram a essência e o papel fundamental do estado quando comparados a outros países da América Latina. Como exemplos podem citar dois exemplos de uma abertura seletiva. Um do setor petrolífero em que Alveal (1999) observa que a Petrobras se manteve como uma empresa de capital misto, mas que se mantém sobre controle do Estado, diferente da YPF argentina que foi privatizada. O outro sobre o sistema financeiro observado por Mendonça (2009) ao analisar os sistemas financeiros do Mercosul observa que a Argentina se mostra com um sistema fraco, desnacionalizado e sem a formação de instrumentos de longo prazo no sistema bancário. Enquanto o Brasil possui o sistema financeiro mais desenvolvido, instituições públicas fortes e bancos privados que dominam o mercado nacional e lideram o movimento de penetração de capitais nos outros países do bloco.
Assim, como defende Costa (2010), a construção do capitalismo brasileiro permite intrinsecamente uma maior intervenção estatal e tendência protecionista. Justificada, aceita e praticada, em maior ou menor medida, pelos governos ao longo dos anos. Assim, transformando-se em uma diferenciação crucial para a gestão da economia brasileira em relação aos demais países da América Latina ao preservar em tese a maior parte da capacidade de intervenção do estado na economia. Presente nas discussões a respeito de dependência financeira e industrialização.
3.2 Da crise as reformas pró-mercado
Entre as décadas de 1930 e 1980 a economia brasileira apresentou um crescimento consistente e elevado ao longo dos anos na medida em que construía sua base industrial e mercado interno. Entretanto, a estratégia de enfrentamento proativos da crise internacional desenhada nos anos 1970, derivada dos choques do petróleo (1973 e 1979), levou a fragilização da economia brasileira levando a crise dos anos 1970 com a estagnação, hiperinflação, crise da dívida interna e externa fechamento dos mercados financeiros internacionais. Encerrando um ciclo e forçando a reformas estruturais que desmontar a articulação proposta anteriormente.
No período antecedente a crise nos anos 1970s, Mantega (1997) observa que o II Plano Nacional de Desenvolvimento (ou II PND) pretendia implantar um conjunto ambicioso de projetos de bens de capital e insumos básicos. Visualizando a consolidação do processo de substituição de importações, construindo a indústria pesada, fortalecimento do empresariado nacional e garantindo a manutenção das taxas de crescimento em contraste com a crise e estagflação que se desenhava no mundo desenvolvido. Incorporando uma política do governo militar em fortalecer a economia nacional.
Durante o período de vigência o II PND (1975-1979) levando ao sucesso do II PND em sustentar elevadas taxas de crescimento registrando elevadas em um cenário internacional adverso com picos de 10% em 1976 e como piores anos 1977 e 1978 na casa dos 4%. Entretanto, Mantega ressalta a inflação se mantinha ao redor de 30% no biênio 1974-1975. Enquanto o déficit comercial acumulado de mais de US$ 10 bilhões de 1974 a 1976 e um em conta corrente de quase US$ 20 bilhões. Sendo acentuadas pela elevação no preço do petróleo no mercado internacional, mas financiada pela elevada liquidez devido a abundância de divisas dos países exportadores de petrolíferos.
Ao mesmo tempo a relação do governo autoritário com o empresariado se metamorfoseia como constam nos trabalhos de Lessa (1998) e Barros de Castro (1985) em especial devido a duas características. Uma relacionada ao um nacionalismo econômico crescente levando ao governo tentar isolar e afastar os membros considerados simpáticos a país estrangeiros, sobretudo aos Estados Unidos. A outra o afastamento da base de apoio representada pelo empresariado fomentando um plano de intensificação da industrialização em que o estado assume o papel de protagonista trazendo consigo o viés de estatização. Em paralelo, Macarani (2007) ressalta a motivação do regime militar em fortalecer o empresariado nacional como forma de fomentar o poder nacional justificando medidas em prol dos grandes conglomerados em diversas áreas como dos bancos.
O acirramento da crise internacional com o segundo choque do petróleo em 1979 acompanhado das medidas retracionistas nos países centrais para reduzir a inflação. Protagonizado pelo movimento de aumento das taxas de juros básicas promovidas pela Federal Reserve como forma de controlar a inflação a inflação norte-americana. Em paralelo, Eichengreen (2007) provocou uma reorganização no ordenamento do sistema financeiro e monetário internacional em que inicialmente os maiores prejudicados foram os países periféricos que contraíram empréstimos nos anos anteriores quando existia excesso de liquidez internacional a baixos custos. Assim, transformando dívidas em moeda estrangeira impagáveis levando a justes recessivos para enfrentar o estrangulamento externo acompanhando de aceleração do ciclo inflacionário, crise do endividamento público e estagnação.
Para a América Latina os números são desanimadores (ver Tabela 1). Levando a se encontrar na literatura a expressão “década perdida” (ou lost decade) para se referir a década de 1980 e desempenho econômico dos países da região. Como resposta a este cenário Cimolli et al. (2003) ressalta o inicio do desmonte da estrutura institucional que dava suporte ao modelo de desenvolvimento. Focadas principalmente nas reformas pro mercado, redução do papel do Estado e abertura financeira e comercial. Fortalecidas com o fracasso das tentativas de reviver o modelo ao longo dos anos 1980 através de moratórias, congelamento de preços e outras medidas visando controlar a inflação.
Tabela 1 - Variáveis macroeconômicas da América Latina: 1980-1989
1980 1985 1989
PIB Industrial 100 103,5 113,1
PIB per capita 100 92,2 91,7
Investimento/PIB 24,2 16,3 16,2
Dívida/Exportações 2,1 3,5 3,2
Inflação (em %) 54,9 274,7 1157,6
Fonte: Cepal
Nota: extraído de Bresser-Pereira (1991)
Para o Brasil significa a adoção de uma política econômica retracionista visando o controle inflacionário, endividamento público e externo admitindo a redução do crescimento como necessária para estabilizar as variáveis macroeconômicas. Levando a uma depressão do PIB em 4% em 1981 seguido de desempenhos medíocres até 1983. Quando se iniciou um miniciclo de crescimento entre 1984-1987 na medida em que a economia mundial reagia e os investimentos realizados no âmbito do II PND maturavam. Entretanto, os planos de redução do déficit público, controle da inflação e equacionamento do endividamento externo não surtiram os efeitos esperados. Resultando em uma série de planos fracassados em conjunto com espiral inflacionária e a moratória de 1987, levando o país a uma citação calamitosa entre 1988-1992 (ver tabela 2).
Tabela 2 - Principais planos de recuperação no Brasil: 1980-1990
Plano Ano Principais Medidas
Cruzado 1986 Introduz o cruzado em substituição ao cruzeiro
Congelamento de preços e salários
Câmbio fixo em relação ao dólar e libra
Extingue a correção monetária para desindexar a economia
Cria o seguro-desemprego e o gatilho salarial através de reajustes automáticos
Decreta a moratória e suspende o pagamento da dívida externa
Bresser 1987 Mantém o congelamento de preços, salários e a moratória
Aumenta tarifas públicas
Acaba com o gatilho salarial
Verão 1989 Procura segurar a inflação pelo controle do déficit público
Privatiza estatais
Estabelece novo congelamento de preços
Determina a desindexação da economia
Collor 1990 Confisca 80% dos depósitos bancários e aplicações financeiras
Volta o cruzeiro como moeda
Congela preços
Acaba com a indexação
Demite funcionários
Privatiza estatais
Fecha órgãos públicos
Começa a abrir a economia à competição internacional
Real 1994 Muda a moeda para o Real
Fixa a taxa de câmbio na paridade de R$ 1,00 para US$ 1,00
Acelera as privatizações
Eleva os juros
Facilita as importações
Prevê o controle dos gastos públicos
Mantém o processo de abertura econômica
Busca medidas de apoio à modernização das empresas
Fonte: João Sayad <
http://www.tecsi.fea.usp.br/eventos/con ... -plano.htm >
Nota: adaptado pelos autores
Em meio às reformas e desmonte do modelo de desenvolvimento predominante pré-1980 se consolida o chamado “Consenso de Washington” que sintetiza as reformas pro mercado propostas pelos órgãos internacionais, especialmente Fundo Monetário Internacional – FMI, sobre os caminhos para resolução da crise. Argumentos presentes em Williamson (1990) fornecendo uma base técnica e um direcionamento das reformas para que a economia funcionasse mais livre e os países latino-americanos se integrassem melhor a economia mundial. Proporcionando um ambiente de estabilidade, bem-estar e crescimento no longo prazo benéfico para a sociedade como um todo.
O incentivo a aplicação dessas políticas se deu principalmente através do FMI em conjunto com o governo norte-americano materializado no Plano Brady que alivia o montante de juros pago pelos países latino-americanos. Fornecendo uma perspectiva de reestruturação do endividamento externo e volta aos mercados financeiro internacional em que poderiam ser utilizados em planos econômicos para a estabilização da economia e retorno ao ciclo virtuoso de crescimento. Apesar de nem todos os itens terem sido aplicados como a taxa de câmbio flutuante, pois países como Brasil e Argentina vincularam ao câmbio valorizado e fixo a chave para o sucesso da estabilização da economia. Além de utilizarem taxas de juros elevadas para reprimir a demanda e atrair capital especulativo a fim de equilibrar as contas externas.
A indústria latino-americana era vista por autores como Dosi et al. (1994) de forma depreciativa pela dificuldade em criar um sistema de inovação e desenvolvimento em área com intensidade tecnológica. Sendo capazes de introduzir produtos com valor agregado em escala global garantindo a eficiência e capacidade competitiva fruta de um modelo de desenvolvimento fechado em si mesmo. Outros como Katz (2005) contra-argumento que as indústrias latino-americanas estavam intensificando as capacidades tecnológicas nos anos 1970 evidenciadas no maior valor agregado dos produtos e exportações. Porém foram minadas pelas dificuldades econômicas e choques de competição dos anos 1980 levando ao movimento de desindustrialização e primarização da economia.
As metamorfoses do sistema ficam mais claras no Brasil após a implantação do Plano Real em 1994. Trazendo o controle inflacionário acompanhando da abertura econômica, câmbio valorizado e fatal de apoio estatal expondo as empresas nacionais à competição externa acirrada. Entretanto, as boas perspectivas econômicas dos primeiros anos levaram ao que Bielschowsky (1999) miniciclo de modernização no triênio 1995-1997 que inicialmente aparecem como uma nova fase da indústria brasileira favorecida facilidade de importar equipamentos. Em seguida abortadas devido a crise cambial de 1998/1999 que forçaram a quebra estrutural do plano real ao alterar o câmbio fixo para flutuante em conjunto com o regime de metas de inflação e incentivo a exportação. Uma situação calamitosa que perdurou pelo segundo governo Fernando Henrique (1999-2002) e nos dois primeiros anos da gestão Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).
Entretanto, as particularidades do capitalismo brasileiro reduziram os efeitos de desindustrialização em comparação os demais países da América Latina levando em uma abertura mais seletiva e que manteve os instrumentos estatais de intervenção na economia. A velocidade de abertura e redução do tamanho do estado foram mais lentas e pragmáticas que em outros países latino-americanos. Além dos grandes conglomerados públicos e privados formados ao longo do processo de industrialização brasileira se consolidaram nos anos 1980 e se mantiveram fortes mesmo com a abertura na década de 1990. Por exemplo, a sustentação do oligopólio no setor financeiro protagonizado por dois bancos estatais (Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) e três privados (Unibanco, Itaú e Bradesco). A Petrobras como uma empresa estatal de capital misto fundamental para as políticas energéticas do país. Seguidas de empresas como Embraer (área aeroespacial), Vale (mineração) e CSN (metalurgia) se mantiveram nas mãos de controladores nacionais após a privatização. Empresas privadas como Sadia e Perdigão (alimentos) e Randon (metal-mecânica) se fortaleceram ao longo do processo.
3.3 Novas perspectivas da década de 2000
O inicio da década de 2000 se apresenta depressivo em relação as perspectivas econômicas que o país poderia vislumbrar como resultado das reformas dos anos 1990 e crise externa. Entretanto, as variáveis macroeconômicas após 2003 indicam um momento econômico favorável de crescimento e estabilidade. O Brasil se insere na segunda opção e, portanto, possuindo uma tendência crônica a ter dificuldade nas contas externas e compatibilizar as políticas cambiais e monetárias com a construção da estrutura produtiva. Assim, duas discussões ganharam força nos últimos anos oriundas do relativo sucesso no período após 2003 em garantir crescimento e fortalecer o mercado interno: desindustrialização e política monetária de controle da inflação.
Ao mesmo tempo em que o modelo de desenvolvimento dos países latino-americanos era desmontado o mundo passava por uma reestruturação produtivas e financeiras consolidando mudanças que estavam em curso desde aos anos 1960/1970. Nesta linha, o trabalho de Dooley et al. (2003) indica que a integração econômica mundial proporcionou a criação de dois tipos de regiões. Uma denominada trade account regions que continuem regiões que se industrializaram visando o mercado externo e a acumulação de reservas em moedas conversíveis como forme de financiar e assegurar o desenvolvimento. O exemplo se encontra nos países asiáticos em especial com as relações com os estados unidos recebendo investimentos externos e criando uma estrutura industrial capaz de exportar.
A outra chamada de capital account regions em que a forma primordial de integração não se dá pelo comércio, mas sim pela atração de capital para assegurar o crescimento econômico possuindo problemas crônicos em relação as contas externas. O exemplo está na América Latina ressaltada pelas fragilidades em relação aos ataques especulativos eternos seja contra a política cambial e monetária ou solvência ante os débitos internacionais e capacidade de angariar reservas em moedas conversíveis.
Em relação ao comércio exterior que representa um indicativo da produtividade e competitividade da indústria brasileira, o IPEA (2012) revela que entre 2005 e 2011 a pauta de exportações os produtos básicos subiram a participação de 29,3% para 38,7%, enquanto os manufaturados caíram de 55,1% para 44,1% mantido os preços constantes. Na visão do IPEA, a fraqueza nas exportações de manufaturados brasileiros está atribuída a problemas de competitividade através da política cambial que mantém a moeda valorizada e juros altos para controlar a inflação e fatores estruturais especialmente a falta de investimento. Nesse contexto, a limitação do investimento está relacionada com a falta de articulação entre o real e financeiro não permitindo as empresas buscarem canais para alavancar seus projetos de ampliação da capacidade, desenvolvimento de novos produtos, processos e tecnologias capazes de competir globalmente.
A literatura sobre o tema desindustrialização enfatiza o papel do câmbio no processo de desindustrialização da economia brasileira nas últimas décadas. Para Feijô (2007) as taxas de juros elevadas através dos canais econômicos provavam a valorização cambial e queda na demanda interna, sobrevalorização cambial e desincentivo ao investimento. A solução vista com simpatia por Oreiro et al. (2011) são políticas que propiciem a desvalorização cambial trazendo efeitos positivos sobre o produto industrial, exportações de manufaturados e investimento.
No aspecto monetário, a crítica está reservada a elevada taxa de juros básica e uma estrutura de crédito baseada na sustentação de níveis elevados de juros e ganhos financeiros. Em conjunto com um mercado de capitais, crédito externo e utilização de inovações financeiros relativamente restritos que dificultam a capacidade das empresas alavancarem e acelerarem os investimentos. Ao mesmo tempo trabalhos como de Gonçalves e Yonamini (2010) mostram os diferentes graus de dificuldades das empresas intensivas em tecnologia encontrarem fontes de financiamento. Enquanto as grandes possuem facilidade e vários caminhos para encontrar recursos as pequenas e médias são restritas ao autofinanciamento. Representando uma falha genética no sistema financeiro brasileiro.
No biênio 2008/2009, quando a crise financeira mundial chegou ao Brasil, foram reveladas as operações financeiras das companhias com derivativos e o elevado grau de risco, quando chegou ao Brasil trazendo o primeiro impacto da desvalorização cambial, comprometendo as operações com derivativos que apostavam na valorização do real como observado Fornazier et al. (2011). Em que a desvalorização de cerca de 40% do real frente ao dólar no último trimestre de 2008, levou ao prejuízo de cerca de R$ 40 bilhões para 200 grandes empresas. Não se pode dizer que era um movimento especulativo proposital ou uma forma de proteção e levantamento de fundos. Porém foi uma forma das firmas enfrentarem o ambiente desfavorável e se manterem competitivas no cenário internacional e viabilizarem os investimentos.
A situação calamitosa das empresas envolvidas levou a intervenções do governo por meio dos bancos públicos para manter as linhas de crédito abertas e evitar um agravamento da crise. Como também, o BNDES agiu não apenas como um provedor de recursos, mas também como um instrumento para reorganização do setor evitando que companhias chaves da economia brasileira entrassem em colapso. O então presidente do Banco, Luciano Coutinho (2011), contou em entrevista a revista “Cadernos do Desenvolvimento” atuação da instituição para socorrer o setor e traçar estratégias para superar a crise. Ao mesmo tempo registrando um aumento dos desembolsos do BNDES passando de R$ 19 bi em 1998 para pico de 168 em 2010. Ao mesmo tempo mostrando a necessidade e capacidade de intervenção estatal na esfera financeira através de outras instituições públicas. Principalmente banco do Brasil e Caixa Econômica Federal que oferecem produtos e direcionamento de créditos aos quais não existe paralelo na iniciativa privada.