marcelo bahia escreveu:AlbertoRJ escreveu:Antigamente a indústria de autopeças era praticamente toda nacional, agora não sei como está.
[]'s
Continua assim, meu caro!
Leandro G. está equivocado. Não montamos apenas os carros, pois em média 75% das peças que compõem nossos veículos são de produção nacional. Os da Argentina também usam peças brasileiras. O Ágile (made in Argentina), que foi o primeiro carro da GM desenhado lá, não foge à regra, pois também 75% das peças são importadas do Brasil, ou seja, nós importamos o que já exportamos antes. Isso me foi dito por um diretor da GM da Argentina que foi meu aluno de português. Renault, Fiat, VW, etc, abriram centros de desenho e desenvolvimento de veículos no Brasil.
Marcelo, a grande maioria dos sistemistas (chamados fornecedores Tier-1, que entregam sistemas completos) como Visteon, ZF, Bosch, Magnetti Marelli, e algumas outras são empresas também multinacionais, da mesma forma que as montadoras (OEM's). Na verdade, embora eu trabalhe na área não me lembro de cabeça de nenhum Tier-1 nacional. Entre os fornecedores destes fornecedores (Tier-2), que entregam as peças mais sofisticadas como amortecedores, pistões, motores, etc... havia alguns nacionais importantes (COFAP, Metal-Leve, Maxion, etc...) mas a maioria foi comprada por multinacionais durante o governo FHC, e hoje sobram muito poucos ainda sob o controle de brasileiros. Apenas quando se chega aos fornecedores de terceiro nível (Tier-3), que entregam peças avulsas com baixo conteúdo tecnológico, é que ainda existe forte participação nacional. São empresas de fundição, estampagem, forjamento, fabricantes de bombas d´água, reservatórios de óleo, molas, parafusos, etc..., que entregam peças sob especificação dos OEM´s, Tier-1 e Tier-2.
Se você considerar que todo carro é composto por peças, então a participação nacional (em peso) é bem importante, muito poucas peças vem de fora. Mas a produção de simples peças ou sistemas pouco sofisticados agrega muito pouco valor ou conhecimento ao produto final, até porque as especificações delas são definidas pelos sistemistas e pelas montadoras. E estas empresas é que ficam com o filão do dinheiro da venda dos carros. Já os produtores de peças basicamente operam as máquinas para fabricar o que foi projetado em grande parte fora do país. O máximo de desenvolvimento que eles fazem é na construção dos ferramentais e dispositivos de produção (moldes, matrizes, gabaritos de medição, etc...), mas pouco ou nada em termos de produto. Estes fabricantes de peças tem margens e lucro muito estreitas, e mesmo que soubessem como dificilmente teriam capital para tentar vôos mais altos.
O trabalho do segundo link abaixo parece ser justamente sobre como estas informações de engenharia, geradas no s OEM's e Tier-1, são repassadas para os fornecedores Tier-2 e Tier-3.
Para você ter uma idéia, a empresa em que eu era sócio atendia justamente este centro de desenvolvimento de veículos da VW do Brasil citado no primeiro link, com serviços de digitalização 3D. Para ficar bem claro, o trabalho deles era basicamente de design (carroceria e interior), a plataforma mecânica era totalmente projetada fora. E o trabalho de engenharia era centrado na instalação dos ítens acessórios (faróis, limpeza do para-brisas, bateria, rádio, etc...) no espaço entre a plataforma, a carroceria e o interior. Mas infelizmente os designers fizeram um trabalho bom demais no caso do Fox, que se tornou um sucesso até na Europa, e TODOS OS MELHORES ENGENHEIROS E TÉCNICOS foram transferidos para o centro de design da VW NA ALEMANHA em 2009. Apenas a equipe de acabamento (cores, tecidos, etc...) permanece hoje no Brasil.
A GM também montou um centro de desenvolvimento aqui no Brasil, um dos 5 que ela tem no mundo (semana passada mesmo eu estava aplicando um treinamento para alguns engenheiros de lá). Mas novamente, o trabalho deles é design e desenvolvimento de carrocerias, o projeto da plataforma (motor e powertrain, chassis básico e suspensão) vem pronto de fora, geralmente da Opel da Alemanha. Na FIAT também não é muito diferente, embora eles pareçam querer trazer uma parte maior da engenharia para o Brasil hoje nem a própria unidade da FIAT em Betim tem capacidade para desenvolver quase nada, e a parcela (pequena) de engenharia que fazem é subcontratada em escritórios de projeto dedicados ou pertencentes a fornecedores Tier-2 ou mesmo Tier-3, o que tem levado a muitos problemas, pois é um pessoal novo que não está plenamente capacitado. A Ford segue mais ou menos pelo mesmo caminho, perdi muitos projetistas que eu havia acabado de formar para escritórios de projeto que atendem a Ford. As demais montadoras ou trazem tudo pronto de fora ou ainda estão começando a pensar no assunto de nacionalizar a engenharia. Por exemplo, a Renault solicitou ao seu Tier-2 Magneto, uma empresa italiana, que montasse um centro de desenvolvimento de estampados aqui, mas isso só deve começar ano que vem (treinamos semana passada um primeiro projetista deles, aliás bem fraquinho, que está indo para a Itália justamente para trazer algum know-how).
Esta é a realidade da indústria automobilística nacional vista de dentro. Sem dúvida estamos na frente de uma Argentina ou de um México, mas ainda estamos a anos-luz dos países desenvolvidos ou dos que fazem esforços verdadeiros nesta área como Coréia do Sul, Índia e China.
Leandro G. Card