Eleições presidênciais na França
Enviado: Seg Abr 09, 2007 10:00 am
Um passeio em Saint-Denis
Um brasileiro que se aventurar nos bairros populares da cidade de Saint-Denis, subúrbio ao norte de Paris, poderá, ao revelar sua nacionalidade, se surpreender com a imediata reação de jovens das chamadas cités, os populosos conjuntos habitacionais. Em vez dos normalmente citados craques da bola Ronaldinho, Ronaldo ou Kaká, são os nomes de personagens do filme brasileiro "Cidade de Deus", uma trama sobre a marginalidade em favelas do Rio, os primeiros a ser evocados com entusiasmo, admiração e mesmo uma certa intimidade.
- Você é brasileiro? Conhece Zé Pequeno, Buscapé? ¿ diz de pronto Reda, 21 anos, com a cumplicidade imediata de seus amigos.
Num muro do centro da cidade, uma pichação se intromete sobre as imagens de candidatos às eleições presidenciais francesas, exibidas em cartazes de campanha: "Estar na miséria não é uma vergonha; a miséria é que é uma vergonha".
As estatísticas comprovam a preocupação dos grafiteiros. Na região de Seine-Saint-Denis, o número de desempregados aumentou de 81 mil para 94 mil entre 2002 e 2005. Em bairros menos favorecidos de Saint-Denis, o índice dos sem-trabalho chegou a crescer de 21,8% para 31% (Floréal-Saussaie) e de 26,6% para 36,1% (Francs-Moisins). A pobreza afeta particularmente a população de origem imigrante, proporcionalmente mais numerosa e diversificada (62 nacionalidades estão representadas em Saint-Denis).
A delinqüência e a violência também são uma preocupação para os quase 94 mil habitantes da cidade, um dos principais focos do motim que se propagou pela França em novembro de 2005, provocando milhares de incêndios de veículos e outros atos de vandalismo. Em 2005, foram registrados 14.122 crimes e delitos, dos quais 2.799 foram elucidados. O índice de criminalidade por 1.000 habitantes é de 150,71 (bem acima da média nacional de 83/1000).
Em frente à chamada Cité Carrefour, num dos centros Antenne de Jeunesse, espaços de lazer mantidos pela prefeitura para evitar que os jovens perambulem pelas ruas, Reda, filho de imigrantes argelinos, atualmente à procura de emprego, se altera ao avistar três policiais do grupo CRS, da polícia de choque. "Olhe os policiais, eles nos infernizam a vida, nos provocam todo o tempo, é por isso que aumenta a delinqüência na França". Seu amigo, Mohamed, 19, de origem tunisiana, empregado como entregador, acrescenta: "Eles controlam nossos documentos por nada, nos algemam diante de nossos pais. E só param negros e árabes".
Nicolas Sarkozy, o candidato do partido governista União por um Movimento Popular (UMP), que criou polêmica ao anunciar a criação, se eleito, do Ministério da Imigração e da Identidade Nacional, é um dos principais visados do grupo. "Sarkozy é um ditador! Se vencer, vai haver menos trabalho e mais repressão. Os jovens irão para a cadeia por nada", diz Ayub, 20, jovem estudante de origem magrebina.
Nem todos se dispõem a falar sobre o clima pré-eleitoral e a situação nos subúrbios, na maioria das vezes desconfiados de que o jornalista é uma farsa que esconde um policial em busca de informações. Na entrada de um prédio da Cité Saint Rémy, um grupo de sete jovens, a maioria encapuzados, se recusa a qualquer comentário. Um pouco mais adiante, na Cité Romain Rolland, Alexis, 18, padeiro-confeiteiro e, nas horas vagas, organizador de festas rave, diz que vai votar nas próximas eleições presidenciais, mas sem nenhuma convicção: "Nenhum candidato me convence. Não acredito que algo vá mudar. Há muitos problemas nos subúrbios, e a tensão poderá novamente aumentar se Sarkozy for eleito".
Sarkozy, atualmente o líder nas pesquisas eleitorais, mantém seu discurso de controle rígido da imigração e tolerância zero para a delinqüência. A segunda colocada nas pesquisas, Ségolène Royal, do partido Socialista (PS), embora seja contra um "regularização global" dos imigrantes ilegais na França, promete uma abordagem menos radical do problema. Para enfrentar a criminalidade, ela defende a criação de uma "polícia de bairro", um substituto da "polícia de proximidade", suprimida por Sarkozy durante sua gestão no Ministério do Interior. Enquanto isso, François Bayrou, da União pela Democracia Francesa (UDF) o terceiro homem nas sondagens, tem multiplicado suas visitas aos subúrbios, em busca do voto dos descontentes com seus adversários.
Mas, por enquanto, a cotação dos políticos está em baixa em Saint-Denis. Bem menor, pelo menos, do que a de Zé Pequeno e Buscapé.
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1535368-EI6782,00.html
Um brasileiro que se aventurar nos bairros populares da cidade de Saint-Denis, subúrbio ao norte de Paris, poderá, ao revelar sua nacionalidade, se surpreender com a imediata reação de jovens das chamadas cités, os populosos conjuntos habitacionais. Em vez dos normalmente citados craques da bola Ronaldinho, Ronaldo ou Kaká, são os nomes de personagens do filme brasileiro "Cidade de Deus", uma trama sobre a marginalidade em favelas do Rio, os primeiros a ser evocados com entusiasmo, admiração e mesmo uma certa intimidade.
- Você é brasileiro? Conhece Zé Pequeno, Buscapé? ¿ diz de pronto Reda, 21 anos, com a cumplicidade imediata de seus amigos.
Num muro do centro da cidade, uma pichação se intromete sobre as imagens de candidatos às eleições presidenciais francesas, exibidas em cartazes de campanha: "Estar na miséria não é uma vergonha; a miséria é que é uma vergonha".
As estatísticas comprovam a preocupação dos grafiteiros. Na região de Seine-Saint-Denis, o número de desempregados aumentou de 81 mil para 94 mil entre 2002 e 2005. Em bairros menos favorecidos de Saint-Denis, o índice dos sem-trabalho chegou a crescer de 21,8% para 31% (Floréal-Saussaie) e de 26,6% para 36,1% (Francs-Moisins). A pobreza afeta particularmente a população de origem imigrante, proporcionalmente mais numerosa e diversificada (62 nacionalidades estão representadas em Saint-Denis).
A delinqüência e a violência também são uma preocupação para os quase 94 mil habitantes da cidade, um dos principais focos do motim que se propagou pela França em novembro de 2005, provocando milhares de incêndios de veículos e outros atos de vandalismo. Em 2005, foram registrados 14.122 crimes e delitos, dos quais 2.799 foram elucidados. O índice de criminalidade por 1.000 habitantes é de 150,71 (bem acima da média nacional de 83/1000).
Em frente à chamada Cité Carrefour, num dos centros Antenne de Jeunesse, espaços de lazer mantidos pela prefeitura para evitar que os jovens perambulem pelas ruas, Reda, filho de imigrantes argelinos, atualmente à procura de emprego, se altera ao avistar três policiais do grupo CRS, da polícia de choque. "Olhe os policiais, eles nos infernizam a vida, nos provocam todo o tempo, é por isso que aumenta a delinqüência na França". Seu amigo, Mohamed, 19, de origem tunisiana, empregado como entregador, acrescenta: "Eles controlam nossos documentos por nada, nos algemam diante de nossos pais. E só param negros e árabes".
Nicolas Sarkozy, o candidato do partido governista União por um Movimento Popular (UMP), que criou polêmica ao anunciar a criação, se eleito, do Ministério da Imigração e da Identidade Nacional, é um dos principais visados do grupo. "Sarkozy é um ditador! Se vencer, vai haver menos trabalho e mais repressão. Os jovens irão para a cadeia por nada", diz Ayub, 20, jovem estudante de origem magrebina.
Nem todos se dispõem a falar sobre o clima pré-eleitoral e a situação nos subúrbios, na maioria das vezes desconfiados de que o jornalista é uma farsa que esconde um policial em busca de informações. Na entrada de um prédio da Cité Saint Rémy, um grupo de sete jovens, a maioria encapuzados, se recusa a qualquer comentário. Um pouco mais adiante, na Cité Romain Rolland, Alexis, 18, padeiro-confeiteiro e, nas horas vagas, organizador de festas rave, diz que vai votar nas próximas eleições presidenciais, mas sem nenhuma convicção: "Nenhum candidato me convence. Não acredito que algo vá mudar. Há muitos problemas nos subúrbios, e a tensão poderá novamente aumentar se Sarkozy for eleito".
Sarkozy, atualmente o líder nas pesquisas eleitorais, mantém seu discurso de controle rígido da imigração e tolerância zero para a delinqüência. A segunda colocada nas pesquisas, Ségolène Royal, do partido Socialista (PS), embora seja contra um "regularização global" dos imigrantes ilegais na França, promete uma abordagem menos radical do problema. Para enfrentar a criminalidade, ela defende a criação de uma "polícia de bairro", um substituto da "polícia de proximidade", suprimida por Sarkozy durante sua gestão no Ministério do Interior. Enquanto isso, François Bayrou, da União pela Democracia Francesa (UDF) o terceiro homem nas sondagens, tem multiplicado suas visitas aos subúrbios, em busca do voto dos descontentes com seus adversários.
Mas, por enquanto, a cotação dos políticos está em baixa em Saint-Denis. Bem menor, pelo menos, do que a de Zé Pequeno e Buscapé.
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1535368-EI6782,00.html