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Assuntos em discussão: Força Aérea Brasileira, forças aéreas estrangeiras e aviação militar.

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R.A.Barros
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Estórias

#1 Mensagem por R.A.Barros » Seg Set 13, 2010 7:41 am

Galera, quem tem alguma estória referente a aviação, que então compartilhe aqui :D
Sei que muitos tem muito o que contar :wink:


Começando:
Estória retirada do site ABRA-PC
ENGOLIDO POR CUMULUS NIMBUS (CB) EM PARATY
(Estória 75-2)


Certo fim de tarde, início de noite, na BASC (Santa Cruz). Minha função era de chefe da SCOAM (Seção de Controle de Operações Militares) e estávamos na véspera de uma manobra “SACI” com a Brigada Paraquedista do EB (Exército Brasileiro), sendo o assalto aeroterrestre planejado para a área de Resende, no Vale do Paraíba.

A previsão meteorológica não era nada boa. Chuva forte à noite e teto baixo na manhã seguinte. Nada bom para se fazer ataques de apoio aéreo aproximado e lançamento de PQD (paraquedistas).

Peguei meu “Jeep” funcional com o Gustavo (Guga), então um guri de oito anos, que vivia “grudado” comigo quando o assunto era operacional, e fui para o acampamento dos PQD, próximo à cabeceira da pista 04, falar com o general comandante da brigada.

Dei as “más novas” e após os devidos brifins e acertos, saí com o general a conversar pelo pátio de cheque-final e vimos um enorme CB (cumulus nimbus) lá pela área de Paraty – Angra.

Temendo que ele viesse para a BASC, falei com o OPO (Oficial de Permanência Operacional) de serviço e perguntei quantas aeronaves tínhamos voando. Ele me disse que umas seis e que já estariam sendo recolhidas.

Vimos mesmo uns cinco F-5E pousando quando me chamaram no rádio. O “THOR” (Controle de Defesa Aérea, em Brasília) acabara de informar que perdera contacto radar – rádio com um dos F-5E que estava numa missão de interceptação sobre o setor de Paraty.

Fui de imediato para a sala do OPO e iniciei o acompanhamento da situação. Era um elemento liderado pelo Mauro, da minha turma, cujo ala era o Ten. Rui Barbosa Nunes.

Por coincidência eu havia cruzado com eles, na sala de equipamento de vôo, ao voltar de uma missão, naquela tarde, e trocamos algumas palavras, sendo que o Nunes dissera estar um pouco gripado. Eu lhe disse ser melhor então não voar. Ele respondeu que era coisa leve e que “hora de vôo perdida era hora de vôo nunca mais recuperada”.

Eu gostava do Nunes. Garoto dinâmico, educado, vibrador e jovial. Voara algumas missões de instrução comigo em seu curso de formação operacional de F-5E/B. Era irmão do Gilmar, da turma de 65 (BQ). Mesmo “pedigree”!

Esgotada a fase de “Alerfa” (Alerta) e entrado direto na de “Detresfa” (Acidente quase certo) já não havia mais esperança do retorno do Nunes. Foi acionado o SAR (Busca e Salvamento), decolando do Campo dos Afonsos um helicóptero “Puma”, pilotado pelo Tsuji (turma de 65) e Neves (turma de 68).

Pousaram em Santa Cruz, fizeram um brifim conosco e fomos, eu aí embarcado, para o setor da Ilha Grande – Paraty. Noite escura e ventania super forte. O CB estava muito próximo e ativo.

Circulamos a Ilha Grande em seu setor de Angra e fomos até próximos à Ponta do Boi, em Paraty, dali voando no setor do mar aberto da ilha. Próximos à Ponta do Boi avistamos uma luz a piscar no mar. Euforia a bordo! Deveria ser o Nunes, de seu bote, a nos sinalizar. Foi iniciada a aproximação para a luz sob muita chuva e vento. Tensão a bordo... Ao chegarmos a uns 100 pés vimos que a luz era de um pequeno barco de pesca que balançava muito no mar super agitado. Frustração geral!

Ainda voamos uns 30 minutos enquanto pudemos, mas tivemos de voltar a Base. O CB “entrava rachando” ali!

Passamos a noite em brifins e preparativos para o reinício das buscas logo cedo, o que foi feito. Decolei ao nascer do sol com um U-42 “Regente” e vasculhei todo o litoral até pousar em Santos. Reabasteci e voltei esquadrinhando tudo a baixa altura e velocidade; nada...

Continuamos as buscas à tarde por uns 10 dias. Voei muito com os “Puma” como observador de porta. Fomos até cerca de 50 milhas náuticas do litoral, nada escapava de ser investigado no mar. Qualquer objeto flutuante que era avistado era investigado. Nada...

O Gilmar veio com sua família para a Base e ficaram acompanhando tudo de perto; que sofrimento, que pena! Eles possuíam um tio, mateiro experiente, que foi chamado, pois havia, também, a possibilidade de que o Nunes se ejetara e pudesse estar na densa mata atlântica da Serra do Mar, na área de Angra-Cunha-Paraty.

Um “Puma”, com colegas meus de turma (Joel e Paulo Tadeu) foi acionado. Fomos, Gilmar, o tio e eu, até uma clareira da serra e pela mata andamos por todo um dia; nada... No dia seguinte isso se repetiu; nada...

Foram avistados detritos no mar próximos à Ponta do Boi. A descrição coincidia com a espuma marrom dos tanques do F-5E. Fui com um “Puma” para a área e realmente vimos as espumas. O helicóptero nos deixou, eu e um cabo do PARASAR, o Tinoco, que havia sido meu comandado na Marambaia, no Condomínio Laranjeiras, onde consegui uma lancha emprestada e fomos em direção ao local. Que mar agitado! Após uns 30 minutos chegamos à área mas nada vimos, a não ser um aviso de um “Bandeirante” SAR de que havia tubarões próximos. f-5 para interceptação

No outro dia um “Puma” me deixou com mais 3 elementos do PARASAR num ponto do litoral, a oeste da Ponta do Boi, e dali saímos a esquadrinhar as pedras e praias por todo um dia; nada...

As buscas foram encerradas em mais uns 5 dias. Após isso, numa tarde, recebi na Base a informação de que haviam sido encontradas espumas tais como as do F-5E, numa praia da Vila do Abrahão, na Ilha grande. Não acreditei que fosse verdade, mas enviei um pessoal para recolhê-las...

Era!

Isso, se confrontado com as informações do último “plot” radar de “Thor”, da observação do Mauro que disse ter visto o Nunes iniciar a curva de conversão da interceptação às suas 7 horas sobre a área de Paraty e as correntes da área, nos deixa muita dúvida de onde poderia ter sido a queda e impacto com o mar. Se formos considerar as correntes marítimas, entre a Marambaia e a Ilha Grande... se considerarmos o “Thor”, entre a Ponta de Paraty e a Ilha Grande, mas então as correntes não poderiam ter levado as espumas para a Enseada do Abrahão...

O cenário em vôo não foi difícil de imaginar; vôo noturno, interceptação supersônica a Mach 1,2, curva de conversão com 60 graus de inclinação puxando uns 2,5G, cheque cruzado bem rápido entre os instrumentos de vôo e o escopo do radar – aquele nosso velho AN/APQ-153 – um CB enorme logo abaixo com suas inerentes correntes ascendentes- descendentes e muito gelo, piloto novo, em fase de instrução... uma vez “entrado” nele, bem difícil de se recuperar...

Pena... perdemos um ótimo oficial, colega e caçador.

Marco Aurélio Rocha Rocky – Maj.Av.R1.
Piloto de Caça - Turma de 1976
Várias estórias de todas as épocas são encontradas nesse maravilhoso site:
http://www.abra-pc.com.br/ -> ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PILOTOS DE CAÇA




VALENTE , GUERREIRO E AUDAZ;
NÃO RECUAMOS JAMAIS;
CONTE COMIGO BRASIL , BRASIL !
SEJA NA GUERRA OU NA PAZ.
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Re: Estórias

#2 Mensagem por R.A.Barros » Seg Set 13, 2010 6:14 pm

Essa é ótima, serve até de lição. :wink:
POR QUE NÃO FALAR DO RASANTE?
(Estória 70-2)


Manobra Real do Estado Maior da Aeronáutica de 1977. O Grupo de Defesa Aérea (GDA) foi deslocado para Campinas, com a missão de manter o alerta de defesa à Cidade de São Paulo. Primeiramente, Campinas não tem Base Aérea e as instalações do DPV não eram apropriadas para alojar uma Unidade Aérea. Ficamos acantonados na Torre, em beliches, distribuídos nos três cômodos improvisados no andar térreo. Logo acima, muito disputado, era o vestiário e o banheiro de todo o DPV, agora, muito mais concorrido com o nosso pessoal.

O material ficou em barracas montadas no antigo pátio B, bem como as aeronaves e dois trailers que serviam de Centro de Operações Aéreas (COA) e abrigo para o alerta a tempo. Esses trailers foram conseguidos por empréstimo de um amigo de um dos nossos oficiais. Para finalizar o cenário, um caminhão dos bombeiros, como redundância do rádio do Oficial de Permanência Operacional (OPO), acionava o alerta a postos através da sirene e do beacon.

Na época era previsto o desdobramento para a defesa de São Paulo pelo GDA, em Campinas. Acredito que essa estratégia não tenha mudado e que, também, nada mudou em relação às instalações e aos meios para cumprir essa missão. Entretanto nem tudo era ralação, quem não estava engajado no alerta, almoçava e jantava nas instalações do restaurante do aeroporto. Salve o sistema de terceirização das ALAs!

Naquela época o Comandante da 1a ALADA era o Cel Av Ó de Almeida, o Ten Cel Av Castro Paz era o Comandante do 1o GDA e o Maj Av Queiroz o Comandante do GSM. Eu, já Capitão, era Chefe da Seção das aeronaves administrativas (Regente U-42, Universal T-25, Sêneca U-7, Bandeirante C-95 e Bell H-13).

Durante o desenrolar da manobra, fomos notando que éramos carta fora do baralho, que as missões estavam concentradas na área de Brasília e Anápolis. Na Área de Campinas (S. Paulo), certamente pela concentração do tráfego aéreo civil, por segurança, só pintavam alvos de madrugada e assim mesmo eram muito poucos, certamente pelo esforço realizado durante o dia. Ou seja, a unidade essencialmente de interceptação da FAB, estava relegada a um segundo plano em benefício de uma unidade pertencente ao COMAT, da qual sua parcela na Defesa Aérea era proporcional.

Muitas vezes éramos acionados para nada. Decolávamos e quando passávamos ao controle de "Thor" nos era dada uma área para PAC e lá ficávamos rodando que nem peru por uns trinta a quarenta minutos e éramos recolhidos, sem ver nem escutar nada, muito menos interceptar.

Numa manhã bem cedo, ao cagar dos pintos, apareceu um Búfalo C-115. Num rasante sorrateiro fez um pouso curto e dele saiu um Grupo de Combate (GC). Simularam sabotar a pista e voltaram a decolar. Após a decolagem fizeram curva apertada a direita sobrevoando as nossas instalações e jogaram um pequeno gorila de pelúcia no nosso pátio. Nossa esperança de soltar o alerta atrás dele nos foi negada pelo controle da manobra e perdemos a chance de lavar a honra da provocação. Foi aquela água fria na moral da tropa.

Nos raros momentosem que éramos acionados, sintonizávamos as frequências de Anápolis e sempre ouvíamos o pau comer daqueles lados. A frustração só aumentava quando relatávamos o que tínhamos ouvido. Questionada, a Direção da Manobra sempre botava a culpa na falta de janelas disponibilizadas pelo Centro/Controle de SP, mas, tentavam melhorar o nosso ânimo dizendo que ia melhorar.

No terceiro dia, bateu uma ventania cedo, de uns 60, 70 km/h e arrancou as barracas da manutenção e alguns itens mais leves foram arrastados. Com a chuva vindo em seguida, conseguimos resgatar as barracas e jogá-las por cima do material, principalmente o eletrônico e safar a onça. Cumprimos mais um dia frustrado de manobra sem que o ocorrido causasse alguma alteração. Não armamos mais as barracas mas, sim, começamos a preparar o retorno, que na sua maioria seria de caminhão, boa solução para distâncias até mil quilômetros e boas estradas. Recebemos a ordem de retorno e esvaziamos Campinas, menos eu, o 4911 e sua manutenção com uma viatura menor, acho que era uma Kombi.

Eis que, de repente, pousa um Bandeirante com uma comitiva do EMAER para visitar a unidade e muito preocupada com a ventania que ocorrera no dia anterior. Satisfeitos com os meus relatos, voltaram para o Bandeirante e seguiram para Anápolis.

Puto nas calças eu me perguntava por que esses caras só vieram agora. Será que não sabiam que a Manobra já havia terminado, que a Unidade já tinha decolado de retorno e que só havia um pássaro ferido para ver. Mal a comitiva decolou o meu avião ficou pronto. Vocom (plano de voo) feito, decolei em torno das dez horas. Como a pista era a 15, recolhi o trem e fiz curva apertada à direita, mantive a altura e a Pós-combustão (PC). Ainda acelerando passei sobre os meus mecânicos girando o "tonneau" da falsa vitória. Aproveitei a velocidade e subi rápido para o nível de cruzeiro e tomando a proa 360o. O tempo aproximado em rota era de quarenta minutos, o que me garantia um combustível confortável na chegada em Anápolis.

Durante a descida fui transferido para o APP AN e informado que todas as aeronaves estavam no solo e que só era esperado o tráfego de um Bandeirante para daqui a trinta minutos. Olha a comitiva atrasada aí gente! Chamei o OPO e informei a minha chegada, solicitando, ainda, a situação da solenidade de encerramento. – Solenidade encerrada, as autoridades estão indo para o "debriefing" geral no rancho.

– “Copy”.

Chamei a TWR e pedi uma passagem baixa sobre o GDA no sentido sul/norte. Acelerei com a PC até Mach 0.96. Passei rasante sobre as instalações sustentando a PC para fazer bastante barulho e acertei em cheio. A grande maioria dos pilotos, principalmente os do Grupo de Caça, estavam recostados saboreando o chope da vitória. Acho que uma meia dúzia caiu sentada com o susto. Levantei o nariz, saí girando alguns "tonneaux" e voltei para mais duas passagens. rasante de F-103 Mirage

Ao entrar na perna do vento da pista 24, notei que ainda tinha 360 galões e resolvi, então, fazer mais uma passagem. Não dei o trem e comecei a embalar a Jaca. Curva a direita aberta para enquadrar o estacionamento entre as aeronaves estacionadas e a calçada do GDA. Como a cabeceira da pista 24 é bem mais baixa do que a 06, mantive a altura e deixei que o chão subisse para o meu avião. Quando passei pela torre já estava na altura do PAR e a .96 subindo. Da torre para o pátio as alterações foram mínimas. Passei baixo, os presentes dizem que mais baixo que as aeronaves estacionadas, tão baixo que não daria para baixar o trem de pouso. Ao final puxei forte para a vertical varrendo o asfalto com o jato da tubeira. Girei até os 16.000ft e executei um retournement para a perna do vento e pousei.

Dizem que eu quebrei o vidro do Grove, o que é mentira porque já estava quebrado. E que quase atropelei o jipe do Tacarijú. Pelo que eu me lembro consegui livrar o jipe que foi deixado no meio do caminho. Após o pouso a torre me orientou para estacionar no pátio das aeronaves administrativas, o pátio ao lado do hangar de eletrônica.

“Mifu”! Já vou sair do avião preso, pensei.

Taxiei pelos fundos do estacionamento das várias aeronaves e parei onde já estavam me esperando. A maior autoridade era o Taca, muito puto pelo susto que havia tomado quando dirigia o jipe e com a ordem de que eu fosse imediatamente para casa.

É, dessa vez não tem jeito, “mifu” de verde e amarelo.

Cheguei em casa, após quase uma semana, tomei um banho, tomei coragem e contei para a Márcia a merda que tinha feito e que estava esperando a trolha alada que vinha por aí. Lá pelas oito horas da noite tocaram a campainha. Era o Maj Queiroz, Comandante do Grupo de Suprimento e Manutenção e meu chefe direto.

Entrou e já foi dizendo:
– Chama todo mundo, inclusive as crianças!
Senti que o meu Comandante não estava à vontade e que ainda não tinha se decidido pela minha punição. Tinha tomado algumas procurando amortecer o seu coração.Todos presentes, ele começou:
– Gordo, você sabe o que fez?
Eu disse:
– Dei um puta dum rasante!
Ele:
– Não, você quase deixa uma esposa viúva e duas filhas órfãs.
E ainda:
– Gordo, você é um baita instrutor, um cara admirado por todos e referência de todos os novinhos. O limite deles é diferente do seu. Pense nisso.

E, aí, depois de grande explanação pediu:
– Gordo, pede desculpas sua mulher, as suas filhas e a mim.
Assim eu fiz e ele disse:
- espero que tenha aprendido, se aprendeu estou satisfeito.

Deu um beijo na Márcia, afagou as crianças, deu uma olhada marcante para mim e saiu.Também dei sorte, pois no dia seguinte não houve expediente e depois veio o fim de semana. Nesse período o papo extraoficial correu por toda a vila dos oficiais, vila dos sargentos e extrapolou para a cidade.

A Márcia fazia curso intensivo para vestibular quando um colega, sabendo que o seu sobrenome era Côrtes, perguntou se era minha esposa. Com a resposta positiva, identificou-se como um dos controladores que estavam na torre no dia do meu rasante e disse que teve que olhar para baixo para me ver passar, como um foguete no pé da torre e acrescentou:
– A torre tremeu!

Na segunda-feira cheguei para o expediente com a pulga atrás da orelha, pois ninguém falava nada a respeito. À medida que os dias iam passando alguém arriscava uma pergunta ou uma exclamação. Passado um mês do evento, quebrei o pé jogando salão em Canoas e entrei de férias. Quando voltei, as pressões estavam normais e a preocupação com a recuperação do meu pé mascarou a curiosidade sobre o rasante.

Nunca fui chamado pelo Ó de Almeida ou pelo Castro Paz e eles nunca questionaram a decisão do Queiroz. Aliás, ninguém questionou tal decisão. A partir dessa lição, que valeu muito mais que uma punição, sem deixar de ser intrépido, passei a respeitar o limite dos outros muito mais que os meus. O legado deixado pelo Queiroz, de respeitar, em primeiro lugar, os limites dos outros, tem me servido durante toda a minha vida, como oficial, como piloto, como instrutor e como civil.

Algumas vezes, por defender esse princípio, fui atingido de cima por pessoas que me forçaram aos seus limites, mas nunca cedi e fui prejudicado por isso. Por outro lado, na grande maioria das vezes, esse princípio me tem sido de grande valia. Como o Mirage, o rasante é passado. A lição por sua vez é presente e será futuro Até hoje me perguntam sobre o rasante que dei em Anápolis e eu tenho desconversado.
Mas só até hoje!

Alberto de Paiva Côrtes - Cel.Av. (Reserva)
Piloto de Caça - Turma de 1970




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Re: Estórias

#3 Mensagem por alcmartin » Sáb Set 18, 2010 3:13 pm

R.A.Barros escreveu:Galera, quem tem alguma estória referente a aviação, que então compartilhe aqui :D
Sei que muitos tem muito o que contar :wink:


Começando:
Estória retirada do site ABRA-PC
ENGOLIDO POR CUMULUS NIMBUS (CB) EM PARATY
(Estória 75-2)


Certo fim de tarde, início de noite, na BASC (Santa Cruz). Minha função era de chefe da SCOAM (Seção de Controle de Operações Militares) e estávamos na véspera de uma manobra “SACI” com a Brigada Paraquedista do EB (Exército Brasileiro), sendo o assalto aeroterrestre planejado para a área de Resende, no Vale do Paraíba.

A previsão meteorológica não era nada boa. Chuva forte à noite e teto baixo na manhã seguinte. Nada bom para se fazer ataques de apoio aéreo aproximado e lançamento de PQD (paraquedistas).

Peguei meu “Jeep” funcional com o Gustavo (Guga), então um guri de oito anos, que vivia “grudado” comigo quando o assunto era operacional, e fui para o acampamento dos PQD, próximo à cabeceira da pista 04, falar com o general comandante da brigada.

Dei as “más novas” e após os devidos brifins e acertos, saí com o general a conversar pelo pátio de cheque-final e vimos um enorme CB (cumulus nimbus) lá pela área de Paraty – Angra.

Temendo que ele viesse para a BASC, falei com o OPO (Oficial de Permanência Operacional) de serviço e perguntei quantas aeronaves tínhamos voando. Ele me disse que umas seis e que já estariam sendo recolhidas.

Vimos mesmo uns cinco F-5E pousando quando me chamaram no rádio. O “THOR” (Controle de Defesa Aérea, em Brasília) acabara de informar que perdera contacto radar – rádio com um dos F-5E que estava numa missão de interceptação sobre o setor de Paraty.

Fui de imediato para a sala do OPO e iniciei o acompanhamento da situação. Era um elemento liderado pelo Mauro, da minha turma, cujo ala era o Ten. Rui Barbosa Nunes.

Por coincidência eu havia cruzado com eles, na sala de equipamento de vôo, ao voltar de uma missão, naquela tarde, e trocamos algumas palavras, sendo que o Nunes dissera estar um pouco gripado. Eu lhe disse ser melhor então não voar. Ele respondeu que era coisa leve e que “hora de vôo perdida era hora de vôo nunca mais recuperada”.

Eu gostava do Nunes. Garoto dinâmico, educado, vibrador e jovial. Voara algumas missões de instrução comigo em seu curso de formação operacional de F-5E/B. Era irmão do Gilmar, da turma de 65 (BQ). Mesmo “pedigree”!

Esgotada a fase de “Alerfa” (Alerta) e entrado direto na de “Detresfa” (Acidente quase certo) já não havia mais esperança do retorno do Nunes. Foi acionado o SAR (Busca e Salvamento), decolando do Campo dos Afonsos um helicóptero “Puma”, pilotado pelo Tsuji (turma de 65) e Neves (turma de 68).

Pousaram em Santa Cruz, fizeram um brifim conosco e fomos, eu aí embarcado, para o setor da Ilha Grande – Paraty. Noite escura e ventania super forte. O CB estava muito próximo e ativo.

Circulamos a Ilha Grande em seu setor de Angra e fomos até próximos à Ponta do Boi, em Paraty, dali voando no setor do mar aberto da ilha. Próximos à Ponta do Boi avistamos uma luz a piscar no mar. Euforia a bordo! Deveria ser o Nunes, de seu bote, a nos sinalizar. Foi iniciada a aproximação para a luz sob muita chuva e vento. Tensão a bordo... Ao chegarmos a uns 100 pés vimos que a luz era de um pequeno barco de pesca que balançava muito no mar super agitado. Frustração geral!

Ainda voamos uns 30 minutos enquanto pudemos, mas tivemos de voltar a Base. O CB “entrava rachando” ali!

Passamos a noite em brifins e preparativos para o reinício das buscas logo cedo, o que foi feito. Decolei ao nascer do sol com um U-42 “Regente” e vasculhei todo o litoral até pousar em Santos. Reabasteci e voltei esquadrinhando tudo a baixa altura e velocidade; nada...

Continuamos as buscas à tarde por uns 10 dias. Voei muito com os “Puma” como observador de porta. Fomos até cerca de 50 milhas náuticas do litoral, nada escapava de ser investigado no mar. Qualquer objeto flutuante que era avistado era investigado. Nada...

O Gilmar veio com sua família para a Base e ficaram acompanhando tudo de perto; que sofrimento, que pena! Eles possuíam um tio, mateiro experiente, que foi chamado, pois havia, também, a possibilidade de que o Nunes se ejetara e pudesse estar na densa mata atlântica da Serra do Mar, na área de Angra-Cunha-Paraty.

Um “Puma”, com colegas meus de turma (Joel e Paulo Tadeu) foi acionado. Fomos, Gilmar, o tio e eu, até uma clareira da serra e pela mata andamos por todo um dia; nada... No dia seguinte isso se repetiu; nada...

Foram avistados detritos no mar próximos à Ponta do Boi. A descrição coincidia com a espuma marrom dos tanques do F-5E. Fui com um “Puma” para a área e realmente vimos as espumas. O helicóptero nos deixou, eu e um cabo do PARASAR, o Tinoco, que havia sido meu comandado na Marambaia, no Condomínio Laranjeiras, onde consegui uma lancha emprestada e fomos em direção ao local. Que mar agitado! Após uns 30 minutos chegamos à área mas nada vimos, a não ser um aviso de um “Bandeirante” SAR de que havia tubarões próximos. f-5 para interceptação

No outro dia um “Puma” me deixou com mais 3 elementos do PARASAR num ponto do litoral, a oeste da Ponta do Boi, e dali saímos a esquadrinhar as pedras e praias por todo um dia; nada...

As buscas foram encerradas em mais uns 5 dias. Após isso, numa tarde, recebi na Base a informação de que haviam sido encontradas espumas tais como as do F-5E, numa praia da Vila do Abrahão, na Ilha grande. Não acreditei que fosse verdade, mas enviei um pessoal para recolhê-las...

Era!

Isso, se confrontado com as informações do último “plot” radar de “Thor”, da observação do Mauro que disse ter visto o Nunes iniciar a curva de conversão da interceptação às suas 7 horas sobre a área de Paraty e as correntes da área, nos deixa muita dúvida de onde poderia ter sido a queda e impacto com o mar. Se formos considerar as correntes marítimas, entre a Marambaia e a Ilha Grande... se considerarmos o “Thor”, entre a Ponta de Paraty e a Ilha Grande, mas então as correntes não poderiam ter levado as espumas para a Enseada do Abrahão...

O cenário em vôo não foi difícil de imaginar; vôo noturno, interceptação supersônica a Mach 1,2, curva de conversão com 60 graus de inclinação puxando uns 2,5G, cheque cruzado bem rápido entre os instrumentos de vôo e o escopo do radar – aquele nosso velho AN/APQ-153 – um CB enorme logo abaixo com suas inerentes correntes ascendentes- descendentes e muito gelo, piloto novo, em fase de instrução... uma vez “entrado” nele, bem difícil de se recuperar...

Pena... perdemos um ótimo oficial, colega e caçador.

Marco Aurélio Rocha Rocky – Maj.Av.R1.
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Renan, as vezes parece que a gente contando as coisas aqui é mentira, porque sempre alguem viu, ou conhece alguem que viu, etc. Mas não é. As FA´s brasileiras são relativamente pequenas. Um tenente conhecerá, pelo menos de vista, todos os outros tenentes. Porque na AFA terá contato com 3 turmas da frente e 3 turmas atrás. E são poucas bases aéreas.

O preambulo foi para contar que estava em S.Cruz no dia em que o citado acidente ocorreu. Eu e 3 colegas, todos alunos da EPCAR, tentando peruar vôos, de qualquer coisa que voasse. :)
Ao entrarmos no esquadrão, o cmte já estava vestido para sair em busca. Mesmo assim nos recebeu e explicou o ocorrido. Completamente chocados e sem graça, :( fomos saindo e deparamos com a esposa, ou irmã, do tenente Nunes. Ela estava chorando, mas quando nos viu, com a farda de aluno, parou e por instantes, pareceu viajar no tempo. Então voltou ao semblante triste. :(
Essa imagem foi o primeiro contato real que tive com a dor de um acidente aéreo e marcou a mim e a meus colegas, igualmente. E nunca mais esqueci do nome do Tenente Nunes... :(
Só o que estranhei do relato foi o horário, em minha memória foi logo após o almoço(ainda não tinhamos almoçado). Mas faz tempo, ou o próprio oficial que relatou pode ter tomado conhecimento do fato mais tarde.

abs!




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