Marechal-do-ar escreveu:FCarvalho escreveu:Isto sinceramente já passou do cúmulo do ridículo. É patético, e risível. Já não bastasse ter que aturar uma legião de semi-analfabetos e despreparados nas IES, por causa de uma legislação tão absurda quanto ordinária, ainda se vê isso.
FCarvalho, você é professor?
Se for, por favor, conte um pouco da sua experiência, geralmente os professores com quem converso não são contra as cotas.
Olá Marechal, bom dia. Desculpe pela demora na resposta, mas aqui vai.
Sim, sou professor em IES federal. E pedagogo, acrescente-se. Trabalho princiapalmente nas áreas de gestão/políticas publicas educacionais e em história da educação.
Em todo caso, de modo bem resumido, não sou a favor de nenhum tipo de cota, seja ela racial, social ou o que venham a chamar, e por um motivo bem simples: este tipo de "politica" tira todo o foco dos problemas principais, e reais, da educação no Brasil. E qual são os problemas reais da educação no Brasil? Cinco questões fulcrais postas na lei de diretrizes e bases da educação: o Estado tem a obrigação de garanti os seguintes direitos: acesso, permanência, sucesso e qualidade na educação básica. Cumprimos hoje quase que integralmente com o primeiro, ainda que os números sejam muito díspares em termos regionais, mesmo dentro de um mesmo estado, e mal e porcamente todo o restante no Brasil inteiro.
Então, na verdade o que acontece nas IES, sejam federais ou estaduais, em função das cotas - que não são mais do que um mero paliativo de fundo político-ideológico e, penso, uma das maiores jogadas de marketing ideológico e social dos últimos vinte anos, frente às massas - é que os problemas da educação básica não se resolvem, e não são resolvidos, pura e simplesmente em um ou dois mandatos, e nem mesmo em uma década. O que estamos vendo hoje no Brasil, como bem disse o colega Dholf é a venda, ou imposição, de mais uma daquelas verdades incontestes cheias de rótulos e mistificações que as esquerdas políticas sempre adotaram como bandeira, incentivando e alardeando um eterno, e quase etéreo, conflito de classes, de pessoas, interesses, etc, etc, etc..
E com base nisso, ela apela frequentemente para as diferenças entre as pessoas, e não suas similaridades e aproximações como modelo de identificação social, embasando assim suas soluções em teses há muito descabidas e desanparadas mesmo em países como os USA hoje, onde as cotas estão encontrando cada vez menos espaço como solução das mazelas sociais, econõmicas e educacionais, apenas para citar o principal exemplo de onde veio a idéia base das cotas aqui. Lá eles fizeram o dever de casa. Ou seja, investiram nos cinco pontos acima por primeiro e em prioridade a qualquer outro tipo de opção, mesmo com as cotas.
No nosso presente caso, isso aqui não se aplica, porque, para dar um exemplo, o nosso Plano Nacional de Educação, que é decenal, já vai para a sua segunda edição, com bastante atraso, diga-se, e ainda contempla metas, agora estipuladas para serem alcançadas em 2024, que já o tinham sido ainda em 2002 quando de sua primeira edição. Cito, alfabetização completa de crianças até os 8 anos de idade, e da população adulta analfabeta no Brasil (hoje em cerca de 13,9 milhões).
O que se está tentando fazer hoje com as cotas é simplesmente tapar o sol com a peneira. Porque elas simplesmente não irão alterar significativamente o quadro de adultos ou jovens que ingressam no ensino superior a cada ano, e no médio/longo prazo, ajudam, quer gostemos ou não de admitir isso, a diminuir a qualidade do processo ensino-aprendizagem nas IES, que tem necessariamete que tentar fazer um trabalho de educação de base que obviamente não foi feito ou foi mal feito pelas escolas públcias, que é de onde vêem a maioria dos cotistas. Neste sentido atesto aqui minha própria experiência. A imensa maioria dos meus alunos, que serão futuros professores, não tem a mínima condição intelectual, emocional ou mesmo maturidade para estar frequentando um curso superior. Tais são os óbices imposto a eles na educação básica que nunca tierem em qualidade, ou mesmo, em quantidade suficiente para prover-lhes a condição de seguir ao ensino superior. E isso ocorre independente da cor de sua pele ou condição social. Todos eles sofrem por demais, pelo simples fato de não estarem preparados para estar em uma IES.
Para não me alongar mais, pois o assunto é extenso, ainda digo o seguinte. Hoje não existe mais um processo verdadeiramente seletivo para o ingresso nas IES. O que há na verdade é apenas um processo, digamos, organizatório e medianeiro que visa integralizar as vagas dispostas pelas IES públicas de forma a dar a este um certo ar de acesso mais democrático, entre todos, o que de fato não ocorre, mas que visa principalmente tentar favorecer, ainda que de forma indireta, o alunado das escolas públicas que concorrem obviamente em desvantagem com os alunos das escolas particulares, pelos motivos já sabidos. Neste sentido, além de termos alunos que não tem condições de estarem em um curso superior, ainda se tem a falsa idéia de colaborar para democratizar o acesso, o que nem de longe é verdade, principalmente nas IES públicas.
Por fim, eu tenho um ditado comigo, e que vez ou outra o expresso aos meus alunos e por aí. A universidade é um direito de todos. Mas ela não é para todos.
Agora, se queremos mesmo resolver o problema da educação superior, concretamente, precisamos primeiro, e com urgentíssma pressa, atentar para as questões postas da educação básica. Sem isso, e que levará muito, mas muito tempo mesmo, não vai ter cota que resolva, ou amenize as coisas, como se alardeia.
ps: eu estudei em escola pública e particular. e meus pais nunca foram ricos ou bem de vida, e lutaram a vida toda para bancar a educação dos filhos. sem cotas, sem bolsas-esmola, e nem nenhuma outra vantagem adicional do Estado. E se eu cheguei até aqui com 2 faculdades, uma especialização, um mestrado e um doutorado por vim, não foi por causa da cor da minha pele ou da minha condição social, mas porque a minha família me deu a condição, e a oportunidade, de conseguir por meus próprios méritos e esforços, chegar onde cheguei. se eu consegui, porque os meus alunos não podem também?
abs.