Bolívia inicia campanha de execração de colonos brasileiros na Foz do Abunã
SEX, 27 DE ABRIL DE 2012 17:55 AGAZETA.NET
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O terror ecoa na selva. O semblante dos colonos brasileiros é de pavor. Eles estão humilhados. Vêem o que semearam por décadas, sendo destruídos por facínoras representantes de um Estado sem governo: a Bolívia. Soldados bolivianos bêbados e armados de fuzis impõem o terror, ameaçam estuprar mulheres e roubam o gado e a castanha como verdadeiros 'jagunços oficiais'.
É este o clima vivido neste momento, na foz do rio Abunã, uma extensa área na divisa do Acre com o departamento boliviano do Beni, e palco de uma onda de saques, incêndios e até ameaças de morte a cidadãos brasileiros fincados na floresta amazônica boliviana desde a década de 70.
Fernando Rodrigues e a esposa perderam quase tudo, após militares bolivianos incendiarem casa e os expulsarem de colocação (Foto: Cedida por Manoel Tavares)
Não se estranha que a subjugação desses brasileiros já leve décadas. No entanto, essas ações se intensificaram, desde a última quinta-feira, 19, elevando-se a ataques que numa primeira análise, parecem ser financiados por empresários da castanha, nas cidades de Riberalta e Cobija. As cidades possuem duas usinas de beneficiamento, cada uma, e na ausência do Estado Boliviano, o aparato bélico estatal corrupto sofre influência do poderio econômico de empresários de Pando e do Beni.
Ao menos 80 militares vindos de Riberalta (cidade a 250 quilômetros da fronteira com o Acre) estão na região, desapropriando terras cultivadas por famílias brasileiras, muitas ali desde a década de 70. Os soldados estão sendo liderados por um coronel identificado por Torres, o mesmo que tentou negociar a esposa de um brasileiro para violentá-la sexualmente.
José Carlos Caldas também teve a propriedade invadida e registrou queixa na Polícia Federal (Foto: Clériston Amorim/AGazeta.net)
Alcoolizados, como é sempre do feitio dessas tropas que estão no local, dez soldados invadiram a casa de José Carlos Fernandes Caldas e lá permaneceram do dia 19 ao dia 23 deste mês, onde confiscaram toda a produção de castanha, cerca de duas mil latas. Cada lata poderia ser vendida à Cooperacre, uma cooperativa de Capixaba, a R$ 22.
“Ele chegaram bêbados, pediram para que José se ajoelhasse e só não bateram nele porque ele se humilhou”, narra Manoel da Silva Tavares, que é observador do Palácio do Itamaraty na região e funcionário da Secretaria de Meio Ambiente, da Prefeitura de Capixaba (80 quilômetros de Rio Branco e cidade mais próxima dos conflitos).
Num tom patético, um dos comandados de Torres chegou a afirmar: “Estamos prontos para derramar o sangue pela pátria boliviana”. O colono registrou uma queixa na Polícia Federal de Epitaciolândia.
No mesmo período: no sábado, dia 21, o coronel Torres causaria também uma das mais aterrorizantes situações para o irmão de José Caldas. Sob suas ordens, o colono Fernando Rodrigues Caldas teve a sua casa e uma miniusina de beneficiamento de farinha de mandioca incendiadas por soldados. Das cinzas só restou o fogão.
“O mesmo coronel Torres pegou no braço de minha esposa e disse que a levaria com ele”, diz. “Troco a chôca (palavra para ‘loira’) em troca de dez soldados”, disse o oficial, segundo Fernando.
"Então, eu disse ao coronel que minha mulher não era animal para ser trocada e consegui convencê-lo. Mesmo assim, os seus soldados passaram a noite bebendo e nos ameaçando de morte dentro de nossa propriedade”.
O rapaz foi localizado por AGazeta.net quando viajava às pressas, em motocicleta com a mulher na garupa, num trecho do quilômetro 18 do ramal Brasil/Bolívia. Ele vinha em busca de ajuda para retirar 80 cabeças de gado que foram deixadas na propriedade. Outras cinco já tinham sido embarcadas em caminhões bolivianos rumo a Riberalta.
Coronel Torres, ao centro, é considerado o homem que impõe o terror a colonos brasileiros. Nesta foto, almoçando armado em território nacional (Foto: Cedida por Manoel Tavares)
O ultimato do Governo Boliviano para os brasileiros se retirarem é de 15 dias. “Por isso, vou ter que remover até amanhã (sexta-feira) as 80 cabeças de boi que deixei lá. Senão vai virar tudo churrasco de soldado”, brinca.
A área que está sendo desapropriada pelos bolivianos é de mais ou menos mil quilômetros, segundo levantamento da Prefeitura de Capixaba, por meio do Google Earth. Ela começa na região de Santa Rosa, próximo à cidade de Riberalta e se estende à Cobija, a capital do departamento de Pando, já na fronteira com a cidades brasileiras de Epitaciolândia e Brasiléia (a 240 quilômetros de Rio Branco).
Até esta quinta-feira, 26, cerca de 80 militares bolivianos tinham chegado à região. Na próxima segunda-feira, 30, outros 15 soldados vindos de Cobija e de Riberalta, aportam na Vila Rapi-Rã, separada do Brasil apenas pelo ramal Brasil/Bolívia.
Na região do Chipamano, eles se concentram em grupos de cinco ou seis soldados por cada propriedade tomada. Ali, confiscam a castanha e as revendem também para o custeio das próprias operações que realizam ou mesmo para ficar com o dinheiro.
Invasões ao território nacional – Fotos mostram que tropas bolivianas sob o comando de Torres estão invadindo o solo nacional armadas de pistolas e facões. As imagens foram registradas por brasileiros na região da Vila Rapi-Rã, no início desta semana,
Numa dessas imagens, o coronel Torres, acusado de tortura aos colonos brasileiros dentro da Bolívia, se mostra sorridente numa rodada de comandados, durante almoço num restaurante do lado brasileiro.
Nas fotos, eles almoçam tranquilamente no estabelecimento de um brasileiro em solo nacional, embora armados.
“Isso nos mostra uma contradição, porque ao passo que somos destratados lá, aqui nós os recebemos muito bem”, pontua Manoel Tavares.
Exército Brasileiro se instalou no início do ramal Brasil/Bolívia (Foto: Clériston Amorim/AGazeta.net)
O observador do Itamaraty enviou nesta quinta-feira, 26, relatório da situação ao Governo Brasileiro, em Brasília e também à embaixada do Brasil em La Paz. Em anexo, estavam as imagens das tropas bolivianas em território brasileiro.
Desde que a tensão aumentou no local, o Exército Brasileiro mantém uma tropa de cerca de 50 homens na entrada do ramal Brasil/Bolívia, próximo ao km 4 e a mais ou menos oito quilômetros da Vila Rapi-Rã. Embora estejam todos armados de fuzil, a missão dos soldados brasileiros se resume a fiscalizar o tráfego de veículos que saem do ramal em direção à cidade de Capixaba.
Produtor vai resistir – A caminho da colocação do Limoeiro encontramos Bento Marques de Souza, cuja família está na região desde 1975. Seus pais, ex-donos de três seringais na Bolívia, legaram aos filhos as terras que hoje estão sendo desapropriadas.
“Aqui, até 1990, era muito tranquilo. Eles (os bolivianos) reivindicavam apenas 10% da produção de borracha e agora de castanha e ficava assim”, relembra Souza, que tem uma carteira de identidade, que segundo ele, lhe dá direitos parecidos aos de uma dupla nacionalidade, já que a família está desde a década de 70 na área.
Afirma que vai ficar no local até as “últimas consequências”, porque acredita que a perseguição boliviana que agora sofrem tende a acabar nos próximos meses.
Ele cita um indivíduo identificado por Pato Lebre, comprador de castanhas, como principal articulador dessas ações.
“Esse boliviano veio aqui no ano passado e quase não comprou castanhas, porque queria levar por um preço bem abaixo do de mercado”, diz Bento de Souza. No entanto, teria saído do local afirmando: “Em 2012, vocês saberão do que sou capaz de fazer contra vocês”.
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