Nova estatal para petróleo ganha força em Brasília
BRASÍLIA - Vem ganhando força, na cúpula do governo, a tese de criar uma nova empresa, 100% estatal, para administrar os contratos de exploração da chamada camada do pré-sal, área em que estão localizadas reservas petrolíferas de grande potencial, como Tupi e Júpiter.
No mês passado, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, abriu uma polêmica com a Petrobras ao defender publicamente essa hipótese. A maior estatal brasileira, temerosa de perder poder com a criação de uma nova empresa, rechaçou a idéia.
Por algumas semanas, predominou nos bastidores de Brasília a interpretação de que a proposta de Lobão não teria o apoio da Casa Civil. Mas, segundo três fontes do governo ouvidas na semana passada pela reportagem, essa maré pode estar mudando. A avaliação é de que a criação da nova estatal vem conquistando a simpatia da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e também do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A favor da tese da nova estatal, que seria 100% pública, pesa o fato de a Petrobrás, apesar de ser controlada pelo governo, ter parte significativa de suas ações nas mãos da iniciativa privada brasileira e estrangeira. Com a nova empresa, o governo traria mais para perto de seu domínio a gestão das reservas gigantes.
O próprio Lobão, nas vezes em que defendeu a criação da nova estatal, fez referências à participação da iniciativa privada no capital da Petrobras, afirmando que a petroleira tem 60% de capital privado.
Modelos
A empresa 100% estatal é uma das condições para a aplicação de dois tipos de modelo de exploração petrolífera: o de "partilha" e o de "prestação de serviços". No primeiro caso, o óleo extraído pertence à União e a empresa 100% pública contrata as petroleiras para explorar os campos. As empresas contratadas recebem a parte que for combinada, em petróleo ou em dinheiro.
No segundo modelo, a empresa 100% estatal contrata as petroleiras na condição de prestadoras de serviços. Uma das justificativas técnicas para a adoção desse modelo é que o petróleo da camada do pré-sal poderia estar interligado por dutos profundos e, sem uma coordenação na sua extração, haveria um risco de um campo extrair o óleo mais rapidamente e "invadir" a reserva de outra área.
É como se várias empresas estivessem compartilhando o líquido de uma bacia, cada uma com seu canudo. Mas essas são apenas especulações. O fato é que o governo ainda não fechou questão em torno do modelo que usará na exploração do pré-sal.
Aliás, o debate em torno do marco regulatório do petróleo tem tudo para esquentar a partir de hoje quando deverá ser realizada a primeira reunião da comissão interministerial criada pelo governo para discutir o assunto. A comissão terá prazo de 60 dias para apresentar uma proposta ao presidente Lula.
Lobão coordenará o grupo, que será formado ainda por Dilma e pelos ministros Guido Mantega (Fazenda), Paulo Bernardo (Planejamento) e Miguel Jorge (Desenvolvimento). Integram também a comissão o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômicos e Social (BNDES), Luciano Coutinho e o diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima.
Fontes que acompanham o tema disseram também que faz parte da estratégia do governo tentar resolver primeiro a questão das regras para a exploração do pré-sal para depois, em um segundo momento, tratar da distribuição dos volumosos royalties que serão pagos por esses campos petrolíferos.
Isso ocorre porque a divisão dos royalties deve produzir longos debates entre União, estados e municípios. O governo teme que essas disputas contaminem a tramitação, no Congresso, de eventuais projetos propondo mudanças nas regras para exploração de petróleo.
Royalties
O governo começa a definir nesta semana, por meio de uma comissão interministerial, a estratégia para mudar as regras de divisão dos lucros e dos royalties derivados da exploração das novas reservas de petróleo. Há vários meses, o Palácio do Planalto vive polarizado em torno de duas alternativas distintas: uma revisão geral da Lei do Petróleo, que inclui até mesmo a criação de uma nova empresa estatal, ou uma ação cirúrgica e rápida para ajustar o decreto que regulamenta a cobrança das participações governamentais sobre a produção de óleo e gás natural.
O debate foi deflagrado no fim do ano passado, quando se descobriu que o Brasil possui uma enorme - porém não totalmente dimensionada - reserva de petróleo na chamada camada de pré-sal da plataforma continental, no subterrâneo do oceano situado entre o norte de Santa Catarina e o centro do Espírito Santo, a distâncias superiores a 100 quilômetros do litoral.
Projeções extra-oficiais indicam que o petróleo encoberto pela camada de sal pode totalizar 50 bilhões de barris - quatro vezes mais do que todo o "ouro negro" descoberto até hoje no País. O governo tem duas formas de ganhar com o petróleo: como sócio majoritário da Petrobrás, que tem direito a mais da metade dos dividendos e lucros da empresa, e como poder público, com direito a receber das empresas uma compensação financeira pela extinção de um recurso natural finito.
Rendimento
Neste ano, essas compensações devem render cerca de R$ 25 bilhões aos cofres públicos, e até 50% disso deve ficar com a União. Entre as estratégias da equipe econômica para extrair ainda mais dinheiro da exploração do petróleo, existem duas propostas principais em discussão: a criação de uma estatal para administrar a exploração das novas reservas e a modificação do decreto 2.705/98, que regulamentou a Lei do Petróleo.
Esse decreto define as alíquotas e faixas de isenção utilizadas para a cobrança da "participação especial", uma espécie de imposto de renda pago apenas pelos campos de petróleo mais produtivos do País. Somente 14 dos 73 campos de mar contribuem com esse tributo. Marlim, na Bacia de Campos, é responsável por 43% de todos os pagamentos.
Defensor
O diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima, foi o primeiro a defender, ainda no ano passado, que o governo aproveite as facilidades de um decreto para alterar, por canetaço, a faixa de isenção e as alíquotas da participação especial. Essa saída seria simples, rápida e proporcionaria um reforço considerável de recursos nos cofres da União.
Os problemas dessa estratégia, segundo os críticos, é que não corrige as distorções que existem atualmente no modelo de repartição dos royalties e participações especiais, que dependem de mudanças na Lei do Petróleo.
Fonte: http://www.tribunadaimprensa.com.br/not ... economia01