Trump queria mais (muitas mais) armas nucleares e Tillerson chamou-lhe "bronco"
Numa reunião, em Julho, o Presidente norte-americano deu um raspanete aos conselheiros e disse que o país devia ter dez vezes mais armas nucleares. No final, em segredo, o secretário de Estado desabafou: Trump é "um bronco".
Alexandre MartinsAlexandre Martins
11 de Outubro de 2017, 18:44
O Presidente norte-americano, Donald Trump, disse aos mais altos responsáveis políticos e militares do país, durante uma reunião no Pentágono, que os Estados Unidos deveriam ter dez vezes mais armas nucleares do que têm actualmente. Foram comentários como este que levaram o secretário de Estado, Rex Tillerson, a desabafar no final da reunião que o Presidente norte-americano é um "bronco", noticia esta quarta-feira a NBC News.
A relação entre Donald Trump e Rex Tillerson começou a degradar-se no Verão, quando os dois responsáveis fizeram uma série de declarações contraditórias sobre vários assuntos. Nos últimos meses, o secretário de Estado tentou manter vivos, através do diálogo, temas como o bloqueio do Qatar pela Arábia Saudita, o acordo sobre o programa nuclear iraniano e a estratégia para lidar com as ambições nucleares da Coreia do Norte, mas o Presidente norte-americano veio sempre a público desautorizar Rex Tillerson, dizendo o contrário do que ele tinha dito.
Na última semana de Julho já era óbvio para quem acompanha de perto as notícias da Casa Branca que Trump e Tillerson não conseguiam estar na mesma sala sem que um deles dissesse ou pensasse algo rude sobre o outro. A paciência do secretário de Estado parece ter-se esgotado entre os dias 19 e 20 de Julho, após duas reuniões importantes que juntaram vários altos responsáveis políticos e militares, como o vice-presidente, Mike Pence; o secretário da Defesa, James Mattis; e o chefe do Estado-maior das Forças Armadas, o general Joseph Dunford – para além do secretário de Estado, Rex Tillerson, e de altos responsáveis da Casa Branca na época, como o então principal estratega de Donald Trump, Stephen Bannon, e o então chefe de gabinete, Reince Priebus.
A reunião de 19 de Julho decorreu na Casa Branca e tinha como objectivo discutir e aprovar uma nova estratégia norte-americana para a guerra no Afeganistão, mas o encontro foi dominado por um acesso de fúria de Donald Trump contra o comandante das forças norte-americanas no país, o general John Nicholson.
Segundo algumas das pessoas que estiveram nessa reunião (que falaram à NBC News sob a condição de anonimato), o Presidente disse que o general Nicholson devia ser substituído porque os EUA estão a perder a guerra no Afeganistão, e comparou os responsáveis presentes na reunião a um consultor que foi contratado a peso de ouro para renovar um restaurante de Nova Iorque e que ao fim de um ano apenas tinha aconselhado o alargamento da cozinha.
Essa reunião acabou sem que o Presidente tenha aprovado uma das várias propostas de mudança de estratégia para a guerra no Afeganistão que estavam em cima da mesa – Trump não concordava com nenhuma, e foi isso que o levou a destratar os seus conselheiros e o comandante das forças norte-americanas no Afeganistão, atrasando ainda mais a apresentação do novo plano.
Só quatro mil?
Um dia depois dessa reunião na Casa Branca, os responsáveis voltaram a reunir-se, dessa vez no Pentágono, numa sala conhecida como "O Tanque". Mais uma vez, o ponto principal era a definição de uma estratégia para o Afeganistão, mas o Presidente norte-americano deixou muitos dos presentes de boca aberta, segundo o relato feito à NBC News, quando estava a ser informado sobre o arsenal nuclear norte-americano:
ao passar um slide onde se lia que os Estados Unidos tinham cerca de 32 mil armas nucleares no final da década de 1960 contra as actuais quatro mil, Donald Trump disse que queria voltar a ter tantas como naquela época.
Segundo a NBC News, alguns dos responsáveis presentes disseram ao Presidente que isso não seria possível porque iria contra décadas de uma estratégia global de redução de armamento e contra os tratados internacionais assinados por todos os seus antecessores desde Ronald Reagan – e que, para além disso, a superioridade militar norte-americana em relação aos outros países é hoje mais vincada do que quando o seu arsenal tinha 32 mil armas nucleares.
Na mesma reunião, Trump queixou-se do que considera ser a falta de gratidão dos sul-coreanos perante a defesa militar norte-americana, e alguns dos seus conselheiros salientaram que os Estados Unidos têm importantes ganhos estratégicos e de segurança por estarem presentes na Coreia do Sul.
No final dessa reunião, quando os responsáveis políticos e militares ainda estavam a sair do Pentágono, o secretário de Estado, Rex Tillerson, terá desabafado o seu descontentamento em relação a Donald Trump perante um pequeno grupo de conselheiros – na semana passada, a NBC News noticiou que Tillerson chamou a Donald Trump "moron" (bronco, idiota), e esta quarta-feira ficou a saber-se que esse comentário foi feito no final daquela reunião no Pentágono.
O Presidente norte-americano reagiu a esta última notícia da NBC News com duas mensagens partilhadas no Twitter. Na primeira, Trump acusa a NBC de inventar uma história para o humilhar: "A mentirosa NBC News inventou a história de que eu queria um aumento de dez vezes do nosso arsenal nuclear. Pura ficção, inventada para rebaixar. NBC = CNN!"
Numa segunda mensagem, o Presidente dos Estados Unidos da América sugeriu que os principais canais de televisão norte-americanos podem ter as suas licenças de emissão em risco: "Com todas estas notícias falsas a saírem da NBC e de outros canais, quando é que será apropriado contestar as licenças deles? Mau para o país!"
https://www.publico.pt/2017/10/11/mundo ... co-1788522