Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Enviado: Dom Dez 07, 2008 12:41 am
Excelente.
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Antes fazer pouco do que fazer errado | 23.12.2008
É isso que tem prevalecido na política econômica. Pena que tantas áreas do governo, com destaque para o Itamaraty, mostrem tamanha obsessão pelo erro
Antonio Lacerda/EPA/Corbis
Encontro de líderes na Bahia: eles batem, o Brasil apanha
Por J.R. Guzzo
É realmente uma pena que o Brasil, que vinha com tudo para comemorar um 2008 muito bom nos resultados básicos da economia, tenha encontrado em seu caminho um desses desmancha-prazeres que freqüentemente dão um jeito de aparecer nas piores horas. O terceiro trimestre, como se viu, registrou um avanço de quase 7% no PIB em relação ao mesmo período de 2007. Não houve como comemorar, porém. O grande número apareceu, brilhou por um instante e foi embora, secado pela certeza de que, já naquele momento, a crise mundial estava provocando outras cifras na economia brasileira. Tudo bem; fica para outra vez. O que importa é o que pode ser feito agora e qual a garantia de que o governo, diante das dificuldades já presentes no momento e das que vão aparecer no curto prazo, resista à tentação e às pressões para tomar decisões erradas.
Garantia, mesmo, não há nunca, mas existe o conforto relativo de saber que até agora não parece ter avançado nenhuma idéia mais séria de tentar as soluções tipo "tem de mudar tudo". Há ações do governo, mas não se pensa em "pacote". Medidas administrativas foram tomadas aqui e ali, mas ninguém propôs remédios jamais testados antes ou, pior, já testados com fracasso. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva diz que a taxa de juro é um absurdo, mas segura no cargo o presidente do Banco Central, que mantém os juros no nível em que estão; joga no vermelho e no preto ao mesmo tempo e consegue, assim, agradar a platéia sem correr o risco de mudanças que poderiam levar a economia a território desconhecido.
O presidente, nessa questão, parece mais inclinado a ficar com o que sabe do que a tentar o que não sabe. Sabe, por exemplo, que o Brasil cresceu a 6,8% num trimestre durante o qual os juros estavam basicamente tão altos quanto estão agora; se forem reduzidos em meio ponto ou coisa parecida, pois muito melhor que isso não dá para fazer de uma vez só, quantos por cento a mais a economia poderá crescer? Como ninguém é capaz de apresentar um número que possa ser levado a sério, a impressão é que o governo prefere ficar com a velha máxima: se você não tem certeza a respeito do que precisa fazer, é melhor não fazer nada.
Essa espécie de calmaria na área econômica contrasta com a insaciável busca pelas soluções comprovadamente fracassadas que marcam outras áreas do governo. Ainda não dá para dizer qual delas acabará com o título de pior ao fim do governo Lula; trata-se, no caso, de campeonato por pontos corridos, em que o vencedor será quem acumular o maior número de derrotas, e resta muito jogo para ser jogado. Mas o final de 2008 parece estar confirmando que vai ser difícil tirar a taça da área de política externa. Não consegue ganhar uma, desde o começo do atual governo, e tem tudo para chegar a 31 de dezembro de 2010 no topo da classificação geral. Justo agora, por exemplo, fechou o ano com chave de ouro na Cúpula da América Latina e Caribe, recepcionada pelo Brasil nas praias da Costa do Sauípe. A grande vitória da reunião, de acordo com o ministro do Exterior, Celso Amorim, foi a ausência dos Estados Unidos, da Espanha e de Portugal - algo que certamente abre possibilidades ilimitadas de novos sucessos no futuro; basta, para isso, dar um trato na lista de convidados. Depois dessa não seria preciso dizer mais nada, mas a coisa não ficou por aí. O Itamaraty queria que a cúpula eliminasse a cobrança dupla da Tarifa Externa Comum no comércio da região. Não conseguiu; o Paraguai não aceitou, e o chanceler Amorim, sempre disposto a entender tudo, disse que se fosse paraguaio também não iria aceitar. Queria que fosse aprovado um Código Aduaneiro. Também não conseguiu. Para encerrar, o Brasil se dispôs a dobrar sua contribuição, hoje na casa dos 70 milhões de reais, para um "Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul", poço sem fundo do qual já é o maior contribuinte. É uma sorte, realmente, que reuniões vitoriosas como essa da Costa do Sauípe não aconteçam a toda hora.
O Itamaraty não é pago para ser amigo ou inimigo de A ou B, mas para defender o interesse nacional; em vez disso, preferiu defender o conjunto de idéias e desejos de seus chefes, que há seis anos cedem tudo o que podem aos vizinhos de continente na vã esperança de um dia liderá-los numa frente em favor do bem universal. Mas a generosidade brasileira, sobretudo em relação aos países classificados como de "esquerda", não deu certo - para eles, o Brasil não é generoso, é apenas pusilânime. Sua reação diante disso, da Bolívia ao Equador, do Paraguai à Venezuela, é bater cada vez mais.
Proximidades perigosas
NOVA YORK. Mais uma vez a proximidade conceitual entre parcela ponderável do governo Lula com as atitudes do histriônico protoditador venezuelano Hugo Chávez deixam a política externa brasileira em situação absurda. A tentativa oficial do Itamaraty de se equilibrar entre a solidariedade ao povo palestino e o direito de Israel de existir sempre revela uma posição mais favorável à crítica à "reação desproporcional" do que à condenação aos ataques do Hamas. Se somarmos a essa posição no mínimo ambígua, mas amparada em uma posição humanitária consensual, as declarações do assessor especial Marco Aurélio Garcia e a nota do PT, teremos um quadro em que o governo brasileiro corre o risco de se comparar com a irresponsável política bolivariana.
Seria exagero atribuir à declaração de Garcia ao jornal "Valor" de que Israel pratica "terrorismo de Estado" na guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza a expulsão pela Venezuela do embaixador israelense "em sinal de solidariedade com o povo palestino", mas há quem tenha visto nessa atitude um desejo de Chávez de não ficar atrás do que identificou ter sido uma posição oficial do governo brasileiro.
O mais provável é que das duas cabeças tenha saído a mesma radicalização por simples "proximidades conceituais", ainda mais que o PT soltou uma nota oficial subindo mais ainda o tom, comparando a atuação de Israel a atitudes nazistas.
A confusão entre as posições do PT e as do governo brasileiro sempre acontecem quando está envolvido no episódio o assessor especial Marco Aurélio Garcia. Assim foi no caso da crise do Equador com a Colômbia envolvendo as Farc, e volta a ser agora, com os compromissos políticos do partido que tem Lula como presidente de honra destoando de uma política de governo que teria que ser independente e cautelosa.
Mas a postura do PSDB, evitando tomar partido no conflito entre Israel e o Hamas, também não ajudou a dar equilíbrio político à visão brasileira, já que, ao contrário da radicalização petista, os tucanos optaram por ficar "em cima do muro", justificando a atitude pelo fato de o conflito "ser muito complexo".
Um partido que pretende assumir o governo, e que já lá esteve por oito anos, tem obrigação de ter posição formada num conflito tão fundamental para a paz mundial, e poderia ter recorrido aos ex-chanceleres que atuaram no governo de Fernando Henrique para se posicionar de maneira mais clara.
O governo Lula já vinha se posicionando de forma mais aberta na tentativa de exercer uma política externa agressiva, se aproximando dos países árabes sem causar danos nas relações com o chamado "mundo ocidental", especialmente Estados Unidos e Israel.
Em 2005, promoveu a primeira cúpula entre a América do Sul e os países árabes em Brasília, e teve um relativo sucesso, com alguns percalços, tendo sido a cúpula previsivelmente um palco aberto para ataques de todos os tipos, com temas delicados como terrorismo e democracia.
A proximidade com os países árabes tem fortes apoios econômicos, numa região com disponibilidade de capitais para investimento, e uma necessidade imensa de serviços, setor onde nós somos bons e temos tradição de construir estradas, hidrelétricas, usinas, obras urbanas.
A aproximação do Brasil com os países árabes não colocou em risco nossa relação com os Estados Unidos, nem com Israel, embora, na ocasião, o governo Bush tenha querido participar da Cúpula como "observador", o que lhe foi corretamente negado, e tentado pressionar alguns países árabes amigos para que esvaziassem a reunião.
O sucesso diplomático acabou sendo relativo, sem que o governo brasileiro tenha conseguido incluir a defesa da democracia no comunicado final. A análise geral é que, enquanto a América do Sul estiver dominada por governos como o de Chávez, que agora se junta em projetos militares com o Irã de Ahmadinejad, e outros que cultivam o antiamericanismo como política de governo, o Brasil continuará sendo um ponto de equilíbrio, mesmo que avance em posições independentes como agora faz em relação a Israel.
Mas deixar que um assessor especial que trata de política internacional suba de tom como fez Marco Aurélio Garcia pode atrapalhar todo um processo político que já não vem sendo conduzido com a necessária competência.
No Oriente Médio, não adianta tentar ter relações com o mundo árabe alienando inteiramente Israel. A solução palestina, com a criação de um Estado independente, deve ser o caminho para as negociações, e seria mais positivo que o governo brasileiro já se posicionasse nesse sentido, que deve ser o caminho a ser seguido pelo futuro governo de Barack Obama nos Estados Unidos.
No momento em que for resolvida a questão palestina, tudo indica que a relação do mundo árabe preferencial vai ser com Israel, que se transformará em uma imensa plataforma: de serviços financeiros, de infraestrutura, de intermediação comercial, em larga escala.
A "ambição de alto risco" da política externa brasileira, como a definiu o professor Clóvis Brigagão, da Universidade Candido Mendes, seria consequência de o governo Lula já ter tido três condutores da política externa: Marco Aurélio Garcia, o ex-ministro José Dirceu e o chanceler Celso Amorim, e se mantém hoje, mesmo com Dirceu fora do governo.
Há necessidade de a política do Itamaraty estar afinada com a sociedade brasileira, e nessa questão entre Israel e palestinos, a convivência pacífica que se registra no Brasil deveria ser norteadora das ações da política externa brasileira, que não pode confundir o governo com o Estado. As posições políticas e ideológicas do PT não podem se sobrepor às razões do Estado brasileiro.
Marco Aurélio: diplomacia não está dividida
Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência para Assuntos Internacionais
Aloisio Milani
A diplomacia brasileira tem buscado diálogo com líderes árabes e israelenses para obter um cessar-fogo urgente na Faixa de Gaza. Hoje, o assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, respondeu às críticas de que suas declarações sobre o conflito estariam em desacordo com o Itamaraty. Garcia defendeu que há "uma só" política e reivindicou novos mediadores da paz no Oriente Médio, onde os negociadores já estariam desgastados.
"Há uma linha de continuidade do Itamaraty, mas há também aspectos que são determinados pelos sucessivos governos", disse, em entrevista exclusiva ao Terra Magazine. "Vamos perder essa idéia de que essa política externa é absolutamente imutável. Não. Ela tem uma linha de continuidade que foi preservada e com os traços particulares, que o governo Lula e o chanceler Celso Amorim imprimiram, são evidentemente diferentes daquelas adotadas no governo passado."
Garcia faz até uma referência direta ao artigo publicado por Carlos Brickman na Folha de S.Paulo, no qual o jornalista acusa o assessor de Lula de dividir a política externa brasileira. "Não existe ambiguidade. E essas tentativas de estabelecê-la já são históricas em setores da mídia brasileira. Na maioria das vezes, inclusive, com mentiras. Um caso típico é o artigo de esgoto que Carlos Brickman publicou. Ele tenta estabelecer uma duplicidade que seria decorrente de uma posição ideológica que eu teria e que seria diferente da posição histórica do Itamaraty."
O assessor de Lula reiterou que a posição brasileira sobre os ataques israelenses é única e sobre ela que o Ministério das Relações Exteriores tem trabalhado. "Temos uma só posição. É aquela expressa pelo presidente Lula em Recife no fim de dezembro", disse. "Vale dizer qual foi: condenar os ataques por considerá-los uma reação desproporcional às condenáveis ações do Hamas e, em segundo lugar, propor um cessar-fogo imediato que permitisse criar um quadro favorável para negociações definitivas no Oriente Médio".
Indagado sobre qual seria a posição brasileira para resolver os conflitos, Marco Aurélio Garcia respondeu que é necessário um "Estado palestino com fronteiras seguras". "Não pode ser esse arremedo de Estado que vezes aparece. Um território totalmente cortado, descontínuo, com muros no meio, porque essa situação, inclusive, que tem provocado o radicalismo de determinadas facções como é o caso do Hamas. As reações do Hamas que nós condenamos - a de jogar foguetes sobre Israel - foram, em grande medida, provocadas pela situação insuportável da vida cotidiana em Gaza."
O governo brasileiro, segundo Marco Aurélio Garcia, faz a defesa "intransigente" da existência do Estado de Israel, criado em 1948 após decisão da Organização das Nações Unidas. "Insisto que o Estado palestino conviva pacificamente com o Estado de Israel, cuja existência e necessidade são incontestáveis", finaliza.
Terra Magazine
Bolivianas
ELIANE CANTANHÊDE
BRASÍLIA - O Brasil foi, voltou e a qualquer hora vai de novo. Ou melhor: vai ter que ir, por causa da argumentação técnica e do bom senso. De que se fala aqui? Da compra de gás à Bolívia.
O governo anunciou na sexta de manhã o desligamento de praticamente todas as usinas termelétricas e corte de boa parte da importação do gás boliviano. Com bons motivos: afinal, a chuva torrencial encheu os reservatórios das hidrelétricas, mais baratas e menos poluentes. Tudo resolvido? Não.
Horas depois, a guinada: três usinas seriam religadas e o Brasil compraria até 4 milhões de metros cúbicos a mais por dia do vizinho muy amigo. O que houve? A chuva acabou? Os tanques furaram?
Não exatamente. O que houve é que o assessor internacional, Marco Aurélio Garcia, e o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães foram agregados às reuniões com três ministros bolivianos, em Brasília. E os dois entronizaram a "questão geopolítica estratégica". A Bolívia é o país mais pobre da região...
Como me disse Garcia, a solução foi "tecnicamente viável e politicamente conveniente para os dois lados". O Brasil fica adequadamente abastecido, e a Bolívia, vendendo bem para o maior país da América do Sul, não vai à bancarrota.
Lula pode ir sem susto para a Bolívia na próxima quinta, pronto para ser muito bem recebido e ainda dar uma "canja" para a campanha de reeleição de Evo Morales, enquanto circula em Brasília um texto de uma página e meia do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) justificando a reabertura das termelétricas e mais gás boliviano.
Há dois probleminhas aí. Primeiro: os motivos ali apresentados são puramente conjunturais e podem evaporar em semanas, ou meses. E, aí, corta-se o gás boliviano de novo, no recuo do recuo? Segundo: e se Rafael Correa (Equador) se animar com a equação do "politicamente conveniente"? Vai voltar à carga? Se vale para um, vale para todos.
Aliás, como só tem acontecido.