Re: SYRIZA vence eleições gregas
Enviado: Qua Jul 15, 2015 2:53 pm
Os brutais credores da Grécia têm arrasado o projeto da zona euro
por WOLFGANG MÜNCHAU Ontem
Se despojarmos a zona euro da ambição política, esta transforma-se num projeto económico utilitário. Algumas coisas que muitos de nós tomávamos por garantidas, e em que alguns de nós acreditávamos, terminaram num único fim de semana. Ao imporem a Alexis Tsipras uma derrota humilhante, os credores da Grécia fizeram muito mais do que provocar uma mudança de regime na Grécia ou pôr em perigo as suas relações com a zona euro. Eles destruíram a zona euro tal como a conhecemos. Eles arrasaram a ideia de uma união monetária como um passo rumo a uma união política democrática e retrocederam para as lutas nacionalistas pelo poder europeu do século XIX e início do século XX. Eles despromoveram a zona euro para um sistema tóxico de taxas de câmbio fixas, com uma moeda única partilhada, gerido segundo os interesses da Alemanha, mantido pela ameaça da miséria absoluta para aqueles que desafiam a ordem vigente. A melhor coisa que pode ser dita sobre o fim de semana é a honestidade brutal dos que estão a perpetrar esta mudança de regime.
Mas não foi só a brutalidade que se destacou, nem mesmo a capitulação total da Grécia. A mudança real foi que a Alemanha propôs formalmente um mecanismo de saída. No sábado, Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças, insistiu numa saída temporária - um timeout (intervalo), como ele lhe chamou. Já ouvi uma boa quota de propostas loucas ao longo do tempo e esta é sem dúvida uma delas. Um Estado membro fez pressão para a expulsão de outro. Este foi o verdadeiro golpe do fim de semana: a mudança de regime na zona euro.
O facto de um grexit formal poder ter sido evitado no momento é irrelevante. O grexit estará de volta à mesa quando houver o mínimo acidente político - e ainda há muitas coisas que podem correr mal, tanto na Grécia como noutros parlamentos da zona euro. Qualquer outro país que possa, no futuro, desafiar a ortodoxia económica alemã enfrentará problemas semelhantes.
Isto traz-nos de volta a uma versão mais tóxica do antigo mecanismo de taxas de câmbio da década de 1990 que deixou os países presos a um sistema gerido principalmente em benefício da Alemanha, que levou à saída da libra inglesa e ao afastamento temporário da lira italiana. O que restou foi uma coligação de países dispostos a ajustar as suas economias à da Alemanha. A Grã-Bretanha teve de sair porque não estava disposta a isso.
O que devem os gregos fazer agora? Esqueçamos por um momento o debate económico dos últimos meses, sobre questões como o impacto da austeridade ou das reformas económicas no crescimento e coloquemos a nós próprios esta pergunta simples: estamos mesmo convencidos de que um programa de reforma económica, para o qual um governo não tem nenhum mandato político, que foi explicitamente rejeitado num referendo e que foi imposto através de pura chantagem política, poderá alguma vez funcionar?
As implicações para o resto da zona euro são pelo menos igualmente preocupantes. Em breve estaremos a perguntar a nós mesmos se esta nova zona euro, em que os fortes intimidam os fracos, poderá ser sustentável. Anteriormente, o argumento mais forte contra quaisquer previsões de rompimento era o forte empenho político de todos os seus membros. Se perguntarmos aos italianos porque estão na zona euro, serão poucos os que apontam os benefícios económicos. Eles queriam fazer parte do projeto mais ambicioso de integração europeia até agora levado a cabo.
Mas se retirarmos a aspiração política poderemos acabar com uma opinião diferente. De um ponto de vista meramente económico, nós sabemos que o euro tem funcionado bem para a Alemanha. Funcionou moderadamente bem para os Países Baixos e para a Áustria, embora tenha criado um certo grau de instabilidade financeira em ambos.
Mas para a Itália foi um completo desastre económico. O país não viu praticamente qualquer crescimento na produtividade desde o início do euro em 1999. Se quisermos culpar a falta de reformas estruturais, então teremos de explicar como a Itália conseguiu taxas de crescimento decentes antes de 1999. Poderemos ter a certeza de que a maioria dos italianos apoiará a moeda única dentro de três anos?
O euro também não funcionou para a Finlândia. Embora o país seja considerado o campeão do mundo das reformas estruturais, a sua economia tem caído desde que a Nokia deixou de ser a fabricante número um de telemóveis no mundo. A França teve um desempenho relativamente bom durante os primeiros anos do euro, mas também ela tem tido agora défices persistentes da balança corrente. Não é só na Grécia que o euro não é o ideal.
Se despojarmos a zona euro de quaisquer ambições de uma união política e económica, esta transforma-se num projeto utilitário no qual os Estados membros irão pesar friamente os benefícios e os custos, tal como a Grã-Bretanha está atualmente a avaliar as vantagens ou desvantagens relativas da adesão à UE. Num tal sistema, alguém, em algum lugar, vai querer sair algum dia. E o forte empenho político para o evitar também já lá não vai estar.
(c) 2015 The Financial Times Limited
http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interio ... au&page=-1
por WOLFGANG MÜNCHAU Ontem
Se despojarmos a zona euro da ambição política, esta transforma-se num projeto económico utilitário. Algumas coisas que muitos de nós tomávamos por garantidas, e em que alguns de nós acreditávamos, terminaram num único fim de semana. Ao imporem a Alexis Tsipras uma derrota humilhante, os credores da Grécia fizeram muito mais do que provocar uma mudança de regime na Grécia ou pôr em perigo as suas relações com a zona euro. Eles destruíram a zona euro tal como a conhecemos. Eles arrasaram a ideia de uma união monetária como um passo rumo a uma união política democrática e retrocederam para as lutas nacionalistas pelo poder europeu do século XIX e início do século XX. Eles despromoveram a zona euro para um sistema tóxico de taxas de câmbio fixas, com uma moeda única partilhada, gerido segundo os interesses da Alemanha, mantido pela ameaça da miséria absoluta para aqueles que desafiam a ordem vigente. A melhor coisa que pode ser dita sobre o fim de semana é a honestidade brutal dos que estão a perpetrar esta mudança de regime.
Mas não foi só a brutalidade que se destacou, nem mesmo a capitulação total da Grécia. A mudança real foi que a Alemanha propôs formalmente um mecanismo de saída. No sábado, Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças, insistiu numa saída temporária - um timeout (intervalo), como ele lhe chamou. Já ouvi uma boa quota de propostas loucas ao longo do tempo e esta é sem dúvida uma delas. Um Estado membro fez pressão para a expulsão de outro. Este foi o verdadeiro golpe do fim de semana: a mudança de regime na zona euro.
O facto de um grexit formal poder ter sido evitado no momento é irrelevante. O grexit estará de volta à mesa quando houver o mínimo acidente político - e ainda há muitas coisas que podem correr mal, tanto na Grécia como noutros parlamentos da zona euro. Qualquer outro país que possa, no futuro, desafiar a ortodoxia económica alemã enfrentará problemas semelhantes.
Isto traz-nos de volta a uma versão mais tóxica do antigo mecanismo de taxas de câmbio da década de 1990 que deixou os países presos a um sistema gerido principalmente em benefício da Alemanha, que levou à saída da libra inglesa e ao afastamento temporário da lira italiana. O que restou foi uma coligação de países dispostos a ajustar as suas economias à da Alemanha. A Grã-Bretanha teve de sair porque não estava disposta a isso.
O que devem os gregos fazer agora? Esqueçamos por um momento o debate económico dos últimos meses, sobre questões como o impacto da austeridade ou das reformas económicas no crescimento e coloquemos a nós próprios esta pergunta simples: estamos mesmo convencidos de que um programa de reforma económica, para o qual um governo não tem nenhum mandato político, que foi explicitamente rejeitado num referendo e que foi imposto através de pura chantagem política, poderá alguma vez funcionar?
As implicações para o resto da zona euro são pelo menos igualmente preocupantes. Em breve estaremos a perguntar a nós mesmos se esta nova zona euro, em que os fortes intimidam os fracos, poderá ser sustentável. Anteriormente, o argumento mais forte contra quaisquer previsões de rompimento era o forte empenho político de todos os seus membros. Se perguntarmos aos italianos porque estão na zona euro, serão poucos os que apontam os benefícios económicos. Eles queriam fazer parte do projeto mais ambicioso de integração europeia até agora levado a cabo.
Mas se retirarmos a aspiração política poderemos acabar com uma opinião diferente. De um ponto de vista meramente económico, nós sabemos que o euro tem funcionado bem para a Alemanha. Funcionou moderadamente bem para os Países Baixos e para a Áustria, embora tenha criado um certo grau de instabilidade financeira em ambos.
Mas para a Itália foi um completo desastre económico. O país não viu praticamente qualquer crescimento na produtividade desde o início do euro em 1999. Se quisermos culpar a falta de reformas estruturais, então teremos de explicar como a Itália conseguiu taxas de crescimento decentes antes de 1999. Poderemos ter a certeza de que a maioria dos italianos apoiará a moeda única dentro de três anos?
O euro também não funcionou para a Finlândia. Embora o país seja considerado o campeão do mundo das reformas estruturais, a sua economia tem caído desde que a Nokia deixou de ser a fabricante número um de telemóveis no mundo. A França teve um desempenho relativamente bom durante os primeiros anos do euro, mas também ela tem tido agora défices persistentes da balança corrente. Não é só na Grécia que o euro não é o ideal.
Se despojarmos a zona euro de quaisquer ambições de uma união política e económica, esta transforma-se num projeto utilitário no qual os Estados membros irão pesar friamente os benefícios e os custos, tal como a Grã-Bretanha está atualmente a avaliar as vantagens ou desvantagens relativas da adesão à UE. Num tal sistema, alguém, em algum lugar, vai querer sair algum dia. E o forte empenho político para o evitar também já lá não vai estar.
(c) 2015 The Financial Times Limited
http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interio ... au&page=-1