Exclusivo: Barack Obama e John McCain falam sobre relações com o Brasil
Barack Obama defende cópia nos EUA de modelo do Brasil, que implantou sua política do álcool há mais de 20 anos, com grandes subsídios governamentais. Candidato só acabará com sobretaxa ao produto brasileiro depois que a produção americana estiver bem estabelecida
John McCain quer acabar com os impostos sobre as importações de etanol e defende diminuição de subsídios agrícolas, para que a competição diminua o preço dos alimentos. O candidato propõe ainda um grupo – como o G8 – só de potências econômicas democratas, que incluiria o Brasil
Etanol americano é prioridade
Um possível governo de Barack Obama, 46 anos, não mudaria a política americana com relação ao etanol brasileiro. As sobretaxas de importação ao produto continuariam em vigor. O candidato democrata à Presidência dos EUA também não estaria muito disposto a derrubar os subsídios agrícolas que adubam as lavouras de sua nação. O que transforma as negociações na Rodada de Doha numa parada dura para os países emergentes que exigem abertura deste mercado.
As afirmações destas plataformas de governo foram feitas em entrevista segmentada – com perguntas colhidas pelo JB em tumultuados minutos antes e depois de comícios. Foram quatro oportunidades de questões – gritadas a plenos pulmões – em entradas e saídas de estádios lotados e assembléias menores nos Estados americanos de Ohio, Illinois, Pensilvânia, Michigan e Nova York, no começo do mês de junho.
Caso Barack Obama fosse conceder um único minuto de seu tempo a cada repórter cobrindo sua campanha, passaria quase 24 horas ininterruptas falando. O número de jornalistas que o acompanham é de 1.400. Proporção igual ao contingente de imprensa mandado pelo Brasil às coberturas de Copa do Mundo. E não é para menos, o carismático candidato presumível democrata é uma espécie de Pelé da política dos Estados Unidos. Atrai tantos fãs com sua oratória empolgante, que parece encabeçar um movimento sem igual na História recente do país.
Ele pode não ser a melhor solução para as exportações brasileiras, mas inspira esperanças mundiais de que o isolamento americano da Era Bush finalmente terminará. Barack, multiculturalista por essência, é a cara do mundo. E, importante para seu país, injeta ânimo em um eleitorado famoso por sua apatia junto às urnas.
As pesquisas no Brasil, assim como em outros países do mundo, mostram que o senhor é o candidato preferido por eles para ocupar a Casa Branca. O que o senhor acha disso?
– Fico muito feliz. É pena que eles não votem aqui. Mas acho que isso demonstra também que as pessoas, americanos, brasileiros, indianos, em toda a parte do mundo, compreendem minhas intenções de melhorar o padrão de vida global. A globalização, infelizmente, tem sido desproporcionalmente aproveitada pelas grandes corporações, as pessoas, de modo geral, não têm as mesmas oportunidades. Minha meta é retirar milhões de indivíduos da miséria. Colocar estas pessoas numa economia global mais justa e em paz. Assim como o povo americano, acredito que, internacionalmente, as pessoas sabem que meu oponente é a continuidade de oito anos de política falida do governo George Bush. Esta mesma política que nos afastou dos aliados e causou instabilidade política-econômica no mundo.
No entanto, o senhor aprovou, recentemente, um enorme pacote de subsídios agrícolas, que vai contra o que estes países emergentes e pobres pedem nas negociações da Rodada de Doha. Isso não se choca com sua intenção de melhorar a vida de miseráveis?
– Não! O que tenho proposto é reciprocidade no comércio com outros países. Por exemplo: sempre levantam a questão de que desejo renegociar o Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta). Pode dar a impressão de que estou tentando acabar com o acordo. No entanto, o que procuro é equiparar certos padrões de regulamentações sobre o meio ambiente e proteções sociais e trabalhistas. Os Estados Unidos não podem competir com quem barateia a produção pela piora de condições de trabalho e agressões ao meio ambiente. Veja que, no México, as grandes agroindústrias – americanas e internacionais – aproveitam-se desta falta de regulamentação e disparidades entre as leis mexicanas e americanas, para invadir as zonas rurais e aplicar modos de produção que não são aceitáveis nos Estados Unidos. Fazem isso em grande escala e acabam com a competição. O resultado é que os pequenos trabalhadores rurais mexicanos não têm mais condições de sobreviver. Foram desalojados pelas grande corporações da agroindústria. Tornaram-se imigrantes, indo primeiro para a Cidade do México, e depois cruzaram a fronteira com os Estados Unidos. Agravou-se assim o enorme problema de imigração ilegal nos Estados Unidos e o México foi privado de importantes recursos humanos. Este é um exemplo dos motivos de minha proposta para negociações de mudanças estruturais que equilibrem a balança em acordos comerciais. Também é exemplo dos vários motivos pelos quais apoio alguns subsídios – setoriais – à agricultura. É preciso nivelar o campo de competição de algum modo. No momento em que resolvermos estas disparidades, acho que não haverá mais motivos para subsídios nos Estados Unidos. O mesmo exemplo mexicano serve para outras zonas rurais do mundo. Devem ser criadas melhores regulamentações trabalhistas, sociais e ambientais, para que haja equilíbrio comercial. Mas, de todo modo, estou aberto à negociações.
No caso do etanol brasileiro, o seu oponente apóia a reavaliação da sobretaxa imposta nos Estados Unidos ao produto. Por que o senhor é à favor deste imposto?
– Tenho elogiado o programa do álcool brasileiro desde antes de ser eleito senador. Sou um admirador do que os brasileiros fizeram em seu programa de energia, e acho que é exemplo a ser seguido. Mas é preciso lembrar também que o Brasil implantou sua política do álcool há mais de duas décadas. E o fez com grandes subsídios governamentais. Estavam certos, pois criaram um programa de sucesso. Nós, americanos, estamos também tentando desenvolver nossos programas de energias alternativas. E isso somente ocorrerá com investimentos. Na minha plataforma proponho US$ 15 bilhões de aplicações anuais do governo federal para o desenvolvimento de energias alternativas limpas. Mas, para conseguirmos desenvolver nosso programa, são também necessárias algumas proteções iniciais. Faço uma analogia com uma plantinha, que brotou da semente e requer cuidados especiais até que atinja a resistência da maturidade. Do contrário ela morrerá. Assim, como vamos competir com um país que tem produto desenvolvido há mais de duas décadas, que já está em fase madura, e foi no princípio altamente subvencionado? Acho que teremos em algum momento condições de acabar com a sobretaxa ao etanol brasileiro, e de outros locais onde se criaram oportunidades para a produção do álcool. Mas antes, esta área deve ser também desenvolvida plenamente nos Estados Unidos. E isso implica em proteção aos produtores nacionais de etanol.
O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, disse esta semana ao Jornal do Brasil e à Gazeta Mercantil que está empolgado com sua candidatura. O senhor já conversou com ele?
– Não tive a oportunidade, mas esta é uma conversa prioritária para depois da eleição. O Brasil é, certamente, um país fundamental em nossas relações com a América Latina.
Pelo fim da sobretaxa ao álcool
O candidato republicano à Presidência americana, John McCain, impôs à sua agenda de campanha fins de semana de folga. São dias passados na magnífica mansão em Oak Creek, no Arizona. E é durante estes períodos que os repórteres que não têm cadeiras cativas no chamado “Expresso da Conversa Franca”, seu ônibus de viagens, aproveitam para falar com o velho senador. Ele é cordialíssimo com repórteres, ao ponto de provocar suspeitas de que está sendo protegido na imprensa. E os sucos de frutas e chás gelados que manda à portaria no deserto, onde estão os jornalistas, dá combustível a tais suspeitas. Foi durante uma destas paradas de McCain que o JB conseguiu abrir uma série de perguntas rápidas. Compõem entrevista que terminaria somente quatro dias depois, no 11 de junho, ao fim de um comício no Grand Hall National Constitution Center, na Filadélfia.
O senador do Arizona, de 71 anos, parece disposto a enfrentar o carisma de seu oponente, o democrata Barack Obama, com doses de remédios amargos para o paladar de parte do eleitorado. Por exemplo: diz que é contra os subsídios agrícolas no país e que pretende acabar com as sobretaxas às importações de etanol brasileiro. Em seus cálculos políticos, as medidas devem agradar o americano médio, que já não consegue encher a própria mesa, ou o tanque do carro. Trata-se de novidade para as negociações futuras num acordo na chamada Rodada de Doha. Confirmou também que quer formar uma parceria de nações democráticas que incluiria consultas a Brasília. O Brasil, deste modo, poderia sair ganhando com um novo republicano na Casa Branca. McCain, diga-se, parece mesmo gostar dos brasileiros, ou pelo menos das mulheres do país. Ele finalmente esclareceu seus romances passados com mais de uma delas.
Senador, o senhor é a favor das sobretaxas americanas à importação de etanol brasileiro?
– Não! Está claro em minha plataforma que eu apóio o fim da sobretaxa. Nesta questão, pode ter certeza que minha proposta é a de acabar com os impostos sobre as importações de etanol, não apenas do Brasil, mas de outros produtores.
O senhor também parece ser contra os subsídios agrícolas, como o pacote recentemente aprovado pelo Congresso. Será isto indicativo de que o senhor está aberto a aceitar a principal reivindicação dos países emergentes nas negociações da Rodada de Doha?
– A Rodada de Doha tem vários aspectos e é uma avenida de mão dupla. Mas, basicamente, na questão dos subsídios agrícolas, acho que minha administração fará grande esforço para acomodar uma solução. E a questão dos produtos agrícolas estará na mesa com muitas chances de um acordo.
Nem todos americanos concordam com isso. Acreditam que vai prejudicar os agricultores dos Estados Unidos. Por que o senhor discorda?
– Os subsídios ajudam mesmo os grande produtores de milho. Eles não são os pequenos produtores, as fazendinhas de mamãe e papai. São grandes conglomerados, ganhando subsídios amealhados com os impostos pagos pelo povo americano. E, o que se vê, especialmente agora, é que as famílias estão tendo cada vez mais dificuldades para colocar a comida na mesa. Por que não dar a oportunidade para países agrícolas da América do Sul, da África e do resto do mundo competirem para a venda de seus produtos nos supermercados americanos? A competição fará os preços dos alimentos baixarem.
Recentemente o senhor propôs um grupo – como o G8 – só de potências econômicas democratas. E incluiu o Brasil neste conjunto. Não acha que um grupo político multinacional que exclua a China e a Rússia será inexpressivo?
– Você acha que o Brasil é inexpressivo? Ou o Reino Unido, a França, a Itália, a Índia? Estas são potências – muitas delas nucleares – que cada vez mais têm projeção no cenário político mundial. A idéia é fazer países não democráticos perceberem que não podem mais jogar com cartas marcadas, abusar de seus poderes, e ficar impunes num mundo civilizado. Um bloco democrático teria condições de derrubar barreiras alfandegárias, negociar seus produtos livremente, e prosperar. Os que não respeitam os valores democráticos ficariam de fora deste bloco, com prejuízo de suas economias.
O senhor já se disse intransigente com relação a conversas com Cuba e com o presidente venezuelano Hugo Chávez. Mesmo muitos republicanos são à favor de um acomodamento com Cuba. Por que o senhor é contra uma tentativa de diálogo?
– Exatamente porque não são democráticos, não respeitam valores de liberdade, são hostis e desestabilizam a paz na região. Nunca ouvi uma única frase de Chávez que fosse uma tentativa de diálogo. Ele mesmo não quer conversar. Por que nós deveríamos fazê-lo? E em Cuba, apesar das reformas cosméticas de Raúl Castro, não têm ocorrido reformas democráticas plenas. Aqueles que desejam o fim do embargo e as conversas apaziguadoras com regimes tirânicos, como meu oponente propõe, colocam em risco a segurança americana e dos países livres. Aqueles que defendem fazer negócios com Cuba, como meu oponente, esquecem que existem outros países democráticos oferecendo as mesmas oportunidades de negócios. A cana do Brasil, por exemplo, não é mais cara do que aquela produzida em Cuba. Nem as praias e hotéis brasileiros são piores e mais caros.
E, nesta mesma linha, o senhor também pretende jogar mais duro com, por exemplo, a Arábia Saudita, onde o regime é uma monarquia autoritária, mas tem petróleo que os Estados Unidos desesperadamente necessitam?
– Minha proposta é a de acabar com a dependência americana das fontes externas de energia. A auto-suficiência envolverá novas prospecções em território nacional, muito investimento em tecnologias alternativas de energia, mudança nos padrões de consumo – onde se inclui o maior uso de biocombustíveis – e abertura de mercado para produtores que sejam aliados democráticos dos Estados Unidos. Deste modo, acho que poderíamos entrar em outros patamares de conversas com os sauditas. Mesmo porque, meu amigo, eles não têm se mostrado muito simpáticos quanto ao aumento de sua produção de petróleo para o barateamento de preços.
Por fim, senador, esclareça algumas dúvidas que estão nas cabeças do Brasil: a sua ex-namorada brasileira foi conquistada no Rio, na Virgínia, ou foram duas em locais diferentes? Pelo que parece, o senhor teve um amor tórrido, mas passageiro, numa estada carioca. E outro, mais prolongado, com uma “dançarina exótica”, que trabalhava num show burlesco em Washington, quando o senhor era estudante em Annapolis. Qual suposição é a verdadeira?
– A última (risos). Eu era muito namorador. Foram duas brasileiras: a “dançarina exótica”, nos tempos da Academia Naval. E a do Rio de Janeiro no final dos anos 50. Como você vê, meu amigo, eu gosto dos brasileiros (risos).
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