NAS ENTRELINHAS
Por Alon Feuerwerker
alonfeuerwerker.df@dabr.com.br
Das palavras aos atos
Se o Brasil está convicto do que diz o novo ministro da Defesa (e ele no ambiente atual
certamente não sairia deitando falação sem combinar com a chefe), deve avaliar a sério a assinatura do
protocolo adicional do TNP
Começou bem o novo ministro da Defesa, Celso Amorim, ao dizer que interessa ao Brasil manter
a região como área completamente livre de armas de destruição em massa. Contribui para afastar um
pouco as dubiedades cultivadas no período anterior, quando o então chanceler Amorim e o chefe dele
fizeram o mundo desconfiar de nossas intenções nesse tema.
A doutrina é sabida. Numa região estrategicamente pacífica, nossa liderança é natural e nossa
hegemonia, inercial. Nas redondezas ninguém compete conosco em território, população ou economia.
Aliás, bastou o Brasil nos anos recentes inverter a lógica de dar as costas aos vizinhos que
liderança e hegemonia se impuseram quase naturalmente.
Quem procura ter a bomba é para apontá-la na direção de alguém. Nós não temos contenciosos
territoriais com os vizinhos, nem somos alvo nuclear da superpotência.
E a Amazônia ser cada vez mais brasileira depende principalmente de outras políticas,
econômicas e demográficas. E de defesa convencional.
Qualquer sinal brasileiro rumo à bomba desencadearia uma corrida regional, quando certamente
alguns hoje parceiros iriam bater às portas de Washington atrás de proteção contra nós.
Ingerência é tudo que não queremos. E do que não precisamos.
Quando o Brasil se meteu no imbróglio levantino, dando sustentação política ao jogo belicista de
comprar tempo praticado pelos iranianos, despertou a dúvida razoável sobre nossas próprias intenções.
A transformação do TNP (Tratado de Não Proliferação) em letra morta cairia bem para um país,
supostamente nós, incomodado por ter assinado o acordo.
E desconfortável por estar legalmente manietado nas ambições nucleares.
Estava na moda dizer, como fez o presidente da época, que os detentores de tecnologia bélica
nuclear não tinham moral para impedir os demais de buscar o mesmo status.
Formalmente lógico, mas bizarro. Pois a consequência prática dessa linha seria uma corrida
nuclear em escala global. O armamentismo nuclear generalizado.
A partir do qual ficaria certamente mais difícil promover o desarmamento generalizado.
E o risco de perda de controle dos estoques de armas, o risco de disseminação, sofreria
elevação exponencial.
Resta saber se a nova linha de Amorim é jogo de sedução, convicção ou decisão política de
governo. Provavelmente uma combinação dos três vetores.
E a vida prática se encarregará de esclarecer qual deles pesa mais.
Para remover dúvidas, talvez fosse o caso, então, de passar das palavras aos atos.
Se o Brasil está convicto do que diz o novo ministro da Defesa (e ele no ambiente atual
certamente não sairia deitando falação sem combinar com a chefe), deve avaliar a sério a assinatura do
protocolo adicional do TNP. Protocolo que prudentemente aumenta o poder investigativo e fiscalizatório
da Agência Internacional de Energia Atômica sobre os programas nucleares dos signatários.
E o certo seria dar esse passo no âmbito da Unasul, a união de países sul-americanos. Todos
juntos. Exatamente para garantir o cenário regional pacífico, que mais atende ao legítimo interesse
nacional.