#116
Mensagem
por gil eanes » Dom Dez 09, 2007 4:13 pm
ÊXODO NA MARINHA: Força confirma 315 pedidos de saída entre 2000 e 2006
Oficiais das Forças Armadas dão baixa para tentar outros cargos
Marinha diz que busca por melhores salários é o principal motivo
André Freitas
Uma silenciosa revolta do oficialato, que começa nos conveses dos navios e termina nos bancos dos cursinhos preparatórios para concursos, tem abatido parte dos quadros da Marinha. A Força, que se envolveu em importantes movimentos de insatisfação nos últimos dois séculos, agora perde seus oficiais de maneira discreta, mas constante. Militares, não só da Marinha, se esforçam para deixar as Forças Armadas e assumirem outros cargos públicos civis.
Na Academia do Concurso Público, no Rio, a insatisfação já foi percebida e virou filão de mercado. Nos últimos oito anos, nada menos que 11.810 militares das três Forças passaram pelas salas de aula do curso. Em novembro, 1.584 militares se prepararam lá para tentar deixar a carreira.
Em nota, o Centro de Comunicação Social da Marinha confirmou que seus quadros estão inseridos nesse processo e que a busca por outras carreiras com melhores salários no serviço público é o principal motivo para os pedidos de baixa de oficiais. A Força informou ter concedido baixa a 315 oficiais entre 2000 e 2006. No ano passado, foi registrada a maior perda de quadros: 72, o equivalente a seis saídas por mês. Nos mesmos sete anos, a Marinha formou 2.318 novos oficiais, uma média de 331 por ano. Os números revelam que, a cada sete militares admitidos na carreira, um é dispensado. No ano passado, essa relação foi mais preocupante: quatro ingressos por baixa.
Fábio Gonçalves, diretor da Academia do Concurso, explicou seu curso oferece bolsa de 50% para qualquer militar.
- É só chegar na secretaria, comprovar que é militar e dizer que quer fazer concurso público - explicou ele, que vê três motivos para o êxodo. - Primeiro, eles procuram cargos públicos, querem manter a estabilidade. O plano de carreira militar também é longo demais e, os salários, considerados baixos. Na Marinha, por exemplo, o guarda-marinha, após cinco anos de formação, ganha pouco mais de R$2 mil. Quando sai da Escola Naval, descobre que um auditor fiscal ganha de imediato R$12 mil, salário que talvez ele não tenha ao se aposentar. Por último, querem qualidade de vida.
Gonçalves conta ainda que muitos alunos já querem deixar a carreira antes de ingressar nela. Começam a se preparar ainda na Escola Naval, estudando aos sábados ou nas férias, escondidos dos superiores.
COLABOROU Bernardo Mello Franco
ÊXODO NA MARINHA: 'Saí por menos, não me arrependo'
Sucateamento e cultura militar desmotivam oficiais
Ex-militares se sentiam subutilizados e desrespeitados
André Freitas
Em 1998, quando ingressou na Escola Naval, no Rio de Janeiro, o então aluno Cardoso acreditava que teria uma longa carreira militar. Não pensava que, nove anos depois, mais precisamente no dia 22 de outubro deste ano, o primeiro-tenente Cardoso daria baixa para assumir a função de analista do TRE-RJ.
- O motivo principal da minha saída é o desrespeito. Ninguém quis saber por que eu estava indo embora. O pensamento militar padrão é que quem sai quer salário melhor ou porque é um fraco que não suportou o peso da carreira - diz ele.
Técnico da CVM estudava escondido na Marinha
José Ventura é outro ex-primeiro-tenente que deixou a Marinha para ocupar um cargo no serviço público civil. Detalhe: ninguém pode dizer que Ventura estava insatisfeito com o salário. Ele trocou a farda de oficial pela função de técnico da Comissão de Valores Mobiliários, que exige apenas o ensino médio e oferece salário menor que o de um segundo-tenente.
- Saí para ganhar menos, e não me arrependo. O que me motivou foram os excessos de arbitrariedades. Tive que estudar escondido lá dentro. Quando descobrem, ficam todos te olhando estranho - conta Ventura, que agora estuda para concursos de nível superior.
A Marinha informou ainda que o regimento interno da carreira obriga os oficiais a comunicarem previamente sua inscrição em concursos públicos.
MÁRCIO CARDOSO, EX-OFICIAL DA MARINHA
'Era como se fosse guerra'
Aos 27 anos, Márcio Cardoso relembra os detalhes da vida na Marinha e diz que o cotidiano da carreira, mesmo em tempos de paz, era semelhante ao de uma guerra. De fora, ele se diz mais feliz.
Como você se sentia na carreira militar?
MÁRCIO CARDOSO: Com todas as letras, me sentia subutilizado. Você estuda muito e depois é colocado para ficar preocupado com a quantidade de papel higiênico, cerimoniais e coquetéis.
A carreira era estressante?
CARDOSO:Muito. É como se fosse guerra. Nunca tive um dia sem estar preocupado com o reparo de alguma coisa que estava quebrada. E verdade que isso é resultado do sucateamento.
Que tipo de atitude você achava desrespeitosa?
CARDOSO:As idiossincrasias. Já passei pela situação de estar indo embora e o superior dizer que era para ficar porque era dia de adestramento para ser contrariado.