Sonar brasileiro!

Assuntos em discussão: Marinha do Brasil e marinhas estrangeiras, forças de superfície e submarinas, aviação naval e tecnologia naval.

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VICTOR
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Sonar brasileiro!

#1 Mensagem por VICTOR » Ter Nov 01, 2005 3:22 pm

Quando conversamos sobre sistemas serem tao ou mais importantes que plataformas, podemos nos mirar nesse exemplo de outrora.

Sonar detector de submarinos

Marcello Damy se formou em física em 1936, na primeira turma do Curso de Física da USP - onde, anos mais tarde, também obteve seu doutorado. Em 1938, com bolsa de estudos do Conselho Britânico, seguiu para fazer pós-graduação na Universidade de Cambridge, Inglaterra, onde trabalhou com os prêmios Nobel de Física John Cockroft e William L. Bragg. Marcelo Damy estagiou em Cambridge, na Inglaterra, como físico, tendo desenvolvido um circuito multivibrador capaz de medir tempos da ordem de 10ns, cerca de 10 vezes mais rápido que os equipamentos equivalentes, e útil na verificação de mésons nos chuveiros de raios cósmicos. Os primeiros radares ingleses, construídos por W. Lewis e Watson Watt uasavam esse sistema para medir intervalo de tempo. Era um método primitivo, hoje totalmente superado. Mas como era novo e importante na época, Lewis convidou Marcelo para participar do esforço de guerra inglês e entrou em contato com a embaixada. O ministro do exterior , Oswaldo Aranha, que era primo-irmão do pai de Marcelo, disse: "Se esse sujeito serve para a Inglaterra, vai ser mais útil para o Brasil", foi quando Marcelo retornou ao Brasil, no início da guerra.

O Exército e a Marinha tinham problemas extremamente sérios. Nosso equipamento militar era, na sua quase totalidade, de origem germânica, inglesa ou francesa. A USP estabeleceu contato com o antigo Departamento de rádio da Marinha, através do comandante Reis que havia procurado a Universidade de São Paulo, cujo reitor era o professor Jorge Americano. Logo que o Brasil entrou na guerra, Jorge Americano instituiu na USP os Fundos Universitários de Pesquisa, que deram origem à Fapesp. Ele conseguia recursos das indústrias para custear pesquisas de interesse do Brasil. A Marinha tinha problemas fundamentais na época: nossos navios, inclusive os de guerra, navegavam completamente cegos, sem qualquer método de detecção de submarinos e de navios de superfície. Então, o Brasil ficou sem poder navegar. E ficar sem navegar em 1942 significava não poder trazer açúcar do Norte e não transportar trigo e demais mercadorias para outras regiões do país.

Com o início da guerra a Marinha perdeu uma parte de sua Marinha Mercante. Os navios brasileiros já não viajavam para o Norte e para o sul porque os submarinos alemães estavam por ali.Quando a Marinha precisou de aparelhos para localizar submarinos fez um apelo ao meio científico e técnico brasileiro. Ninguém aceitou. Foi quando o Departamento de Comunicações da Marinha procurou Marcelo Damy e o prof. Pompéia que tinha vindo dos EUA, onde trabalhou num aparelho capaz de contar até 105 impulsos elétricos por segundo e de medir intervalos de tempo com cinco casas decimais.

Marcelo Damy relata: "Ouvimos as explicações da Marinha e dissemos que nenhum de nós jamais havia visto de perto um submarino e muito menos um aparelho de detecção de submarino. "Fazemos ciência pura - dissemos - trabalhamos em raios cósmicos. O que podemos prometer é que vamos estudar": o que aprendemos na ciência pura é que nela parte-se da existência de um fenômeno e o físico procura um método de pôr esse fenômeno em evidência, de descobri-lo e estudar suas propriedades. A vantagem que o físico leva sobre o engenheiro é que este trabalha na física aplicada, nos problemas físicos já de âmbito aplicativo. Fomos procurar a bibliografia existente depois da Primeira Guerra Mundial, pois, nessa época, já existiam equipamentos precários de detecção de submarinos e navios de superfície. Nossas primeiras tentativas foram baseadas na construção de um microfone que apanhasse os ruídos produzidos pela rotação das hélices na água. Para produzir sons na água e detectá-los à distância, precisávamos de um laboratório. O professor Jorge Americano, que era um homem de sete instrumentos, decidiu projetar e construir para nós um laboratório na represa de Santo Amaro."

Os experimentos eram feitos no laboratório de Física da faculdade de Filosofia, numa antiga residência na avenida Brigadeiro Luís Antônio, os experimentos de propagação de sons eram feitos numa banheira. Os pesquisadores fizeram um gerador de ruído acústico baseado no fenômeno de cavitação, o que entusiasmou o pessoal da Marinha, que levou o presidente Getúlio Vargas para visitar o laboratório. depois, foi montado um laboratório flutuante na represa de Santo Amaro. Jorge Americano construiu e forneceu dois barcos em cima dos quais montou um laboratório com um gerado elétrico com um buraco no centro, por onde os sonares ficavam em contato com a água. Neles, os pesquisadores se afastavam um quilômetro, colocando barquinhos de briquedos na água. Eram brinquedos que funcionavam com velas comuns, nas quais se colocava um pouco de álcool.A água fervia e eles saíam propelidos por jatos de vapor, fazendo barulho com a cavitação produzida por uma hélice. Os pesquisadores conseguiram detectar os ruídos dos barquinhos a dois quilômetros com os aparelhos então construídos.

Depois descobrimos que no fim da Primeira Guerra o grande físico francês Langevin havia desenvolvido um método de localização por ultra-som. A detecção era feita com cristais de quartzo, lançando mão do efeito piezelétrico, descoberto por Pierre Curie. Após essa época foram descobertos outros métodos de se produzir a piezeletricidade, por meio de cristais artificiais, os cristais de sal de Rochelle. Para construir um detetor de sal de Rochelle tivemos de produzir os cristais em laboratório, cortá-los no ângulo certo, revesti-los e colocá-los de tal forma que resistissem às ondas de pressão no navio devido às bombas de profundidade. Essas ondas eram tão fortes que um aparelho frágil seria destruído. Fizemos esses detetores com o auxílio de colegas da Química e Geologia, que nos ajudaram sobre a produção e a orientação dos cristais. Depois, acabamos criando os cristais, cortando e revestindo no próprio laboratório de Física. Além disso necessitávamos de amplificadores eletrônicos para corrente alternada de alta freqüência. Outro problema para a época era o da construção de geradores para corrente alternada, porém, este foi solucionado por uma indústria pequena, mas de excelente qualidade, de um engenheiro húngaro chamado Kessler.

Nasceu, assim, o detetor de submarinos, que funcionava com cristais de sal de Rochelle e com tubos de níquel colocados abaixo da quilha do navio. Aí surgiram outros problemas. Era necessário furar o casco do navio, ter um dispositivo telescópico para baixar esse aparelho em profundidade. Era preciso então usar materiais que resistissem à pressão da água e não sofressem corrosão. Surgiu, assim, a necessidade de se fazer aço inoxidável. Pela primeira vez o aço inoxidável foi feito no Brasil, pelo IPT. Como não se fazia na época nada em metalurgia de níquel no Brasil, procuramos o apoio da Laminação Nacional de Metais. Eles laminaram o níquel e, depois, com o auxílio de uma firma de fabricação de móveis de aço, conseguimos fazer o tubo. Essa empresa de móveis de aço era dirigida pelo engenheiro Aldo Magnelli, que havia trabalhado em Roma em Física experimental, sob a orientação de Enrico Fermi - o criador da primeira reação em cadeia com o urânio, em Chicago.

No início todos os comboios americanos e ingleses tinham que acompanhar os navios brasileiros até a Argentina e voltar. Quando o Brasil passou a ter esses dispositivos de segurança, os combois americanos deixavam os navios mercantes em Natal. O comboio até a Argentina já era feito pela Marinha brasileira. Foi um auxílio substancial, porque os aliados passaram a contar com maior disponibilidade de destróieres e torpedeiros para a linha de frente. O trabalho desenvolvido no Laboratório de Física da Faculdade de Filosofia do Estado de São Paulo, por Marcelo Damy e Paulus Pompeia, na construção de cristais de Rochelle, foi repassado para a empresa paulista Cacique S.A (Inbelsa), para fabricação de ecobatímetros. Depois da guerra, a tecnologia de fabricação passou para a indústria, que pode assim fabricar as cápsulas de cristal dos antigos toca-discos.

Nenhuma patente foi solicitada para a invenção e Marcelo se justifica: "Antes da segunda guerra havia uma liberdade total de intercâmbio científico e o cientista trabalhava em descobertas novas, fazendo ciência pela ciência. Não conheço nenhum bom físico que tenha tirado patente de suas pesquisas antes da Segunda Guerra Mundial. O único caso - censurado por cientistas do mundo todo foi o de Enrico Fermi, D´Agostino, Amaldi, Segré, Rasetti e Pontecorvo que pediram e ganharam a patente do processo de realentamento de nêutrons. A Comissão de Energia Atômica dos EUA teve que lhes pagar uma quantia enorme de royalties. Isso mudou depois de 1945, porque a Segunda Guerra (Fermi ganha nova patente nesta época US2708656 de 1955), ganha basicamente pelos físicos, demonstrou que a pesquisa pura pode ter uma série de conseqüências de interesse industrial. A partir daí surgiu o hábito das patentes, hoje incluídas nos contratos dos órgãos de financiamento nacionais e internacionais. Isso desvirtuou completamente a pesquisa na física e em outras ciências. Entre uma pesquiisa pura a longo prazo, que vai exigir muitos anos de trabalho, e uma pesquisa aplicada, simples, que possa lhe dar uma patente, ele faz a segunda."

Marcelo Damy teve papel importante também no desenvolvimento da energia nuclear no país. Após retornar ao Brasil, com o advento da Segunda Guerra Mundial, Marcelo Damy construiu o Bétatron, o primeiro acelerador da América Latina, implantado em 1950, na USP. Iniciou, com o equipamento, as pesquisas de física nuclear no país. Em 1956, fundou e tornou-se o primeiro diretor do Instituto de Energia Atômica (IEA) - hoje Ipen - e lá implantou o primeiro reator brasileiro, marco para a energia nuclear nacional. Em 1961, foi convidado pelo presidente Jânio Quadros para ser o presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), cargo que ocupou até 1964. Aposentou-se como professor da USP em 1968, quando foi nomeado diretor do Instituto de Física da Unicamp e tornou-se responsável por sua implementação. Em 1973, assumiu como professor titular de Física Nuclear na PUC-SP, onde se aposentou em 1994 como professor emérito. É também professor emérito da USP e pesquisador emérito do Ipen. A partir de 1988, passou a atuar como consultor científico do Ipen, mantendo na instituição um grupo de pesquisas até hoje, no alto dos seus 88 anos. O professor Marcello Damy de Souza Santos, considerado o decano da física nuclear no Brasil, recebeu em outubro de 2002 o Título de Cidadão Paulistano.

Fonte: http://www.usp.br/iea/revista/revista22/damy.html
acesso em junho de 2002
http://www.aben.com.br/
acesso em dezembro de 2002
Cientistas do Brasil, SBPC, 1998, página 524, 636
História da Indústria de Telecomunicações no Brasil, Henry Barros, 1989, páginas 24 e 108
envie seus comentários para abrantes@inpi.gov.br

http://inventabrasilnet.t5.com.br/damy.htm




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#2 Mensagem por César » Ter Nov 01, 2005 3:45 pm

Fantástico!!!!

São pessoas como ele que dão orgulho e prestígio ao Brasil. Muito legal a história.

Outro físico de destaque mundial, Brasileiro, foi o famoso César Lattes( :D ), que trabalhou na procura pelo méson-pi. E hoje é homenageado na "Plataforma lattes", o site que arquiva boa parte do conhecimento científico nacional.

Abraços

César




"- Tú julgarás a ti mesmo- respondeu-lhe o rei - É o mais difícil. É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar os outros. Se consegues fazer um bom julgamento de ti, és um verdadeiro sábio."

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#3 Mensagem por VICTOR » Ter Nov 01, 2005 4:00 pm

Nem me fale, tenho que atualizar meu cadastro no Curriculo Lattes e minha senha nao funciona mais... o povo da UFPR vai me matar uma hora dessas.




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