OK, vamos tentar de novo:
1 - Pensar que fazer um Guarani 8 x 8 equivalente ao Centauro é apenas (1) esticar o monobloco, (2) abrir um buraco no topo para instalar a torre e (3) botar mais um eixo é desconhecer por completo várias questões envolvendo Bldos. Apenas para começar, olhemos as dimensões do Centauro II MGS 120 (Tank Destroyer):
(1) Só por aí já dá para ver que não se mexe
SÓ no comprimento: são 40+ cm de largura a mais (lógico né, não deve ser mole disparar um 120 com DM-63A1 às 3 ou 9 hs sem capotar a VTR só com o recuo. Em movimento, então, deve ser RADICAL
); deve-se rebaixar o topo do monobloco tanto quanto possível, pois aquela torre blindada com aquele canhãozão lá em cima sobe pra burro o CG; para fazer isso, se deve reprojetar o posto do condutor (aí volta aquela diferença entre quem realmente esteve num Guarani e andou nele e quem só o conhece da Wikipédia & quetales: com capacete, a cabeça fica a poucos cm do teto - lembrar,
todos os assentos não tocam no piso, ficando suspensos do teto - da VTR, ou seja, vai ter que ficar mais "deitado", tipo o do Osório EE-T2); o (grande) aumento de tamanho e peso (massa) e acréscimo de mais um eixo vão exigir troca de motor e transmissão, o que leva ao reprojeto de seu compartimento, tanques de combustível e mesmo reposicionamento/reprojeto dos sistemas automáticos de extinção de incêndio. Isso sem mencionar relocalização/reprojeto do painel e prováveis alterações no software, relocalização e aumento/troca do sistema de refrigeração do motor, ar condicionado, QBRN & quetales. Ou seja, é praticamente outro carro, com muito menor comunalidade com o Guarani do que podemos imaginar. E isso custa um monte de dinheiro e homens-hora para fazer.
(2) Para "abrir o buraco" da torre, primeiro se precisará estabelecer o CG longitudinal E LATERAL (lembrar, o motor não fica no centro e sim à direita do motorista, e vai ser um motor
maior) da VTR, depois reforçar os pontos de suporte (não apenas para o peso - massa - da torre em si mas também levando em conta os esforços causados pelo recuo da Pç ao ser disparada), definir a localização de equipamentos internos (como os descritos acima e mais o depósito de munição extra) e pontos de abandono (para o caso de algo dar errado), mais uns quetales. E isso custa um monte de dinheiro e homens-hora para fazer.
(3) Botar mais um eixo não é essa molezinha toda. Dada a presença da torre (que, para contrabalançar o motor e caixa, certamente irá ficar tão para trás quanto for possível sem desequilibrar o carro), é provável que ao menos dois dos três atuais tenham que ser reposicionados, ao menos se se quiser alguma similaridade em comprimento com o citado Centauro II. Notemos que no atual Guarani o segundo eixo está mais próximo do dianteiro, o que faz todo o sentido do mundo, eis que o motor, caixa e blindagem mais espessa ali estão. Numa versão pesadamente artilhada, olhemos outra vez para o Centauro II: três eixos estão mais para trás (para contrabalançar o peso da torre, estando um pouco mais separados do frontal. Os propulsores aquáticos serão removidos, por óbvio. E isso custa um monte de dinheiro e homens-hora para fazer.
2 - Bueno, só quis dar uns toques sobre como é complicado transformar uma VTR em algo que ela não foi originalmente pensada para ser. Lembro que, quando se começou a falar em uma família de blindados - então ainda chamada de URUTU III - se cogitava também em uma versão artilhada para substituir o Cascavel, usando uma torre da CMI Belga com Pç 90, sobre a qual escrevi um texto anos atrás:
TORRE LCTS 90
Muitas das apresentações desta torre são similares ou mesmo iguais às da CT-CV, como ser biplace, estabilizada, modular, ter peça principal com carregamento automático, eletrônica digital com sensores de última geração, atuação eletromecânica tanto no giro quanto na elevação e rebaixamento do armamento, além da capacidade de proteção (integral contra munição perfurante calibre 7,62 mm; com blindagens modulares adicionais, ambas podem atingir o nível 4 das especificações da OTAN STANAG 4569 (como resistir a um impacto direto de munição 14,5mm APDS-T (M791) com velocidade de 911 m/s a 200 metros ou a uma explosão de granada de artilharia de 155 mm a 30 m). Tendo sido desenvolvidas pela mesma empresa, sendo praticamente da mesma geração e para propósitos semelhantes, isso é bastante natural. Assim, nos concentremos nas diferenças, que residem principalmente na peça principal e munição disponível, além de a torre, principalmente por seu armamento, ser mais leve (a CT CV pesa cerca de 4 tons sem os módulos de blindagem adicional).
O comprimento da peça é de 4,365 mm, ou seja, 48,5 calibres. Atinge seu melhor desempenho AC com munição APFSDS M603 MECAR Kenerga 90/46, que dispara um penetrador de 1,73 kg com velocidade inicial de 1430 m/s, entregando assim uma energia cinética (KE) de aproximadamente 1,77 MJ (equivalente ao 105 empregado por blindados como o SK-105 da Bolívia e AMX-13 da Argentina) sendo, de acordo com a empresa fabricante, capaz de penetrar cerca de 150 mm de RHAs a 2.000 m em ângulo de 60º (nem o Leo1A5 segura isso). Os valores de elevação e rebaixamento da peça são outra grande diferença em relação à torre CT-CV, sendo de -9º a + 20º o que, mesmo assim, são muito bons para peças embarcadas em veículos blindados de combate.
Ainda segundo o fabricante, esta torre e sua arma são particularmente adequados ao emprego por VTRs com peso entre 10 e 20 toneladas, sendo vista tanto sobre VTRs 6 x 6 como o Pandur quanto 8 x 8 como o Piranha IIIC. Outra característica que a diferencia da CT CV é que não há míssil AC disponível para emprego a partir da peça principal. Por outro lado, a LCTS 90 conduz um total de 37 cartuchos em seu interior, sendo 20 no compartimento blindado para emprego imediato e outras 17 estocadas em um compartimento inferior, dentro da própria torre, com a finalidade de agilizar a recarga.
Poucas modificações precisariam ser feitas no Guarani 6 x 6 para receber esta torre (chegaram a haver conversações entre a CMI e a Imbel sobre fabricação das munições, já que era considerada como quase certa a sua adoção pelo EB) e, dadas as peculiaridades do nosso entorno e nossas características físicas, geopolíticas, econômicas e geoestratégicas, seria sim uma ótima substituição para o Cascavel por uma fração do custo do monstrengo acima citado. Aliás, se é para torrar uma fortuna (que não existe nem vai existir tão cedo) para cometer "isso", melhor economizar um pouco e importar Centauro logo de uma vez, a logística seria da própria Iveco, que o fabrica na Itália.
3 - Só que...
...a lógica que norteia o desenvolvimento da chamada Brigada Guarani (não confundir com aquela no PR que só tem o nome mas não as características) tem vários requisitos já "congelados" e que restringem muito os tipos de VTRs que poderão ser empregadas em sua função original, que privilegia a rapidez no deslocamento. Notar que a citada Bda e seus requisitos foram BASEADOS e não COPIADOS da Stryker, a tigrada foi lá, estudou os equipamentos, técnicas e táticas para então desenvolver um modelo que se adequasse à NOSSA realidade operacional.
Um dos requisitos citados - e que tem impedido a adoção de Art orgânica da Bda, já que só é conhecido UM modelo aceitável (tem que ser AP), o CAESAR, e é caro pra burro - é que a GU deve ser capaz de se deslocar pelas mesmas vias e, em um território cheio de pontos de travessia de obstáculos (rios, lagos, barrancos), as pontes utilizáveis devem ser - no máximo - da Categoria 21, o que inviabiliza a maioria dos modelos de Art AP (com exceção do caro CAESAR) bem como o Centauro ou a VBR-MR 8 x 8. A questão toda se prende a haver muito mais pontes da citada categoria do que das maiores (o Leopard 1A5 usa Categoria 45, p ex). Assim, ou mudam a filosofia que norteia a criação da Bda Guarani ou Centauro vai continuar a ser apenas sonho molhado de leitor da Wikipédia...