O Kirk postou alguns dias atrás (semanas acho) uma de suas típicas bobagens, no caso se referia aos relógios dos ditadores. Tinha até um videozinho do Che, Fidel e Chavez ostentando seus Rolex. Já vi muito boato também sobre o Lula usar Rolex, o presidente da CUT também, além de camisas do "jacaré" que podem ser compradas a menos de 100 pila em liquidações. Bem, como sou um "relojólogo" inveterado, apesar de possuir apenas um Dumont Dellie Titanium surrado que adquiri em 6x de R$ 56,00 no meu primeiro emprego no distante ano de 2000...gostaria de esclarecer alguns pontos sobre esse curioso assunto.
O Lula, segundo ele mesmo, usa um relógio Citizen, é uma marca de origem japonesa, muito boa por sinal, mas totalmente
mainstream, é um relógio com mecanismo em quartzo, invenção suíça que quase acabou com a alta relojoaria local, pois como foi desprezada em função da tradição de fabricação de relógios mecânicos, a patente foi oferecida aos japoneses que rapidamente massificaram a produção de relógios baratos de qualidade e precisão, característica propiciada pelo mecanismo de quartzo.
Rapidamente, marcas japonesas como Seiko, Citizen, Orient e Casio tomaram o mercado com seus mecanismos analógicos e digitais baseados em quartzo. Isso começou lá pela década de 60.
Bem...os relojoeiros suíços souberam se reinventar e começaram a focar no nicho de relógios mecânicos de luxo, que são praticamente um artesanato de altíssima qualidade e tradição.
Antes da massificação do mecanismo de quartzo, relógios de qualidade eram um item restrito e caro, mas eram considerados muito mais ferramentas de trabalho do que ornamentos de ostentação. Vamos lembrar que também não existiam celulares, GPS e demais tecnologias de nossa época. Pilotos de avião, motoristas, maquinistas, comandantes de navio, soldados, necessitavam dessa ferramenta para desempenhar suas tarefas.
A Rolex, é uma marca fundada por um Alemão na Inglaterra, que fabricava relógios com mecanismos importados da Suíça, e que mais tarde se mudou para Genebra por questões tributárias. Hoje, sem dúvida é a marca mais prestigiada de relógios do mundo, mas nem sempre foi assim, no começo, paradoxalmente, ela foi considerada intrusa e sofreu até um certo desdém por parte de suas irmãs suíças legítimas, mas sempre foi uma marca que primou muito pela qualidade e logo caiu no gosto de profissionais que necessitavam de um relógio confiável, principalmente em suas versões mais acessíveis em aço inox.
Quando o relógio de pulso se popularizou a partir de 1910, enfrentou três grandes problemas para se tornar um instrumento tão confiável como seu ancestral de bolso:
O primeiro foi a própria miniaturização, para não andar com um cebolão deselegante no pulso, os mecanismos tiveram que encolher, e fazer engrenagens significativamente menores se tornou uma tarefa desafiadora até mesmo para os melhores artesãos suíços. A Rolex, com sua obsessão por qualidade foi uma das que conseguiu suplantar esse desafio.
O segundo foi a necessidade de dar corda, molas menores necessitavam de mais frequência para essa tarefa, e a minituarização também tornava essa tarefa um tanto quanto desajeitada. A Rolex inventou um dispositivo de contrapeso interno, o famoso automático, que carrega a corda do relógio com os movimentos do braço.
O terceiro, foi o fato de ao passar do bolso para o pulso, o relógio passou a ser bem mais sensível a sujeira e umidade, provocando frequentes transtornos aos seus proprietários. Novamente a Rolex inovou com as caixas roscadas e hermeticamente fechadas que impediam a entrada de sujeira e água. Uma das grandes sacadas de marketing da marca, foi expor relógios nas lojas dentro de aquários e presentear a primeira mulher a cruzar o Canal da Mancha a nado com um exemplar e constatar ao final da travessia que o mesmo funcionava perfeitamente. Rolex também estava no pulso de um dos dois primeiros homens a chegar ao topo de Everest.
Vamos então colocar as coisas em um contexto histórico, na década de 60, um bom relógio era considerado muito mais uma ferramenta de trabalho altamente especializada do que um mimo caro. Vale lembrar também que Fidel e Che são originários de famílias de classe média de Cuba e Argentina, não estou falando de classe C emergente, estou falando de classe média dos anos 50, famílias com posses e empregados. Um bom Rolex Submariner em aço inox, custava na época US$ 180,00, atualizado pela inflação, custaria em torno de US$ 1600,00, bem longe dos US$ 8500,00 pedidos hoje pelo mesmo modelo.
Fidel, durante as lutas armadas, costumava presentear seus comandantes de campo com relógios, um bom relógio era um item essencial para coordenar e sincronizar os movimentos das tropas, na era pré quartzo, a qualidade e o preço justo, tornavam o Rolex uma escolha óbvia.
Che foi presenteado por Fidel com pelo menos dois Rolex GMT - Master, um modelo bem básico na época. O primeiro foi presenteado por Che a seu pai, o segundo foi tomado na Bolívia por um de seus captores, que o tem em posse até hoje.
Quanto ao Chavez, bem...o Chavez era um Fanboy inveterado da dupla de revolucionários comunistas.
Em tempo: Um Citizen parecido com o do Lula, custa em torno de R$ 1000,00.
Em 2006, espalharam na imprensa que o Lula estava ostentando um Cartier no pulso.
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Tratava-se na verdade de um Amsterdan Sauer, que apesar do nome pomposo é nacional e custava na época em torno de R$ 1300,00.
Isso que aparece no pulso do presidente da CUT:
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Não é Rolex nem aqui nem na 25 de Março.