Túlio escreveu:
Buenas, Ricardo
Vou tentar expor minha posição por pontos. Assim:
Deveríamos em primeiro lugar estabelecer como se define o que é "potência". Se é pela qualidade ou quantidade/disponibilidade das tropas, dos equipamentos ou o quê. Não compreendi inteiramente quais os critérios usados pelo GFP - Site que nem conhecia, aliás - mas uma rápida olhada, com eles nos colocando em 1º lugar na América do Sul pareceu usar, entre seus pontos-chave, a existência de um NAe que apenas existe mas não está e dificilmente estará algum dia novamente operacional. Ademais, números simples dizem pouco, não faz muita diferença ter, no papel, trocentos navios ou aviões mas no ar e no mar há apenas um punhado em operação e são todos obsoletos/obsolescentes. Idem em terra, ao que somamos um grande Exército composto sobretudo por
conscritos e sem qualquer experiência real em conflitos desde a 2GM. E nem falei na capacidade industrial que, no nosso caso, está em eterna decadência: qual a capacidade que temos de manter as FFAA em operação apenas com a BID? Praticamente ZERO! Para manter o foco apenas no hemisfério sul, os números apenas podem nos mostrar quantitativamente como muito mais fortes do que a África do Sul mas basta analisar com calma e ver que eles têm experiências bem mais recentes de combate e uma BID incomparavelmente melhor e mais capaz. E experiência em se virar quando sob embargo (durante o Apartheid chegaram e reconstruir seus Mirage III como Cheetah, com o apoio de Israel, devido precisamente aos embargos internacionais). Se restringirmos apenas à América do Sul, fica complicado comparar Leo1 e M-60 com Leo 2, F-16 com F-5, Niterói e T-22 com T-23, Scorpéne com IKL e conscritos com soldados em crescente profissionalização que o Chile (em
sexto
lugar na lista) tem. Entramos aí em uma série de dicotomias entre qualidade vs quantidade, meios modernos vs meios antigos, meios operacionais vs meios indisponíveis (como o citado NAe), efetivo maior (mas de conscritos) vs efetivo menor (mas de profissionais) e por aí vai. Não se trata de mera "viralatice" nem de seu oposto, a patriotada ufanística, e sim de ser realista e encarar de frente o que realmente temos e como usamos (se é que usamos). Assim, meu juízo pessoal sobre a metodologia empregada pelo Site em apreço é um bocado desfavorável.
Não há (nem vai haver, ao menos no futuro previsível) hipótese que sustente um cenário de conflito na América do Sul sem considerar algum envolvimento, político e/ou econômico e/ou militar dos EUA. Mesmo no caso das Falklands ficou claro que houve apoio Americano à Inglaterra, tendo inclusive sido este o começo do fim do TIAR, que hoje é apenas um pedaço de papel sem valor real. Não há potência em parte alguma do planeta (muito menos aqui na região) com capacidade de desafiar a US Navy no Atlântico Sul. Sobre isto basta saber que um único CVN concentra maior capacidade de projeção de poder aéreo do que qualquer País Sul-Americano dispõe e uma única de suas Frotas pode mandar para o fundo qualquer coisa que Russos ou Chineses (presumindo-se que seriam os únicos com alguma capacidade de
tentar isso) mandem para cá. Outra vez, nada de "viralatice", apenas uma apreciação objetiva do que é real agora e dificilmente deixará de ser nas décadas vindouras.
Por fim, qualquer conflito entre forças Sul-Americanas que dure mais do que uns poucos dias e inclua mais do que algumas poucas GUs se tornará (ou melhor,
deverá ser considerado) longo e de modo algum poderá ser sustentado basicamente por recursos disponíveis em qualquer das Nações envolvidas. Cada propulsor com defeito significará um vetor a menos (pois ninguém aqui fabrica seus próprios propulsores), cada míssil ar-ar/antiaéreo disparado trará para mais perto o fim dos estoques (pois ninguém fabrica AAM nem SAM, ao menos não todas as peças. Notar que até o radar Saber M60 tem parte de seus componentes originários de outros Países), cada pneu usado em aeronaves de alto desempenho que for baixado não poderá ser substituído, pois ninguém na América do Sul fabrica e etc, etc, etc. Novamente, nada de "viralatice", é a nossa
realidade.
Olá Túlio, e obrigado pela resposta detalhada - no entanto, gostaria de discordar em parte de suas colocações - tenho a impressão de que vc repete uma percepção extremamente pessimista da capacidade brasileira em empreender um esforço de guerra sustentado, sem aplicar os mesmos standards a outros países vizinhos. Na verdade, o ranking estabelecido pelo site GFP não é apenas um somatório de números - ele analisa o tamanho da economia nacional bem como sua capacidade de concentrar esforços e recursos em caso de conflito militar.
E neste quesito, é mais do que óbvio que o Brasil detém imensas possibilidades já que produz praticamente tudo em casa, com um mercado interno gigantesco - por esta e outras razões vê-se o Brasil como um país ainda muito fechado para o resto do mundo (OMC e várias outras organizações o confirmam), o que, ironicamente, seria algo positivo para nós se fontes externas secassem.
Fica claro também que a exclusão do "400-pound gorilla in the room", os EUA, é um exercício teórico - mas mesmo assim temos precedentes onde eles escolheram o não-envolvimento em casos onde seus interesses não estavam sendo afetados de forma considerável - inúmeros conflitos bilaterais/regionais no passado recente (i.e. desde 1850 ou algo assim) NÃO tiveram intervenção norte-americana.
Mesmo o caso das Falklands mostrou que os EUA tinham pouco apetite para apoiar ostensivamente GB ou Argentina - in fact they left such countries to their own devices, como diríamos em inglês.
Assim sendo, manteria meu entendimento de que, parafraseando outro colega acima, somos "caolhos" em um terra de cegos - nem Chile, nem Argentina, nem Colômbia, nem África do Sul nem Venezuela teriam QUALQUER capacidade industrial ou bélica de dominar nosso país - e uma vez unificado o povo ao redor de um conflito (difícil pensar nisto em termos de paz, mas quase SEMPRE acontece), nossa vasta indústria se tornaria, SIM, uma indústria de guerra pronta a produzir o que fosse necessário excetuados talvez itens de altíssima tecnologia fornecidos por EUA/EU. E vou mais longe: até mesmo a França padece de uma péssima reputação quando projeta força: vide o ridículo trabalho que fizeram na Líbia recentemente - sem apoio logístico dos EUA a Europa é um tigre sem dentes.
Também discordo de sua análise de que tudo o que temos é "obsoleto" - tropas de paz brasileiras têm feito um ótimo trabalho em outras paragens, e particularmente nossos equipamentos de terra deixam muito pouco a desejar em termos de qualidade - nossas tropas de selva são as melhores do mundo - nossas tropas de segurança urbanas também estão expostas a riscos que poucas outras tropas de elite encaram. E uma vez mais: TODA a supply chain militar hoje em dia é internacionalizada - até no caso do desastre chamado F-35 vemos inúmeros itens produzidos fora dos EUA; mas daí a dizer que, em caso de crise não temos capacidade de produzir mísseis, munição e peças de reparo é um pouco excessivo. Nossa indústria bélica beneficia de acordos de transferência de tecnologia bem como de longa experiência advinda dos tempos de ENGESA etc. - fora que, em caso de conflito, a hipótese de isolamento COMPLETO à la Coréia do Norte é muito remota.
De qq forma, obrigado pelas atenciosas colocações..!