BUSSOLA POLITICA
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Re: BUSSOLA POLITICA
Fiz o meu ... havia aparecido a foto do Mussolini ... acho que o Grep hackeou meu teste !
[] kirk
Os Estados não se defendem exigindo explicações, pedidos de desculpas ou com discursos na ONU.
“Quando encontrar um espadachim, saque da espada: não recite poemas para quem não é poeta”
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Re: BUSSOLA POLITICA
Lula tinha (tem) planos de se refugiar na embaixada Italiana e pedir asilo ...
[] kirk
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- Wingate
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Re: BUSSOLA POLITICA
Ué! Por que ele não vai pedir asilo na Casa dos Artistas? É logo ali, no Congresso Nacional...kirk escreveu:Lula tinha (tem) planos de se refugiar na embaixada Italiana e pedir asilo ...
Wingate
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Re: BUSSOLA POLITICA
Contagem de tempo para este tópico se autodestruir.
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14....
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Re: BUSSOLA POLITICA
Como sempre, os primeiros (de preferência um de cada "torcida") que chegarem provocando/ofendendo vão ser punidos. A continuar a bagunça, este será mais um tópico trancado. O CMFDB lamenta profundamente mas lembramos que há um Regulamento a ser respeitado.
Notar, somos totalmente favoráveis ao debate político, o problema está na tendência constante que alguns colegas apresentam, de transformar algo que poderia ser saudável e edificante em briga de torcida.
EDIT MOD - Tornamos a lembrar aos colegas o teor de um dos artigos do Regulamento:
"7.8) Reclamações, sugestões e dúvidas devem exclusivamente ser enviadas por Mensagem Privada (MP) a qualquer Moderador do CMFDB, visando evitar polêmicas desnecessárias e contraproducentes. Quotar posts em verde (oficiais) será considerado agravante.
"
Notar, somos totalmente favoráveis ao debate político, o problema está na tendência constante que alguns colegas apresentam, de transformar algo que poderia ser saudável e edificante em briga de torcida.
EDIT MOD - Tornamos a lembrar aos colegas o teor de um dos artigos do Regulamento:
"7.8) Reclamações, sugestões e dúvidas devem exclusivamente ser enviadas por Mensagem Privada (MP) a qualquer Moderador do CMFDB, visando evitar polêmicas desnecessárias e contraproducentes. Quotar posts em verde (oficiais) será considerado agravante.
"
“Look at these people. Wandering around with absolutely no idea what's about to happen.”
P. Sullivan (Margin Call, 2011)
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Re: BUSSOLA POLITICA
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Re: BUSSOLA POLITICA
O futuro do PT e o risco da radicalização.
Epoca, 7.09.16.
Em seu primeiro discurso como ex-presidente, Dilma Rousseffemocionou a claque com a frase: “Haverá contra eles a mais determinada oposição que um governo golpista pode sofrer”. E arrematou: “Vão capturar as instituições do Estado para colocá-las a serviço do mais radical liberalismo econômico e do retrocesso social”. É jogo de cena, claro. Até agora o governo Temer não acrescentou nada de novo na agenda dos últimos tempos da política brasileira. Defende um teto para os gastos públicos, ideia que surgiu no início do governo Lula e foi retomada por um ministro de Dilma, Nelson Barbosa. Vai retomar a discussão das reformas previdenciária e trabalhista – que a própria Dilma prometia fazer, no fim de 2015, embora não tivesse mandado nenhum projeto ao Congresso. Em todos esses casos, as nuances fazem muita diferença, claro. Mas até agora o governo Temer não colocou em cena nada de muito diferente das soluções consensuais que nortearam, inclusive, os governos do PT.
O que mudou? O PT agora foi para a oposição – e, na oposição, a julgar pelas últimas declarações de políticos do partido, como o senador Lindbergh Farias, pode retomar o estilo que os petistas usavam no governo do tucano Fernando Henrique Cardoso. Se isso se confirmar, o PT bombardeará toda e qualquer medida do governo Temer, concordando ou não com ela. “Ir para a oposição agora é confortável, porque o ajuste vai ser muito impopular. É fácil. Vai dar voto”, afirma o sociólogo Celso Rocha de Barros. O PT se opôs, no governo Fernando Henrique, a medidas de austeridade que acabaria por adotar depois, no primeiro governo Lula. A diferença entre o discurso do PT na oposição e de quando chegou ao poder marca aquilo que os cientistas políticos chamam de “esquerda tradicional” e “esquerda moderna”.
A esquerda moderna é aquela que concilia o desejo de igualdade com uma administração competente e responsável da economia, que a faça crescer e gerar recursos para criar programas sociais. O governo de FHC cabe nessa definição. O governo de Lula, pelo menos até 2008, seguiu o mesmo figurino.
Nos dois casos ocorreu uma combinação virtuosa entre uma administração econômica que os especialistas chamariam de “ortodoxa” – com ajustes fiscais e a previsibilidade que atrai investimentos que geram empregos – e a criação de políticas sociais. Os santos padroeiros da esquerda moderna, que nos anos 1990 era chamada de terceira via, são o ex-presidente americano Bill Clinton e o ex-primeiro ministro britânico Tony Blair. Fernando Henrique se juntou ao clube – e o sociólogo inglês Anthony Giddens, criador da expressão “terceira via”, diz que o Lula do primeiro mandato merecia carteirinha de sócio.
A esquerda tradicional, em contraposição, é aquela que defende a criação e ampliação infinita de políticas sociais – mas não oferece soluções de como viabilizá-las na economia real. “O problema do socialismo é que eventualmente o dinheiro alheio acaba”, disse em 1976 a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher. A coalizão Syriza, que quebrou a Grécia, é um exemplo de esquerda tradicional. Outro exemplo é o último candidato a primeiro-ministro do Partido Trabalhista inglês, Ed Miliband – que perdeu a eleição ao não conseguir dizer de onde tiraria recursos para viabilizar suas promessas. Nas democracias mais saudáveis, a esquerda moderna e a direita moderna mantêm um debate produtivo sobre problemas concretos. Propostas como as de Miliband são vistas com desconfiança – embora populistas existam, em todo lugar, sobretudo em situações de crise.
Se o PT, na oposição ao governo Temer, adotar o discurso da esquerda tradicional – fincar pé na manutenção dos programas sociais sem propor alternativas concretas de como viabilizá-los no mundo da economia real –, disputará eleitores com outros partidos que já fazem o mesmo. O mais notório é o PSOL – que combina um programa moderno do ponto de vista dos direitos individuais, ao defender o casamento gay e a liberação de drogas leves, com propostas antiquadas do ponto de vista econômico. Isso deixaria vago, na política brasileira, o posto de defensor da esquerda moderna.
A esquerda moderna não tem um representante claro no Brasil. “Eles hoje estão dispersos em vários partidos, como o PSDB, o PMDB, o PPS, o PSB e a Rede”, diz o filósofo Fernando Schüler. Na campanha de 2014, o espaço foi ocupado por Marina Silva, que depois resolveu dar um tempo na política. Segundo o sociólogo Celso Barros, esse espaço não ficará vago por muito tempo. “Ele é eleitoralmente bom. Lula ganhou quando moderou seu discurso e foi reeleito depois de um primeiro mandato em que adotou a política econômica ortodoxa do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci”, afirma o sociólogo. “O eleitorado parece querer o que Lula ofereceu: políticas sociais e distribuição de renda, com um certo equilíbrio macroeconômico e uma certa previsibilidade.” O senador Cristovam Buarque, do PPS, personificou o dilema entre a sensibilidade social e a responsabilidade fiscal. “Espero que o presidente Temer cumpra seu compromisso de recuperar a estabilidade monetária”, afirmou Buarque, ao votar, constrangido, a favor do impeachment. Ex-petista e ex-ministro do governo Lula, Buarque pertence ao mesmo campo da esquerda que o PT. Mas não tolera irresponsabilidade fiscal. “Estamos fazendo o impeachment não só de Dilma, mas de uma esquerda velha.”
Tal dualidade existe também na direita. Os cientistas políticos definem a direita tradicional como uma mistura entre liberalismo econômico e conservadorismo de costumes. O sociólogo Giddens diz que tal direita está fadada a desaparecer, principalmente entre os jovens. No debate brasileiro, a direita tradicional se expressa por políticos de extração religiosa, espalhados por vários partidos. Basta lembrar os louvores a Deus ou “à família tradicional”, na sessão que aprovou o impeachment na Câmara dos Deputados. Aquela ode ao conservadorismo religioso – mais a composição do primeiro ministério de Temer, sem mulheres ou negros – ajudou a sedimentar, entre intelectuais de esquerda, a versão de que a presidente Dilma foi vítima de um golpe perpetrado por misóginos intolerantes. “É muito fácil passar o dia jogando pedras na direita brasileira, afinal ela é caricata e machista. Atribuir a eles a responsabilidade pelo impeachment é um exercício narcísico, improdutivo”, diz o filósofo Vladimir Safatle. A realidade, claro, é mais complexa. O governo Temer é um condomínio com várias tendências ideológicas, incluindo o que há de mais moderno do ponto de vista da gestão econômica. O discurso do “golpe”, com a vitimização e o clima de “nós contra eles”, pode atrasar uma importante autocrítica das esquerdas no Brasil. “O fracasso do projeto nacional-desenvolvimentista do governo Dilma levou o Brasil à grave crise e comprometeu os ganhos sociais da última década”, diz o economista Marcos Lisboa, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Lula. “A gente tem de rever políticas públicas que estão na contramão do mundo, como o regime previdenciário, que permite aposentadorias aos 50 anos de idade.”
A redução do peso do Estado terá a contribuição da direita moderna, que, segundo os cientistas políticos, se caracteriza pela postura igualmente liberal na condução da economia e nos costumes. Bandeiras caras à direita tradicional, como livre porte de armas, convivem com bandeiras caras à esquerda, como casamento gay. Na essência, é tudo liberdade individual. Historicamente impopular no Brasil, na última década o liberalismo ganhou foros de discussão, como o Instituto Millenium, e um partido: o Novo. Registrado no TSE em 2015, o Novo estreou neste ano em eleições ao lançar uma candidata à prefeitura do Rio de Janeiro, com o slogan “Mais com menos”.
Uma democracia se faz com uma pluralidade de pontos de vista. É normal existirem tendências tradicionais e modernas à esquerda e à direita. O debate entre as posturas modernas, que partem do mundo concreto – o realismo econômico e a evolução dos costumes –, costuma ser, no entanto, mais produtivo. Se o PT abandonar a esquerda moderna, é importante aparecer alguém que abrace essa posição. É igualmente fundamental a direita moderna ganhar densidade política à altura de sua densidade teórica. Quando isso ocorrer, o debate público brasileiro atingirá um outro nível.
Epoca, 7.09.16.
Em seu primeiro discurso como ex-presidente, Dilma Rousseffemocionou a claque com a frase: “Haverá contra eles a mais determinada oposição que um governo golpista pode sofrer”. E arrematou: “Vão capturar as instituições do Estado para colocá-las a serviço do mais radical liberalismo econômico e do retrocesso social”. É jogo de cena, claro. Até agora o governo Temer não acrescentou nada de novo na agenda dos últimos tempos da política brasileira. Defende um teto para os gastos públicos, ideia que surgiu no início do governo Lula e foi retomada por um ministro de Dilma, Nelson Barbosa. Vai retomar a discussão das reformas previdenciária e trabalhista – que a própria Dilma prometia fazer, no fim de 2015, embora não tivesse mandado nenhum projeto ao Congresso. Em todos esses casos, as nuances fazem muita diferença, claro. Mas até agora o governo Temer não colocou em cena nada de muito diferente das soluções consensuais que nortearam, inclusive, os governos do PT.
O que mudou? O PT agora foi para a oposição – e, na oposição, a julgar pelas últimas declarações de políticos do partido, como o senador Lindbergh Farias, pode retomar o estilo que os petistas usavam no governo do tucano Fernando Henrique Cardoso. Se isso se confirmar, o PT bombardeará toda e qualquer medida do governo Temer, concordando ou não com ela. “Ir para a oposição agora é confortável, porque o ajuste vai ser muito impopular. É fácil. Vai dar voto”, afirma o sociólogo Celso Rocha de Barros. O PT se opôs, no governo Fernando Henrique, a medidas de austeridade que acabaria por adotar depois, no primeiro governo Lula. A diferença entre o discurso do PT na oposição e de quando chegou ao poder marca aquilo que os cientistas políticos chamam de “esquerda tradicional” e “esquerda moderna”.
A esquerda moderna é aquela que concilia o desejo de igualdade com uma administração competente e responsável da economia, que a faça crescer e gerar recursos para criar programas sociais. O governo de FHC cabe nessa definição. O governo de Lula, pelo menos até 2008, seguiu o mesmo figurino.
Nos dois casos ocorreu uma combinação virtuosa entre uma administração econômica que os especialistas chamariam de “ortodoxa” – com ajustes fiscais e a previsibilidade que atrai investimentos que geram empregos – e a criação de políticas sociais. Os santos padroeiros da esquerda moderna, que nos anos 1990 era chamada de terceira via, são o ex-presidente americano Bill Clinton e o ex-primeiro ministro britânico Tony Blair. Fernando Henrique se juntou ao clube – e o sociólogo inglês Anthony Giddens, criador da expressão “terceira via”, diz que o Lula do primeiro mandato merecia carteirinha de sócio.
A esquerda tradicional, em contraposição, é aquela que defende a criação e ampliação infinita de políticas sociais – mas não oferece soluções de como viabilizá-las na economia real. “O problema do socialismo é que eventualmente o dinheiro alheio acaba”, disse em 1976 a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher. A coalizão Syriza, que quebrou a Grécia, é um exemplo de esquerda tradicional. Outro exemplo é o último candidato a primeiro-ministro do Partido Trabalhista inglês, Ed Miliband – que perdeu a eleição ao não conseguir dizer de onde tiraria recursos para viabilizar suas promessas. Nas democracias mais saudáveis, a esquerda moderna e a direita moderna mantêm um debate produtivo sobre problemas concretos. Propostas como as de Miliband são vistas com desconfiança – embora populistas existam, em todo lugar, sobretudo em situações de crise.
Se o PT, na oposição ao governo Temer, adotar o discurso da esquerda tradicional – fincar pé na manutenção dos programas sociais sem propor alternativas concretas de como viabilizá-los no mundo da economia real –, disputará eleitores com outros partidos que já fazem o mesmo. O mais notório é o PSOL – que combina um programa moderno do ponto de vista dos direitos individuais, ao defender o casamento gay e a liberação de drogas leves, com propostas antiquadas do ponto de vista econômico. Isso deixaria vago, na política brasileira, o posto de defensor da esquerda moderna.
A esquerda moderna não tem um representante claro no Brasil. “Eles hoje estão dispersos em vários partidos, como o PSDB, o PMDB, o PPS, o PSB e a Rede”, diz o filósofo Fernando Schüler. Na campanha de 2014, o espaço foi ocupado por Marina Silva, que depois resolveu dar um tempo na política. Segundo o sociólogo Celso Barros, esse espaço não ficará vago por muito tempo. “Ele é eleitoralmente bom. Lula ganhou quando moderou seu discurso e foi reeleito depois de um primeiro mandato em que adotou a política econômica ortodoxa do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci”, afirma o sociólogo. “O eleitorado parece querer o que Lula ofereceu: políticas sociais e distribuição de renda, com um certo equilíbrio macroeconômico e uma certa previsibilidade.” O senador Cristovam Buarque, do PPS, personificou o dilema entre a sensibilidade social e a responsabilidade fiscal. “Espero que o presidente Temer cumpra seu compromisso de recuperar a estabilidade monetária”, afirmou Buarque, ao votar, constrangido, a favor do impeachment. Ex-petista e ex-ministro do governo Lula, Buarque pertence ao mesmo campo da esquerda que o PT. Mas não tolera irresponsabilidade fiscal. “Estamos fazendo o impeachment não só de Dilma, mas de uma esquerda velha.”
Tal dualidade existe também na direita. Os cientistas políticos definem a direita tradicional como uma mistura entre liberalismo econômico e conservadorismo de costumes. O sociólogo Giddens diz que tal direita está fadada a desaparecer, principalmente entre os jovens. No debate brasileiro, a direita tradicional se expressa por políticos de extração religiosa, espalhados por vários partidos. Basta lembrar os louvores a Deus ou “à família tradicional”, na sessão que aprovou o impeachment na Câmara dos Deputados. Aquela ode ao conservadorismo religioso – mais a composição do primeiro ministério de Temer, sem mulheres ou negros – ajudou a sedimentar, entre intelectuais de esquerda, a versão de que a presidente Dilma foi vítima de um golpe perpetrado por misóginos intolerantes. “É muito fácil passar o dia jogando pedras na direita brasileira, afinal ela é caricata e machista. Atribuir a eles a responsabilidade pelo impeachment é um exercício narcísico, improdutivo”, diz o filósofo Vladimir Safatle. A realidade, claro, é mais complexa. O governo Temer é um condomínio com várias tendências ideológicas, incluindo o que há de mais moderno do ponto de vista da gestão econômica. O discurso do “golpe”, com a vitimização e o clima de “nós contra eles”, pode atrasar uma importante autocrítica das esquerdas no Brasil. “O fracasso do projeto nacional-desenvolvimentista do governo Dilma levou o Brasil à grave crise e comprometeu os ganhos sociais da última década”, diz o economista Marcos Lisboa, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Lula. “A gente tem de rever políticas públicas que estão na contramão do mundo, como o regime previdenciário, que permite aposentadorias aos 50 anos de idade.”
A redução do peso do Estado terá a contribuição da direita moderna, que, segundo os cientistas políticos, se caracteriza pela postura igualmente liberal na condução da economia e nos costumes. Bandeiras caras à direita tradicional, como livre porte de armas, convivem com bandeiras caras à esquerda, como casamento gay. Na essência, é tudo liberdade individual. Historicamente impopular no Brasil, na última década o liberalismo ganhou foros de discussão, como o Instituto Millenium, e um partido: o Novo. Registrado no TSE em 2015, o Novo estreou neste ano em eleições ao lançar uma candidata à prefeitura do Rio de Janeiro, com o slogan “Mais com menos”.
Uma democracia se faz com uma pluralidade de pontos de vista. É normal existirem tendências tradicionais e modernas à esquerda e à direita. O debate entre as posturas modernas, que partem do mundo concreto – o realismo econômico e a evolução dos costumes –, costuma ser, no entanto, mais produtivo. Se o PT abandonar a esquerda moderna, é importante aparecer alguém que abrace essa posição. É igualmente fundamental a direita moderna ganhar densidade política à altura de sua densidade teórica. Quando isso ocorrer, o debate público brasileiro atingirá um outro nível.
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Re: BUSSOLA POLITICA
A Revista Época, aquela pertencente ao Grupo Globo, falando como a esquerda deve ser comportar (ou seja, a esquerda pode ser esquerda desde que fique na direita) e fazendo propaganda pro Instituto Millennium, aquele mesmo grupo que defende o liberalismo total da economia e que tem como um dos membros João Roberto Marinho (http://www.institutomillenium.org.br/in ... uem-somos/), vice-presidente do Grupo Globo? Ah, que coisa mais linda, cara! O amor é MUITO LINDO!
"Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."
Darcy Ribeiro (1922 - 1997)
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Re: BUSSOLA POLITICA
Parlamentarismo, um sistema bem-sucedido.
Ives Gandra da Silva Martins - O Estado de São Paulo, 14.09.16.
Creio que chegou o momento de repensar o modelo político brasileiro
Com exceção dos Estados Unidos, o presidencialismo nas Américas tem sido um permanente fracasso. Todos os países que o adotaram tiveram golpes de Estado, revoluções e períodos de uma frágil democracia.
Se analisarmos, depois da 2.ª Guerra Mundial os principais países sul-americanos foram agitados por rupturas institucionais e regimes de exceção. Assim, Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Bolívia, Peru, Venezuela, Cuba, etc., passaram por rupturas democráticas e pela implantação de regimes de força.
O Brasil, que viveu 42 anos no sistema parlamentar monárquico, desde 1889 jamais teve um período tão longo de estabilidade. De 1889 a 1930, foram 41 anos interrompidos pela ditadura Vargas (de 1930 a 1945). O período de 1946 a 1964 (18 anos) terminou com a revolução de 31 de março. A redemocratização de 1985 deu início a um período de 31 anos, com dois impeachments presidenciais e alta instabilidade. Os governos dos presidentes Lula e Dilma Rousseff levaram o País à crise econômica sem precedentes em sua História, com queda assustadora do PIB, 11,5 milhões de desempregados, retorno da inflação e fantástico nível de corrupção.
Decididamente, o presidencialismo não é um bom sistema, pois confunde o chefe de Estado com o chefe de governo e este, quando eleito, se sente dono do poder, transformando-o, o mais das vezes, numa ditadura a prazo certo.
Presidi entre 1962 e 1964, na cidade de São Paulo, o extinto Partido Libertador, o único partido autenticamente parlamentarista entre os 13 existentes até o Ato Institucional n.º 2. Declarava Raul Pilla, seu presidente nacional, ser o parlamentarismo o sistema de governo da “responsabilidade a prazo incerto”, pois, eleito um chefe de governo irresponsável, por voto de desconfiança é alijado do poder, sem traumas. O presidencialismo, ao contrário, considerava Pilla, é o sistema “da irresponsabilidade a prazo certo”, pois, eleito um presidente incompetente ou corrupto, só pelo traumático processo do impeachment é possível afastá-lo.
Vejamos, por exemplo, o Brasil atual. Desde 2014 os sinais de fracasso do modelo econômico adotado eram evidentes, mas só houve consenso em iniciar o processo de impeachment em meados de 2016.
Arend Lijphart, professor da Universidade Yale, publicou um livro, em 1984, intitulado Democracies:Patterns of Majoritarian & Consensus Government in Twenty-one Countries. Examinou o sistema dos 21 principais países do mundo onde não houvera ruptura institucional depois de 2.ª Guerra Mundial e encontrou 20 hospedando o parlamentarismo e só os Estados Unidos presidencialista.
Historicamente, os dois sistemas têm origem na Inglaterra, o parlamentar (1688/89), e nos Estados Unidos, o presidencial (1776/87). A própria influência inglesa nas Treze Colônias levou os norte-americanos a adotar um sistema presidencial quase parlamentar, pois lá o Congresso tem participação decisiva nas políticas governamentais.
O grande diferencial entre parlamentarismo e presidencialismo reside na responsabilidade. No parlamentarismo, o mau desempenho é motivo de afastamento do primeiro-ministro, eleito sem prazo certo para governar. A própria separação entre chefe de Estado e chefe de governo cria um poder ultrapartidário capaz de intervir nas crises, seja para avalizar novos governos escolhidos pelo Parlamento, seja para dissolver o Parlamento quando este se mostre também irresponsável, a fim de consultar o povo se aquele Parlamento continua a merecer a confiança do eleitor.
O simples fato de o chefe de governo ter de prestar contas ao Parlamento e os parlamentares poderem voltar mais cedo para casa impõe a seus governos a responsabilidade, característica dominante no sistema parlamentarista.
Por outro lado, a separação da chefia de governo da chefia de Estado – algo que, no presidencialismo, se confunde na mesma pessoa – facilita a adoção de outros atributos próprios do sistema parlamentar, como o da burocracia profissionalizada. Este jornal publicou em 3/1/2015 que, enquanto o governo parlamentar alemão tinha 600 funcionários não concursados para tais funções, a presidente Dilma Rousseff tinha 113 mil.
Eleito um governo, este escolherá entre os servidores públicos que estão no topo da carreira os que mais se afinam com a maneira de ser do novo governo. Gozam os presidentes dos Bancos Centrais de autonomia maior, quando não de independência. Por essa razão, nas quedas de Gabinete os servidores administram o País até a escolha de um novo governo, sem a economia ser afetada.
Acrescente-se que a maioria dos países parlamentares adota o voto distrital puro ou misto, o que facilita o controle do eleitor sobre o político eleito.
Os modelos parlamentaristas são diversos, com maior ou menor atuação do chefe de Estado. Alguns até exercem funções de governo, como nos modelos francês e português, por exemplo, mas a regra é não exercê-las.
Também os partidos políticos se fortalecem no parlamentarismo, enquanto no presidencialismo se esfacelam, à luz da maior força do presidente. Quando se diz que o Brasil não pode ter o parlamentarismo porque não tem partidos políticos, respondo que o Brasil não tem partidos políticos porque não tem o parlamentarismo. Cláusula de barreira é fundamental para evitar legendas de aluguel, algo que, no Brasil, é um dos maiores males do presidencialismo.
Creio que chegou o momento de repensar o modelo político brasileiro e adotar o sistema parlamentar, que sempre deu certo no mundo, substituindo o adotado pelo Brasil, cujo fracasso é fantasticamente constante na sua História.
____________________________________
Professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo e Unifmu, do Ciee/'o Estado de S. Paulo', da Eceme, da ESG e da Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal-1ª Região.
Ives Gandra da Silva Martins - O Estado de São Paulo, 14.09.16.
Creio que chegou o momento de repensar o modelo político brasileiro
Com exceção dos Estados Unidos, o presidencialismo nas Américas tem sido um permanente fracasso. Todos os países que o adotaram tiveram golpes de Estado, revoluções e períodos de uma frágil democracia.
Se analisarmos, depois da 2.ª Guerra Mundial os principais países sul-americanos foram agitados por rupturas institucionais e regimes de exceção. Assim, Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Bolívia, Peru, Venezuela, Cuba, etc., passaram por rupturas democráticas e pela implantação de regimes de força.
O Brasil, que viveu 42 anos no sistema parlamentar monárquico, desde 1889 jamais teve um período tão longo de estabilidade. De 1889 a 1930, foram 41 anos interrompidos pela ditadura Vargas (de 1930 a 1945). O período de 1946 a 1964 (18 anos) terminou com a revolução de 31 de março. A redemocratização de 1985 deu início a um período de 31 anos, com dois impeachments presidenciais e alta instabilidade. Os governos dos presidentes Lula e Dilma Rousseff levaram o País à crise econômica sem precedentes em sua História, com queda assustadora do PIB, 11,5 milhões de desempregados, retorno da inflação e fantástico nível de corrupção.
Decididamente, o presidencialismo não é um bom sistema, pois confunde o chefe de Estado com o chefe de governo e este, quando eleito, se sente dono do poder, transformando-o, o mais das vezes, numa ditadura a prazo certo.
Presidi entre 1962 e 1964, na cidade de São Paulo, o extinto Partido Libertador, o único partido autenticamente parlamentarista entre os 13 existentes até o Ato Institucional n.º 2. Declarava Raul Pilla, seu presidente nacional, ser o parlamentarismo o sistema de governo da “responsabilidade a prazo incerto”, pois, eleito um chefe de governo irresponsável, por voto de desconfiança é alijado do poder, sem traumas. O presidencialismo, ao contrário, considerava Pilla, é o sistema “da irresponsabilidade a prazo certo”, pois, eleito um presidente incompetente ou corrupto, só pelo traumático processo do impeachment é possível afastá-lo.
Vejamos, por exemplo, o Brasil atual. Desde 2014 os sinais de fracasso do modelo econômico adotado eram evidentes, mas só houve consenso em iniciar o processo de impeachment em meados de 2016.
Arend Lijphart, professor da Universidade Yale, publicou um livro, em 1984, intitulado Democracies:Patterns of Majoritarian & Consensus Government in Twenty-one Countries. Examinou o sistema dos 21 principais países do mundo onde não houvera ruptura institucional depois de 2.ª Guerra Mundial e encontrou 20 hospedando o parlamentarismo e só os Estados Unidos presidencialista.
Historicamente, os dois sistemas têm origem na Inglaterra, o parlamentar (1688/89), e nos Estados Unidos, o presidencial (1776/87). A própria influência inglesa nas Treze Colônias levou os norte-americanos a adotar um sistema presidencial quase parlamentar, pois lá o Congresso tem participação decisiva nas políticas governamentais.
O grande diferencial entre parlamentarismo e presidencialismo reside na responsabilidade. No parlamentarismo, o mau desempenho é motivo de afastamento do primeiro-ministro, eleito sem prazo certo para governar. A própria separação entre chefe de Estado e chefe de governo cria um poder ultrapartidário capaz de intervir nas crises, seja para avalizar novos governos escolhidos pelo Parlamento, seja para dissolver o Parlamento quando este se mostre também irresponsável, a fim de consultar o povo se aquele Parlamento continua a merecer a confiança do eleitor.
O simples fato de o chefe de governo ter de prestar contas ao Parlamento e os parlamentares poderem voltar mais cedo para casa impõe a seus governos a responsabilidade, característica dominante no sistema parlamentarista.
Por outro lado, a separação da chefia de governo da chefia de Estado – algo que, no presidencialismo, se confunde na mesma pessoa – facilita a adoção de outros atributos próprios do sistema parlamentar, como o da burocracia profissionalizada. Este jornal publicou em 3/1/2015 que, enquanto o governo parlamentar alemão tinha 600 funcionários não concursados para tais funções, a presidente Dilma Rousseff tinha 113 mil.
Eleito um governo, este escolherá entre os servidores públicos que estão no topo da carreira os que mais se afinam com a maneira de ser do novo governo. Gozam os presidentes dos Bancos Centrais de autonomia maior, quando não de independência. Por essa razão, nas quedas de Gabinete os servidores administram o País até a escolha de um novo governo, sem a economia ser afetada.
Acrescente-se que a maioria dos países parlamentares adota o voto distrital puro ou misto, o que facilita o controle do eleitor sobre o político eleito.
Os modelos parlamentaristas são diversos, com maior ou menor atuação do chefe de Estado. Alguns até exercem funções de governo, como nos modelos francês e português, por exemplo, mas a regra é não exercê-las.
Também os partidos políticos se fortalecem no parlamentarismo, enquanto no presidencialismo se esfacelam, à luz da maior força do presidente. Quando se diz que o Brasil não pode ter o parlamentarismo porque não tem partidos políticos, respondo que o Brasil não tem partidos políticos porque não tem o parlamentarismo. Cláusula de barreira é fundamental para evitar legendas de aluguel, algo que, no Brasil, é um dos maiores males do presidencialismo.
Creio que chegou o momento de repensar o modelo político brasileiro e adotar o sistema parlamentar, que sempre deu certo no mundo, substituindo o adotado pelo Brasil, cujo fracasso é fantasticamente constante na sua História.
____________________________________
Professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo e Unifmu, do Ciee/'o Estado de S. Paulo', da Eceme, da ESG e da Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal-1ª Região.
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Re: BUSSOLA POLITICA
Oras, mas o Brasil já vive num sistema parlamentarista. O congresso derrubou uma chefe de governo sem que ela tenha cometido nenhum crime, a derrubaram pelo "conjunto da obra", assim como acontece com a queda dos primeiro-ministros mundo afora. O Estadão só quer legitimar sua posição política, não tem nada de imparcial nisso.
"Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."
Darcy Ribeiro (1922 - 1997)
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Re: BUSSOLA POLITICA
A esquerda em crise.
João Domingos - O Estado de São Paulo, 24.09.16.
Desde que se recompôs da tentativa de aniquilação total por parte da ditadura militar, primeiro em 1980, com a criação do PT, e depois em 1985, já no governo Sarney (1985-1990), com a legalização do PCB e do PCdoB, a centro-esquerda brasileira não vivia um momento tão delicado quanto o de agora. Delicado e de poucas perspectivas.
Em primeiro lugar, porque o PT, alcançado pelo escândalos do mensalão e do petrolão, apurado pela Operação Lava Jato, não tem mais a bandeira da ética para levantar. Foi com ela que o partido se enraizou na sociedade brasileira, tornou-se conhecido, conquistou parte do eleitorado e chegou ao poder. Por lá permaneceu por 13 anos, até sofrer o processo de impeachment.
Sem a possibilidade de fazer a defesa da ética, os petistas tentam, num gesto desesperado, empunhar algumas bandeiras políticas, como as do “Fora, Temer” e das “Diretas-Já”. Mas eles mesmos sabem que são bandeiras que não se sustentam por tempo longo e têm pouco apelo eleitoral.
Em segundo lugar, o momento é delicado e de poucas perspectivas porque a esquerda dita mais moderna, como o PSB e o PPS, enfrentam o dilema do adesismo ao governo Temer. E aderir à política do Palácio do Planalto significa apoiar o arrocho fiscal representado pelo projeto que estabelece um teto de gastos para o poder público, as reformas da Previdência e trabalhista.
No mundo, as esquerdas enfrentam dificuldades de todo tipo, principalmente depois do fim da União Soviética, que fez surgir a chamada crise paradigmática entre elas. Logo em seguida, o Partido Socialista Italiano (PSI) foi pego pela Operação Mãos Limpas. O desgaste foi tão grande que teve até de mudar de nome.
No Brasil, os problemas são especialmente dramáticos porque o PT, num deslize semelhante ao do PSI, afundou-se nas suspeitas de envolvimento em corrupção. Hegemônico entre as esquerdas, o PT comprometeu outras legendas com a imagem ruim que criou para si, pois muitas vezes são todas colocadas no mesmo balaio pelo eleitor, ou pela propaganda da extrema direita.
Quando o PT foi criado, em 1980, o dualismo da força de trabalho versus burguesia capitalista já começava a ficar no passado. Mesmo assim, a nova legenda, idealizada por parte do clero progressista, comunistas arrependidos, intelectuais de esquerda e elite sindical, recebeu o nome de Partido dos Trabalhadores.
Como a maioria esmagadora dos fundadores do PT não abraçava a doutrina comunista da luta de classes, optou-se por um programa mais moderno, sem enfrentamentos, baseado na ética. Como já dito aqui, essa bandeira caiu. Mas o PT tinha ainda uma segunda opção a explorar. Esta de forte apelo eleitoral, a da ajuda aos mais pobres.
Desde o escândalo do mensalão, em 2005, houve uma guinada no discurso do governo petista. Durou até a saída de Dilma Rousseff, no dia 31 de agosto. Trata-se do que se convencionou chamar de “discurso do ódio”. Segundo esse discurso, o governo petista era atacado pelas elites porque fazia distribuição de renda, aumentava os ganhos do trabalhador, dava oportunidade de todos andarem de avião. Esse discurso ainda é usado para justificar o impeachment de Dilma. Mas não passa de um chavão populista.
Por causa da crise que atingiu o PT, alguns líderes importantes do partido, como o ex-governador Tarso Genro e o ex-presidente da Câmara Arlindo Chinaglia, têm trocado ideia com parlamentares de outros partidos, principalmente do PSB, do PPS e da Rede, sobre a possibilidade de criar uma nova legenda. A bandeira da ética seria novamente levantada.
Proposta nova, mesmo, não há. O que é mais um indício de que a esquerda continua em crise e não consegue apontar uma saída para ela mesma.
João Domingos - O Estado de São Paulo, 24.09.16.
Desde que se recompôs da tentativa de aniquilação total por parte da ditadura militar, primeiro em 1980, com a criação do PT, e depois em 1985, já no governo Sarney (1985-1990), com a legalização do PCB e do PCdoB, a centro-esquerda brasileira não vivia um momento tão delicado quanto o de agora. Delicado e de poucas perspectivas.
Em primeiro lugar, porque o PT, alcançado pelo escândalos do mensalão e do petrolão, apurado pela Operação Lava Jato, não tem mais a bandeira da ética para levantar. Foi com ela que o partido se enraizou na sociedade brasileira, tornou-se conhecido, conquistou parte do eleitorado e chegou ao poder. Por lá permaneceu por 13 anos, até sofrer o processo de impeachment.
Sem a possibilidade de fazer a defesa da ética, os petistas tentam, num gesto desesperado, empunhar algumas bandeiras políticas, como as do “Fora, Temer” e das “Diretas-Já”. Mas eles mesmos sabem que são bandeiras que não se sustentam por tempo longo e têm pouco apelo eleitoral.
Em segundo lugar, o momento é delicado e de poucas perspectivas porque a esquerda dita mais moderna, como o PSB e o PPS, enfrentam o dilema do adesismo ao governo Temer. E aderir à política do Palácio do Planalto significa apoiar o arrocho fiscal representado pelo projeto que estabelece um teto de gastos para o poder público, as reformas da Previdência e trabalhista.
No mundo, as esquerdas enfrentam dificuldades de todo tipo, principalmente depois do fim da União Soviética, que fez surgir a chamada crise paradigmática entre elas. Logo em seguida, o Partido Socialista Italiano (PSI) foi pego pela Operação Mãos Limpas. O desgaste foi tão grande que teve até de mudar de nome.
No Brasil, os problemas são especialmente dramáticos porque o PT, num deslize semelhante ao do PSI, afundou-se nas suspeitas de envolvimento em corrupção. Hegemônico entre as esquerdas, o PT comprometeu outras legendas com a imagem ruim que criou para si, pois muitas vezes são todas colocadas no mesmo balaio pelo eleitor, ou pela propaganda da extrema direita.
Quando o PT foi criado, em 1980, o dualismo da força de trabalho versus burguesia capitalista já começava a ficar no passado. Mesmo assim, a nova legenda, idealizada por parte do clero progressista, comunistas arrependidos, intelectuais de esquerda e elite sindical, recebeu o nome de Partido dos Trabalhadores.
Como a maioria esmagadora dos fundadores do PT não abraçava a doutrina comunista da luta de classes, optou-se por um programa mais moderno, sem enfrentamentos, baseado na ética. Como já dito aqui, essa bandeira caiu. Mas o PT tinha ainda uma segunda opção a explorar. Esta de forte apelo eleitoral, a da ajuda aos mais pobres.
Desde o escândalo do mensalão, em 2005, houve uma guinada no discurso do governo petista. Durou até a saída de Dilma Rousseff, no dia 31 de agosto. Trata-se do que se convencionou chamar de “discurso do ódio”. Segundo esse discurso, o governo petista era atacado pelas elites porque fazia distribuição de renda, aumentava os ganhos do trabalhador, dava oportunidade de todos andarem de avião. Esse discurso ainda é usado para justificar o impeachment de Dilma. Mas não passa de um chavão populista.
Por causa da crise que atingiu o PT, alguns líderes importantes do partido, como o ex-governador Tarso Genro e o ex-presidente da Câmara Arlindo Chinaglia, têm trocado ideia com parlamentares de outros partidos, principalmente do PSB, do PPS e da Rede, sobre a possibilidade de criar uma nova legenda. A bandeira da ética seria novamente levantada.
Proposta nova, mesmo, não há. O que é mais um indício de que a esquerda continua em crise e não consegue apontar uma saída para ela mesma.
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Re: BUSSOLA POLITICA
Quem é de esquerda?
Roberta da Matta - O Globo, 5.10.16.
Numa velha investigação que realizei sobre identidade política, encontrei uma divisão nítida entre “esquerda” e “direita”. No início dos anos 60, um mundo muito maior e menos transparente do que o atual, dava pleno sentido à divisão entre direita e esquerda.
Além disso, quem era de esquerda ou de direita via o outro lado como contrário, mas também como imprescindível. Um dos maiores erros dos radicalismos e, no caso do Brasil, da direita representada pelo regime militar, foi a tentativa de dar uma “solução final” para a outra margem, esquecendo-se do rio por onde a história não deixa de correr. O mesmo ocorreu com a esquerda desmoralizada pelo lulopetismo.
A destruição do opositor subtrai a legitimidade de quem tem o “poder”. Quem sustenta a governabilidade é o derrotado. Daí a importância da competição eleitoral que acabamos de vivenciar. O processo eleitoral ajuda a descobrir novas lideranças tanto quanto a descartar projetos de “soluções finais” de quem, alojado no poder, planejou jamais perder uma disputa eleitoral. Enfrentar o nosso papel como como eleitores não é fácil quando não há salvadores da pátria ao lado de um punhado de partidos com bandeiras cansadas ou sem mastro. Naquele tempo havia medo, mas não havia vergonha nem culpa em ser “esquerdista”. Examinando meus dados, vejo que muitos se viam como peça de resistência ou vítima, mas todos tinham orgulho de sua escolha política.
Ser de “esquerda” era ser uma pessoa fiel, honesta e de boa vontade. Era ser alguém que enxergava a “realidade brasileira” (ou o todo) desdenhando dos “interesses de classe” que remetiam à parte e exprimiam egoísmo e descaso pelos pobres. Pelos explorados que constituíam o “povo” brasileiro ao qual nós, nos coretos acima da multidão, obviamente não pertencíamos. Éramos pastores do povo, e eu confirmei tal atitude numa entrevista na qual um operário dizia: “Os teóricos são o farol que guia a nossa prática”. Tal opinião confirmava a busca utópica de uma igualdade substantiva. A esquerda queria o paraíso neste mundo e perseguia o altruísmo. Ademais, ela não havia estado no poder. Esse poder que muda até mesmo a igreja do diabo, como ensinou Machado de Assis.
O poder corrompia, mas nós não entraríamos nisso. Como disse o próprio Lula décadas depois: em seis meses, o PT acaba com a corrupção. E José Genoino, presidente do partido, já no poder, reiterava: o PT não rouba e não deixa roubar.
O “poder” era um cetro ou palácio. Ele não era contraditório ou personalizado.
Reprimíamos o fato de sermos meninos brancos de classe média que viviam em “casas” hierarquizadas e aristocráticas, com um pai-patrão e seus empregados e, talvez por isso mesmo, tínhamos o sonho de uma igualdade ilimitada no plano político. Vencer uma discussão com o pai, cantar que o Brasil era um país subdesenvolvido era fazer a revolução...
Uma revolução que surgia como um conjunto de “reformas” a serem perpetradas pelo governo e por decreto, tal como ocorreu no comício da Central do Brasil em março de 1964. Ali, João Goulart decretou alguns dos seus pontos cruciais. Dezenove dias depois, veio — aí sim — o golpe militar que em menos de 48 horas pôs a esquerda na marginalidade, explodindo uma margem do rio.
Naquele tempo havia “reacionários”. Hoje há conservadores defendendo a “ordem” para situá-la ao lado do “progresso” e um enorme time de fascistas (úteis e inúteis) com suas listas de temas e pessoas a serem banidos e, eventualmente, eliminados. Em 1960, imitando a experiência cubana, falava-se em paredão; hoje — imitando sem saber os velhos nazistas — temos soluções finais para o mercado e para um capitalismo diabolizado.
Em nome dos direitos, evita-se corrigir a desigualdade que começa no desencontro entre uma aristocracia paga pelo Estado e os cidadãos comuns. Os idiotas que trabalham para sustentar um Estado a ser descontaminado de sua imagem de fiador do roubo, da incompetência e de uma burocracia marginal à norma da igualdade. É incabível, com a devida vênia aos meus amigos do Judiciário, que um juiz venal seja condenado à aposentadoria em sua residência com salário integral!
Essa foi uma eleição histórica. Nela, a esquerda abalada e derrotada pelo lulopetismo que a marginalizou. A crise fez com que ser esquerdista virasse sinônimo de demagogia burra, irresponsável e arrogante. Ou, para resumir numa palavra: a tudo o que era de “direita”.
PS: Se Marta Suplicy não é de esquerda, tudo é possível.
Roberta da Matta - O Globo, 5.10.16.
Numa velha investigação que realizei sobre identidade política, encontrei uma divisão nítida entre “esquerda” e “direita”. No início dos anos 60, um mundo muito maior e menos transparente do que o atual, dava pleno sentido à divisão entre direita e esquerda.
Além disso, quem era de esquerda ou de direita via o outro lado como contrário, mas também como imprescindível. Um dos maiores erros dos radicalismos e, no caso do Brasil, da direita representada pelo regime militar, foi a tentativa de dar uma “solução final” para a outra margem, esquecendo-se do rio por onde a história não deixa de correr. O mesmo ocorreu com a esquerda desmoralizada pelo lulopetismo.
A destruição do opositor subtrai a legitimidade de quem tem o “poder”. Quem sustenta a governabilidade é o derrotado. Daí a importância da competição eleitoral que acabamos de vivenciar. O processo eleitoral ajuda a descobrir novas lideranças tanto quanto a descartar projetos de “soluções finais” de quem, alojado no poder, planejou jamais perder uma disputa eleitoral. Enfrentar o nosso papel como como eleitores não é fácil quando não há salvadores da pátria ao lado de um punhado de partidos com bandeiras cansadas ou sem mastro. Naquele tempo havia medo, mas não havia vergonha nem culpa em ser “esquerdista”. Examinando meus dados, vejo que muitos se viam como peça de resistência ou vítima, mas todos tinham orgulho de sua escolha política.
Ser de “esquerda” era ser uma pessoa fiel, honesta e de boa vontade. Era ser alguém que enxergava a “realidade brasileira” (ou o todo) desdenhando dos “interesses de classe” que remetiam à parte e exprimiam egoísmo e descaso pelos pobres. Pelos explorados que constituíam o “povo” brasileiro ao qual nós, nos coretos acima da multidão, obviamente não pertencíamos. Éramos pastores do povo, e eu confirmei tal atitude numa entrevista na qual um operário dizia: “Os teóricos são o farol que guia a nossa prática”. Tal opinião confirmava a busca utópica de uma igualdade substantiva. A esquerda queria o paraíso neste mundo e perseguia o altruísmo. Ademais, ela não havia estado no poder. Esse poder que muda até mesmo a igreja do diabo, como ensinou Machado de Assis.
O poder corrompia, mas nós não entraríamos nisso. Como disse o próprio Lula décadas depois: em seis meses, o PT acaba com a corrupção. E José Genoino, presidente do partido, já no poder, reiterava: o PT não rouba e não deixa roubar.
O “poder” era um cetro ou palácio. Ele não era contraditório ou personalizado.
Reprimíamos o fato de sermos meninos brancos de classe média que viviam em “casas” hierarquizadas e aristocráticas, com um pai-patrão e seus empregados e, talvez por isso mesmo, tínhamos o sonho de uma igualdade ilimitada no plano político. Vencer uma discussão com o pai, cantar que o Brasil era um país subdesenvolvido era fazer a revolução...
Uma revolução que surgia como um conjunto de “reformas” a serem perpetradas pelo governo e por decreto, tal como ocorreu no comício da Central do Brasil em março de 1964. Ali, João Goulart decretou alguns dos seus pontos cruciais. Dezenove dias depois, veio — aí sim — o golpe militar que em menos de 48 horas pôs a esquerda na marginalidade, explodindo uma margem do rio.
Naquele tempo havia “reacionários”. Hoje há conservadores defendendo a “ordem” para situá-la ao lado do “progresso” e um enorme time de fascistas (úteis e inúteis) com suas listas de temas e pessoas a serem banidos e, eventualmente, eliminados. Em 1960, imitando a experiência cubana, falava-se em paredão; hoje — imitando sem saber os velhos nazistas — temos soluções finais para o mercado e para um capitalismo diabolizado.
Em nome dos direitos, evita-se corrigir a desigualdade que começa no desencontro entre uma aristocracia paga pelo Estado e os cidadãos comuns. Os idiotas que trabalham para sustentar um Estado a ser descontaminado de sua imagem de fiador do roubo, da incompetência e de uma burocracia marginal à norma da igualdade. É incabível, com a devida vênia aos meus amigos do Judiciário, que um juiz venal seja condenado à aposentadoria em sua residência com salário integral!
Essa foi uma eleição histórica. Nela, a esquerda abalada e derrotada pelo lulopetismo que a marginalizou. A crise fez com que ser esquerdista virasse sinônimo de demagogia burra, irresponsável e arrogante. Ou, para resumir numa palavra: a tudo o que era de “direita”.
PS: Se Marta Suplicy não é de esquerda, tudo é possível.
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Re: BUSSOLA POLITICA
Caraca, a bolinha ficou praticamente no centro de cruz...
Não temais ímpias falanges,
Que apresentam face hostil,
Vossos peitos, vossos braços,
São muralhas do Brasil!
Que apresentam face hostil,
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- Clermont
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Re: BUSSOLA POLITICA
Hora de rever conceitos...
Bolívar Lamounier - O Estado de São Paulo, 15.10.16.
Desde o final de agosto, o status quo político brasileiro foi atingido por três belas pancadas: o impeachment de Dilma Rousseff, a contundente derrota do PT na eleição municipal e a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 (teto de gastos públicos), esta em primeiro turno, mas por larga margem. Considerando, ainda, que as três decorreram direta ou indiretamente da Operação Lava Jato, é razoável conjecturar que o próprio sistema político tende a se alterar em profundidade, e para muito melhor.
O impeachment concretizou-se apesar da fábula do “golpe”, que as forças ditas de esquerda se encarregaram de propagar pelo mundo afora, com zelo suficiente para levar na conversa alguns respeitáveis órgãos da imprensa internacional. Na eleição, o PT venceu em Rio Branco, capital do Acre, mas perdeu em São Bernardo. Em São Paulo, a joia da coroa, o estreante Doria derrotou o incumbente Haddad e, de quebra, três figuras já curtidas desde outros carnavais: Russomanno, Marta Suplicy e Luiza Erundina. No mesmo sentido, a PEC 241 foi aprovada com uma folgada margem de 255 votos (366 a 111), deixando ao menos temporariamente em suspenso aquele monstro a que se convencionou denominar “presidencialismo de coalizão”.
Os efeitos produzidos pela avalanche de corrupção desvendada pela Lava Jato e pelos três episódios que venho de mencionar certamente levarão os pesquisadores políticos acadêmicos e os jornalistas de um modo geral a repensar os esquemas que utilizam em suas análises. Embora não os veja como um grupo homogêneo, creio que a maioria observa a cena pública brasileira por um prisma ideológico, esforçando-se para enquadrar a variedade das questões e dos agentes políticos na dicotomia direita x esquerda. Esse tipo de exercício às vezes abeira-se ao simplório, como na análise do Movimento Brasil Livre (MBL) escrita por dois jornalistas argentinos, Diego González e Julia Muriel Dominzain, publicada esta semana num site denominado America’s Program. Descrevendo o movimento como um dos grupos promotores do “golpe institucional”, os signatários o caracterizam como uma das faces da “nova direita” brasileira, embasando tal caracterização no fato de o MBL pedir o fim da Lei Rouanet, a simplificação do sistema tributário, a privatização dos bancos oficiais e a abertura da economia.
Mas tudo bem, os dois jornalistas citados são argentinos, e quiçá jovens. O problema é que o prisma ideológico a que me refiro remonta aos anos 1950 e raramente é questionado, mantendo uma presença incomodamente dominante no circuito de formação da opinião. Naqueles tempos, inegavelmente, a dicotomia direita x esquerda (ou conservador x progressista) fazia sentido, não exatamente porque uma tivesse mais “sensibilidade social” que a outra, mas porque eram os tempos da guerra fria, que dividira nesses termos não só o Brasil, mas o mundo inteiro. No Brasil de hoje, não há como não entrar na substância. Quem quer conservar o quê? Faz sentido afirmar que é progressista o defensor de estatais semifalidas e do corporativismo sindical, sendo conservador e até reacionário o defensor do mérito, da probidade na administração pública, do mercado e de uma economia mais aberta?
Num livrinho intitulado Partidos Conservadores no Brasil Contemporâneo, publicado no ano 2000, os cientistas políticos Scott Mainwaring, Rachel Meneguello e Timothy Power esmeraram-se no manejo das estatísticas, mas parecem não ter percebido a fragilidade do esquema de análise fundado na dicotomia direita-esquerda, já insinuada no título da obra. “Partidos conservadores” no Brasil contemporâneo? Quais são eles? O polo “não conservador”, como é fácil adivinhar, compreende o PT, o PDT e as pequenas siglas comunistas. Fernando Collor de Mello, cujo PRN era para inglês ver, é descrito como um mero populista, mas esse adjetivo não é aplicado a Lula, sutileza que implicitamente o transforma numa liderança “verdadeiramente” ideológica.
No centro os autores colocam o PMDB e o PSDB – este, porém, pendendo para a direita por causa do papel proeminente que nele desempenha o “neoliberal” Fernando Henrique Cardoso. Do ponto de vista programático, os autores informam que o traço distintivo dos conservadores, nos anos 90, foi o papel dos Estados e mercados (o neoliberalismo tornou-se a bandeira unificadora da agenda política da direita). No Brasil, além do apoio ao governo “neoliberal” de Fernando Henrique, o que distinguiu os conservadores dos partidos de centro e de esquerda foi o fato de enfatizarem mais o crescimento econômico do que a distribuição, bem como o enxugamento da máquina estatal, a redução dos gastos públicos e a privatização. Sobre a iminência da hiperinflação em meados dos anos 90 os autores não se detiveram.
Do ponto de vista eleitoral, os conservadores geralmente se davam mal nas grandes cidades, angariando mais votos nos pequenos municípios que nos grandes centros. Quanto a este ponto, louve-se a isenção valorativa dos autores citados. Em outros tempos, era comum contrapor-se a iluminação ateniense dos grandes centros à treva perpétua dos “grotões”, como se o voto daqueles fosse portador de uma legitimidade superior à destes.
Embora sucintas, as citações acima devem ser suficientes para evidenciar o arcaísmo dessa estrutura conceitual e as distinções arbitrárias a que ela conduz. Contudo o ponto que desejo frisar é a urgente revisão de tal esquema à luz dos acontecimentos recentes. O que derrubou eleitoralmente o PT não foi a prévia ocorrência do “neoliberalismo” de Fernando Henrique, mas o paleoestatismo ideológico pelo qual se orienta, seus colossais erros de política econômica e a dimensão amazônica da corrupção posta a nu pela Lava Jato.
Bolívar Lamounier - O Estado de São Paulo, 15.10.16.
Desde o final de agosto, o status quo político brasileiro foi atingido por três belas pancadas: o impeachment de Dilma Rousseff, a contundente derrota do PT na eleição municipal e a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 (teto de gastos públicos), esta em primeiro turno, mas por larga margem. Considerando, ainda, que as três decorreram direta ou indiretamente da Operação Lava Jato, é razoável conjecturar que o próprio sistema político tende a se alterar em profundidade, e para muito melhor.
O impeachment concretizou-se apesar da fábula do “golpe”, que as forças ditas de esquerda se encarregaram de propagar pelo mundo afora, com zelo suficiente para levar na conversa alguns respeitáveis órgãos da imprensa internacional. Na eleição, o PT venceu em Rio Branco, capital do Acre, mas perdeu em São Bernardo. Em São Paulo, a joia da coroa, o estreante Doria derrotou o incumbente Haddad e, de quebra, três figuras já curtidas desde outros carnavais: Russomanno, Marta Suplicy e Luiza Erundina. No mesmo sentido, a PEC 241 foi aprovada com uma folgada margem de 255 votos (366 a 111), deixando ao menos temporariamente em suspenso aquele monstro a que se convencionou denominar “presidencialismo de coalizão”.
Os efeitos produzidos pela avalanche de corrupção desvendada pela Lava Jato e pelos três episódios que venho de mencionar certamente levarão os pesquisadores políticos acadêmicos e os jornalistas de um modo geral a repensar os esquemas que utilizam em suas análises. Embora não os veja como um grupo homogêneo, creio que a maioria observa a cena pública brasileira por um prisma ideológico, esforçando-se para enquadrar a variedade das questões e dos agentes políticos na dicotomia direita x esquerda. Esse tipo de exercício às vezes abeira-se ao simplório, como na análise do Movimento Brasil Livre (MBL) escrita por dois jornalistas argentinos, Diego González e Julia Muriel Dominzain, publicada esta semana num site denominado America’s Program. Descrevendo o movimento como um dos grupos promotores do “golpe institucional”, os signatários o caracterizam como uma das faces da “nova direita” brasileira, embasando tal caracterização no fato de o MBL pedir o fim da Lei Rouanet, a simplificação do sistema tributário, a privatização dos bancos oficiais e a abertura da economia.
Mas tudo bem, os dois jornalistas citados são argentinos, e quiçá jovens. O problema é que o prisma ideológico a que me refiro remonta aos anos 1950 e raramente é questionado, mantendo uma presença incomodamente dominante no circuito de formação da opinião. Naqueles tempos, inegavelmente, a dicotomia direita x esquerda (ou conservador x progressista) fazia sentido, não exatamente porque uma tivesse mais “sensibilidade social” que a outra, mas porque eram os tempos da guerra fria, que dividira nesses termos não só o Brasil, mas o mundo inteiro. No Brasil de hoje, não há como não entrar na substância. Quem quer conservar o quê? Faz sentido afirmar que é progressista o defensor de estatais semifalidas e do corporativismo sindical, sendo conservador e até reacionário o defensor do mérito, da probidade na administração pública, do mercado e de uma economia mais aberta?
Num livrinho intitulado Partidos Conservadores no Brasil Contemporâneo, publicado no ano 2000, os cientistas políticos Scott Mainwaring, Rachel Meneguello e Timothy Power esmeraram-se no manejo das estatísticas, mas parecem não ter percebido a fragilidade do esquema de análise fundado na dicotomia direita-esquerda, já insinuada no título da obra. “Partidos conservadores” no Brasil contemporâneo? Quais são eles? O polo “não conservador”, como é fácil adivinhar, compreende o PT, o PDT e as pequenas siglas comunistas. Fernando Collor de Mello, cujo PRN era para inglês ver, é descrito como um mero populista, mas esse adjetivo não é aplicado a Lula, sutileza que implicitamente o transforma numa liderança “verdadeiramente” ideológica.
No centro os autores colocam o PMDB e o PSDB – este, porém, pendendo para a direita por causa do papel proeminente que nele desempenha o “neoliberal” Fernando Henrique Cardoso. Do ponto de vista programático, os autores informam que o traço distintivo dos conservadores, nos anos 90, foi o papel dos Estados e mercados (o neoliberalismo tornou-se a bandeira unificadora da agenda política da direita). No Brasil, além do apoio ao governo “neoliberal” de Fernando Henrique, o que distinguiu os conservadores dos partidos de centro e de esquerda foi o fato de enfatizarem mais o crescimento econômico do que a distribuição, bem como o enxugamento da máquina estatal, a redução dos gastos públicos e a privatização. Sobre a iminência da hiperinflação em meados dos anos 90 os autores não se detiveram.
Do ponto de vista eleitoral, os conservadores geralmente se davam mal nas grandes cidades, angariando mais votos nos pequenos municípios que nos grandes centros. Quanto a este ponto, louve-se a isenção valorativa dos autores citados. Em outros tempos, era comum contrapor-se a iluminação ateniense dos grandes centros à treva perpétua dos “grotões”, como se o voto daqueles fosse portador de uma legitimidade superior à destes.
Embora sucintas, as citações acima devem ser suficientes para evidenciar o arcaísmo dessa estrutura conceitual e as distinções arbitrárias a que ela conduz. Contudo o ponto que desejo frisar é a urgente revisão de tal esquema à luz dos acontecimentos recentes. O que derrubou eleitoralmente o PT não foi a prévia ocorrência do “neoliberalismo” de Fernando Henrique, mas o paleoestatismo ideológico pelo qual se orienta, seus colossais erros de política econômica e a dimensão amazônica da corrupção posta a nu pela Lava Jato.
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Re: BUSSOLA POLITICA
Doce ilusão a sua, ela cometeu sim, CRIME CONTRA AS CONTAS PUBLICAS, a presiDANTA recorreu ao STF trilhões de vezes e deu sempre com a cara no chão...Bolovo escreveu:Oras, mas o Brasil já vive num sistema parlamentarista. O congresso derrubou uma chefe de governo sem que ela tenha cometido nenhum crime, a derrubaram pelo "conjunto da obra", assim como acontece com a queda dos primeiro-ministros mundo afora. O Estadão só quer legitimar sua posição política, não tem nada de imparcial nisso.
Chega de mimimi... o sistema é presidencialista e o impechment foi totalmente legal e nada teve haver com parlamentarismo, já que não houve uma eleição para um novo primeiro-ministro dentre os deputados, assumiu o vice, como Itamar, COMO DIZ A LEI...