JT8D escreveu:A situação realmente é difícil e eu não quero "impor" meu otimismo a ninguém. Essa atitude é mais uma opção pessoal minha.
Por incrível que pareça, o projeto do sub nuclear tem resistido bravamente às inúmeras crises ao longo de todos esses anos. O resultado dessas crises tem sido atrasos, mas não a descontinuidade do programa. Bem ou mal, um núcleo de técnicos extremamente experientes e capacitados tem sido mantido e, como um organismo em estado latente, o projeto sobrevive e vai acumulando conhecimento. Não é incomum que programas complexos sofram grandes atrasos, mesmo em países de economia saudável e mesmo com verbas abundantes. Pesquisa e desenvolvimento é uma atividade árdua, que requer persistência e continuidade, o que não é fácil se de conseguir na era imediatista em que vivemos. Matar o projeto não vai resolver nossos problemas atuais, só vai contribuir para perpetuá-los. É apenas a minha opinião.
Abs,
JT
Sabe, amigo JT8D, a questão é que não dá para ser otimista com a situação do programa hoje. Tudo bem que o pessoal do reator ainda está lá, bravamente se mantendo ativo para tentar colocá-lo pelo menos para realizar os testes (que deveriam ter começado 5 anos atrás - o que se tem feito desde então?) e provavelmente estudando muito para se manterem atualizados com pelo menos a teoria de reatores, de forma a algum dia, se forem chamados, poderem tentar desenvolver um sucessor para o RENAP11/50 (que convenhamos, tem concepção de 20 anos atrás). Imagine por exemplo um engenheiro que projetou um único avião 20 anos atrás, se daqui a dez anos fosse chamado a projetar outro - ele teria como superar estes 30 anos de defasagem na sua experiência de projetos? Mas vamos imaginar que de alguma forma, sim.
O casco também poderemos desenvolver, este é o escopo do contrato com a DCNS. No mínimo os franceses poderiam nos passar um projeto praticamente pronto, e faríamos apenas as adaptações necessárias para encaixar nele os nossos sistemas.
Mas e o resto? Só casco e reator não fazem um submarino nuclear operacional. Quem faria o motor elétrico (o do Labgene veio da França), os sistemas eletrônicos de controle, sensores, sistemas de armas, e etc...? Para os Scorpène-BR tudo isso vem da França, mas dificilmente eles poderiam fornecer para um sub nuclear de um país que não pertença ao clube das grandes potências. E por mais que se fale que sim, hoje ninguém no Brasil está pensando seriamente em desenvolver tudo isso, simplesmente não há verba sequer para pagar os salários dos engenheiros que poderiam fazê-lo, se for possível encontrar algum.
Então como vai ser? Vamos comprar todo o "recheio" do nosso sub nuclear na França também? Eles vão poder vender apesar das pressões internacionais que com certeza surgiriam (lembra dos Mistral para a Rússia)? Desenvolver tudo o que seria preciso não é coisa que se possa fazer em um ou dois anos, se quiséssemos mesmo ter um sub nuclear pronto em 2025 a maior parte já teria que estar sendo desenvolvida hoje. Só para dar um exemplo, quando a Petrobrás quis desenvolver sondas de perfuração de alta profundidade o programa demorou 10 anos para dar resultado, e isso com verbas praticamente ilimitadas. Para um sub nuclear serão necessários muito mais componentes, muito mais complexos. Quem está indo atrás disso? Quando o programa de construção de submarinos foi relançado lá em 2008 previa-se que estas coisas começariam a ser desenvolvidas aqui, e até agora não se fez praticamente nada. Daqui para a frente será muito mais difícil ainda que se comece. E a cada ano que passa a coisa vai ficar mais e mais difícil (a derrocada de nossa indústria não está dando mostras de ser interrompida).
Então, infelizmente, não consigo sequer imaginar que se possa construir um sub nuclear no Brasil em qualquer prazo previsível. E temo sim que a simples insistência nisso inviabilize até a construção de subs convencionais após os Scorpène-BR. E isso apesar de todo o esforço e todo o gasto feito para mais uma vez tentar absorver tecnologias que permitissem isso.
É uma grande pena, mas é só mais um dos muitíssimos exemplos do processo de decadência nacional em que estamos agora metidos. E que ainda não se vê sequer tentativas de resolver.
Leandro G. Card