#1421
Mensagem
por gingerfish » Qui Abr 03, 2014 3:27 am
Antes de 1964, os militares não exerceram o poder em nome das Forças Armadas, principalmente do Exército, de forma duradoura.
Mas envolveram-se "amiúde" na política, com proclamações, manifestos, revoltas e ultimatos.
A partir de 1910, a "tentação" de intervir na política foi acompanhada de preocupações com as desordens internas que esse comportamento poderia acarretar. Primeiro tiveram medo, depois foi constatado que a participação na política provocaria debates, talvez conflitos, bem no seio da corporação, que atentariam contra a ordem hierárquica e sua eficiência.
A contradição de "não mexer com política" e as frequentes intervenções militares foram incômodas... Com o movimento de 1964, essa contradição tornou-se insustentável.
A fim de "conciliar exigência disciplinar" e "ação política militarista", concluíram que, para proteger a instituição, apenas a "elite hierárquica" trataria dos assuntos de Estado, em detrimento do restante da tropa que deveria ser mantido a distância.
Já dizia o general Orlando Geisel: "Queiramos ou não, estamos metidos na política." Para ele, política é só nos altos escalões. Capitão, major, coronel e até general de brigada não devem fazer política, porque política é coisa para o alto escalão, o mais alto...
Um pensamento da "elite militar" é que militares não fazem política, mas, se fizerem, e quando fizerem, isso é um assunto de general.
Os próprios cientistas sociais, cientistas políticos, só se interessam pela ação política dos mais graduados. Em se tratando da participação militar na política, praticamente com unanimidade, a maioria ficou longe dos círculos de decisão, e, se uma minoria resolvesse participar desse assunto, ela seria "um grupo de criminosos cuja conduta |fanática| não merece análise política".
Apenas generais levam o crédito de possuir uma doutrina, uma estratégia, ou uma "racionalidade política", e o status de participante político foi atribuído exclusivamente aos generais.
O militar subalterno, à medida que a organização reforçava sua coerência interna, dissolveu-se no grupo... surgiu aí a figura do "soldado cidadão", que existiu num momento como o da Proclamação da República, mas ele representou um risco para a instituição e sua figura desapareceu em benefício da figura do "soldado profissional", depois do "soldado corporação".
A "profissionalização" não os afastou da política, pois, com a "proliferação" de golpes de Estado, entre 1960 e 1970, aqui na América Latina mesmo, em países dotados de exércitos profissionalizados, como o Brasil, o Uruguai, o Chile e a Argentina, isso desmentiu categoricamente tal ideia. Mas, em vez de "intervenção militar" - coisa de politização de oficiais de todas as patentes -, o que surgiu foi a "intervenção dos generais".
É forçoso destacar que no século XX os generais participaram cada vez mais das intervenções políticas dos militares. Nos primeiros momentos da República, os agitadores foram quase sempre jovens oficiais.
Os principais artífices da Proclamação da República brasileira são |alunos oficiais| da Escola da Praia Vermelha, conquistados próximo de 1880 pelo republicanismo, pelo positivismo e pelo abolicionismo, que foram doutrinas modernas que modificaram sua relação com o mundo, e pela ideia de "soldado cidadão", isto é, de responsabilidade |individual| dos oficiais com relação à sociedade.
Mudando um pouco o assunto, o golpe e a manutenção do Regime Militar de 64 estão inscritos na Doutrina de Segurança Nacional, que teve origem nos Estados Unidos, e ela foi criada na Guerra Fria, no governo do general Eurico Gaspar Dutra, e essa "DSN" municiou intrinsecamente toda a estrutura de que precisavam para a instalação e a manutenção de um Estado forte.
A DSN foi embasado dentro da ESG, e é aí que o golpe foi dado. Ele não só tinha um lado destrutivo, como destruir o governo de Goulart, mas tinha uma doutrina de construção também; não obstante, ficaram 21 anos no poder.
Durante os 21 anos do Regime Militar não houve nenhum tipo de "alternância" partidária de poder, a não ser entre as correntes militares que trafegavam nas Forças Armadas. 21 anos de continuidade ininterrupta de generais na chefia do Estado brasileiro, mas de partidos diferentes.
Quando chegou o AI-5, as coisas adquiriram um outro perfil, programado para devolver a direção do Estado aos civis, mas teria que ser em bases confiáveis, uma relação de confiança para uma "não argentinização" do regime, para que os militares que cometeram excessos não fossem levados ao banco dos réus pelos crimes praticados durante o "dia que durou 21 anos"...
A vida do homem na Terra é uma guerra.
Jó 7:1