MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Moderador: Conselho de Moderação
-
- Sênior
- Mensagens: 2427
- Registrado em: Sex Mai 18, 2012 6:12 pm
- Agradeceu: 40 vezes
- Agradeceram: 205 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Bourne e com vc
André Lara Resende - Projeto do PT parece o do Regime Militar
Para Resende, governo precisa mudar rumo para evitar ‘crescimento medíocre
André Lara Resende é considerado um dos economistas mais brilhantes e inquietos do Brasil. Doutor em Economia pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT, uma das instituições mais conceituadas dos Estados Unidos, destacou-se pela vasta produção acadêmica, mas também pelo requintado gosto por cavalos puro- sangue e por pilotar carros de corrida. No serviço público, foi um dos pais do Plano Cruzado e do Plano Real. Negociou a dívida externa e presidiu o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social. Na atividade privada, trabalhou no mítico banco Garantia e foi sócio do Matrix, onde fez fortuna. Agora, aos 62 anos e distante das turbulências do mercado financeiro e da gestão pública, o filho do escritor mineiro Otto Lara Resende dedicase à reflexão. Em seu livro Os Limites do Possível questiona verdades estabelecidas sobre o desenvolvimento econômico. Na entrevista abaixo, na semana em que o Banco Central tem nova reunião para definir a taxa básica de juros, Lara Resende defende que, se o governo não controlar os gastos, vai pressionar os juros e levar o País a um ciclo de crescimento medíocre.
O governo e o Banco Central devem adotar medidas mais enérgicas para controlar a inflação, que já supera o teto da meta?
Seria preciso corrigir o mix equivocado de políticas: reduzir os gastos correntes do governo e os estímulos à demanda. Em contrapartida, estimular a oferta (de moeda) e os investimentos. Como não estou mais no dia a dia do mercado, não gosto de fazer projeções de valores, mas o Banco Central demorou para reagir e, ainda que com uma correção de rumo a partir de agora, a tendência é de alta dos juros.
O que vai ocorrer se o governo insistir em manter os gastos?
Veremos o agravamento da pressão inflacionária e do déficit da conta corrente do balanço de pagamentos, o que obrigará o Banco Central a subir a taxa de juros, para não perder o controle da inflação. O resultado desse mix perverso – que foi opção do governo – é a valorização cambial, o desestímulo ao investimento, a desindustrialização e o baixo crescimento.
O cenário é tão ruim assim?
Não dá para prever o futuro, mas as coisas não estão bem encaminhadas. Aliás, estão piorando. Temos uma política macroeconômica malfeita. A partir de 2008, o PT adotou um projeto anacrônico. O curioso é que ele é parecido com o do regime militar. Esse projeto está levando ao crescimento medíocre. O governo usou o pretexto da crise financeira nos países avançados para aumentar o gasto público e dar estímulos ao consumo. Um grave equívoco, pois temos uma insuficiência histórica de poupança. Deveríamos ter aumentado o investimento em educação e eminfraestrutura, para estimular a produtividade. Se após a crise de 2008 fosse para fazer política macroeconômica anticíclica (conjunto de medidas que em período de retração econômica incluem redução de tributos, aumento do crédito e do gasto público para ativar a economia), a opção correta teria sido baixar os juros, e não aumentar os gastos. Aumento de gasto se justifica quando há uma contração da demanda, o que efetivamente ocorreu nos países avançados, mas não aqui. Fomos momentaneamente atingidos via comércio internacional, mas nosso problema é falta de poupança, não insuficiência de consumo
O governo aposta na nova rodada de concessões públicas para atrair investidores e reativar a economia. Qual é a sua projeção para os investimentos?
Ao que tudo indica, os investimentos vão ser muito abaixo do que se esperava. As concessões poderiam despertar atenção, mas a opção do governo por definir rentabilidades incompatíveis com os riscos, o ambiente regulatório hostil e, sobretudo, as mudanças de regras a posteriori, desenham um quadro desanimador para os investidores. E investimento direto em baixa e déficit em conta corrente em alta é sinal de problemas à frente.
Em dezembro de 2009, o Cristo Redentor decolava na capa da ‘The Economist’. Por que o Brasil foi de queridinho a país de segunda categoria entre os investidores em tão pouco tempo?
Como é da psicologia humana, que os mercados refletem, há exageros tanto na euforia quanto no pessimismo. O Brasil é um país de grandes possibilidades, mas que tem ainda sérios e conhecidos problemas. Perdemos, é verdade, uma grande oportunidade. O otimismo do mundo em relação ao Brasil, num momento em que as economias avançadas se viam em grande dificuldades, deveria ter sido aproveitado para nos consolidar como uma economia integrada à dinâmica do mundo globalizado. Deveríamos ter aproveitado a oportunidade para investir mais e melhor, sobretudo na infraestrutura e na educação, principais fatores determinantes da produtividade. Mas, infelizmente, não o fizemos. Preferimos aumentar os gastos do governo e dar estímulos fiscais à demanda, contribuindo para agravar a nossa estrutural insuficiência de poupança. Espantamos o investimento estrangeiro de longo prazo, com a falta de estabilidade das regras, com uma regulação barroca e discriminatória, com uma política macroeconômica incompetente e a opção por um capitalismo de Estado anacrônico.
O sr. tem proposto uma discussão, digamos, mais sofisticada sobre o que é crescimento econômico. Qual modelo de crescimento seria o ideal agora?
É preciso rever e adaptar o conceito de desenvolvimento, que hoje não deve mais estar baseado exclusivamente no aumento da produção doméstica e do consumo de bens materiais. Não faz sentido olhar apenas o porcentual do PIB. O projeto de desenvolvimento do século 21 deve levar em conta as evidências de que o bemestar depende da qualidade de vida, cujos elementos fundamentais são o sentido de comunidade e a confiança nos concidadãos, a saúde, o tempo com a família e os amigos e a ausência de stress emocional. As grandes propostas totalizantes ideológicas deixaram de fazer sentido. A ideia de rever o projeto de desenvolvimento está na essência da discussão atual. É o tema do momento. Os países mais avançados já perceberam isso. Nós não precisamos chegar ao patamar deles para fazer essa revisão. Desenvolvimento hoje é qualidade de vida, algo que a população já intuiu, como demonstram as recentes manifestações de ruas, mas que ainda não encontrou uma formulação clara. Hoje o que importa são questões concretas, relativas ao cotidiano, à eficiência administrativa. É preciso rever um Estado que absorve 36% da renda nacional, mas investe menos de 3% e consome grande parte dos recursos para sua própria operação. O Estado não pode continuar a ser percebido como um expropriador ilegítimo de uma fatia expressiva da renda da sociedade, sem contrapartida de serviços à altura, como um criador de dificuldades em todas as esferas da vida.
Qual será o impacto das demandas populares na condução da economia, ainda mais em véspera de eleição?
As ruas pediram seriedade e eficiência do Estado, não benefícios e vantagens. São demandas de quem amadureceu. Mas o governo corre o risco de não compreender, de continuar a tratar a população como primitiva e imatura, que pode ser cooptada por gestos demagógicos, o que agravaria o desequilíbrio das contas públicas, a insuficiência de poupança e investimento, que está na base do desempenho medíocre da economia.
O sinal de recuperação nos Estados Unidos mostra que o mundo está entrando em um novo ciclo?
É sempre difícil fazer previsões. Decretar o fim de um ciclo e o início de uma nova era é missão para os historiadores, com o benefício do olhar retroativo, mas parece haver um certo consenso de que a grande crise financeira de 2008 encerrou um período de excessivo otimismo em relação à capacidade de autorregulação dos mercados. Encerrou também, com certeza, a falsa impressão de que se tinha chegado à fórmula perfeita de condução da política macroeconômica, capaz de pôr fim à instabilidade cíclica das economias, de que se tinha chegado à era da “Grande Moderação”. A economia americana parece estar se recuperando, depois de mais tempo do que se imaginava e de doses maciças de estímulos monetários, num experimento inédito, cuja reversão, apenas anunciada para ter início no próximo ano, já causou grande turbulência nos mercados financeiros mundiais. Não me parece que a recuperação americana esteja consolidada. O desemprego caiu, mas continua alto, muita gente abandonou o mercado de trabalho e saiu das estatísticas de desemprego. Tenho a impressão de que vai passar por um ciclo semelhante ao do Japão desde o fim da bolha imobiliária, há já quase duas décadas. Como a economia e a sociedade são mais flexíveis, pode ser que o ciclo de estagnação seja menos prolongado.
Como ficam a Europa, os países emergentes e o Brasil?
A Europa ainda está um passo atrás dos Estados Unidos. A moeda única, adotada sem a integração financeira e fiscal, por economias com produtividades muito díspares, levou a um desequilíbrio entre elas, que foram explicitados de forma dramática com o fim da bolha financeira em 2008. Sem a capacidade de ajustes cambiais entre elas, atreladas à política monetária única do Banco Central Europeu, o ajuste deve vir primordialmente da redução do gasto público e da redução de salários nos países menos competitivos. É umprocesso extremamente longo e penoso. A alternativa para os países periféricos seria abandonar a moeda única, ao menos transitoriamente, algo que, embora seja tecnicamente possível, tem altos riscos econômicos e políticos. Os mercados emergentes foram beneficiados. Com as taxas de juros próximas de zero no mundo desenvolvido, o capital se redirecionou para as economias emergentes, onde havia boas oportunidades. O Brasil foi beneficiado. O influxo de capitais foi tal que provocou a valorização do real. Nos últimos meses assistimos à reversão do quadro e, como a economia brasileira não cresce como se esperava, os equívocos da política macroeconômica ficam evidentes.
http://www.defesanet.com.br/pensamento/ ... e-Militar/
André Lara Resende - Projeto do PT parece o do Regime Militar
Para Resende, governo precisa mudar rumo para evitar ‘crescimento medíocre
André Lara Resende é considerado um dos economistas mais brilhantes e inquietos do Brasil. Doutor em Economia pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT, uma das instituições mais conceituadas dos Estados Unidos, destacou-se pela vasta produção acadêmica, mas também pelo requintado gosto por cavalos puro- sangue e por pilotar carros de corrida. No serviço público, foi um dos pais do Plano Cruzado e do Plano Real. Negociou a dívida externa e presidiu o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social. Na atividade privada, trabalhou no mítico banco Garantia e foi sócio do Matrix, onde fez fortuna. Agora, aos 62 anos e distante das turbulências do mercado financeiro e da gestão pública, o filho do escritor mineiro Otto Lara Resende dedicase à reflexão. Em seu livro Os Limites do Possível questiona verdades estabelecidas sobre o desenvolvimento econômico. Na entrevista abaixo, na semana em que o Banco Central tem nova reunião para definir a taxa básica de juros, Lara Resende defende que, se o governo não controlar os gastos, vai pressionar os juros e levar o País a um ciclo de crescimento medíocre.
O governo e o Banco Central devem adotar medidas mais enérgicas para controlar a inflação, que já supera o teto da meta?
Seria preciso corrigir o mix equivocado de políticas: reduzir os gastos correntes do governo e os estímulos à demanda. Em contrapartida, estimular a oferta (de moeda) e os investimentos. Como não estou mais no dia a dia do mercado, não gosto de fazer projeções de valores, mas o Banco Central demorou para reagir e, ainda que com uma correção de rumo a partir de agora, a tendência é de alta dos juros.
O que vai ocorrer se o governo insistir em manter os gastos?
Veremos o agravamento da pressão inflacionária e do déficit da conta corrente do balanço de pagamentos, o que obrigará o Banco Central a subir a taxa de juros, para não perder o controle da inflação. O resultado desse mix perverso – que foi opção do governo – é a valorização cambial, o desestímulo ao investimento, a desindustrialização e o baixo crescimento.
O cenário é tão ruim assim?
Não dá para prever o futuro, mas as coisas não estão bem encaminhadas. Aliás, estão piorando. Temos uma política macroeconômica malfeita. A partir de 2008, o PT adotou um projeto anacrônico. O curioso é que ele é parecido com o do regime militar. Esse projeto está levando ao crescimento medíocre. O governo usou o pretexto da crise financeira nos países avançados para aumentar o gasto público e dar estímulos ao consumo. Um grave equívoco, pois temos uma insuficiência histórica de poupança. Deveríamos ter aumentado o investimento em educação e eminfraestrutura, para estimular a produtividade. Se após a crise de 2008 fosse para fazer política macroeconômica anticíclica (conjunto de medidas que em período de retração econômica incluem redução de tributos, aumento do crédito e do gasto público para ativar a economia), a opção correta teria sido baixar os juros, e não aumentar os gastos. Aumento de gasto se justifica quando há uma contração da demanda, o que efetivamente ocorreu nos países avançados, mas não aqui. Fomos momentaneamente atingidos via comércio internacional, mas nosso problema é falta de poupança, não insuficiência de consumo
O governo aposta na nova rodada de concessões públicas para atrair investidores e reativar a economia. Qual é a sua projeção para os investimentos?
Ao que tudo indica, os investimentos vão ser muito abaixo do que se esperava. As concessões poderiam despertar atenção, mas a opção do governo por definir rentabilidades incompatíveis com os riscos, o ambiente regulatório hostil e, sobretudo, as mudanças de regras a posteriori, desenham um quadro desanimador para os investidores. E investimento direto em baixa e déficit em conta corrente em alta é sinal de problemas à frente.
Em dezembro de 2009, o Cristo Redentor decolava na capa da ‘The Economist’. Por que o Brasil foi de queridinho a país de segunda categoria entre os investidores em tão pouco tempo?
Como é da psicologia humana, que os mercados refletem, há exageros tanto na euforia quanto no pessimismo. O Brasil é um país de grandes possibilidades, mas que tem ainda sérios e conhecidos problemas. Perdemos, é verdade, uma grande oportunidade. O otimismo do mundo em relação ao Brasil, num momento em que as economias avançadas se viam em grande dificuldades, deveria ter sido aproveitado para nos consolidar como uma economia integrada à dinâmica do mundo globalizado. Deveríamos ter aproveitado a oportunidade para investir mais e melhor, sobretudo na infraestrutura e na educação, principais fatores determinantes da produtividade. Mas, infelizmente, não o fizemos. Preferimos aumentar os gastos do governo e dar estímulos fiscais à demanda, contribuindo para agravar a nossa estrutural insuficiência de poupança. Espantamos o investimento estrangeiro de longo prazo, com a falta de estabilidade das regras, com uma regulação barroca e discriminatória, com uma política macroeconômica incompetente e a opção por um capitalismo de Estado anacrônico.
O sr. tem proposto uma discussão, digamos, mais sofisticada sobre o que é crescimento econômico. Qual modelo de crescimento seria o ideal agora?
É preciso rever e adaptar o conceito de desenvolvimento, que hoje não deve mais estar baseado exclusivamente no aumento da produção doméstica e do consumo de bens materiais. Não faz sentido olhar apenas o porcentual do PIB. O projeto de desenvolvimento do século 21 deve levar em conta as evidências de que o bemestar depende da qualidade de vida, cujos elementos fundamentais são o sentido de comunidade e a confiança nos concidadãos, a saúde, o tempo com a família e os amigos e a ausência de stress emocional. As grandes propostas totalizantes ideológicas deixaram de fazer sentido. A ideia de rever o projeto de desenvolvimento está na essência da discussão atual. É o tema do momento. Os países mais avançados já perceberam isso. Nós não precisamos chegar ao patamar deles para fazer essa revisão. Desenvolvimento hoje é qualidade de vida, algo que a população já intuiu, como demonstram as recentes manifestações de ruas, mas que ainda não encontrou uma formulação clara. Hoje o que importa são questões concretas, relativas ao cotidiano, à eficiência administrativa. É preciso rever um Estado que absorve 36% da renda nacional, mas investe menos de 3% e consome grande parte dos recursos para sua própria operação. O Estado não pode continuar a ser percebido como um expropriador ilegítimo de uma fatia expressiva da renda da sociedade, sem contrapartida de serviços à altura, como um criador de dificuldades em todas as esferas da vida.
Qual será o impacto das demandas populares na condução da economia, ainda mais em véspera de eleição?
As ruas pediram seriedade e eficiência do Estado, não benefícios e vantagens. São demandas de quem amadureceu. Mas o governo corre o risco de não compreender, de continuar a tratar a população como primitiva e imatura, que pode ser cooptada por gestos demagógicos, o que agravaria o desequilíbrio das contas públicas, a insuficiência de poupança e investimento, que está na base do desempenho medíocre da economia.
O sinal de recuperação nos Estados Unidos mostra que o mundo está entrando em um novo ciclo?
É sempre difícil fazer previsões. Decretar o fim de um ciclo e o início de uma nova era é missão para os historiadores, com o benefício do olhar retroativo, mas parece haver um certo consenso de que a grande crise financeira de 2008 encerrou um período de excessivo otimismo em relação à capacidade de autorregulação dos mercados. Encerrou também, com certeza, a falsa impressão de que se tinha chegado à fórmula perfeita de condução da política macroeconômica, capaz de pôr fim à instabilidade cíclica das economias, de que se tinha chegado à era da “Grande Moderação”. A economia americana parece estar se recuperando, depois de mais tempo do que se imaginava e de doses maciças de estímulos monetários, num experimento inédito, cuja reversão, apenas anunciada para ter início no próximo ano, já causou grande turbulência nos mercados financeiros mundiais. Não me parece que a recuperação americana esteja consolidada. O desemprego caiu, mas continua alto, muita gente abandonou o mercado de trabalho e saiu das estatísticas de desemprego. Tenho a impressão de que vai passar por um ciclo semelhante ao do Japão desde o fim da bolha imobiliária, há já quase duas décadas. Como a economia e a sociedade são mais flexíveis, pode ser que o ciclo de estagnação seja menos prolongado.
Como ficam a Europa, os países emergentes e o Brasil?
A Europa ainda está um passo atrás dos Estados Unidos. A moeda única, adotada sem a integração financeira e fiscal, por economias com produtividades muito díspares, levou a um desequilíbrio entre elas, que foram explicitados de forma dramática com o fim da bolha financeira em 2008. Sem a capacidade de ajustes cambiais entre elas, atreladas à política monetária única do Banco Central Europeu, o ajuste deve vir primordialmente da redução do gasto público e da redução de salários nos países menos competitivos. É umprocesso extremamente longo e penoso. A alternativa para os países periféricos seria abandonar a moeda única, ao menos transitoriamente, algo que, embora seja tecnicamente possível, tem altos riscos econômicos e políticos. Os mercados emergentes foram beneficiados. Com as taxas de juros próximas de zero no mundo desenvolvido, o capital se redirecionou para as economias emergentes, onde havia boas oportunidades. O Brasil foi beneficiado. O influxo de capitais foi tal que provocou a valorização do real. Nos últimos meses assistimos à reversão do quadro e, como a economia brasileira não cresce como se esperava, os equívocos da política macroeconômica ficam evidentes.
http://www.defesanet.com.br/pensamento/ ... e-Militar/
- Bourne
- Sênior
- Mensagens: 21087
- Registrado em: Dom Nov 04, 2007 11:23 pm
- Localização: Campina Grande do Sul
- Agradeceu: 3 vezes
- Agradeceram: 21 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
revista Piauí > Edição 80 > Maio de 2013
O ENIGMA E O DEMÓGRAFO
Vida de professor mineiro é um espelho da virada populacional que ele ajudou a detectar e que explica boa parte do desemprego baixo, mesmo em época de crescimento fraco
por RAFAEL CARIELLO
Fonte:
Na manhã da Quinta-Feira Santa, em março, o professor José Alberto Magno de Carvalho levantou-se cedo para pescar. Munido de um caniço simples, sem molinete, levava dois tipos de isca – milho verde, guardado num pequeno pote de vidro, e uma espécie de massa de pão, feita com farinha de trigo, leite e fubá.
Caminhou despreocupado, como fizera na véspera, até o rio parcialmente represado que corre nos fundos da sede de sua fazenda, em São Vicente de Minas, um pequeno município de 7 mil habitantes distante quatro horas de carro de Belo Horizonte. Havia chegado à cidade, onde também nasceu e passou a infância, dois dias antes.
Carvalho, um senhor alto, magro, de voz grave e sobrancelhas grossas, é tratado por colegas e ex-alunos como um dos pais da demografia brasileira, a ciência encarregada de medir e estudar a dinâmica populacional humana. Participou da criação dos cursos de pós-graduação ligados à disciplina, nos anos 70, na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais, hoje reconhecida como um centro de excelência na área. No final dos anos 90, tornou-se o primeiro brasileiro – o único, até o momento – a ser nomeado presidente da associação mundial de demógrafos, a iussp (sigla em inglês para União Internacional para o Estudo Científico da População).
Aos 72 anos, contudo, o professor mineiro parece se orgulhar mais de sua origem e de seu time de futebol do que da carreira acadêmica. Quem deixa a estrada de asfalto para trás e toma o caminho de terra que conduz à Fazenda Saudade se depara, diante da casa térrea principal, com dois mastros imponentes. No mais alto tremula o estandarte do Clube Atlético Mineiro. Um pouco abaixo se avista a bandeira do Brasil.
Quando está ali, o demógrafo costuma passar as tardes de folga na varanda. De sua cadeira divisa um mar de montanhas que se perde no horizonte. Conta histórias longas, fazendo algum suspense. As pausas são sempre seguidas por uma admoestação ao interlocutor: “Vai escutando!” É também comum ele se referir, com vaidade mal disfarçada de modéstia, à própria disposição moderada e cautelosa, sobretudo quando descreve embates ideológicos. “Eu, como bom mineiro, nunca fui maniqueísta.”
No final dos anos 70, José Alberto de Carvalho ajudou a identificar uma reviravolta, para muitos inesperada, na dinâmica demográfica do país. Com base nos imprecisos dados disponíveis, notou que as mulheres brasileiras haviam passado a ter um número cada vez menor de filhos. O tamanho médio das famílias diminuía e, tudo indicava, continuaria a cair. “Foi uma surpresa”, lembrou, naquela manhã, enquanto colocava isca no anzol. “Na época, quase todo mundo acreditava que continuaríamos a conviver com um rápido crescimento populacional.”
Parte dos efeitos dessa mudança só começou a ser sentida nos últimos anos. Um número crescente de pesquisadores tem associado o comportamento atual da economia à redução na taxa de fecundidade das mulheres brasileiras. Para eles, a inflexão demográfica iniciada nos anos 70 explica, em grande medida, o desempregobaixo, mesmo quando o crescimento rateia, acompanhado de alta na renda e queda da desigualdade.
À tarde, o demógrafo deixou para trás a pescaria e o dolce far niente. Ia visitar a mãe. Aos 91 anos, ela ainda vive em São Vicente de Minas. Na casa simples, próxima à praça central e à igreja, dona Mariquinha, como é conhecida, recebia os numerosos membros da família, que aos poucos chegavam para a Semana Santa. Ela teve, ao todo, doze filhos, gestados entre os 18 e os 40 anos de idade. A primeira menina morreu pouco tempo depois do parto. José Alberto veio em seguida e se tornou o primogênito.
Sentada à mesa comprida de madeira coberta com uma toalha de plástico, dona Mariquinha tomava sem pressa uma xícara de café com leite, indiferente à algaravia dos filhos e netos. Falavam todos ao mesmo tempo na sala de jantar, onde um retrato da Santa Ceia pende da parede. Acomodado numa poltrona perto da janela, Carvalho fumava. A figura longilínea – mede quase 1,80 metro – e triste – suas sobrancelhas com frequência se unem numa expressão melancólica ou inquisitiva, formando um acento circunflexo, um telhado de duas águas sobre os óculos – fazia lembrar um dom Quixote sem barba.
Após dar duas batidinhas com a mão no meu braço, dona Mariquinha apontou para o filho e me disse, como quem confia um segredo: “Ele me ajudou a criar os outros.” Uma das irmãs, Ângela, pescou a conversa e completou: “O Zé Alberto foi o arrimo nosso.”
O demógrafo é casado, desde os anos 60, com Nazaré, uma senhora simpática e agitada, de 69 anos. Juntos, tiveram quatro filhos e sete netos. “E não vai passar disso”, Carvalho me assegurou, com sua voz de barítono. “Essa história de família grande acabou. Mesmo nos lugares mais pobres. Você vai a uma favela e ninguém tem mais de três filhos. Irmão, no futuro, vai ser uma coisa rara.” Tratava os parentes mais próximos e a mudança nos tamanhos das diferentes gerações de sua família como exemplares de seu objeto de estudo. “É a história do Brasil.”
A diminuição do número de filhos, ele disse, aconteceu primeiro entre os mais ricos, a partir de meados dos anos 60, chegando em seguida, com atraso inversamente proporcional à renda, ao restante da população.
A cadeia de eventos que liga a queda na taxa de fecundidade a seus efeitos sociais e econômicos atuais pode ser apresentada de forma esquemática. Nos anos 80, o número de filhos por mulher caiu de maneira dramática, mesmo entre as famílias pobres. Nos anos 90, pela primeira vez, o número absoluto de crianças parou de crescer, resultado da queda na fecundidade uma década antes. Ficou assim mais fácil, para o poder público, colocá-las quase todas na escola.
No final dos anos 2000, essa mesma geração chegou afinal ao mercado de trabalho; um número declinante de jovens, mais bem-educados, contribui hoje para a inédita escassez de trabalhadores pouco qualificados. O desemprego se mantém baixo, a renda aumenta e a desigualdade cai. Segundo essa lógica, o Brasil da era Lula começou a tomar forma duas décadas antes da chegada ao Planalto do ex-sindicalista, também ele integrante de uma família numerosa.
A queda no número médio de filhos por mulher representa a etapa final daquilo que os pesquisadores chamam de “transição demográfica”. “A transição é o feijão com arroz de todo demógrafo”, me disse Eduardo Rios-Neto em sua sala no prédio da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, em Belo Horizonte.
Rios-Neto, chefe do Departamento de Demografia, tem 57 anos e foi aluno de José Alberto de Carvalho. Tem olhos claros, rosto redondo e cabelo partido de lado. Naquela manhã, no início de abril, carregava três canetas no bolso da camisa de botões com mangas curtas. A aparência certinha de engenheiro não se estende à sua sala. Papéis e livros sobre as duas mesas do amplo gabinete pareciam ter sido revirados por ladrões ou pela polícia.
“A transição demográfica é um fato estilizado a partir de uma regularidade empírica; algo que você observa em quase todos os países”, ele disse. “Num primeiro momento, você tem mortalidade alta e fecundidade alta, com crescimento populacional próximo de zero.” É o caso da Europa antes da Revolução Industrial. “A mortalidade começa então a cair, numa velocidade maior do que a queda na fecundidade, o que eleva o ritmo de aumento da população. Depois cai a fecundidade e, no último momento, as duas taxas são baixas. É quando você passa a ter crescimento zero ou negativo.” É desse patamar, no qual já se encontram muitos países ricos, que o Brasil está se aproximando.
Demógrafos concordam hoje que tais etapas são comuns a quase todas as sociedades, mas o tempo de duração e a intensidade dos efeitos de cada uma delas variam. O caso brasileiro, no século XX, foi muito mais rápido do que aquilo que se conhecia, historicamente, em países ricos. “Nós fizemos em quarenta anos o que a Inglaterra fez em 120”, disse Carvalho.
Em grandes linhas, é o processo de urbanização e de modernização da sociedade que explica a transição demográfica. A partir da década de 30, com os avanços da medicina, ações de saúde pública e alguma melhora nos padrões de vida, a mortalidade começou a cair no Brasil. Ao mesmo tempo, as famílias continuavam a ter um número grande de filhos, superior, em média, a seis para cada mulher até os anos 60. Como resultado da alta fecundidade, acompanhada da queda na taxa de mortalidade, a população brasileira cresceu de maneira rápida entre os anos 40 e 70. Falava-se, à época, em “explosão demográfica”.
A razão de fundo para o que veio a seguir, a queda da taxa de fecundidade, é a racionalidade econômica: a partir dos anos 70, com a urbanização e as pressões de custo de vida associadas a ela, os casais no Brasil escolheram ter um número cada vez menor de filhos.
Mas outras razões, ligadas à modernização da sociedade, reforçaram os estímulos econômicos para a diminuição no tamanho das famílias. “A ‘mão invisível’ da economia não funciona no automático; ela tem que passar pela consciência das pessoas”, disse Maria Coleta de Oliveira, professora do Departamento de Demografia da Unicamp. “No caso do Brasil, acho que a organização do trabalho foi fundamental. A mulher é o pivô dessa história. Nas formas não capitalistas de trabalho, elas podiam entrar e sair da atividade produtiva, e ter mais filhos. Com o assalariamento, inclusive no mundo rural, isso acabou. Passaram a ter uma jornada fixa. As pressões para a restrição ao número de filhos aumentaram.”
Eduardo Rios-Neto também chamou atenção para o papel da tevê. Nos anos 90, ele participou, ao lado de outros demógrafos e cientistas sociais, de uma pesquisa que buscava captar a influência das telenovelas sobre o tamanho das famílias. “A queda na fecundidade tem a ver com o cálculo econômico, é óbvio. Mas descobrimos que a Rede Globo teve também um efeito de modernização e secularização da sociedade, a conta-gotas.”
As famílias que apareciam na tela nunca eram grandes, segundo ele por razões práticas. Era difícil escrever tramas para núcleos familiares maiores, e também não era fácil dirigir as crianças. O padrão televisivo teve impacto em todas as regiões e todas as classes sociais.
Tudo somado, a taxa de fecundidade despencou. Em 1980, as mulheres brasileiras ainda tinham, em média, 4,4 filhos ao longo de toda a vida. Em 1991, já eram apenas 2,7 filhos. No último Censo, feito em 2010, cada mulher tinha em média 1,9 filho, já abaixo da taxa de reposição da população, que é de 2,1 filhos por mãe.
Às nove e meia da manhã, na Sexta-Feira da Paixão, uma pequena multidão já se acomodava no interior ventilado da igreja que ocupa o centro da praça e da vida religiosa em São Vicente de Minas. A luz, intensa lá fora, invadia o ambiente filtrada por grandes janelas basculantes, pintadas com as cores translúcidas dos vitrais. Cerca de 400 pessoas sentadas, e outra centena em pé, esperavam a cerimônia de confissão comunitária.
Do lado de fora, o pedreiro João José da Silva, de 84 anos, fazia hora enquanto o padre não dava o ar da graça. Disse ir diariamente à missa. Naquele dia, havia ajudado a montar a cruz de quase 3 metros que bloqueava a entrada principal da igreja. Estava vestido com roupa de domingo: camisa polo para dentro da calça social e sapatos lustrosos.
Alguns minutos mais tarde, a procissão da Via Sacra já se aproximava da última estação, encenada diante da cruz erguida pelo pedreiro. Um homem vestindo uma túnica branca levava, à frente, um crucifixo de madeira preta. Atrás vinham o andor com a imagem de Jesus e uma banda de instrumentos de sopro. O surdo marcava o passo da toada lenta e fúnebre.
A mãe de seu João, ele disse, teve doze filhos. Ele próprio, viúvo há 22 anos, teve cinco, que lhe deram apenas dois netos. “Hoje o povo não quer mais família grande, não”, explicou. “Está evitando mesmo. Tem um, dois filhos, no máximo. Eles falam que ficou mais difícil de criar.”
O fenômeno, nacional, se repete mesmo numa cidade católica como São Vicente. O uso de métodos contraceptivos “artificiais” é, para a Igreja, pecaminoso, lembrou José Alberto de Carvalho numa conversa que tivemos, dias mais tarde, em Belo Horizonte. “O interessante”, ele disse, “é que, quando as mulheres decidiram ter um número menor de filhos, fizeram isso apesar das discussões teóricas, apesar das recomendações da Igreja e até mesmo da dificuldade de acesso à pílula anticoncepcional.”
Segundo o economista Samuel de Abreu Pessôa, pesquisador da Fundação Getulio Vargas, a queda na taxa de fecundidade provocou uma revolução no mercado de trabalho brasileiro.
Pessôa, um paulistano de 50 anos, alto e quase calvo, tem pelo menos duas coisas em comum com José Alberto de Carvalho. Confere importância central à dinâmica demográfica para explicar a história econômica, e aprecia cachaça. Ao me receber para o almoço em seu apartamento, num bairro de classe média em São Paulo, serviu uma tradicional marca de aguardente artesanal, produzida em Minas.
O que se vê agora no mercado de trabalho, ele disse, é uma espécie de imagem invertida da lógica que marcou a maior parte da história brasileira. Até os anos 80, o rápido crescimento populacional, associado ao pequeno investimento em educação pública, criou uma oferta constante de mão de obra pouco qualificada, mantendo os salários baixos.
Numa das apresentações que costuma fazer para clientes e colegas, Pessôa mostra um gráfico que representa a evolução do gasto estatal com educação no país ao longo do tempo. Esse investimento se manteve baixo entre as décadas de 50 e 70, justamente quando a população mais crescia, e só passou a subir de maneira contínua a partir dos anos 80.
Mesmo o pouco dinheiro destinado à escola favorecia os mais ricos. Na década de 50, cada estudante universitário recebia 75 vezes mais recursos que um aluno do ensino fundamental. O Estado barrava, assim, a melhor chance de mobilidade social para os mais pobres – e forçava a pobreza a reproduzir mais pobreza.
“Era um sistema totalmente maluco”, afirmou o economista. “Não é à toa que a gente virou essa sociedade com favelas, deterioração do espaço urbano e criminalidade. A gente fez de tudo para virar isso. Acho até que virou pouco. Com tudo o que a gente fez lá atrás, é surpreendente como vivemos numa sociedade calma.”
O inverso dessa lógica ocorre agora, com a queda das taxas de crescimento populacional e a convergência no padrão de família entre os mais ricos e os mais pobres. “A taxa de fecundidade dos pobres, ou seja, o número de filhos por mulher, está convergindo para a taxa de fecundidade dos ricos”, disse Pessôa.
“Isso está tirando um imenso poder de barganha dos ricos. Antes você tinha um monte de pobre pouco qualificado para trabalhar para você. Agora tem cada vez menos. O rico tem dois filhos, o pobre também, dá um pouquinho mais de educação, e aí falta empregada doméstica para trabalhar na casa do rico. O salário vai subir, e a desigualdade vai cair.”
Parte da queda na desigualdade se dá pelo efeito conjunto das decisões reprodutivas de todas as famílias, ao determinar o tamanho da geração seguinte de trabalhadores. No passado, quando havia poucos profissionais mais qualificados, o valor dessa educação extra que possuíam era recompensado, no mercado, com salários bem mais altos. O que os economistas chamam de “retornos” ao investimento em educação – o modo como as diferenças de escolaridade são traduzidas em renda – eram maiores. Esses retornos têm diminuído nos últimos anos.
“Isso tem a ver, ao mesmo tempo, com a questão demográfica e com o aumento da escolaridade média da população”, me disse Simone Wajnman, demógrafa da ufmg, em sua sala, em abril. Com menos gente com baixa escolaridade, e mantida a procura pelos trabalhos que esse grupo de pessoas desempenha, o salário de quem ganha menos tende a subir. Numa velocidade mais rápida do que a do salário de quem tem, por exemplo, o ensino médio completo.
Tal mudança, a que Samuel Pessôa se refere como histórica, não traz necessariamente crescimento econômico nem garante que o Brasil venha a se aproximar dos níveis de renda dos países ricos. “Mas certamente seremos um país mais justo, daqui pra frente”, ele disse, “talvez crescendo pouco e com nível de renda médio. É nessa direção que nós estamos indo. O que já é uma combinação infinitamente melhor do que aquela da minha infância.”
Quando criança, José Alberto de Carvalho morou com os pais e os irmãos na casa paroquial de São Vicente de Minas. “Eu nasci lá; era para eu ter sido muito católico”, me disse o demógrafo numa tarde da Semana Santa. Padre Chico, responsável pela paróquia, era irmão de dona Mariquinha. O pai, José do Carmo, trabalhava como funcionário administrativo da prefeitura. Recebia um salário mínimo por mês.
“Do ponto de vista social, a gente era de classe média, porque a mamãe era irmã do vigário”, explicou Carvalho. “Mas em termos de renda era muito apertado, até mesmo na comida. O prato do dia a dia era arroz, feijão, abobrinha e um pedacinho de carne de porco. Era muito controlado. O presente, no Natal, era um carrinho de madeira.”
Ângela, uma das irmãs de José Alberto, descreveu o cotidiano da família numerosa como “uma loucura”. “Mas tinha ordem. Nosso pai matava um frango, no domingo, e, a cada semana, a melhor parte era de um dos filhos. O pior é que às vezes ele ainda trazia quatro, cinco pessoas da missa e mandava servir para elas também. Mas nunca passamos necessidade.”
Era o final dos anos 40, início da década de 50, no interior de Minas Gerais. O convívio nos clubes da cidade, e até mesmo na igreja, era informalmente segregado. Havia bancos separados para negros e para brancos durante a missa. Por um breve período, houve até mesmo clubes exclusivos para simpatizantes da UDN, de um lado, e do PSD, de outro. “E o pessoal que era do PTB?”, perguntei, em referência à legenda que se situava à esquerda daquelas outras duas agremiações. “Aqui em São Vicente não tinha PTB, não”, respondeu o demógrafo, com um sorriso no rosto.
Como, segundo Carvalho, um dos grupos políticos reuniu o maior número de moças, enquanto o outro ficou com os rapazes, a separação foi desfeita. Mas permaneceu no que dizia respeito à cor da pele.
A exceção era a escola, garantem os irmãos. “Ali nunca houve discriminação”, afirmou Ângela. Carvalho frequentou o colégio primário, em São Vicente, até os 11 anos. Para continuar os estudos, entrou para o seminário dos irmãos maristas, em Mendes, no sul do estado do Rio. “Naquele tempo, eu não teria outra alternativa para continuar a estudar.”
O regime de internato era rigoroso. Carvalho chamou a atenção para duas restrições, em particular. Era proibido tomar água fora das refeições, e não se podia visitar a família durante as férias. “A gente ficava por lá mesmo, capinando. Dos 11 aos 18, meus pais me visitaram apenas duas vezes. Mas eu tenho a maior gratidão aos maristas, que me deram uma formação razoável, inclusive em termos éticos. Qualquer outra coisa seria cuspir no prato em que comi.”
Certo dia, no último ano de estudos, o aluno recebeu, em Mendes, a notícia de que seu pai havia sofrido “uma ameaça de derrame”. Permitiram, excepcionalmente, que o seminarista viajasse a São Vicente. Durante a breve estada em casa, ruiu qualquer vocação sacerdotal que o rapaz pudesse ter tido. Uma menina da cidade chamou a sua atenção. “O que era bonita essa moça!”, lembrou Carvalho, mais de meio século depois, unindo as sobrancelhas no alto do rosto. “Filha de dinamarquês com uma morena de Minas. Você imagina.”
O demógrafo disse ter ficado um ano em São Vicente, sem saber direito que rumo tomar, até que seu tio, o padre Chico, tivesse uma conversa séria com ele. Fez então vestibular para economia e se mudou para Belo Horizonte. De lá, ajudava a sustentar a família. Trabalhou como contínuo, num banco. Mais tarde, receberia uma bolsa da faculdade, destinada aos melhores alunos. Em 1964, “esse ano fatídico”, concluiu o curso. Pouco depois, foi contratado como professor na universidade. Ele e Nazaré decidiram se casar.
“Mas papai me fez o favor de morrer na véspera do meu casamento civil. O dinheiro que tinha para a lua de mel eu usei para pagar o enterro. Eu e a Nazaré nos casamos na igreja no dia seguinte à missa de sétimo dia. Mamãe, que não tem nem o curso primário, ficou viúva com pouco mais de 40 anos. Mas tinha que continuar a vida, não tinha? Eu era professor da UFMG. Trabalhava lá e mandava o dinheiro para cá. Vários dos meus irmãos estavam na adolescência. Foi uma saga.”
O esforço do demógrafo servia para tentar realizar o que seu aluno, Eduardo Rios-Neto, disse ser, em regra, “quase uma impossibilidade lógica”: “É praticamente inviável para um cidadão normal ou pobre fazer um grande investimento em educação se ele tiver, digamos, sete filhos.” Dos dez irmãos de Carvalho, apenas dois não chegaram à universidade. Ninguém é rico, alguns têm uma vida confortável, outros vivem de maneira remediada.
Na Quinta-Feira Santa, metade da família se reuniu na casa de dona Mariquinha. Já de noite, lembravam, em coro, um antigo sucesso da música caipira: Colcha de Retalhos. “Aquela colcha de retalhos que tu fizeste/ juntando pedaço em pedaço foi costurada/ serviu para nosso abrigo em nossa pobreza/ aquela colcha de retalhos está bem guardada.” Como no poema de Drummond, a lua e o conhaque botaram o demógrafo comovido como o diabo. Ele também cantava.
Num trajeto de carro entre a Fazenda Saudade e o centro urbano, Carvalho comentou as mudanças do seu tempo de infância e juventude para os dias de hoje. “A pobreza diminuiu. São Vicente mudou demais. Sempre teve uma certa indústria de laticínios, mas agora está desenvolvendo muito a área de serviços. Tem muito bar, restaurante, academia de ginástica.”
Nem todos estão satisfeitos com as mudanças, contudo. O fazendeiro Alaor Leite Guimarães, de 53 anos, mora não muito longe da casa de dona Mariquinha. Ao se encontrarem num final de tarde, em março, ele e Geraldo, um dos irmãos de Carvalho, comentaram sobre o infortúnio de um amigo em comum. O conhecido havia sido forçado a fechar a fábrica de doce de leite que mantinha. “Está difícil arrumar gente para trabalhar”, explicou Guimarães. Ele próprio encerrou a fabricação da cachaça Mula Manca, que funcionava havia dezoito anos na sua fazenda. “Acabou por falta de mão de obra. Quando você diz que é para ir para a roça, eles não querem. E olha que o salário da roça, hoje, é salário bom.”
O motivo do desinteresse, avalia Guimarães, são o excesso de regras trabalhistas e os “vales” criados pelo governo. “Tem vale pra tudo”, reclamou. Ao ouvir a queixa de um comerciante local sobre a dificuldade de “arrumar gente”, Carvalho deu outra explicação: “É claro que é difícil. Não nasce mais criança.” Descontado o exagero, proposital, os especialistas em mercado de trabalho têm usado argumentos próximos àquele destacado pelo demógrafo.
Em um artigo para os jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, no início do ano passado, o economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, constatou que “algo interessante” acontecia no país. “Odesemprego tem melhorado num contexto de piora da economia”, escreveu.
“O crescimento do PIB desacelerou para cerca de 2,7% no ano passado”, apontou, fazendo referência à evolução de tudo o que havia sido produzido no Brasil em 2011, quando ainda era recente a memória do espetacular salto de 7,5% em 2010. Uma freada desse tipo, argumentou Goldfajn, “normalmente levaria a um aumento do desemprego”. Mas não foi o que ocorreu, nem em São Vicente de Minas, nem na maior parte do país. “O que está acontecendo? O mercado de trabalho está se descolando do resto da economia? Quais as consequências?”, ele se perguntava.
Um ano depois, o crescimento da economia ficou ainda mais lento. Ao longo de 2012, o PIB subiu apenas 0,9%. Mas o desemprego, que no final de 2011 já tinha sido o menor desde 2002, repetiu o resultado em dezembro passado.
Já naquele primeiro artigo, Goldfajn afirmava que mudanças demográficas, com efeitos sobre a quantidade de gente que chega a cada ano ao mercado de trabalho, ajudavam a explicar o que ele chamou de “enigma do desemprego”. Uma ideia semelhante vinha sendo desenvolvida, havia algum tempo, por Naercio Menezes Filho, professor de economia na Universidade de São Paulo e no Insper, o Instituto de Ensino e Pesquisa.
Em um trabalho escrito em 2006, em parceria com Luiz Guilherme Scorzafave, da USP, Menezes Filho já se mostrava capaz de prever, com bastante antecedência, o cenário de virtual pleno emprego e de aumento dos salários, em especial para os trabalhadores pouco qualificados, que se confirmou nos últimos anos. A partir de dados estatísticos para vários estados brasileiros, colhidos no período entre 1985 e 2004, Menezes Filho estimou a tendência de comportamento da procura por mão de obra – ou seja, das vagas abertas pelas empresas. Calculou também a tendência de variação do número de pessoas oferecendo trabalho – determinada principalmente pelo ritmo de aumento da população, e também pela variação dos salários.
A tendência encontrada pelos pesquisadores, e projetada para o futuro, é de que o número de vagas de emprego aumente 1% para cada ponto percentual de aumento do PIB. “Assim, se o país crescer 20% em dez anos, o número de vagas também aumentaria mais ou menos 20%”, explicou Menezes Filho. “Os dados indicam que, em longo prazo, a variação da procura por mão de obra tende a acompanhar o crescimento do PIB.”
A grande mudança encontrada pelos dois autores foi do outro lado, o da oferta de mão de obra, uma decorrência da queda abrupta no crescimento da população brasileira desde os anos 80. Há três décadas, a parcela adulta da população crescia cerca de 3% a cada ano. Hoje, o aumento anual desse contingente, disse Menezes Filho, é de 1,2%. Juntando as duas informações – sobre o comportamento da demanda e da oferta de trabalho –, o professor do Insper afirma que a economia do país precisa crescer relativamente pouco, nos próximos anos, para manter uma situação de quase pleno emprego.
“Ponha aí um aumento de 1,5% na oferta de mão de obra”, disse o economista, supondo, por segurança, que a elevação dos salários leve mais gente a procurar emprego do que indica a tendência de 1,2% de crescimento demográfico.Bastaria ao país crescer mais de 1,5% para criar, segundo os autores do estudo, uma porcentagem equivalente de empregos. O resultado seria um mercado de trabalho ainda aquecido. “Sempre vai ter uma pequena flutuação, de curto prazo, por fatores idiossincráticos. Mas o desemprego não deve aumentar. A conta é bastante simples.”
O economista Fabio Kanczuk, também professor na Universidade de São Paulo, é mais cauteloso. Ele não discorda dos efeitos positivos da dinâmica demográfica sobre a taxa de desemprego. Mas chama a atenção para o comportamento do emprego no país, que, ele diz, “não está indo bem”. O ritmo de criação de vagas na economia, em relação ao total das pessoas já contratadas, tem caído desde o início de 2010.
“A desaceleração no ritmo de criação de vagas é muito forte nos últimos meses”, afirmou Kanczuk, no final de abril. “Não sei se vai continuar a se comportar desse jeito. Mas, se continuar caindo, não tem demografia que ajude. Uma hora aumenta o desemprego.” Ilan Gold-fajn, do Itaú, faz ressalva semelhante. “Se a economia continuar crescendo pouco, o desemprego vai acabar aumentando”, ele disse. “Mas o que é pouco? Pouco é 3%? Não. Pouco agora é 1%.” Foi nesse piso que a mudança no crescimento populacional mexeu, e de maneira favorável aos trabalhadores.
A evolução demográfica do país, segundo Menezes Filho, também coloca em contexto menos voluntarista conquistas dos governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. O número de crianças, definidas como pessoas de zero a 14 anos, cresceu 8% no Brasil entre 1980 e 1985, me disse o economista numa tarde chuvosa em São Paulo. Já entre 1990 e 1995, essa fatia da população aumentou apenas 1%. Nos últimos cinco anos do século passado, ela finalmente começou a diminuir.
Uma quantidade praticamente estável de crianças certamente contribuiu, ele argumentou, para a ampliação do acesso à escola fundamental durante os anos de Fernando Henrique no poder. Essa mesma geração de crianças, dez anos mais tarde, começou a entrar no mercado de trabalho, já durante o governo Lula. Foi então que a fatia de brasileiros de 15 a 24 anos de idade repetiu a queda vertiginosa constatada no número de crianças da década anterior. Se entre 1995 e 2000 a população de jovens havia crescido 11%, dez anos depois, entre 2005 e 2010, aconteceu algo antes impensável. O número de jovens encolheu, cerca de 4%. Uma consequência dessa mudança na dinâmica demográfica é que há hoje muito menos gente procurando emprego.
Além disso, quem chega agora ao mercado de trabalho já tem um nível de escolaridade mais alto. “A porcentagem de jovens com menos de cinco anos de estudo passou de 47%, em 1981, para somente 10%, em 2011”, escreveu Menezes Filho em um artigo recente para o jornal Valor Econômico. A oferta de mão de obra pouco qualificada ficou mais escassa do que nunca, aumentando os salários dos mais pobres e ajudando a reduzir a desigualdade. “É uma mudança muito forte. Muito rápida. Sem igual, eu acho, em outros países”, me disse o economista.
Menezes Filho fez questão de reconhecer a contribuição de políticas públicas, nos últimos vinte anos, para os avanços sociais recentes no país. Mas também comentou, enquanto mudava as imagens na tela: “Tanto o Fernando Henrique quanto o Lula deram sorte.”
A “conversão” de José Alberto de Carvalho à demografia aconteceu quase que à sua revelia, por força da época e das circunstâncias. Nos anos 60, num contexto de Guerra Fria e temor de que a experiência da Revolução Cubana se repetisse em outros países da região, os Estados Unidos voltaram suas atenções à América Latina. Atividades de apoio científico, de aprimoramento técnico da burocracia e de formação de pesquisadores para ajudar a promover o desenvolvimento local foram estimuladas. Foi nessa época que a Fundação Ford, uma entidade privada que tem como objetivos a “consolidação da democracia” e a “redução da pobreza”, começou a fazer fortes investimentos na área de ciências sociais no Brasil.
“Você veja os paradoxos da história”, me disse Carvalho, à beira do rio. “A FundaçãoFord financiou o Cebrap, formado por gente perseguida pela ditadura.” Entre os criadores, em 1969, do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, desde então uma das mais importantes instituições de pesquisa em ciências sociais do país, estavam Fernando Henrique Cardoso e a demógrafa Elza Berquó. Ambos haviam sido afastados pelo regime militar de suas atividades na USP, no ano anterior.
O sociólogo Sergio Miceli, organizador do livro A Fundação Ford no Brasil, ressalta o divórcio entre os interesses do governo norte-americano, que apoiou o golpe de 64, e os jovens acadêmicos encarregados de tocar os negócios da instituição no Brasil. Foi também a fundação a responsável por financiar a ida de Carvalho, em 1970, para o doutorado em demografia, em Londres. Lá, foi orientado por William Brass, criador de métodos indiretos de estimação de variáveis populacionais, como a taxa de fecundidade, quando os dados são falhos, o que era o caso do Brasil naquela época.
Segundo a demógrafa da Unicamp Maria Coleta de Oliveira, os estudos populacionais em países pobres eram então uma área prioritária para o governo e as entidades multilaterais americanas. “No Brasil, havia investimento para pesquisa em demografia a dar com pau. Foi construída a ideia de que, se os países subdesenvolvidos não controlassem o crescimento populacional, eles não iriam romper as barreiras ao seu desenvolvimento.”
A relação entre variações populacionais e mudanças sociais se tornou um campo minado. “À direita, falava-se que a ‘explosão demográfica’ gerava pobreza, era prejudicial e que, se não houvesse planejamento e controle familiar, a fecundidade não ia cair”, me disse Carvalho. “Nós, os intelectuais de esquerda, dizíamos que não adiantava controle familiar. Que a fecundidade só cairia quando houvesse verdadeiro desenvolvimento econômico.” De um lado do espectro ideológico, a dinâmica demográfica era tratada como causa quase exclusiva das diferenças sociais. Do outro, como mera consequência, sem efeitos reais sobre as políticas públicas, os salários e o mercado de trabalho.
Por ironia, os primeiros sinais de que a fecundidade começava a cair no país apareceram em meados daquela década, no momento de auge do maniqueísmo a que se refere José Alberto de Carvalho. “Os dois lados ficaram estatelados”, contou. “A reação imediata foi questionar os dados. Como caiu, se não houve controle oficial nem ‘verdadeiro desenvolvimento’? Porque a gente não podia aceitar que havia desenvolvimento econômico em plena ditadura. Uma das primeiras hipóteses, na esquerda, foi a de que a miséria estava tão grande que teria havido uma queda generalizada da libido no Brasil.”
A hipótese de “diminuição da libido” foi apresentada, em 1980, pela professora Elza Berquó. Pioneira dos estudos demográficos no país, ela formou gerações de pesquisadores, em São Paulo. Criou uma tradição, que se mantém ainda hoje, de aproximação entre a demografia e a sociologia. Em contraste, o departamento capitaneado por José Alberto de Carvalho, em Minas, conferiu ênfase aos métodos quantitativos e sempre manteve proximidade com a economia. A professora, em seu artigo, apresentava também outras hipóteses para a queda da fecundidade, como a inserção da mulher no mercado de trabalho e a “incorporação”, pela classe trabalhadora, do cálculo econômico.
Em um texto recente, Carvalho reconhece que Elza Berquó, pouco depois, abandonou a sua “hipótese heroica”. Numa conversa no Cebrap, em abril, a demógrafa afirmou que tal ideia, para ela, nunca teve muita relevância. “É preciso lembrar que a queda na taxa de fecundidade foi uma surpresa muito grande. Aí surgiram hipóteses de vários tipos. Essa foi uma delas. Logo em seguida, saíram outros trabalhos, a gente fez outras análises e verificou outras explicações. Houve várias explicações.”
O professor mineiro argumenta que, no fundo, esquerda e direita tratavam os pobres como irracionais, incapazes de responder aos estímulos que a urbanização criava para que tivessem um número menor de filhos. “Os pobres surpreenderam os intelectuais brasileiros”, ele comentou, rindo.
A surpresa, afirmou sua colega paulista, se deveu ao fato de os pesquisadores trabalharem, então, “no escuro”. “É preciso não esquecer que o Censo demográfico de 1960 só foi publicado, em parte, no final da década seguinte”, disse Elza. “O regime militar nunca explicou o que houve com a perda de parte dos dados. Foi só com os resultados do Censo de 70 que nós pudemos ver o que estava acontecendo. Nós ficamos num vazio de informações entre 60 e meados dos anos 70.”
A demógrafa Maria Coleta de Oliveira, embora carioca, pertence ao grupo “paulista” dessa discussão. Ela diz que as dicotomias de quatro décadas atrás foram superadas. “Claro, a dinâmica demográfica impõe condições, não há dúvida. O que a sociedade e a economia vão fazer com essas condições é outra coisa.”
A professora Elza disse estar de acordo. “O fato de ter diminuído o número de jovens, em termos absolutos, ajudou a termos menos desemprego. Mas nós precisamos ver que empregos são esses. Mesmo com essa redução, o Brasil não tem mão de obra qualificada para várias especialidades. Não resolve o problema. Investiu-se muito pouco, a meu ver, em educação.”
O efeito equalizador da queda na taxa de fecundidade, dizem os pesquisadores, é duradouro. Há um outro impacto, contudo, a princípio também benéfico, que é transitório. É o chamado “bônus demográfico”, que compreende o período de tempo em que é máxima a participação das pessoas em idade para trabalhar no total da população. Por algumas décadas, a porcentagem de crianças cai numa velocidade maior do que o aumento da parcela de idosos. Em teoria, a geração de renda pelos que trabalham poderia então aumentar numa velocidade maior do que a dos gastos com os grupos que não trabalham – com efeitos positivos sobre o crescimento e a capacidade de poupança.
Ocorre que, com o envelhecimento da população, a porcentagem de idosos continuará a aumentar. Em algum momento, a participação dos adultos no total da população deve encolher. “O bônus demográfico brasileiro iniciou-se em meados dos anos 70 e terminará em dez anos, aproximadamente”, disse Samuel Pessôa. “Já gastamos mais de 80% dele. Agora, que entramos na fase em que a taxa de crescimento da população como um todo e também a da população em idade para trabalhar são baixas, somente conseguiremos crescer mais rapidamente se elevarmos a produtividade dos trabalhadores. A vida ficou mais difícil para o crescimento econômico, apesar de ter ficado mais fácil para a redução da desigualdade de renda.”
Para aumentar a produtividade dos trabalhadores, defende Pessôa, é preciso ter ganhos de qualidade, e não apenas de quantidade, no sistema público de educação. “Ninguém sabe como fazer isso no Brasil, hoje”, ele disse. O discurso é semelhante ao do professor mineiro. “Ou você investe nessa criançada, pouca para sustentar uma proporção crescente de idosos, ou teremos problemas”, me disse Carvalho num final de tarde, quando começava a chover forte em São Vicente de Minas. “O bônus é passageiro, e não o estamos aproveitando. Daqui a algum tempo, com o aumento do número de idosos, a Previdência Social será insustentável. É uma questão aritmética.”
O tema levou o demógrafo a falar de uma imposição que sofreu, há pouco mais de dois anos, e que ainda lhe causa irritação e tristeza. Por ser servidor público, ao completar 70 anos, no final de 2010, José Alberto de Carvalho foi obrigado a se aposentar do cargo de professor titular da UFMG.
Ele veio a ser contratado, em seguida, pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas ligada à universidade, uma entidade de direito privado. Para um cargo alto, de diretor-executivo, o que lhe dá trabalho e lhe confere uma sala confortável no prédio da Faculdade de Ciências Econômicas. O que, afinal, em nada diminuiu a ênfase de sua queixa. “É um absurdo. Não faz sentido. Você abre mão de quem tem experiência e aumenta os gastos ao contratar um novo funcionário.”
“Não é que ele tenha ficado insatisfeito com essa situação”, me disse Simone Wajnman, que acompanhou de perto a frustração do seu antigo professor. “Ele ficou doente! Era uma ideia inaceitável para ele, e é fácil notar o efeito nefasto que a aposentadoria produziu em sua vida. Até hoje, ele se apresenta como um professor compulsoriamente aposentado, e não como um professor aposentado. E não perde uma única oportunidade de fazer uma longa preleção sobre o absurdo dessa legislação, enfatizando, é claro, a questão demográfica envolvida.”
Só se ouve de Carvalho lamento semelhante quando o tema é a política. A chuva levantava um cheiro bom, de terra, na Fazenda Saudade, quando ele elogiou o processo de transição entre os governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, no final de 2002. “Foi tão civilizada”, suspirou. “Mas, agora, está tudo piorando, com essa polarização.”
Da primeira vez que nos falamos, por telefone, o assunto já havia surgido. Fazia pouco tempo, então, que a disputa pela sucessão presidencial havia sido precipitadamente deflagrada. Em fevereiro, no ato em que se comemoravam os dez anos do PT no poder, Lula lançou Dilma como candidata à reeleição. “Nós não herdamos nada; nós construímos”, disse a presidente, em seu discurso. Numa espécie de resposta antecipada, o tucano Aécio Neves havia subido à tribuna do Senado, naquele mesmo dia. Segundo o pré-candidato à Presidência pelo PSDB, desde que chegou ao governo o PT está apenas “exaurindo a herança bendita” que o governo Fernando Henrique lhe legou.
A melhoria dos indicadores sociais no país encontra-se no centro do embate entre PT e PSDB. O professor emérito da UFMG expressou certo fastio em relação à disputa. “Os governos, em vez de reconhecerem a contribuição da demografia e irem além, ficam se autoelogiando, um querendo se comparar com o outro”, reclamou.
“Claro, temos que reconhecer que houve algum esforço. Mas eu diria que a contribuição da transição demográfica foi muito mais importante do que a atuação dos governos federais. O problema é que, se você reconhece a grande contribuição da demografia, surge a pergunta, incômoda: por que não se faz mais?”
- Bourne
- Sênior
- Mensagens: 21087
- Registrado em: Dom Nov 04, 2007 11:23 pm
- Localização: Campina Grande do Sul
- Agradeceu: 3 vezes
- Agradeceram: 21 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Em termos gerais, as declarações do Lara Resende fazem sentido e forma até boas. Defende bem o seu ponto de vista. Está anos-luz de muito comentarista econômico e técnicos que acham que entendem de alguma e argumentam em cima de uma base falha. Com desconto para a politicagem normal no Resende e aspectos obscuros da sua vida como gestor público.
O primeiro está relacionado ao Lara Resente tem uma produção acadêmica muito interessante, especialmente sobre o desenvolvimento da estrutura financeira brasileira enfatizando as políticas de estabilização e crescimento. Portanto, apesar de estar defasado, possui um grande conhecimento histórico, político e teórico para formular as assertivas.
A parte da insuficiência de poupança interna para financiar o investimento. Sem isso não cresce, distribui renda e melhor o padrão de vida da
população de forma continuada. Como também, o governo arrecadar muito, da forma errado com tributação encima do consumo e produção, gasta mal e
não proporciona os serviços a população. Esses são pontos pacíficos que qualquer um sã consciência e estão entre os entraves para o crescimento e desenvolvimento do país de forma continuada. O aspecto da "otimismo irracional" é mais que conhecido.
Outro question relacionada ao governo errar ao incentivar o consumo e não investimento é uma meia verdade que é colocada em debate. No curto prazo para enfrentamento da crise agir para aquecer a demanda era essencial para evitar desemprego, resguardar a estrutura produtiva e incentivar o investimento. Ao mesmo tempo em que os bancos público injetaram dinheiro para investimento e redução das taxas de juros de longo prazo. Assim constitui uma ação conjunta.
Porém o questionável é que existe um surto inflacionário puxado pela demanda. Tudo bem que existe uma elevação de preços, mas a questão é da onde vem, se é continuado e qual a medida adequada para atacá-la.
A explicação do Resende é que a inflação provém demanda por altos gastos do governo e população, sendo continuado e não vai se acomodar. Portanto, a solução é ajuste fiscal, desistimulo ao consumo privado com elevação de juros. Essa é a explicação corrente na imprensa que tem orgasmos ao falar da aceleração inflacionária e medidas duras de combate, como também os banqueiros sentem o mesmo por ser uma forma de ganhar fácil. Porém o resende ressalta que pode ser péssimo e piorar os problemas com um ajuste doloroso de curto prazo durando anos. Isto é, não é maluco como Sardenberg e manja das coisas.
O segudo ponto é Lara Resende, o homem público e político.
Nos anos 1980 e 1990s, Resende sempre esteve nas esferas de poder. Possuía relações bem nebulosas quando estava a frente do BNDES e privatizações. Além disso, ao mesmo tempo ter um banco pequeno porte enquanto exercia funções públicas. No livro que "questionada as verdades sobre desenvolvimento econômico" é direcionado ao público leigo. Quem manja das putarias destruiu essas "verdades" nos anos 1950s.
O teor mais político de atacar o governo Dilma para o prazer da defesanet é colocar os modelos de crescimento do regime militar e Dilma no mesmo pacote. Por que ele sabe que são muito diferentes e não possuem continuidade. Por exemplo, no regime militar castelo branco (1964-67) batia na inflação e era o chamado liberal da época, costa e Silva (1967-69) deu poderes ao Delfin Netto para priorizar o crescimento; Médici (1969-74) tentou implantar o modelo de industrialização com ênfase na exportação; e Geisel (1974-79) o II PNB com a mudança estrutural fortalecendo a elevada estatização que existe até hoje. O que poderia colocar fazer alguma comparação com o Dilma é o governo Médici no sentido de querer implantar um modelo e não ir para frente. Mesmo a situação externa atual é bem mais favorável e o país é outro com novas necessidades e prioridades. Não vi muito sentido na comparação.
Trabalhos bons dele como
http://www.memoria.nemesis.org.br/index ... le/395/336
Existem dois lados da entrevista.Lirolfuti escreveu:Bourne e com vc
André Lara Resende - Projeto do PT parece o do Regime Militar
Para Resende, governo precisa mudar rumo para evitar ‘crescimento medíocre
(...)
http://www.defesanet.com.br/pensamento/ ... e-Militar/
O primeiro está relacionado ao Lara Resente tem uma produção acadêmica muito interessante, especialmente sobre o desenvolvimento da estrutura financeira brasileira enfatizando as políticas de estabilização e crescimento. Portanto, apesar de estar defasado, possui um grande conhecimento histórico, político e teórico para formular as assertivas.
A parte da insuficiência de poupança interna para financiar o investimento. Sem isso não cresce, distribui renda e melhor o padrão de vida da
população de forma continuada. Como também, o governo arrecadar muito, da forma errado com tributação encima do consumo e produção, gasta mal e
não proporciona os serviços a população. Esses são pontos pacíficos que qualquer um sã consciência e estão entre os entraves para o crescimento e desenvolvimento do país de forma continuada. O aspecto da "otimismo irracional" é mais que conhecido.
Outro question relacionada ao governo errar ao incentivar o consumo e não investimento é uma meia verdade que é colocada em debate. No curto prazo para enfrentamento da crise agir para aquecer a demanda era essencial para evitar desemprego, resguardar a estrutura produtiva e incentivar o investimento. Ao mesmo tempo em que os bancos público injetaram dinheiro para investimento e redução das taxas de juros de longo prazo. Assim constitui uma ação conjunta.
Porém o questionável é que existe um surto inflacionário puxado pela demanda. Tudo bem que existe uma elevação de preços, mas a questão é da onde vem, se é continuado e qual a medida adequada para atacá-la.
A explicação do Resende é que a inflação provém demanda por altos gastos do governo e população, sendo continuado e não vai se acomodar. Portanto, a solução é ajuste fiscal, desistimulo ao consumo privado com elevação de juros. Essa é a explicação corrente na imprensa que tem orgasmos ao falar da aceleração inflacionária e medidas duras de combate, como também os banqueiros sentem o mesmo por ser uma forma de ganhar fácil. Porém o resende ressalta que pode ser péssimo e piorar os problemas com um ajuste doloroso de curto prazo durando anos. Isto é, não é maluco como Sardenberg e manja das coisas.
O segudo ponto é Lara Resende, o homem público e político.
Nos anos 1980 e 1990s, Resende sempre esteve nas esferas de poder. Possuía relações bem nebulosas quando estava a frente do BNDES e privatizações. Além disso, ao mesmo tempo ter um banco pequeno porte enquanto exercia funções públicas. No livro que "questionada as verdades sobre desenvolvimento econômico" é direcionado ao público leigo. Quem manja das putarias destruiu essas "verdades" nos anos 1950s.
O teor mais político de atacar o governo Dilma para o prazer da defesanet é colocar os modelos de crescimento do regime militar e Dilma no mesmo pacote. Por que ele sabe que são muito diferentes e não possuem continuidade. Por exemplo, no regime militar castelo branco (1964-67) batia na inflação e era o chamado liberal da época, costa e Silva (1967-69) deu poderes ao Delfin Netto para priorizar o crescimento; Médici (1969-74) tentou implantar o modelo de industrialização com ênfase na exportação; e Geisel (1974-79) o II PNB com a mudança estrutural fortalecendo a elevada estatização que existe até hoje. O que poderia colocar fazer alguma comparação com o Dilma é o governo Médici no sentido de querer implantar um modelo e não ir para frente. Mesmo a situação externa atual é bem mais favorável e o país é outro com novas necessidades e prioridades. Não vi muito sentido na comparação.
Trabalhos bons dele como
http://www.memoria.nemesis.org.br/index ... le/395/336
- knigh7
- Sênior
- Mensagens: 18928
- Registrado em: Ter Nov 06, 2007 12:54 am
- Localização: S J do Rio Preto-SP
- Agradeceu: 2006 vezes
- Agradeceram: 2543 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
http://g1.globo.com/economia/noticia/20 ... -2014.html09/07/2013 11h00 - Atualizado em 09/07/2013 12h46
FMI reduz previsão de crescimento do Brasil de 3% para 2,5% em 2013
Para 2014, previsão de alta do PIB foi reduzida de 4% para 3,2%.
Estimativa de crescimento global também foi reduzida, de 3,3% para 3,1%.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) reduziu nesta terça-feira (9) suas estimativas para o crescimento global pela quinta vez desde o início do ano passado, devido à desaceleração dos mercados emergentes e à prolongada recessão na Europa.
O FMI também reduziu a previsão de crescimento para o Brasil em 2013, de 3% para 2,5%. Para 2014, a estimativa de avanço do PIB foi reduzida em 0,8 ponto percentual, de 4% para 3,2%. O Brasil foi o país com o maior corte na projeção do FMI para crescimento econômico em 2014 dentre as nações monitoradas pelo fundo.
Em seu exame do meio do ano do estado da economia mundial, FMI também advertiu que o crescimento global pode desacelerar ainda mais se a retirada do enorme estímulo monetário nos Estados Unidos levar a uma reversão dos fluxos de capital e reduzir o crescimento nos países em desenvolvimento.
No relatório Panorama Econômico Global, o FMI cortou sua previsão para o crescimento global em 2013 a 3,1%, mesmo ritmo de expansão do ano passado, mas abaixo da previsão de 3,3% divulgada em abril. O Fundo também reduziu sua previsão para 2014 a 3,8%, ante previsão anterior de 4%.
Os mercados emergentes, que tinham sido anteriormente o motor da recuperação global, contribuíram para a piora da perspectiva, intitulada "Dores do Crescimento". O FMI reduziu sua previsão de crescimento em 2013 dos países em desenvolvimento para 5%, incluindo uma previsão menor para os Brics (China, Brasil, Rússia, Índia e África do Sul).
EUA e zona do euro
O FMI espera uma piora dos dados na zona do euro em 2013, e estima agora uma queda do PIB de 0,6%. Para 2014, a previsão é de avanço de 0,9%.
Enquanto isso, a economia americana deve se expandir 1,7% neste ano, e 2,7% em 2014, na previsão do fundo.
Para Alemanha, o fundo prevê crescimento de 0,3% em 2013 e de 1,3% em 2014. Já para a China, a estimativa é de um avanço de 7,8% do PIB neste ano e de 7,7% no próximo.
O Japão é uma das poucas surpresas favoráveis do relatório do FMI em relação ao crescimento de 2013. A instituição projeta agora um avanço de 2% do PIB do país asiático neste ano, acima do 1,5% esperado em abril. Isso reflete, segundo o FMI, os efeitos das políticas mais acomodativas sobre a confiança e a demanda privada.
Países emergentes
"O desempenho abaixo do esperado se dá por três fatores. Primeiro, o crescimento continua a decepcionar nas principais economias emergentes, refletindo, em graus diversos, gargalos de infraestrutura e outros problemas de capacidade, menor crescimento da demanda externa, preços de commodities mais baixos, preocupações com a estabilidade financeira global e, em alguns casos, suporte político débil", afirma o relatório.
"Segundo, a recessão na zona do euro foi mais profunda que o esperado (...) Terceiro, a economia americana se expandiu a um ritmo mais lento, na medida em que a consolidação fiscal pesou na melhora da demanda privada", acrescenta o FMI>
Como saída para o crescimento lento, o FMI recomenda que os países avançados adotem políticas que não abandonem a sustentabilidade fiscal, mas apoiem a recuperação da demanda econômica e do crescimento no médio prazo.
Para os países emergentes, a recomendação é preparar-se para um aumento das taxas de juros nos EUA, o que pode diminuir o fluxo dos capitais financeiros para as economias em desenvolvimento.
Para o economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard, o investimento baixo parece ser um dos motivos para a perda de fôlego das economias emergentes. "Se você olha país por país, parece haver um motivo específico para cada um deles. Na China, parecem os investimentos improdutivos, no Brasil, o investimento baixo, na Índia, incertezas administrativas e sobre políticas. Mas você se pergunta se não há algo por trás disso."
Para Blanchard, o que estaria por trás desse movimento é uma desaceleração do crescimento potencial (aquele que não acelera a inflação) e não do "componente cíclico". "Está claro que esses países não vão crescer a mesma taxa que cresciam antes da crise", afirmou.
- knigh7
- Sênior
- Mensagens: 18928
- Registrado em: Ter Nov 06, 2007 12:54 am
- Localização: S J do Rio Preto-SP
- Agradeceu: 2006 vezes
- Agradeceram: 2543 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/20 ... 2014.shtml09/07/2013 - 11h04
Brasil é o que tem maior corte de projeção do FMI para crescimento em 2014
RAUL JUSTE LORES
DE WASHINGTON
O Brasil é o país com o maior corte na projeção do FMI (Fundo Monetário Internacional) para crescimento econômico em 2014 dentre as nações monitoradas pela instituição: redução de 0,8 ponto percentual.
Apesar disso, a estimativa do FMI de expansão do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro para o ano que vem ainda é de 3,2%, acima de boa parte das projeções do mercado brasileiro sobre a economia. Antes, a projeção do FMI era de 4%.
A economia global crescerá 0,2 ponto a menos do que o antes previsto, tanto neste ano quanto no próximo.
Neste ano, em relação ao Brasil, a revisão foi de 3% para 2,5%. Em entrevista à imprensa na sede do FMI, o diretor do Departamento de Pesquisas do Fundo, Olivier Blanchard, disse que o nível de investimentos no Brasil é ainda baixo e que a redução do crescimento chinês afeta o preço das commodities, atingindo países exportadores de matérias primas como o Brasil.
"O Brasil tem gargalos de infraestrutura e de mão de obra e já está acima da inflação estimada, o que limitou o crescimento nos últimos dois anos", afirmou Thomas Helbling, chefe da Divisão de Estudos Econômicos.
Os países emergentes, em conjunto, tiveram as projeções revisadas 0,3 ponto percentual para baixo, tanto em 2013 quanto em 2014.
Em média, o crescimento dos países emergentes será de 5% neste ano. Rússia e África do Sul terão altas de 2,5% e 2%. O PIB chinês deve crescer 7,8% e o da Índia, 5,7% (abaixo das previsões anteriores, de 8,1% e 5,9% respectivamente).
ECONOMIA MUNDIAL
Em relação à economia mundial, também houve redução das estimativas de crescimento em 2013 e 2014 diante da desaceleração dos países emergentes e a persistente estagnação da Europa.
A economia mundial irá crescer 3,1% em 2013, o mesmo que em 2012. A recuperação americana continua bem melhor que a europeia, mas com números ainda modestos. O crescimento da economia americana deve chegar a 1,7%.
A zona do euro terá uma queda de 0,6% neste ano, maior que a de 0,4% prevista anteriormente e a mesma retração do PIB que já teve no ano passado. Itália e Espanha terão quedas no PIB de 1,8% e 1,6% respectivamente em 2013. Em 2014, porém, a previsão é que a Europa cresça 0,9% --menos que o previsto iniciamente (1%).
Um dos raros casos de revisão para cima foi o do Japão, reflexo da política de expansão monetária do primeiro-ministro Shinzo Abe. A terceira maior economia do mundo deve crescer 2% neste ano, acima do 1,5% da estimativa anterior. Em 2014, porém, houve revisão para baixo, de 1,5% para 1,2%.
- Bourne
- Sênior
- Mensagens: 21087
- Registrado em: Dom Nov 04, 2007 11:23 pm
- Localização: Campina Grande do Sul
- Agradeceu: 3 vezes
- Agradeceram: 21 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
As partes em vermelho são bem interessantes.
Foi postado também no tópico sobre crise econômica mundial para o pzito poder chorar e achar as pistas para encontrar novas desgraças na grande mídia.José Carlos Braga e as incertezas do sistema capitalista global
10/04/2012 - 15:50
Fonte: http://www.unicamp.br/unicamp/noticias/ ... sta-global
O sistema global do capitalismo vive uma espécie de “era da indeterminação”. A hipótese foi defendida recentemente pelo docente do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, José Carlos de Souza Braga, durante aula ministrada como parte das exigências para a obtenção do título de professor titular. De acordo com ele, alguns aspectos contribuem para o estabelecimento do cenário de incertezas. “Atualmente, não há um padrão monetário internacional estável, como havia no passado com o dólar-ouro. Também não está claro como se dará a divisão internacional do trabalho. Há dúvidas sobre quem produzirá o quê e em que lugar. Além disso, ninguém sabe o que acontecerá aos países desenvolvidos, que ainda sofrem reflexos da crise. Será que eles estariam absorvendo aspectos do subdesenvolvimento? A alta taxa de desemprego, por exemplo, preocupa tanto aos países europeus quanto aos Estados Unidos”, analisa.
O trabalho apresentado por Braga, intitulado Teoria e História dos Capitalismos, é o resultado de toda uma vida dedicada ao estudo de temas relacionados às áreas da Teoria Econômica, Economia Internacional e Economia Brasileira. Além de ministrar a aula, o docente também apresentou um memorial acadêmico e se submeteu a uma prova de títulos. “No memorial, eu procurei salientar as minhas linhas de trabalho. Meu propósito foi pensar o capitalismo contemporâneo, cujo recorte temporal compreende desde os anos 1970 até os dias atuais”, explica o docente. De acordo com ele, está cada vez mais claro que o capitalismo entrou numa crise sistêmica global a partir de 2007/2009. “Os desdobramentos dessa crise ainda podem ser sentidos, embora a fase mais aguda já tenha sido superada, graças à atuação dos bancos centrais que apoiaram os sistemas financeiros dos países mais afetados”.
Como decorrência dessa crise sistêmica, continua Braga, o capitalismo teria ingressado nessa fase de indeterminação. O economista lista os fatores que estariam contribuindo para a configuração do período de incertezas. Em primeiro lugar, ele cita a ausência de um padrão monetário consistentemente dominante, como era o dólar-ouro e a libra-ouro. O dólar, que vem cumprindo essa função, tem sido alvo de desconfianças por causa da situação econômica dos Estados Unidos, como lembra o professor da Unicamp. “Os Estados Unidos sofreram nos últimos anos várias instabilidades. O país apresenta déficits fiscal, comercial e de transações correntes importantes, além de ter uma dívida pública igualmente significativa. A princípio, isso deveria tornar a moeda fraca. Isso somente não ocorreu porque o fenômeno monetário está diretamente ligado ao poder político. Então, o dólar segue sendo o padrão monetário, embora o ouro não esteja mais por trás dele. Trata-se, hoje, de uma moeda fiduciária ainda dominante, mesmo que sujeita a muitas flutuações. Tanto é assim que, recentemente, quando a situação da Europa começou a se complicar, os detentores da riqueza correram para o dólar, o que equivale dizer que correram para os títulos da dívida pública americana”, detalha.
As incertezas em relação ao dólar, conforme o economista, também atingem o euro, em razão da crise. “Há, ainda, o caso do yuan, a moeda chinesa. Entretanto, é pouco provável que a China queira inserir a sua moeda no jogo internacional. É que, ao tornar-se internacional, o yuan também se tornaria alvo de especulações por parte dos donos da riqueza. Portanto, nós temos uma indeterminação sobre qual padrão monetário vai conduzir uma nova etapa de desenvolvimento mundial”, reforça Braga. Outra indeterminação aventada por ele refere-se à divisão internacional do trabalho. Ou, em termos mais acessíveis, de como a geografia mundial da produção será dividida. “Estamos assistindo a uma inquestionável manifestação de poder da indústria chinesa, que está articulada com os demais países asiáticos. De outro lado, temos a União Europeia, que tem na Alemanha uma grande potência industrial. E temos os Estados Unidos, que continuam sendo fortes em setores como aeronáutica, tecnologia da informação etc. É briga de cachorro grande. E não podemos nos esquecer dos países emergentes, entre eles o Brasil. Uma pergunta pertinente é: o Brasil continuará sendo um país industrializado? Apenas para lembrar, dados de 2011 do IBGE indicam que a participação da indústria brasileira no PIB foi de 14% naquele ano. É o mesmo índice da era JK! Sem contar que essa participação já atingiu 27% em outras épocas. O fato é que o Brasil está perdendo tecido industrial, principalmente por causa da valorização “fictícia” do real face ao dólar. Estamos perdendo competitividade e oportunidades de exportação”.
A questão é reforçada, assinala Braga, até mesmo por mudanças incipientes. Exemplo é a recente movimentação do México, que até há pouco tempo não era considerado como participante do jogo competitivo internacional, por ser caracterizado como economia das “maquiladoras”, empresas apenas montadoras de partes e peças importadas, sem criação forte de valor agregado. “Nos últimos tempos, o México desvalorizou o peso e ganhou competitividade. Voltou a entrar no jogo, prometendo inovações tecnológicas. O país vai competir com a China pelo mercado dos Estados Unidos e da América Latina, o que representa uma clara ameaça ao Brasil, segundo analistas internacionais. Não é à toa que a presidente Dilma Rousseff está preocupada com a atual taxa de câmbio”, detalha o docente do IE.
Uma terceira indeterminação relativa ao capitalismo contemporâneo, destaca o economista, diz respeito ao futuro das nações desenvolvidas. “O que vai acontecer com elas? Será que estão absorvendo aspectos do subdesenvolvimento? Atualmente, observamos um fenômeno relevante no mundo desenvolvido. De um lado, cresce o desemprego. De outro, aumenta a concentração da renda e da riqueza. O presidente Barack Obama, por exemplo, teve enormes dificuldades para promover uma reforma parcial no sistema de saúde dos Estados Unidos, país que soma 50 milhões de pessoas sem cobertura. O que dizer da desejada regulação financeira?”.
Desregulação
Por último, mas não menos importante, Braga chama a atenção para um ponto fundamental nesse cenário de incertezas. Ele questiona se surgirá uma cooperação internacional capaz de regular o atual capitalismo, cuja desregulação contribuiu para a emergência da crise de 2007. “Isso não está à vista. Na Europa, cada país diz uma coisa. A situação da Grécia, por exemplo, foi levada ao limite. A saída para esse tipo de situação, a meu ver, seria constituir uma federação de nações europeias para promover uma ajuda mútua, a exemplo do que acontece no Canadá, onde as regiões mais ricas socorrem as demais, de modo que ocorra certo equilíbrio. Tal medida, repito, não está à vista, pois temos no mundo um sistema interestatal capitalista. Traduzindo, temos uma realidade na qual, além da competição entre os capitais, os estados nacionais competem entre si, defendendo seus interesses e poderes, inclusive com o uso de armas[/b][/color]”.
E qual seria o fórum adequado para o eventual estabelecimento desse tipo de cooperação internacional? Na opinião do professor da Unicamp, as alternativas naturais seriam a ONU, as organizações multilaterais como o Banco Mundial e o FMI. “Ocorre que nenhuma dessas instituições tem força e/ou representatividade suficiente para promover a aproximação dos países. Hoje, não podemos ter clareza se surgirá uma espécie de capitalismo regulado, no sentido de termos uma disciplina financeira”, entende Braga. O economista faz questão de registrar, porém, que toda essa problemática não significa afirmar que o capitalismo está caminhando para o colapso. “Não é nada disso. Estamos vivendo um período de tensão. São turbulências de um sistema dinâmico que recorrentemente fica entre a expansão e a crise”, esclarece.
Em seu trabalho, Braga também faz uma análise do papel do Brasil no cenário internacional. Segundo ele, desde o advento do Plano Real, em 1994, o país adotou um novo padrão liberal de “desenvolvimento” do capitalismo, que por definição atende, sobretudo, aos interesses do capital. A questão da distribuição de renda e da riqueza, conforme esse modelo, é secundária. “A inflação está baixa e o país dá sinais de voltar a crescer. Nos últimos anos, tivemos uma melhora na distribuição de renda, através do aumento real do salário mínimo e dos programas de transferência do governo federal, como o Bolsa Família. Também experimentamos o aumento da concessão de crédito às famílias de baixa renda. Tudo isso fez com que o consumo crescesse e a economia crescesse junto. A despeito disso, cabe a pergunta: em que pé estamos? Com a taxa de câmbio altamente valorizada, penso que, agora sim, estamos diante do risco de desindustrialização. A saída contra esse tipo de ameaça é a adoção de um projeto nacional de desenvolvimento”, sustenta.
O professor do IE prossegue dizendo que o país carece de uma política macroeconômica mais consistente do que a atual, que está baseada no tripé câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário. “Esse modelo, que parece estar mudando no atual governo, tolhe o nosso desenvolvimento. O Brasil tem uma base industrial importante e um agronegócio igualmente forte. São condições que nos favorecem. Todavia, necessitamos de uma política industrial para valer. Carecemos também de uma política financeira que junte os bancos públicos e induza os bancos privados a financiarem o desenvolvimento de longo prazo. Aqueles que agissem assim poderiam pagar menos tributo, por exemplo. Outra missão importante é adotar políticas de desenvolvimento regionais, que sejam pensadas sob a lógica nacional. Não podemos continuar arcando com as negatividades geradas pela guerra fiscal entre os estados. Por fim, também não podemos deixar de adotar políticas sociais mais consistentes, que objetivem atender as necessidades da população nas áreas de saúde, educação etc, bem como promover a autonomia das pessoas que hoje dependem do Bolsa Família. Isso sem falar nos investimentos em infraestrutura, que são indispensáveis. Se não atuarmos nessas estratégias, correremos o sério risco de sofrer uma regressão histórica”, alerta Braga.
- Bourne
- Sênior
- Mensagens: 21087
- Registrado em: Dom Nov 04, 2007 11:23 pm
- Localização: Campina Grande do Sul
- Agradeceu: 3 vezes
- Agradeceram: 21 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Um debate interessante provocado pelo texto do Lara Resende no Valor. Prestem atenção nas respostas do Pessoa e Manuseto.
O mal-estar contemporâneo
Por André Lara Resende
Fonte: http://www.schwartzman.org.br/sitesimon ... lang=pt-br
Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças
Na tentativa de interpretar o protesto das ruas nas grandes cidades brasileiras, há uma natural tentação de fazer um paralelo com os movimentos similares nos países avançados, sobretudo da Europa, mas também nos EUA – Occupy Wall Street – assim como com os da chamada Primavera Árabe. As condições objetivas são, contudo, muito distintas. A Primavera Árabe é um fenômeno de países totalitários, onde não há representação democrática. Não é o caso do Brasil. Na Europa, sobretudo nos países mediterrâneos periféricos mais atingidos pelos efeitos da crise financeira de 2008, houve uma drástica piora das condições de vida. O desemprego, especialmente entre os jovens, subiu para níveis dramáticos. Mais uma vez, não é o caso do Brasil.
Nem os críticos mais radicais ousariam argumentar que o Brasil de hoje não se enquadra nos moldes das democracias representativas do século XX. Podem-se culpar os desacertos da política econômica nos últimos seis anos. Embora devam ficar mais evidentes daqui para a frente, os efeitos negativos da incompetência da política econômica só muito recentemente se fizeram sentir. Fato é que, desde a estabilização do processo inflacionário crônico, houve grandes avanços nas condições econômicas de vida dos brasileiros. Nos últimos 20 anos, houve ganho substancial de renda entre os mais pobres. Ao contrário do que ocorreu em outras partes do mundo, até mesmo nos países avançados, a distribuição de renda melhorou. O desemprego está em seu mínimo histórico.
É verdade que a inflação, especialmente a de alimentos, que se faz sentir mais intensamente pelos assalariados, está em alta. Por mais consciente que se seja em relação aos riscos, políticos e econômicos, da inflação, é difícil atribuir à inflação o papel de catalisadora do movimento das ruas nas últimas semanas. Só agora a taxa de inflação superou o teto da banda – excessivamente generosa, é verdade – da meta do Banco Central.
Os dois elementos tradicionais da insatisfação popular – dificuldades econômicas e falta de representação democrática – definitivamente não estão presentes no Brasil de hoje. Inflação, desemprego, autoritarismo e falta de liberdade de expressão não podem ser invocados para explicar a explosão popular. O fenômeno é, portanto, novo. Procurar interpretá-lo de acordo com os cânones do passado parece-me o caminho certo para não o compreender.
O movimento de maio de 1968 na França tem sido lembrado diante das manifestações das últimas semanas. O paralelo se justifica, pois maio de 68 é o paradigma do movimento sem causas claras nem objetivos bem definidos, uma combustão espontânea surpreendente, que ocorre em condições políticas e econômicas relativamente favoráveis. Movimento que, uma vez detonado, canaliza um sentimento de frustração difusa – um “malaise”- com o estado das coisas, com tudo e todos, com a vida em geral.
A novidade mais evidente em relação a maio de 68 na França é a internet e as redes sociais. Embora não tivesse expressão clara na vida pública francesa, a insatisfação difusa poderia ter sido diagnosticada, ao menos entre os universitários parisienses. No Brasil de hoje, a irritação difusa podia ser claramente percebida na internet e nas redes sociais. O movimento pelo passe livre fez com que este mal-estar transbordasse do virtual para a realidade das ruas. Tanto os universitários franceses de 68, quanto os internautas do Brasil de hoje, não representam exatamente o que se poderia chamar de as massas ou o povão, mas funcionam igualmente como sensores e catalisadores de frustrações comuns.
Quais as causas do mal-estar difuso no Brasil de hoje, que transbordou da internet para a realidade e levou a população às ruas?
Parecem ter dois eixos principais. O primeiro, e mais evidente, é uma crise de representação. A sociedade não se reconhece nos poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário – em todas suas esferas. O segundo é que o projeto do Estado brasileiro não corresponde mais aos anseios da população. O projeto do Estado, e não do governo, é importante que se note, pois a questão transcende governos e oposições. Este hiato entre o projeto do Estado e a sociedade explica em grande parte a crise de representação.
O Estado brasileiro mantém-se preso a um projeto cuja formulação é do início da segunda metade do século passado. Um projeto que combina uma rede de proteção social com a industrialização forçada. A rede de proteção social inspirou-se nas reformas das economias capitalistas da Europa, entre as duas Grandes Guerras, reforçadas após a crise dos anos 1930. Foi introduzida no Brasil por Getúlio Vargas, para a organização do mercado de trabalho, baseado no modelo da Itália de Mussolini. A industrialização forçada através da substituição de importações, introduzida por Juscelino Kubitschek nos anos 1950, e reforçada pelo regime militar nos anos 1970, tem raízes mais autóctones. Suas origens intelectuais são o desenvolvimentismo latino-americano dos anos 1950, que defendia a ação direta do Estado, como empresário e planejador, para acelerar a industrialização.
Não nos interessa aqui fazer a análise crítica do projeto desenvolvimentista que, com altos e baixos, aos trancos e barrancos, cumpriu seu papel e levou o país às portas da modernidade neste início de século. Basta ressaltar que o desenvolvimentismo, em seus dois pilares – a industrialização forçada e a rede de proteção social – dependem da capacidade do Estado de extrair recursos da sociedade. Recursos que devem ser utilizados para financiar o investimento público e os benefícios da proteção social.
Diante da baixa taxa de poupança do setor privado e da precariedade da estrutura tributária do Estado, a inflação transferiu os recursos da sociedade para o Estado, até que nos anos 1980 viesse a se tornar completamente disfuncional. Com a inflação estabilizada, a partir do início dos anos 1990, o Estado se reorganizou para arrecadar por via fiscal também os recursos que extraía através do imposto inflacionário. A carga fiscal passou de menos de 15% da renda nacional, no início dos anos 1950, para em torno de 25%, nas décadas de 1970 a 90, até saltar para os atuais 36%, depois da estabilização da inflação. O Brasil tem hoje uma carga tributária comparável, ou mesmo superior, à das economias mais avançadas.
O projeto do PT no governo revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional- desenvolvimentismo
Apesar de extrair da sociedade mais de um terço da renda nacional, o Estado perdeu a capacidade de realizar seu projeto. Não o consegue entregar porque, apesar de arrecadar 36% da renda nacional, investe menos de 7% do que arrecada, ou seja, menos de 3% da renda nacional. Para onde vão os outros 93% dos quase 40% da renda que extrai da sociedade? Parte, para a rede de proteção e assistência social, que se expandiu muito além do mercado de trabalho organizado, mas, sobretudo, para sua própria operação. O Estado brasileiro tornou-se um sorvedouro de recursos, cujo principal objetivo é financiar a si mesmo. Os sinais dessa situação estão tão evidentes, que não é preciso conhecer e analisar os números. O Executivo, com 39 ministérios ausentes e inoperantes; o Legislativo, do qual só se tem más notícias e frustrações; o Judiciário pomposo e exasperadoramente lento.
O Estado foi também incapaz de perceber que seu projeto não corresponde mais ao que deseja a sociedade. O modelo desenvolvimentista do século passado tinha dois pilares. Primeiro, a convicção de que a industrialização era o único caminho para escapar do subdesenvolvimento. Países de economia primário-exportadora nunca poderiam almejar alcançar o estágio de desenvolvimento das economias industrializadas. Segundo, a convicção de que o capitalismo moderno exige a intervenção do Estado em três dimensões: para estabilizar as crises cíclicas das economias de mercado; para prover uma rede de proteção social; e, no caso dos países subdesenvolvidos, para liderar o processo de industrialização acelerada. As duas primeiras dimensões da ação do Estado são parte do consenso formado depois da crise dos anos 1930. A terceira decorre do sucesso do planejamento central soviético em transformar uma economia agrária, semifeudal, numa potência industrial em poucas décadas. A proteção tarifária do mercado interno, com o objetivo de proteger a indústria nascente e promover a substituição de importações, completava o cardápio com um toque de nacionalismo.
O nacional- desenvolvimentismo, fermentado nos anos 1950, teve sua primeira formulação como plano de ação do governo na proposta de Roberto Simonsen. Embora sempre combatido pelos defensores mais radicais do liberalismo econômico, como Eugênio Gudin, autor de famosa polêmica com Roberto Simonsen, e posteriormente por Roberto Campos, foi adotado tanto pela esquerda, como pela direita. Seu período de maior sucesso foi justamente o do “milagre econômico” do regime militar.
Na década de 1980, a inflação se acelera e se torna definitivamente disfuncional. As sucessivas e fracassadas tentativas de estabilização passam a dominar o cenário econômico. Com a estabilização do real, a partir da segunda metade da década de 1990, ainda com algum constrangimento em reconhecer que o nacional-desenvolvimentismo já não fazia sentido num mundo integrado pela globalização, o país parecia estar em busca de novos rumos. A vitória do PT foi, sem dúvida, parte da expressão desse anseio de mudança.
Nos dois primeiros anos do governo Lula, a política econômica foi essencialmente pautada pela necessidade de acalmar os mercados financeiros, sempre conservadores, assustados com a perspectiva de uma virada radical à esquerda. A partir daí, o PT passou a pôr em prática o seu projeto. Um projeto muito diferente do que defendia enquanto oposição. O projeto do PT no governo, frustrando as expectativas dos que esperavam mudanças, muito mais do que o aparente continuísmo dos primeiros anos do governo Lula, revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional-desenvolvimentismo, inspirado no período em este que foi mais bem-sucedido: durante regime militar. A crise internacional de 2008 serviu para que o governo abandonasse o temor de desagradar aos mercados financeiros e, sob pretexto de fazer política macroeconômica anticíclica, promovesse definitivamente a volta do nacional-desenvolvimentismo estatal.
O PT acrescentou dois elementos novos em relação ao projeto nacional-desenvolvimentista do regime militar: a ampliação da rede de proteção social, com o Bolsa Família, e o loteamento do Estado. A ampliação da rede de proteção social se justifica, tanto como uma inciativa capaz de romper o impasse da pobreza absoluta, em que, apesar dos avanços da economia, grande parte da população brasileira se via aprisionada, quanto como forma de manter um mínimo de coerência com seu discurso histórico. Já a lógica por trás do loteamento do Estado é puramente pragmática. Ao contrário do regime militar, que não precisava de alianças difusas, o PT utilizou o loteamento do Estado, em todas suas instâncias, como moeda de troca para compor uma ampla base de sustentação. Sem nenhum pudor ideológico, juntou o sindicalismo de suas raízes com o fisiologismo do que já foi chamado de Centrão, atualmente representado principalmente pelo PMDB, no qual se encontra toda sorte de homens públicos, que, independentemente de suas origens, perderam suas convicções ao longo da estrada e hoje são essencialmente cínicos.
Há ainda um terceiro elemento do projeto de poder do PT. Trata-se da eleição de uma parte do empresariado como aliada estratégica. Tais aliados têm acesso privilegiado ao crédito favorecido dos bancos públicos e, sobretudo, à boa vontade do governo, para crescerem, absorverem empresas em dificuldades, consolidarem suas posições oligopolísticas no mercado interno e se aventurarem internacionalmente como “campeões nacionais”.
A combinação de um projeto anacrônico com o loteamento do Estado entre o sindicalismo e o fisiologismo político, ao contrário do pretendido, levou à sobrevalorização cambial e à desindustrialização. Só foi possível sustentar um crescimento econômico medíocre enquanto durou a alta dos preços dos produtos primários, puxados pela demanda da China. A ineficiência do Estado nas suas funções básicas – segurança, infraestrutura, saúde e educação – agravou-se significativamente. Ineficiência realçada pela redução da pobreza absoluta na população, que aumentou a demanda por serviços de qualidade.
A insatisfação difusa dos protestos pode vir a ser catalizadora de uma mudança profunda de rumo, que abra o caminho para um novo desenvolvimento (na foto, manifestantes sobem ao teto do Congresso)
Loteado e inadimplente em suas funções essenciais, enquanto absorvia parcela cada vez maior da renda nacional para sua própria operação, o Estado passou a ser visto como um ilegítimo expropriador de recursos. Não apenas incapaz de devolver à sociedade o mínimo que dele se espera, mas também um criador de dificuldades. A combinação de uma excessiva regulamentação de todas as esferas da vida, com a truculência e a arrogância de seus agentes, consolidou o estranhamento da sociedade. Em todas as suas esferas, o Estado deixou de ser percebido como um aliado, representativo e prestador de serviço. Passou a ser visto como um insaciável expropriador, cujo único objetivo é criar vantagens para os que dele fazem parte, enquanto impõe dificuldades e cria obrigações para o resto da população. O contraste da realidade com o ufanismo da propaganda oficial só agravou o estranhamento e consolidou o divórcio entre a população e os que deveriam ser seus representantes e servidores.
A insatisfação com a democracia representativa não é um fenômeno exclusivamente brasileiro. As razões dessa insatisfação ainda não estão claras, mas é possível que o modelo de representação democrática, constituído há dois séculos para sociedades menores e mais homogêneas, tenha deixado de cumprir seu papel num mundo interligado de 7 bilhões de pessoas, e precise ser revisto. O debate público deslocou-se das esferas tradicionais da política para a internet e as redes sociais. Ameaçada pelo crescimento da internet e habituada ao seu papel de agente da política tradicional, a mídia não percebeu que o debate havia se deslocado.
No caso brasileiro, perplexa com sua aparente falta de repercussão e pressionada financeiramente pela competição da internet, uma parte da mídia desistiu do jornalismo de interesse público e passou a fazer um jornalismo de puro entretenimento. Mesmo os que resistiram, cederam, em maior ou menor escala, à lógica dos escândalos. Foram incapazes de compreender a razão da sua falta de repercussão, pois não se deram conta de que o público e o debate haviam se deslocado para a internet. Surpreendida pelo movimento de protestos, num primeiro momento, a mídia não foi capaz de avaliar a extensão da insatisfação. Transformou-se ela própria em alvo da irritação popular. Em seguida, aderiu sem convencer, sempre a reboque do debate e da mobilização através da internet. A favor da mídia, diga-se que ninguém foi capaz de captar a insatisfação latente antes da eclosão do movimento das ruas. As pesquisas apontavam, até muito recentemente, grande apoio à presidente da República, considerada praticamente imbatível, até mesmo por seus eventuais adversários nas próximas eleições. Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças. Tanto as possibilidades como os riscos são novos.
O projeto nacional-desenvolvimentista combina o consumismo das economias capitalistas avançadas com o produtivismo soviético. Ambos pressupõem que o crescimento material é o objetivo final da atividade humana. Aí está a essência de seu caráter anacrônico. Os avanços da informática permitiram a coleta de um volume extraordinário de evidências sobre a psicologia e os componentes do bem-estar. A relação entre renda e bem-estar só é claramente positiva até um nível relativamente baixo de renda, capaz de atender às necessidades básicas da vida. A partir daí, o aumento do bem-estar está associado ao que se pode chamar de qualidade de vida, cujos elementos fundamentais são o tempo com a família e os amigos, o sentido de comunidade e confiança nos concidadãos, a saúde e a ausência de estresse emocional.
Os estudos da moderna psicologia comprovam aquilo que de uma forma ou de outra, mais ou menos conscientemente, intuímos todos: nossa insaciabilidade de bens materiais advém do fato de que o bem-estar que nos trazem é efêmero. Para manter a sensação de bem-estar, precisamos de mais e novas aquisições. O consumismo material tem elementos parecidos com o do uso de substâncias entorpecentes que causam dependência física e psicológica.
No mundo todo, a população parece já ter intuído a exaustão do modelo consumista do século XX, mas ainda não encontrou nas esferas da política tradicional a capacidade de participar da formulação das alternativas. Apegada a fórmulas feitas, a política continua pautada pelos temas e objetivos de um mundo que não corresponde mais à realidade de hoje. As grandes propostas totalizantes já não fazem sentido. O nacionalismo, a obsessão com o crescimento material, a ênfase no consumo supérfluo, os grandes embates ideológicos, temas que dominaram a política nos últimos dois séculos, perderam importância. Hoje, o que importa são questões concretas, relativas ao cotidiano, questões de eficiência administrativa para garantir a qualidade de vida.
É significativo que os protestos no Brasil tenham começado com a reivindicação do passe livre nos transportes públicos urbanos. A questão da mobilidade nas grandes metrópoles é paradigmática da exaustão do modelo produtivista-consumista. A indústria automobilística foi o pilar da industrialização desenvolvimentista e o automóvel o símbolo supremo da aspiração consumista. O inferno do trânsito nas grandes cidades, que se agrava quanto mais bem-sucedido é o projeto desenvolvimentista, é a expressão máxima da completa inviabilidade de prosseguir sem uma revisão profunda de objetivos. Ao que parece, a sociedade intuiu a falência do projeto do século passado antes que o Estado e aqueles que deveriam representá-la – governo e oposição, Executivo, Legislativo e imprensa – tenham se dado conta de que hoje trabalham com objetivos anacrônicos.
A insatisfação difusa dos protestos pode vir a ser catalizadora de uma mudança profunda de rumo, que abra o caminho para um novo desenvolvimento, não mais baseado exclusivamente no crescimento do consumo material, mas na qualidade de vida. Para isso, é preciso que surjam lideranças capazes de exprimir, formular e executar o novo desenvolvimento.
André Lara Resende é economista. Este texto será apresentado na Festa Literária de Paraty (Flip), em debate com o filósofo Marcos Nobre, que ocorre neste sábado.
- Bourne
- Sênior
- Mensagens: 21087
- Registrado em: Dom Nov 04, 2007 11:23 pm
- Localização: Campina Grande do Sul
- Agradeceu: 3 vezes
- Agradeceram: 21 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Agora a critica do Pessoa ao Lara Resende. Bem interessante.
Samuel Pessoa: As manifestações da rua e o direito à meia-entrada
Fonte: http://www.schwartzman.org.br/sitesimon ... lang=pt-br
A interpretação de André Lara Resende sobre as causas do mal estar contemporâneo recebeu algumas críticas, entre as quais a do economista Samuel Pessoa, que transcrevo a seguir:
Simon,
Há três pontos do texto de André que discordo.
Primeiro é considerar que o nacional desenvolvimentismo era “um projeto que combina uma rede de proteção social com a industrialização forçada.” Poderia ser isto na legislação mas certamente não foi isto na prática. Ao longo dos anos 30 até o final dos anos 70 os gastos do Estado brasileiro com as rubricas sociais eram muito pequenos. Não é possível afirmar que um Estado que aceitava taxas líquidas de matrículas de 40% a 30% no ensino fundamental tinha alguma rede de proteção social. Simplesmente não consigo enxergar qualquer rede de proteção social minimamente abrangente antes da redemocratização. A construção de um Estado de bem estar social é um legado da constituição cidadã.
Este ponto é importante pois somente com ele nós entenderemos o papel profundo e essencial e importante que teve a redemocratização no desenho de nossa instituições atuais. Parece-me que André não consegue enxergar esta profunda transformação que ocorreu por aqui depois que nós nos tornamos urbanos e que todos os brasileiros, inclusive os analfabetos (este ponto é muito importante), passaram a votar.
Confesso que quando leio André escrever que o Estado nacional desenvolvimentista “combina rede de proteção social” pensando nas cinco décadas de 30 até 70 lembro-me de minha avó triste com a queda da qualidade educação pública e dos hospitais públicos. Ela não tinha a menor ideia que provavelmente menos de 2% da população era atendida…
Minha segunda discordância refere-se ao parágrafo: “Apesar de extrair da sociedade mais de um terço da renda nacional, o Estado perdeu a capacidade de realizar seu projeto. Não o consegue entregar porque, apesar de arrecadar 36% da renda nacional, investe menos de 7% do que arrecada, ou seja, menos de 3% da renda nacional. Para onde vão os outros 93% dos quase 40% da renda que extrai da sociedade? Parte, para a rede de proteção e assistência social, que se expandiu muito além do mercado de trabalho organizado, mas, sobretudo, para sua própria operação. O Estado brasileiro tornou-se um sorvedouro de recursos, cujo principal objetivo é financiar a si mesmo. Os sinais dessa situação estão tão evidentes, que não é preciso conhecer e analisar os números. O Executivo, com 39 ministérios ausentes e inoperantes; o Legislativo, do qual só se tem más notícias e frustrações; o Judiciário pomposo e exasperadoramente lento.”
Tenho duas discordâncias com relação ao diagnóstico acima. A primeira é que não é verdade de que a maior parte da receita do Estado vai “sobretudo para sua própria operação.” Esta afirmação vai ao encontro das ruas quando estas afirmam que o combate à corrupção e a redução dos desperdícios liberaria recursos para melhorar a qualidade da saúde e da educação. Não concordo com esta afirmação pois, parece-me que não temos no Brasil funcionários públicos em excesso e também, apesar dos salários serem maiores do que a média paga pelo setor privado, não explica o problema. Os gastos excessivos de nosso Estado devem-se à enorme quantidade de benefícios que nosso Estado, por meio do Congresso Nacional, outorga a indivíduos e às enormes amarras legais que há para melhorar a gestão dos serviços públicos básicos de justiça, segurança, saúde e educação. Estes dois pontos, benefícios e amarras legais, são bem diferentes de “sobretudo para sua própria operação.”
A segunda discordância ao diagnóstico de André é que o diagnóstico trata o Estado como se ele fosse uma entidade apartada da sociedade. Infelizmente este não é o caso. Não existe uma pequena classe (ou estamento) de onde se originam os ocupantes do Estado e o resto da sociedade é constituída de pessoas que trabalham que nem escravos para manter a vaca bem alimentada para que não falte leite em seu úbere de onde se alimenta os membros do estamento. É possível que esta fosse uma descrição correta de nossa sociedade no período colonial, ou no império ou mesmo na república velha, ou até mesmo em períodos mais recentes. Após algumas décadas de redemocratização, em que avançamos muito na construção de um Estado relativamente impessoal no qual a ocupação de vagas no serviço público ocorre por meio de concursos públicos bastante concorridos e eficientes na seleção dos melhores candidatos, me parece que a descrição de André não se sustenta. O mesmo se aplica ao legislativo: temos uma democracia vibrante e muito competitiva com livre entrada no jogo da política.
Não há estamento fechado na política. Parece-me que André não se deu conta (e penso que as massas na rua também não se deram conta) é que provavelmente muitos dos que foram às ruas são filhos ou netos de pessoa que recebem pensão por morte vitalícia, por exemplo e outros que recebem e acumulam benefícios. Vários eram funcionários da saúde cuja demanda é que a carreira da saúde se transforme em uma carreira de Estado como as do judiciário (você pode imaginar a consequência desta medida para o gasto público). Outras devem ser filhos de indivíduos com aposentadoria por invalidez ou usufruindo auxílio doença ou seguro desemprego (vários fraudando o programa, isto é, forçando a demissão para ficar algum tempo na informalidade acumulando salário com o benefício). Outros, alguns poucos, devem ter pais que de alguma forma se beneficiam da bolsa empresários do BNDES e alguns outros, também poucos, devem ter pais ou avós que se beneficiam do programa de reparação dos excessos da ditadura (sabemos que apesar da ditadura brasileira ter matado ou torturado uma fração do que se matou ou torturou na Argentina ou no Chile gastamos com reparação um múltiplo do que eles gastam, somente para termos mais um exemplo de como nós mesmos distribuímos de forma pródiga benefícios e vitaliciedades a indivíduos).
Poderia continuar, na linha do texto de Marcos e Zeina, citando os indivíduos que se beneficiam de empréstimos direcionadas com taxas menores do que as de mercado, que são custeados pelos empréstimos mais caros sobre outros ou por poupança forçada (FGTS) sobre outros, pessoas que tiveram uma boa educação no sistema S custeada por impostos sobre a folha de salários de outros ou de pessoas que trabalham no sistema S, etc. Ou seja nós criamos uma infinidades de meias entradas. Minha discordância com André é que é a própria sociedade, e não um estamento apartado da sociedade, que se beneficia das meias entradas. Este erro penso eu é cometido também pelas ruas quando creem que combatendo a corrupção e as ineficiências do Estado sobrará dinheiro para que tenhamos serviços de saúde e educação muito melhores.
O problema é que muita meia entrada introduz ineficiência no sistema e o crescimento se reduz. É isto que Marcos, Zeina e eu chamamos de rent-seeking. Infelizmente não há um grupo pequeno de pessoas, um estamento, que é o beneficiário das transferências e se eu, de alguma forma, conseguir eliminar este grupo (ou os benefícios a este grupo) tudo estaria resolvido. Trata-se de um complexo problema de ação coletiva a lá Mancur Olson. Cada um enxerga o benefício advindo pela sua meia entrada como de primeira ordem. O custo sobre si mesmo e os demais de sua meia entrada é de segunda ordem. Todos querem manter a sua meia entrada e eliminar as dos demais. Um acordo possível, se nós conseguirmos ter instituições de negociação abrangentes, é eliminar as meias entradas de todos. No novo equilíbrio o crescimento se acelera e todos ganhamos. Trata-se de um complexo problema de ação coletiva que, de fato, nossa democracia está resolvendo muito lentamente. Meu otimismo, e neste ponto discordo de Marcos, é que eu avalio que está resolvendo. Acho a regulamentação do fundo de pensão de funcionário público um enorme passo nesta direção. O processo é muito lento e exasperante mas é muito melhor do que tudo que conheço nos quinhentos anos de história dos tristes trópicos.
Esta tendência a criar meia entrada para indivíduos, que desde Faoro sabemos que é constitutiva de nosso Estado, se potencializou com a democratização da sociedade. A democratização pressionou o legislativo a criar meia entrada para todos. De certa forma podemos dizer que a redemocratização tornou a atividade de rent-seeking competitiva e sabemos que rent-seeking competitivo é pior do que monopólio nesta atividade. Evidentemente a democracia também criou fóruns abrangentes de negociação. Se estes funcionarem bem podem contribuir para que a sociedade resolva (ou minore) o problema de ação coletiva associado à meia entrada e acabe reduzindo rent-seeking. Um resultado na direção positiva da redemocratização em reduzir rent-seeking é a intolerância com a inflação. Ou seja, o rent-seeking competitivo pode existir desde que encontre formas mais claras e transparentes (do que a inflação) de financiamento. E quando há formas claras e transparentes de financiamento fica mais fácil resolver o problema da ação coletiva. Este é o motivo que avalio que a agenda mais importante com relação à reforma tributária é elevar a transparência. É a forma de ajudar a sociedade a resolver o problema de ação coletiva.
Penso que na rua podemos localizar duas forças contrárias que provavelmente ocorrem simultaneamente. Por um lado as ruas podem estar dizendo ‘eu quero a minha meia entrada.’ Seria o caso extremo do processo de democratização da meia entrada. Por outro lado, se o sistema político entender bem as dificuldades do desenvolvimento econômico no Brasil hoje as ruas podem ser um embrião de um mecanismo abrangente olsoniano de negociação social de redução das meias entradas para todos com vistas a potencializar o bem estar de todos.
Minha terceira discordância com André está em associar os movimentos das ruas às necessidades de moderar a demanda por crescimento econômico em função das limitações de recursos naturais do planeta. Confesso que tenho muita dificuldade em entender em que ponto as duas agendas se encontram. Acho que o Brasil ainda é um país em que a renda não é muito elevada e as aspirações de todos são por ganhos de renda. O que ocorreu foi que o contrato social da redemocratização bateu em um de seus limites – a incapacidade dele gerar bens de consumo coletivo – e a população apontou o problema aos políticos. Era previsível que este ponto iria chegar em algum momento. Pensava que a agenda da incapacidade do contrato social gerar bens de consumo coletivo ficaria para 2018 mas parece que o tema terá que ser tratado no ano próximo.
Bem, estes eram meus comentários ao texto de André,
O debate econômico no país da meia-entrada
07/07/2013 por mansueto
Fonte: http://mansueto.wordpress.com/2013/07/0 ... a-entrada/
Ao contrário do que costumo fazer, hoje vou escrever para sugerir, enfaticamente, que vocês visitem o site do sociólogo, Simon Schwartzman, e leiam o que Samuel Pessoa (economistas do IBRE-FGV) e colunista da Folha escreveu sobre o artigo do economista André Lara Resende que foi publicado na sexta-feira no Valor Econômico. Vou colocar o link no final deste post, mas antes faço algumas observações.
(...)
- Grifon
- Avançado
- Mensagens: 492
- Registrado em: Ter Out 21, 2008 10:41 pm
- Agradeceu: 1 vez
- Agradeceram: 3 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Desaceleração da China pode ser oportunidade para Brasil
A desaceleração da China preocupa o mundo, que teve no país asiático seu principal motor de crescimento econômico nos últimos anos, mas não deve assustar o Brasil, dizem especialistas.
Ao contrário: se souber explorar as oportunidades geradas pela transição chinesa, o Brasil poderá reduzir a desigualdade qualitativa da relação com o país, seu principal parceiro comercial.
Especialistas ouvidos pela Folha dizem, porém, que, para isso, o Brasil terá de "fazer seu dever de casa".
Isso significa ajustes macroeconômicos e recuperação da infraestrutura para elevar a competitividade, além de mais agressividade para entrar no mercado chinês.
Os planos do governo chinês de ampliar a classe média do país, a fim de mover o foco do crescimento econômico de exportações para o consumo doméstico, criam novos mercados para produtos brasileiros, sobretudo os industrializados.
A pauta de venda do Brasil para a China é dominada por matérias-primas, com pouco espaço para manufaturados. Dos 20 primeiros da lista, 5 não são commodities.
Do outro lado da corrente, os 20 produtos mais vendidos pela China para o Brasil são manufaturados com valor agregado, como máquinas e tecnologias.
Esse desequilíbrio mudará se a indústria brasileira souber aproveitar o potencial de consumo chinês, diz Claudio Frischtak, consultor do CEBC (Conselho Empresarial Brasil-China).
"Se o governo chinês for bem-sucedido no processo de expansão da classe média, e a probabilidade é grande, a primeira implicação para o Brasil é a diversificação de sua pauta de exportação."
Para Frischtak, é uma conclusão óbvia, já que os gostos dos emergentes chineses não serão diferentes das classes médias de outros países.
Um exemplo citado por ele é o setor de cosméticos, dos quais o Brasil é um grande produtor, mas tímido exportador para a China.
O discurso do governo chinês é que a economia deve ser mais dependente do consumo interno e menos das exportações, mesmo que a consequência seja um crescimento mais moderado.
Um dos sinais dessa desaceleração (provocada também por fatores externos, como a menor demanda de países emergentes e desenvolvidos) é que as importações chinesas recuaram 0,7% em junho. As exportações caíram 3,1% na maior queda desde dezembro de 2009.
Ex-embaixador da China no Brasil, Chen Duqing diz não acreditar numa desaceleração abrupta que afete a economia brasileira. Ele lembra que a China "tem uma demanda rígida" por commodities e prevê que o volume de importação não deve cair.
Chen concorda que é o momento de diversificar a pauta de exportações brasileiras para a China. Mas afirma que isso depende tanto da ação mais efetiva do governo para promover o país como de um espírito empreendedor do setor privado.
"Tem coisa que não dá para fazer pela internet. Tem de vir para cá e fazer amizade."
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/20 ... asil.shtml
- knigh7
- Sênior
- Mensagens: 18928
- Registrado em: Ter Nov 06, 2007 12:54 am
- Localização: S J do Rio Preto-SP
- Agradeceu: 2006 vezes
- Agradeceram: 2543 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/20 ... -ano.shtml13/07/2013 - 03h00
Bancos públicos já preveem PIB abaixo de 2% neste ano
VALDO CRUZ
SHEILA D'AMORIM
de Brasília
Em um cenário de desaceleração da economia --reforçado ontem pelo Banco Central, que apontou retração da atividade em maio-- e com a perspectiva de que os dados de junho mostrarão impacto negativo das manifestações no país, bancos oficiais já trabalham com uma perspectiva de crescimento abaixo de 2% neste ano.
O dado não é divulgado oficialmente, mas a Folha apurou que ele está sendo incorporado nos modelos de análise de risco usados para a concessão de grandes operações de crédito.
O número é importante para avaliar a capacidade de geração de fluxo de caixa em determinados setores tomadores de empréstimos.
O indicador de atividade do Banco Central (IBC-Br) apontou recuo na economia de 1,4% em maio em relação a abril, abaixo do esperado pelo mercado financeiro e o pior resultado desde 2008.
No período acumulado de 12 meses, o crescimento medido pelo índice do Banco Central é de apenas 1,89%.
Para Mauro Rochlin, professor de economia do Ibmec, o dado deixa claro que, "de fato, a economia brasileira está com taxas muito próximas de uma estagnação".
MANIFESTAÇÕES
Apesar disso, o resultado não foi considerado surpreendente dentro do governo. A equipe econômica já esperava um número ruim. A maior preocupação atualmente é com o resultado de junho, que deverá mostrar o impacto das manifestações por todo o país na economia.
O ministro Guido Mantega (Fazenda) foi alertado pelos varejistas para o fato de que as vendas na segunda quinzena de junho foram muito afetadas pelas manifestações, que provocaram o fechamento do comércio em várias partes do país. Mas os técnicos do governo ainda tentam mapear o tamanho do estrago.
O receio é que, se concretizado um impacto maior em junho, o PIB (Produto Interno Bruto) do segundo trimestre do ano será ruim. E, com isso, a recuperação da economia na segunda metade do ano poderá não ser tão boa como espera o governo, afetando diretamente o ânimo dos empresários, principalmente para investir.
A recuperação dos investimentos é a aposta da equipe econômica para sustentar o crescimento neste ano e em 2014, quando a presidente Dilma tentará se reeleger.
Ontem, Mantega se reuniu com empresários e investidores para ouvir as inquietações e tentar convencê-los a não abandonar a agenda investimentos.
Para Rochlin, porém, sem crescimento, isso não será tarefa fácil. "Tivemos um crescimento mais alto em abril e queda em maio, essa trajetória errática confunde. Não há uma estabilidade dos índices e isso retrai investidores."
Segundo ele, "é consagrado" o papel das expectativas para retomada de investimento.
"O governo não tem sido capaz de despertar o espírito animal nos empresários. Os passos que ele toma não trazem segurança."
- knigh7
- Sênior
- Mensagens: 18928
- Registrado em: Ter Nov 06, 2007 12:54 am
- Localização: S J do Rio Preto-SP
- Agradeceu: 2006 vezes
- Agradeceram: 2543 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/20 ... tral.shtml12/07/2013 - 08h39
Economia brasileira recua 1,4% em maio, maior queda desde 2008, diz BC
A economia brasileira registrou em maio uma retração pior do que a esperada, pressionada pela fraqueza da produção industrial e indicando que a recuperação da atividade ainda não deu sinais consistentes.
O IBC-Br (Índice de Atividade Econômica do Banco Central), considerado espécie de sinalizador do PIB (roduto Interno Bruto), registrou queda de 1,4% em maio ante abril, de acordo com dados dessazonalizados (livres de influências típicas de cada período do ano), informou o BC nesta sexta-feira (12).
A queda mensal foi a maior registrada desde dezembro de 2008, quando o indicador recuou 4,31%.
O resultado anulou a alta vista em abril, quando houve crescimento de 0,96% (número revisado ante avanço de 0,84%).
A queda foi bem pior que a mediana das 17 projeções de analistas consultados pela agência Reuters, que mostrava queda mensal de 0,90% em maio. As estimativas variaram de retração de 1,60% a 0,30%.
O resultado também foi pior que o projetado por 14 instituições consultadas pelo Valor. A média das projeções sugeria retração de 1,1%. O intervalo de estimativas variava de queda de 0,5% a retração de 2%.
Na comparação com maio de 2012, o IBC-Br avançou 2,61% e acumula em 12 meses alta de 1,89%.
INDÚSTRIA
O desempenho da indústria exerceu forte peso sobre a economia em maio, uma vez que recuou 2% ante o mês anterior principalmente com a piora nos bens de capital, uma medida dos investimentos.
As vendas no varejo, por sua vez, não conseguiram atenuar o efeito negativo da indústria, já que mostraram estabilidade em maio ante abril, destacando a debilidade do consumo no país, abalado pela inflação alta, num setor que vinha sendo o motor da economia.
As expectativas do mercado para a expansão do PIB já deixaram para trás há tempos o patamar de 3%.
Ao mesmo tempo, na última quarta-feira, o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC elevou em 0,5 ponto percentual o juro básico do país para 8,50% ao ano, diante da necessidade de combater a inflação elevada.
METODOLOGIA
O indicador do BC leva em conta a trajetória das variáveis consideradas como bons indicadores para o desempenho dos setores da economia (agropecuária, indústria e serviços).
A estimativa do IBC-Br incorpora a produção estimada para os três setores acrescida dos impostos sobre produtos.
O PIB, por usa vez, é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país durante certo período.
- Paisano
- Sênior
- Mensagens: 16163
- Registrado em: Dom Mai 25, 2003 2:34 pm
- Localização: Volta Redonda, RJ - Brasil
- Agradeceu: 649 vezes
- Agradeceram: 285 vezes
- Contato:
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
"85% dos economistas merecem ser condenados à prisão perpétua e, depois de cumprida esta pena, merecem ser fuzilados." (Royalties by Jornalista Helio Fernandes)
"Jornalismo econômico no Brasil, não é uma coisa, nem outra." (Royalties by Delfim Netto)
"Jornalismo econômico no Brasil, não é uma coisa, nem outra." (Royalties by Delfim Netto)
- LeandroGCard
- Sênior
- Mensagens: 8754
- Registrado em: Qui Ago 03, 2006 9:50 am
- Localização: S.B. do Campo
- Agradeceu: 69 vezes
- Agradeceram: 812 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
Resumindo, temos que fazer algumas coisas, e estas coisas tem que ser certas.Grifon escreveu:Desaceleração da China pode ser oportunidade para Brasil
.
.
.
Especialistas ouvidos pela Folha dizem, porém, que, para isso, o Brasil terá de "fazer seu dever de casa".
.
.
.
Esse desequilíbrio mudará se a indústria brasileira souber aproveitar o potencial de consumo chinês, diz Claudio Frischtak, consultor do CEBC (Conselho Empresarial Brasil-China).
.
.
.
Chen concorda que é o momento de diversificar a pauta de exportações brasileiras para a China. Mas afirma que isso depende tanto da ação mais efetiva do governo para promover o país como de um espírito empreendedor do setor privado.
.
.
.
Ou seja: Dançaremos mais uma vez .
Leandro G. Card
- Wingate
- Sênior
- Mensagens: 5130
- Registrado em: Sex Mai 05, 2006 10:16 am
- Localização: Crato/CE
- Agradeceu: 819 vezes
- Agradeceram: 239 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
É aí que a coisa empaca de vez...tratando-se de nossos políticos, "nobody shives a git"!Especialistas ouvidos pela Folha dizem, porém, que, para isso, o Brasil terá de "fazer seu dever de casa".
Wingate
- Boss
- Sênior
- Mensagens: 4136
- Registrado em: Ter Ago 10, 2010 11:26 pm
- Agradeceu: 103 vezes
- Agradeceram: 356 vezes
Re: MOMENTO ATUAL DA ECONOMIA BRASILEIRA
A indústria tem sua culpa. Imagino que todos saibam que a CNI e mesmo outros grupos de industriais, não sejam pobres coitados sem poder algum de forçar as coisas no Congresso ou com o Planalto... Ouso dizer que são o grupo com mais fácil acesso ao Planalto.
Ela mesma ajudou a criar e ajuda a manter essa bolha que estamos, de pouca inovação e protecionismo. Só ver como a CNI e outras federações atuam. Parecem satisfeitas com as medidas do governo, já que se estivesse mesmo nessa situação de desmanche, era para suas atuações serem muito mais agressivas. A última vez vi alguma coisa delas na TV, foi da FIESP, a favor do governo. A FIEMG nem se pronuncia.
Por isso acho que é muito difícil abrir o mercado aqui, ou mesmo sair do Mercosul, porque ele ajuda nessas coisas.
Vai precisar de alguém que chegue quebrando as pernas de muita gente, de muitos esqueletos que guardamos no armário.
Ela mesma ajudou a criar e ajuda a manter essa bolha que estamos, de pouca inovação e protecionismo. Só ver como a CNI e outras federações atuam. Parecem satisfeitas com as medidas do governo, já que se estivesse mesmo nessa situação de desmanche, era para suas atuações serem muito mais agressivas. A última vez vi alguma coisa delas na TV, foi da FIESP, a favor do governo. A FIEMG nem se pronuncia.
Por isso acho que é muito difícil abrir o mercado aqui, ou mesmo sair do Mercosul, porque ele ajuda nessas coisas.
Vai precisar de alguém que chegue quebrando as pernas de muita gente, de muitos esqueletos que guardamos no armário.
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL