Até certo ponto as nossas FA's também tem culpa pela falta de continuidade dos programas de sistemas de armas nacionais, por não compreenderem que sem inimigos externos evidentes sua função–fim jamais sensibilizará a sociedade (e portanto os políticos), fora meia dúzia de entusiastas como nós que nada representam. E elas não aprenderam mesmo ao longo das décadas a focar em outros aspectos que possam ter maior apelo político, como fazem as FA’s de outros países.sapao escreveu:Concordo inteiramente, posso falar do A-1 que conheço um pouco.
Com a falta de continuidade teve maquinario ficando as moscas, quem fosse na CELMA dava vontade de chorar...
Por causa disso muitas pessoas quebraram, outras se viraram como puderam. Por isso quando falam de END e planos mil para Defesa, sempre pergunto: Quem vai garantir a verba? Porque esse tipo de coisa não se sustenta em empresa estatal (pelo menos não por aqui) e se não se tem uma promessa de continuidade ninguem vai querer entrar no negocio.
Pergunta para quem ja foi da CELMA se eles querem saber de parceria com o governo?
Ou melhor, de colocar todas suas fichas em um projeto EXCLUSIVO do governo?
E a AEROELETRONICA? A MECTRON?
Vão colocar um monte de clausulas, e estão certos.
O pessoal da CELMA teve que se virar até ser privatizada, e hoje está ai.
O pessoal da MECTRON teve um tempo que fabricava maquina de fralda, e a AEROELETRONICA dispositivo para controle de horario de frota veicular...
Defesa não é prioridade politica no Brasil, vamos vivendo de fases em que temos verbas e outras que não temos verbas, fazendo compras de prateleira para não ficar morrendo de tetano e tentando encaixar nossos projetos em outros que tem projeção politica (SIPAM, Pre-Sal, Calamidades publicas, PAC) para tentar tirar uma casquinha de dinheiro e tentar tocar a vida vegetativa minima operacional dos unidades, e acho que não falo só da FAB.
Perguntem ao MU que acho vislumbrou isso lá atrás, e ao NJ que está começando a perceber isso...
Explico: Em praticamente todos os programas de aquisição de sistemas para nossas FA’s o enfoque é sempre no equipamento em si, que deve suprir uma dada necessidade da força para que esta possa cumprir sua missão. Mas como a missão básica em princípio é enfrentar inimigos e estes não podem sequer ser apontados, para o poder político suprir a necessidade imediata da força tem sempre uma prioridade muito baixa, e daí vem as falhas de continuidade que já viraram rotina.
Mas, e se o foco fosse diferente? Se ao invés de colocar a necessidade do meio/sistema como foco, fosse colocada a capacidade de suprir localmente a necessidade se e quando ela realmente se apresentar? Por exemplo, se ao invés da MB dizer que precisa de 30 escoltas ela colocasse que o país (e não necessariamente a força) precisa manter a capacidade de projetar, construir e operar escoltas atualizados, caso eles venham a ser necessários? Se ao invés de dizer que precisa de 3000 Uruvecos o EB disser que o Brasil precisa poder desenvolver e construir seus próprios veículos blindados para o caso de surgir a necessidade? E se ao invés de falar em N caças para guarnecer M bases aéreas a FAB dissesse que precisa que o país mantenha a capacidade de projetar e construir aviões de combate válidos para os cenários atuais? Nestes casos (e em muitos outros que se pode imaginar) o que as forças armadas estariam solicitando aos políticos em última instância não seriam os equipamentos, mas a infra-estrutura tecnológica e industrial necessária para produzi-los, com os respectivos engenheiros, técnicos, equipamentos, etc... . Esta infra-estrutura poderia pertencer ao próprio governo ou a empresas privadas, isto é indiferente, desde que para garantir seu funcionamento, os empregos que gerassem e os eventuais ganhos econômicos que produzissem elas fossem mantidas sempre ocupadas.
É para mim muito difícil imaginar qualquer político se mexendo ou mesmo perdendo uma hora de sono sequer por estar preocupado que a Marinha não tenha navios aptos a enfrentar ameaças modernas, ou a FAB aviões capazes de sobreviver ao encontro com caças inimigos. Mas para garantir uma fábrica em seus municípios ou estados que gere empregos, riqueza e prestígio (e eventualmente até cargos comissionados ou propinas, esta sempre seria uma esperança deles), aí eles se mexem sim, e muito! Como exemplo basta ver como o governo federal favorece a Embraer, como o de Minas Gerais luta pela Helibrás (que nem sequer é uma empresa nacional) e como o prefeito de SBC está se movimentando para atrair para seu município as empresas que disputam o FX (que em princípio nem vão montar fábrica nenhuma!). Este tipo de coisa, mudar o enfoque da defesa em si para o setor industrial, pode parecer estranho e até sacrilégio para muitos entusiastas, mas é uma das coisas mais comuns em países desenvolvidos ou em desenvolvimento com capacidades militares razoáveis, e explica como estes países (ou grupos de países no caso da UE) conseguem manter seus investimentos no setor e suas capacidades militares atualizadas mesmo em tempos de paz, embora seus políticos não sejam diferentes dos nossos. Uns poucos países parecem ter abandonado esta estratégia (o exemplo mais clássico talvez seja o da Inglaterra), e como resultado viram suas capacidades militares declinarem de forma lastimável.
Mas existe uma grande dificuldade para implementar este modelo no Brasil, e ela não está nos políticos nem nos aspectos econômicos, e sim nas próprias forças armadas. Por falta de tradição, para elas é extremamente difícil mudar o enfoque da sua operação (função-fim) para a idealização de novos sistemas (função-meio), pois desde sempre estes foram especificados de acordo com doutrinas que eram definidas ANTES que os equipamentos fossem escolhidos (isto ocorria e ocorre em grande parte porque as doutrinas de nossas FA’s são basicamente copiadas de doutrinas estrangeiras e apenas adaptadas). Agora seria necessário fazer o contrário, os conceitos doutrinários precisariam ser definidos não antes mas conjuntamente com os equipamentos e sistemas a serem adquiridos, levando em conta a capacidade do país de produzir estes últimos. Isto exigiria um esforço real dos militares em pensar na doutrina como algo eminentemente prático e não com enfoque puramente teórico, e isso é uma mudança de paradigma que não sei se nossas FA’s seriam capazes de fazer.
Abraços,
Leandro G. Card