Valor Economico/Notimp de hoje
Crise e aperto fiscal afetam modernização das Forças Armadas
Daniel Rittner
A crise econômica e a queda da arrecadação tributária ameaçam transformar em peça de ficção os planos de reaparelhamento e modernização das Forças armadas, que ganharam impulso com a Estratégia Nacional de Defesa, divulgada em dezembro. Os investimentos para a compra e a reforma de armamentos chegaram a ser contingenciados em até 47% neste ano, comprometendo o planejamento dos militares. Para 2010, em meio à lenta recuperação da economia, os três comandos estão pedindo um orçamento que excede em até oito vezes os níveis atuais de investimentos.
O Exército foi o primeiro a detalhar, em novo documento, seus planos de reaparelhamento e modernização para as próximas duas décadas. Preocupado com a "ocorrência de ações" que podem deixá-lo em situação de "acentuada visibilidade" na Copa do Mundo - e, possivelmente, nas Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro -, o Exército estima a "necessidade emergencial" de aplicar pelo menos R$ 2 bilhões todos os anos, até 2014. "O caráter de emergência decorre do acentuado índice de indisponibilidade e do elevado grau de sucateamento que atingem todo o Exército", diz o documento, intitulado "Estratégia Braço Forte".
As restrições orçamentárias indicam um cenário bem menos promissor para os generais. Quase todos os contratos de defesa têm financiamentos de longo prazo, o que ameniza o problema da imediata escassez de verbas, mas o pagamento das parcelas sai do orçamento anual das Forças armadas. Os recursos do Exército para 2009, já incluindo crédito especial para a construção do QG do Comando Militar do Planalto, alcançam R$ 458 milhões. No entanto, diante da queda de receitas tributárias com a crise, o governo deixou R$ 148 milhões contingenciados.
A tesoura nos orçamentos militares contraria a espinha dorsal da estratégia de defesa: o fortalecimento da indústria brasileira de armamentos. O plano de reaparelhamento do Exército fala em priorizar "a progressiva nacionalização e as aquisições no mercado interno", com o desenvolvimento tecnológico de sistemas e produtos, como a viatura Urutu III, pertencente à nova família de blindados do comando.
Com o dinheiro sendo liberado pouco a pouco, torna-se mais difícil comprometer o setor privado com o desenvolvimento de projetos, argumenta Jairo Cândido, diretor do Departamento da Indústria de Defesa da Fiesp. "A indústria de defesa é diferente de outros setores. Os projetos nascem em parceria com as empresas e elas não podem se envolver em um programa que não seja prioritário para as Forças armadas e sem compromisso de compra ao fim desse projeto", afirma ele.
Como não há previsibilidade sobre as liberações de orçamento, Cândido nota que os militares ficam sujeitos à tentação de comprar apressadamente novos equipamentos, mesmo que seja no exterior, a fim de evitar que os recursos se percam ao término do ano fiscal. "E aí prevalece a lei do mínimo esforço: comprar um equipamento pronto em vez de desenvolver um projeto nacional de longo prazo", complementa.
A Estratégia Nacional de Defesa, preparada pelo ministro Nelson Jobim (Defesa) e pelo ex-ministro Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos), listava 22 iniciativas - projetos de lei, decretos e planos internos - que o governo se comprometia a tomar até fim de 2010. Do total, 20 ações estavam previstas para encaminhamento até junho de 2009, mas o ministério não divulgou nenhuma delas.
Entre as medidas estava a criação de um regime jurídico especial para a indústria nacional, viabilizando incentivos tributários e desamarrando-a da Lei de Licitações. Também havia a previsão de uma proposta para garantir, de forma continuada, a alocação de recursos orçamentários sem os riscos de contingenciamento. Procurado há duas semanas, o Ministério da Defesa não informou o estágio das ações.
"É preciso alocar recursos para as Forças armadas e saber que se pode contar com essas verbas", afirma o pesquisador de assuntos militares Expedito Bastos, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Ele cita como exemplo o Chile, que vincula 10% de suas receitas com a exploração do cobre a investimentos nas Forças armadas. "Por isso, elas conseguem manter-se no topo tecnológico", diz. No Brasil, cabe à Marinha, conforme a Lei do Petróleo, fatia de 15% dos royalties sobre a produção de óleo em plataformas continentais, mas foram bloqueados mais de R$ 3 bilhões desde 1997.
A Marinha foi contemplada em 2009 com um orçamento de R$ 544 milhões para programas de reaparelhamento e modernização - volume 18% superior ao do ano passado -, mas os recursos efetivamente disponíveis caíram para R$ 355 milhões após o contingenciamento definido para arrumar as contas do governo.
Em plano de reaparelhamento recém-concluído, foram definidas oito prioridades. Elas incluem submarinos e torpedos - projeto que abrange a compra de quatro submarinos franceses e a conclusão do primeiro submarino nuclear brasileiro -, helicópteros, a modernização do porta-aviões São Paulo e navios-patrulha para emprego na Amazônia e no Pantanal.
O plano tem um horizonte de 21 anos, aponta projetos necessários para "proporcionar a capacidade plena de cumprir as tarefas básicas do poder naval" e está estruturado na "priorização da indústria nacional de material de defesa e na redução da indesejável dependência externa". Para o primeiro ano de vigência, em 2010, prevê-se um investimento de R$ 4,7 bilhões. Parece algo pouco factível, já que soma oito vezes e meia o orçamento deste ano, sem levar em conta o contingenciamento.
Para o professor da UFJF, os comandos às vezes funcionam como "ilhas fora da realidade" ao elaborar esse tipo de plano.
"Como podemos convencer a sociedade de que é necessário ter um submarino nuclear se ela não se sente bem atendida nos postos de saúde mais básicos?", questiona Bastos. Ele elogia os conceitos da Estratégia Nacional de Defesa, mas acentua: "É uma carta de intenções, que precisa ser executada, mesmo que parcialmente".
A FAB busca implementar um plano com investimento anual de R$ 1,5 bilhão. O Centro de Comunicação Social da Aeronáutica (Cecomsaer) informou que as prioridades são os projetos "ora em andamento", como a aquisição dos helicópteros franceses de multiemprego EC725, os helicópteros de ataque russos MI-35 e bilionário programa F-X2, para a compra de um lote inicial de 36 caças, que "representa alta prioridade devido aos aspectos estratégicos que lhe são inerentes".
A Fiesp acredita que, no segundo semestre, estará pronto um projeto de lei complementar discutido com o governo para mudar o artigo 24 da lei 8.666/93, dando mais flexibilidade na dispensa de licitação para produtos de defesa. A federação também reivindica tratamento tributário isonômico em relação a fornecedores estrangeiros, que têm isenção fiscal nas vendas ao governo.
Cândido, da Fiesp, avalia que "há uma pauta grande de assuntos para serem enquadrados em uma série de novas legislações", mas enaltece a Estratégia Nacional de Defesa. Para ele, é a primeira vez em que o tema é tratado como política de Estado, não de governo. O diretor acredita que o caso dos caças do F-X2 e o dos submarinos franceses demonstram o comprometimento em negociar transferência de tecnologia e estabelecimento de parcerias comerciais. "Há uma mudança de postura do Ministério da Defesa e das Forças armadas. Acho que estamos andando."
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O sr. EBastos,faz uma análise correta e ai vem e solta uma frase dessas,é brincadeira...

Assim não dá.
Comandos vão redistribuir tropas
As Forças armadas preparam uma redistribuição espacial de suas tropas. O Comando da Aeronáutica resolveu abrir, nos próximos anos, sua primeira base permanente na região Norte. Será em Manaus e terá uma frota de caças F-5, modernizados pela Embraer, para dar combate imediato a qualquer ameaça em território amazônico. No comando da Infraero até agosto, o tenente-brigadeiro Cleonilson Nicácio da Silva acaba de concluir uma espécie de "permuta" com a FAB.
Em troca de um terreno para a expansão do aeroporto de Florianópolis, cederá áreas no aeroporto de Manaus para a construção da nova unidade militar. Uma segunda pista de pouso e decolagem, a ser construída em cerca de quatro anos, servirá tanto à aviação comercial quanto os caças, informou Nicácio, que assume no mês que vem o Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA), em São José dos Campos, um dos principais postos da Aeronáutica. O brigadeiro deverá ser substituído por Murilo Barbosa, chefe de gabinete do ministro da Defesa, Nelson Jobim.
O Exército, no documento "Estratégia Braço Forte", detalha os seus planos de redistribuição. Foram criados dois programas - Amazônia Protegida e Sentinela da Pátria - , que aumentarão o contingente de soldados e oficiais. O primeiro programa visa fortalecer a presença militar terrestre na região e ampliar a vigilância e o monitoramento das fronteiras amazônicas. Serão implementados 28 novos pelotões especiais de fronteira. Eles se somarão aos 21 existentes, que passarão por uma modernização.
O programa Sentinela da Pátria prevê o reforço das estruturas operacional e logística dos comandos militares de área. Inclui basicamente projetos relacionados à transferência, transformação e implantação de unidades. No curto prazo, até 2014, destacam-se os projetos em andamento de implantação da brigada de operações especiais em Goiânia, a transferência da 2ª brigada de infantaria de selva para São Gabriel da Cachoeira (AM) e a reestruturação da força de blindados.
No médio prazo, o programa contempla a transferência da brigada de infantaria Paraquedista para Anápolis (GO) e sua substituição, no Rio, por uma de infantaria leve. Haverá ainda criação de novas unidades de aviação (em Manaus e Campo Grande) e antiaérea (Brasília).
Na Marinha, as mudanças abrangem a criação de uma segunda esquadra e de uma divisão anfíbia no Norte/Nordeste, que também ganharão uma nova base naval. No geral, a Estratégia Nacional de Defesa sugere uma redistribuição territorial que permita o rápido deslocamento das tropas por todo o território brasileiro. A partir dos planos elaborados para cada um dos três comandos, o Ministério da Defesa proporá à Presidência da República um projeto de lei de equipamento e de articulação da Defesa Nacional. (DR)
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Sds