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Mensagem
por Izaias Maia » Qui Jun 04, 2009 11:51 am
Armadilhas na rota da Europa
Empresas pressionam por economia em trajetos conhecido pelos seus riscos Não há esperança de encontrar passageiros vivos, admite a Air France a parentes Localizados novos destroços e mancha de óleo de 20 km na área do desastre
Marcelo Ambrosio
BRASÍLIA
A travessia aérea sobre o Oceano Atlântico rumo à Europa tornou-se uma rota de grandes riscos impostos a passageiros e tripulações. Além de tempestades súbitas e de rara magnitude - comuns no caminho do Airbus da Air France que desapareceu enquanto ia do Rio para Paris - há uma pressão implícita das companhias aéreas para evitar a alteração de rotas, informa o Sindicato Nacional dos Aeronautas. Ontem foi um dia de luto: a direção da Air France descartou a possibilidade de achar sobreviventes entre os passageiros do voo 447. Os aviões de busca encontraram destroços maiores da aeronave e identificaram um rastro de 20 km de óleo na região da queda. Em Paris, as vítimas foram lembradas em missa na Catedral Notre Dame. No Rio, está programado para hoje um culto ecumênico na Igreja da Candelária, com a presença do chanceler da França, Bernard Kouchner.
Os riscos na travessia do Atlântico
Tempestades súbitas e de rara magnitude, pressão por economia de consumo e tripulação menor influem
A aviação é considerada segura, mas não isenta de riscos. E a travessia aérea sobre o Oceano Atlântico para o continente europeu é um exemplo de que há fatores com os quais os passageiros e tripulações não contam. Usuário habitual da rota Rio–Paris, o escritor Paulo Coelho lançou ontem um alerta em seu Twitter a respeito da possibilidade de os pilotos que utilizam as quatro aerovias sofrerem pressões de companhias aéreas para evitarem desvios de rota que possam aumentar o custo da operação. O escritor cobrava o fato de o voo AF447 não ter desviado a rota, apesar da indicação de mau tempo.
"Há dois anos, durante a Copa do Mundo, eu estava no lobby de um hotel na Alemanha conversando com dois pilotos. Eles levantaram o tema: muitas vezes evita-se contornar as CBs (Cumulus Nimbus, as temíveis nuvens de tempestades) para economizar combustível. Acredita-se que o avião resista. Normalmente resiste", diz Coelho, em nota ao blog de Mauricio Stycer.
Consultado pelo JB, o diretor de segurança do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Carlos Camacho, diz que não há denúncias, mas confirma que existe uma pressão implícita das empresas aéreas nacionais para evitar a alteração de rotas, que os pilotos seguem mais por complacência do que por obrigação. No caso das companhias francesas, ainda segundo Camacho, como as entidades sindicais atuam pesado, essa pressão dificilmente ocorreria.
Análise é do piloto
Para o diretor de segurança e os pilotos consultados, o aviador é que faz a análise de cada situação, de acordo com sua convicção. É o chamado Pilot Discreption.
– Sabemos que existe a pressão, mas ela não é declarada – disse Camacho, antes de fazer alusão a um incidente similar relatado por outro comandante. No caso, um piloto brasileiro procurou o sindicato anteontem para contar que havia passado pela mesma situação de "forte pauleira" na região do acidente, e que se livrou um minuto depois da pane geral ter ocorrido, (com apagamento total dos painéis) porque o problema se deu já na saída da turbulência. Se fosse no início da tempestade ou da área de turbulência, segundo ele, poderia ter ocorrido uma tragédia. O avião era do mesmo modelo do usado no voo AF447.
Outra característica da travessia transatlântica é a possibilidade de encarar uma tempestade mais violenta na área do Equador, conhecida com Zona de Convergência Intertropical. Tormentas são comuns esta época do ano ali, mas podem ganhar força nunca vista. Radares de bordo, por mais desenvolvidos que sejam, dão indícios ao cockpit mas não são precisos para o julgamento, por exemplo, da espessura da massa de mau tempo adiante. As ondas emitidas encontram a precipitação interna nos CBs e as refletem como barreira. A leitura correta depende da combinação desse dado com outros conhecimentos e a habilidade na percepção visual a partir do clarão dos raios. No caso do Airbus, ocorreu a coincidência de a rota programada coincidir com a área de maior intensidade no momento da passagem. As CBs podem ter chegado a 15 km de altitude. O jato voava a 11 mil metros de altura.
Uma terceira circunstância envolvendo a travessia é a forma de escalação das tripulações. Quando há o sistema de escala de revezamento, dois comandantes e dois copilotos conduzem o jato durante o percurso, alternando horários de trabalho e de descanso. No caso do AF447, o comandante Marc Dubois, 58 anos, 11 mil horas de voo, 1.700 no A330, dividia o manche com dois copilotos, um deles com 6.600 horas e 2.600 na mesma aeronave e o outro com 3 mil horas, 800 no A330.
De acordo com profissionais de aviação com muito tempo nessa travessia, a escala Composta faz com que, às vezes, o comandante mais experiente assuma a decolagem e, depois do jantar, passe para um dos co-pilotos, denominado Cruise Captain – capitão de cruzeiro – e vá descansar no "sarcófago", logo atrás da cabine. Com isso, em situações críticas, o oficial com maior capacidade pode não ser quem está nos controles. Nessa tragédia, é uma informação que dificilmente se terá.