SEIS HORAS - parte 15
Gabinete da Presidência
- Prossigo então com a América do Sul, que é o que realmente nos interessa. Bem, a crise originada no sistema financeiro norteamericano teve reflexos imediatos, curiosamente, nos países que mais confrontavam Washington: a Venezuela foi duramente abalada pela queda brutal dos preços de sua principal commodity, o petróleo, e entrou numa recessão mortal para sua incipiente economia, mais e mais dependente dos ‘malditos ianques’, por paradoxal que isso possa parecer. A pobreza se alastrando, começaram os inevitáveis conflitos de rua, com as massas pauperizadas exigindo condições de sobrevivência que o Estado não tinha mais como proporcionar. O então Presidente Chávez considerou o momento como ideal para instaurar em definitivo sua ditadura de viés socialista mas, como todos sabemos, esqueceu-se dos Militares: poucas horas antes de dar início à seqüência de eventos que culminaria com a consecução de seus objetivos, todas as armas que o garantiriam, ou seja, as das milícias, e que estavam guardadas nos quartéis, foram retidas. O então Presidente se encontrava no Palácio Miraflores, que foi cercado por tropas apoiadas por tanques. As rádios e estações de TV foram ocupadas por soldados. O objetivo, no entanto, era Chávez. Os Militares contavam com que ele não se rendesse pacificamente, deveria ao menos tentar uma resistência simbólica. - aciona um novo slide. Aparece o Palácio Miraflores, labaredas saindo de uma das janelas.
- Bem, ele o fez. Enquanto as lideranças que o apoiavam eram sistematicamente presas ou mortas – sim, foi o golpe mais cruento que já se viu neste continente – as forças insurgentes avançavam sobre o Palácio. Ele resistiu com sua guarda presidencial. Foi abatido empunhando um AK-47 que lhe havia sido presenteado por Fidel Castro, o falecido ditador Cubano. Caso análogo ao do Chile nos anos setenta. Houve rumores que na verdade teria se rendido e só então sido morto, para prevenir que não voltasse como em 2002. Os Militares dessa vez não queriam cometer erros. Ao fim de três dias, milhares de pessoas haviam sido mortas, em combate ou simplesmente assassinadas pela feroz repressão que se seguiu ao golpe.- novo slide, manchete do Correio Braziliense:
EUA RECONHECEM O NOVO GOVERNO VENEZUELANO
Washington – o Secretário de Estado dos EUA, General Chambers, declarou hoje o reconhecimento formal do novo governo da Venezuela, acrescentando que “nos congratulamos com nossos irmãos militares da Venezuela por terem tido a coragem de livrar o nosso continente da chaga comunista que já lhe fincava as garras ensangüentadas.”
- Mas os milicos de lá não deram a mínima para os americanos, escaldados que estavam de 2002. Pediram uma audiência tão rápido quanto possível da Junta Militar inteira com nosso então Presidente, Aécio Neves, que a concedeu em regime de urgência.
“Claro – pensou o Chileno – dessa vez eram VOCÊS que estavam por trás do golpe, pensa que eu não sei?”
- Das conversações aqui em Brasília emergiu o nosso reconhecimento do novo governo, sob condições que permitissem a estrita observância dos Direitos Humanos e da propriedade privada na Venezuela, o que tem sido mais ou menos cumprido. Em linhas gerais, o status quo de lá nos é satisfatório, têm havido consistentes progressos.
“Mas é muita cara de pau, aquilo lá está virado num inferno, manda quem pode e obedece quem tem juízo. É pena que alguém tão capaz quanto o Paisano faça parte de um governo de m* que nem esse, tendo que explicar o inexplicável, justificar o injustificável.”
- Mas não houve problemas apenas na Venezuela, havia países, ou melhor, regimes que dependiam dela. A Bolívia, por exemplo. O então Presidente Evo Morales, privado de sua mesada em petrodólares, perdeu as poucas condições que tinha para se manter no poder. A guerra civil campeou solta e o país se dividiu em várias frações, algumas com arremedos de governos constituídos e outras simplesmente sob o domínio dos ’Warlords’ locais. Chegamos a comandar uma força de capacetes azuis para tentar dar alguma estabilidade à região mas a Bolívia não é o Haiti, foram tantas emboscadas e ataques que a ONU determinou a retirada. Então, hoje temos aí os nossos Bálcãs exportando refugiados e...
- Aliás, tema para uma conversa reservada que gostaria de ter mais tarde com o senhor, Presidente. – interrompe o Presidente Orestes.
- Sem problemas, senhor Presidente. “Agora vem a parte suja, o imperialista FDP vai querer me meter em alguma confusão...”
Novo slide. Aparece a usina de Itaipu. Muitos soldados e tanques Brasileiros em volta.
- O Paraguai nos causou problemas maiores ainda, resolveram sair do aperto financeiro em que estavam através de um golpe de força. Esqueceram apenas que não éramos mais governados pelo PT, então...mil perdões...- toca o celular do Ministro, que o atende.
- Alô. Sim, sou eu. Ah, Governador, quanto prazer. É, sei, ocorre que agora estou numa reunião. Ah, sim, Manaus, bela cidade, progressista e...Manaus O QUÊ??? Meu Deus, tem certeza?
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O data-link do E-99 passara os dados ao Esquadrão. Os dois elementos de A-29/AT-29 que estavam no ar acorreram para a área indicada, armas prontas e destravadas. Outros se aprestavam febrilmente para decolar. O líder de um dos elementos já em voo, Capitão Gerson Victorio, comanda:
- Olho para baixo, são helis de combate, usem o FLIR para pegar os FDPs se escondendo entre as árvores! Quando enquadrarem, Piranha neles! Se passarem, nosso pessoal está f*!!!
- Não passarão, senhor. Nem que eu tenha que abalroar um com o meu Tucano! Mas e os grandões aqueles?
- São só transportes. Vão desovar tropas e fim. No mano a mano sou mais o nosso pessoal.
Em um Apache Longbow em hovering praticamente no meio das árvores, o Capitão Tommy Frankis comenta para seu 2P:
- Que inferno, como eu gostaria que a menos um de nossos radares estivesse operacional, poderíamos detectar de longe esses teco-tecos lá deles e mandar um Sidewinder em cada um, sem stress. Do jeito que está, temos de ficar de olhos bem abertos...
Os AN/APG-78 originalmente montados nos mastros dos Apaches Longbow estavam todos inoperantes dada a crônica falta de peças de reposição e recursos de manutenção que passaram a existir após as empresas Lockheed Martin e Northrop Grumman, que o desenvolveram, fecharem as portas no auge da crise das subprimes. O Arrowhead estava, pelas mesmas razões, nas mesmas condições. Ide quanto à suite de EW: orçamento apertado...
Do meio das copas das árvores emergiu uma tênue nuvem de fumo, um leve clarão.
- Míssil às onze! Break! Flare!
- PQP!!!
O Super Tucano quebra violentamente para a esquerda, já lançando flares. O topo das árvores se aproxima perigosamente. O Capitão Victorio estabiliza a poucos metros. O míssil explode em meio à vegetação.
- Passou perto. Se fosse um 9X estaríamos ferrados.
- Sem chance, os poucos que eles têm estão nos caças, para os helis é Stinger e Sides antigos revalidados.
- Não estamos muito melhor, os caças têm A-Darter, nós aqui de Piranha B...
- Vamos ver agora.
Curva violenta para a direita, uma mancha na tela do FLIR, enquadramento, sinal do míssil indicando que encontrara o alvo, disparo. Violenta explosão no mato.
- Negativo, erramos, é f* acertar eles no meio das árvores.
Outro Super Tucano passa velozmente mais acima. Então emerge do arvoredo uma linha de projéteis alaranjados, depois outra e outra. Convergem sobre a pequena aeronave, que parece inchar. Então explode. Nem sinal de páraquedas.
- Vamos sair daqui, que p*!
- Mas como, iremos deixar assim?
O Capitão Victorio olha ao longe. Pequenos pontos voam.
- Vamos tirar esses cornos do mato e obrigá-los a lutar que nem gente. PARA CIMA DOS CHINOOKS! Com tudo!
Os três aviões rumam velozmente para os vários helicópteros de dois rotores que vão se tornando mais nítidos nos HUDs. Um deles está a uns 500 pés de altura. É a ele que o Capitão Victorio endereça seu último Piranha. Impacto direto, o enorme helicóptero de despenha rumo ao solo, envolto em fumaça e labaredas.
- Toma o que te mandaram, FDP!
- Sir, eles nos largaram e vão fazer a festa nos Chinooks!
- Tá na cara que querem que os persigamos, onde estamos podemos abater impunemente um por um deles.
- É, mas o combustível não vai durar para sempre, estamos consumindo muito em hovering.
- Que m*, se ficarmos aqui acaba o fuel, se sairmos entramos em assimétrico e o histórico disso não nos é favorável...
- Creio que não temos escolha, sir...
- Bem, que se f*! Atrás deles!
O 2P:
- Capitão Victorio, estão emergindo do mato!!!
- Eu disse. FDPs! Vamos virar e pegar eles!
Os três Super Tucanos curvam como um só para pegar os inimigos de frente. Máxima velocidade. Próximo à distância de tiro, os Apaches assumem atitude NOE, raspando as copas das árvores. A solução de tiro para os aviões se complica sobremodo. Overshoot. Passam zunindo sobre os helis, que giram sobre seu eixo e disparam seus canhões de 30mm.
- PQP, foi-se a ponta da asa!
- Ainda dá para voar.
Curva fechada para a esquerda, arremetida sobre os Apaches, a menor altitude agora, as .50 cuspindo fogo. Os helis novamente se embrenham na mata, sempre atirando. Outro Super Tucano explode, mortalmente atingido.
- Não vai dar, senhor, vamos todos morrer aqui!
- Sir, peguei um.
- É, mas nos atingiram também.
- Grande m*, eles têm só .50, para nos causarem dano precisariam atirar à queima-roupa! Aqui no mato, míssil não adianta, estão ferrados e sabem disso, só precisamos agüentar mais um pouco...
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- Senhor Presidente, poderia lhe falar em particular? Surgiu uma pequena questão...
- Claro, sem problemas. O senhor nos dá licença, Presidente Sut?
- Mas naturalmente que sim.
No closet presidencial.
- O senhor não vai acreditar; os ianques estão nos invadindo neste preciso momento!
- O QUÊ???
- Isso mesmo. Manaus está sob ataque por terra e ar. Nosso pessoal está reagindo, não sei no que vai dar...
- Mas aquela doida lá na Casa Branca está pensando o quê? Eles não têm fôlego financeiro para suportar mais do que dois dias de guerra, que m*...
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Washington DC. A Casa Branca.
- Presidente Palin, ligação do Brasil. O Presidente.
- My beloved Jesus, o quê vou dizer ao pagão?
- Talvez fosse melhor dizer a verdade, a senhora não tem culpa, nem o governo, foi um General que deu essa ordem insensata, exorbitando seus poderes e já está preso. Apresentaremos desculpas oficiais e processaremos criminalmente todos os envolvidos, just that simple...
- Simples para você, que não vai ter de baixar a cabeça para um mísero cucaracha adorador de demônios...
- Bem, não vejo outra saída, a não ser...
- A não ser?...
- ...continuando o ataque, ampliando-o e arranjando uma desculpa, tipo aquela de preservar a rainforest...
- My God! O dinheiro acaba antes que os primeiros Marines desembarquem...
- Não é exatamente assim. Sempre há quem financie uma boa guerra...
- Mas financiamentos têm de ser pagos!
- Na região onde estão sendo travados os combates há recursos minerais quase que infinitos, há a água potável, que eles estão exportando para a Ásia e Europa...
- Ei, parece que os Chineses são os maiores importadores...
- Estava pensando exatamente neles para o financiamento.
- Então vou falar com Pequim. O pele-vermelha que espere, diga que estou indisposta e ligo mais tarde, sim?
- Perfeito, senhora Presidente.
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- Viu essa, Paisano? Desligaram na minha cara com uma desculpa esfarrapada...
- Não consigo deixar de imaginar que há algo de errado aí, não podem ser tão doidos. Talvez alguém tenha interpretado errado alguma ordem, sei lá, não faz sentido, eles sempre começavam com pesados ataques aéreos e não há notícia de nenhum...
- Que se f*! Vou ligar para o Pimenta mandando botar as FFAA de prontidão total para guerra. Reúna o Conselho de Defesa.
- E a inauguração? O Presidente do Chile vai ficar ofendido se...
- PQP! Invadem o Brasil e eu ali cortando fitinha? Mas você tem razão, esta é uma hora em que todo mundo tem que estar contente conosco...
- Exato, senhor. Ademais, a solenidade pode ser bem abreviada, o senhor chega, corta a fita e deixa o discurso para o Presidente Sut, eu explico a ele as razões...
- Faça isso então.
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A Feira está animadíssima. Chegaram as viaturas oficiais com os dois Presidentes. Estes, cercados por seus seguranças, se encaminham para a fita de inauguração, uma clareira em meio ao aglomerado de pessoas desejosas de ver os dignitários, repórteres, agentes secretos e os puxa-sacos e papagaios de pirata de sempre. Um pequeno palanque ao nível do solo com microfones para os discursos presidenciais.
Na torre da igreja, o Sniper observa tudo agora através da lente de seu telescópico ART II acoplado ao sinistro fuzil Mcmillan. Detém a mira por um instante num agente secreto Chileno, um homem louro de estatura mediana, barba cerrada, os indefectíveis terno escuro, óculos escuros e fone de ouvido, distintivos de sua profissão. "Onde foi que vi esse cara?"- pensa. "Será que foi em algum serviço? Guarda-costas de alguma vítima? Terá me visto alguma vez? Talvez devesse matá-lo também, só por garantia..."
Os Presidentes agora se destacam da multidão. Os agentes os deixam sós junto à fita. Perfeito para o Sniper. Tudo limpo em volta. Enquadra o seu alvo, no centro do tórax. Mesmo que use colete balístico, o projétil perfurante calibre .50 vai praticamente cortar em dois o infeliz...
A fita vai ser cortada. Os Presidentes se imobilizam na velha pose sorridente, ambos com a mão na tesoura. As câmeras não páram de fotografar, flashes e flashes ao sol de Brasília. A multidão aplaude. Tudo é alegria. Uma criança é erguida pelo pai e acena com uma bandeirinha do Brasil. O dedo do Sniper toca pela primeira vez no gatilho. Ele prende a respiração. O alvo está no centro da retícula. Ainda sorrindo, comenta algo para seu companheiro.
O Sniper pressiona suavemente o gatilho, quase com gentileza. O tranco forte no ombro, o clarão, o estrondo. Sempre adorou esta parte. Imediatamente abandona a arma, sem sequer parar para ver se atingiu o alvo. Para quê? Sabe que sim, nunca errou...
Um jato de sangue e pedaços de osso no ar. Os agentes secretos Chilenos saltam sobre seu Presidente. Os Brasileiros se atiram no chão, protegendo a cabeça com os braços.
Manchete do Estadão, no dia seguinte:
BRASIL ESTARRECIDO: A MORTE DE UM PRESIDENTE
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