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Mensagem
por Clermont » Ter Jun 24, 2008 11:04 pm
EX-DELEGADO ABRE OS BASTIDORES DA REPRESSÃO - Chefe do antigo DEOPS garante que Tuma sabe muito.
Por Vasconcelos Quadros - Jornal do Brasil, quarta-feira, 2 de agosto de 1995.
SÃO PAULO - Ex-integrante da cúpula do extinto Departamento Estadual de Ordem Política e Social (DEOPS), o delegado aposentado Paulo Bonchristiano garantiu ao JORNAL DO BRASIL, que uma "investigação exaustiva", que inclua a área militar, poderá esclarecer o destino que tiveram os corpos dos presos políticos desaparecidos, colocando um fim à polêmica que se arrasta há quase 30 anos. "É preciso vontade política, preservando os termos da anistia", diz o delegado, que no período da repressão foi assistante de Ordem Social e Ordem Política da polícia paulista. Ele faz questão de frisar que os policias do DEOPS não participaram da tortura e do sumiço dos ativistas.
Um dos chamados arquvios vivos da repressão, segundo ele, é o senador Romeu Tuma (PL-SP), que, de 1963 até 1978, foi chefe do serviço de informações e fazia o ele entre a polícia e a área militar. "O Tuma poderá contar alguma coisa. O problema é que o Tuma não pode entregar ninguém, porque está preocupado com a senatoria. Se falar, sue futuro político será aniquilado", diz o delegado. "Tuma repassava tudo à área militar, era sincero e obediente. Pelo que manuseou de informações, é hoje o único homem do lado de cá (da repressão) que ainda esá na vida pública, e se quiser pode esclarecer alguma coisa", diz.
DEOPS
O delegado afirma que os militares usaram a estrutura e as informações, mas não conseguiram pôr a parte jurídica do DEOPS a serviço da tortura. "Os ativistas que passaram pelo DEOPS hoje estão no governo. Ninguém foi torturado ou morreu. Já com aqueles que passaram pelo QG do Fleury (delegado Sérgio Paranhos Fleury, já morto e do DOI-CODI, a situação foi outra. Muitos estão na lista dos desaparecidos", diz.
Ele afirma que os militares tinham controle da polícia através do ex-secretário de Segurança Erasmo Dias - a quem chama de "direitista radical" -, de Fleury e de Tuma. Este fornecia as informações, a matéria-prima da repressão.
Quando foi convocado para ocupar o 2º andar do DEOPS, na Praça General Osório, Fleury levou quarenta homens da equipe que atuava na repressão aos crimes contra o patrimônio - que já tinham um hisórico de violência por integraram o esquadrão da morte. "Queríamos que o processo corresse na normalidade. Não tínhamos a esquerda como inimiga. O DEOPS não participava de ações violentas", diz o delegado, que lembra de pelo menos três operações que comandou para evitar que o grupo de Fleury e os militares do DOI-CODI promovessem uma carnificina.
Uma delas foi o fechamento do Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em Ibiúna, em 1968, onde a polícia prendeu 1807 estudantes - entre eles, os ex-deputados José Dirceu (PT-SP) e Vladimir Palmeira (PT-RJ). "Deixaram que eu fizesse a operação não haver derramamento de sangue, mas o Fleury queria comandar", conta ele, que na última eleição votou em José Dirceu para o governo paulista "Dirceu pensa, o Brasil evoluiu."
Em 64, o delegado liderou a equipe que, depois de uma delação, chegou às cadernetas do líder comunista Luiz Carlos Prestes, na casa da Rua Nicolau de Souza Queiroz, 153, no Paraíso, em São Paulo. As cadernetas permitiram a prisão de outros ativistas.
Bonchristiano não revela o nome do delator, mas garante que Prestes nunca negociou com a polícia para escapar. "Chegamos lá e encontramos toda a família dele. Sua mulher, Maria Ribeiro Prestes, estava grávida, e a levamos para o Hospital Matarazzo, onde acompanhamos o parto do Iúri (filho caçula de Prestes) sem incomodar a família. Prestes soube disso e acabou permitindo que se firmasse um acordo, segundo o qual nenhum dos dois lados (repressão ou ativistas) incomodaria as famílias", revela. "Em países em confronto político, esse foi8 único acordo respeitado no mundo."
Outra operação chefiada por Bonchristiano deixou de mudar o curso da história por cinco minutos. Em março de 1971, a polícia soube que o líder da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), Carlos Lamarca, se encontrava com a namorada, a ativista Iara Iavelberg, no apartamento 121, no 12º andar da Rua da Consolação, 1222, nos Jardins. Bonchristiano prendeu Iara, mas perdeu Lamarca que acabara de partir em direção à Bahia pelo grupo do general Nilton Cerqueira, atual secretário de Segurança do Rio. Iara foi interrogada e liberada. Dias depois, seguiu para a Salvador, onde se suicidou com um tiro no peito durante cerco da polícia.
Figuras.
Aos 65 anos, 35 deles na polícia – de 63 a 74, lotado como assistente no DEOPS -, Bonchristiano teve intensa participação no período da reprepssão e conhece as principais figuras do cenário nacional atual. Sobre o presidente Fernando Henrique Cardoso, diz que o DEOPS o considerava apenas um intelectual da esquerda, e afirma que em nenhum momento houve pressão para que saísse do país. “Os intelectuais eram chamados, prestavam depoimento e eram liberados. O Fernando Henrique saiu do país para fazer currículo.”
Ao líder do PT Luiz Inácio da Silva, Bonchristina reserva revelação curiosa: “O Lula não ficava preso nas celas. Um dia o Tuma chamou os delegados e pediu que o colocassem no apartamento dos delegados. Muitas vezes, mesmo preso, Lula saía com os policiais e ia almoçar no antigo Restaurante Ferramenta”, conta. O restaurante ficava na Avenida Duque de Caxias, no antigo prédio da Estação Rodoviária.