ARSENAL DE GUERRA DE SÃO PAULO - AGSP
ONDE O SONHO TORNA-SE REALIDADE.
O RENASCER DOS BLINDADOS DE RODAS NO EXÉRCITO BRASILEIRO
Expedito Carlos Stephani Bastos,
Pesquisador de Assuntos Militares do Centro de Pesquisas Sociais da UFJF e Coordenador do Núcleo de Estudos Estratégicos do Instituto Histórico e Geográfico de Juiz de Fora.
expeditobastos@artnet.com.br
Criado, em 02 de dezembro de 1958, na cidade paulista de Barueri, o Arsenal de Guerra de São Paulo (AGSP), desempenhou um pioneirismo importante na área da Indústria Bélica Brasileira, pois ele é o herdeiro do Parque Regional de Manutenção da 2ª Região Militar (PqRMM/2), extinto em 1997, e a ele incorporado. (foto 1)
Com a experiência já existente no AGSP e a capacidade criadora do PqRMM/2, responsável pelos mais brilhantes projetos, que posteriormente serão concebidos pela Indústria de Material de Defesa Brasileira, destacando dentre eles os afamados CASCAVEL e URUTU, responsáveis pelo sucesso da extinta ENGESA, uma história de sucessos e frustrações que ainda está para ser escrita.
Sem dúvida após os anos de ouro de nossa indústria, e seu grande declínio na década de 90, fiquei verdadeiramente feliz e impressionado com a visita que fiz à aquela instituição no último dia 07 do corrente mês e ano, ocasião em que como correspondente da DEFESANET, fui recebido pelo Comandante do AGSP, Cel. QEM Ernesto Ribeiro RONZANI, para tão agradável visita. (foto 2)
O Arsenal de Guerra de São Paulo tem como missão; "Contribuir para a operacionalidade do combatente por meio da fabricação e recuperação do material de emprego militar", o que vem cumprindo com garra e determinação, muito embora seu quadro mereceria um maior atenção, pois trata-se de mão de obra extremamente qualificada e de longo aprendizado, sendo necessário até mesmo rever os problemas de baixa por ter atingido um determinado tempo servindo no quadro do Exército, o que certamente trará conseqüências para a continuidade do trabalho de revitalização, objetivo maior do AGSP no contexto operacional do Exército Brasileiro.
Atua nas áreas de recuperação e fabricação de:
Armamento: Metralhadoras, Fuzis, Pistolas, Obuseiros e Canhões;
Comunicações: Rádio-Transmissores e Sistema de Comunicação de Blindados;
Engenharia: Geradores Elétricos;
Intendência: Colchões, Travesseiros, Capacetes de Fibra e de Fibra Aramida, Fogareiros;
Produtos Especiais: Redes de Camuflagem, Caixa de Acondicionamentos para Transporte de Fuzis em fibra de vidro;
Motomecanização: Recuperação de Viaturas Blindadas;
Alguns dos itens acima mencionados, serão temas de futuras matérias, nas páginas da Defesanet, mas no momento o mais importante é sem sombra de dúvida a parte referente à Motomecanização.
Coube ao AGSP a manutenção de 5º Escalão das Viaturas Blindadas sobre Rodas CASCAVEL EE-9 Modelo VII-9 e Viatura Blindada Transporte de Pessoal EE-11 URUTU Modelo VI-4, de fabricação Engesa, nos anos 80, pois a meta é recuperar algo em torno de 500 viaturas, partindo dos modelos mais novos para os mais antigos, uma vez que estes veículos nunca sofreram uma manutenção neste nível, e destes tornarem-se totalmente operacionais aproximadamente 300. (foto 3)
A idéia para a recuperação em larga escala destas viaturas remonta a 1998, culminando os estudos em 2000 e em 2001, foi montado esta linha de recuperação, prevista para a conclusão dos trabalhos em 2005, que na realidade é quase uma fabricação de veículos blindados sobre rodas, de certa forma mais complexa, pois numa linha normal de fabricação todas as peças são novas e neste caso é necessário desmontar cada um dos veículos, item por item, procedendo até a modificações para melhorar ainda mais os defeitos que por ventura existem desde quando de sua fabricação, melhorando-os e até mesmo inovando-os, o que visa permitir um sobrevida destas viaturas até o ano de 2015, quando a nova família de blindados de rodas (NFBR), já esteja sendo entregue ao Exército Brasileiro.
O trabalho em alguns itens foi terceirizado, mas é todo executado no interior do AGSP, e só foi possível pois as firmas recontrataram experientes operários da extinta Engesa, que mais uma vez voltam à ativa em conjunto com os militares técnicos que fazem parte daquele aquartelamento.
Isto vem comprovar, que a revitalização só se tornou viável pois os veículos são totalmente brasileiros, concebidos e produzidos por nós, pois o maior patrimônio de uma nação são os seus cérebros, as grandes nações que foram totalmente aniquiladas, ressurgiram das cinzas, por possuírem conhecimento, coisa impossível de ser tirada.
A ordem de trabalho executada pelo AGSP começa com a linha de desmontagem, onde cada componente é totalmente desmontado e levado para sua linha de manutenção, a carcaça sofre um processo de jateamento, por micro-partículas de metal(granalha), e após recebe uma pintura protetora, retornando à linha de montagem, onde cada componente depois de verificado e testado é montado na viatura, cada item volta para mesma viatura, com exceção do motor. (fotos 5, 6, 7 e 7a)
Cada conjunto sofre diversos serviços, no caso dos motores é feito o seguinte:
Retífica completa;
Manutenção do turbo compressor;
Manutenção dos órgãos anexos;
Substituição do alternador de 50 A por outro de 75, uma vez que o primeiro já não é mais produzido pela indústria nacional.
Cada motor é testado num dinamômetro, onde é emitido um laudo, que irá acompanhar a vida do motor de cada veículo até o fim de sua vida útil, acompanhamento que até então não existia, muitas das vezes a própria unidade mandava fazer a retífica, numa firma particular, o que trouxe sérios problemas, que agora estão sendo sanados de vez.
É verificado o sistema de arrefecimento, onde o principal serviço é a substituição de todas as colmeias dos radiadores do motor. (fotos 8, 9 e 9a)
Também é verificado todo o sistema de transmissão, onde são realizados o seguinte:
Na caixa automática(1): Revisão completa;
Adaptação do kit de modificação estendida para o "lock-up", permitindo o uso do freio motor (o que muito melhorou a performance do EE-9 e EE-11 que sofria com este problema);
Mas,o mais complicado foram os pneus, pois a indústria brasileira não produz seriadamente os modelos usados pela Engesa e para voltar a produzi-los faz-se necessário uma grande encomenda, o que de certa forma inviabilizaria o projeto do AGSP, face às restrições orçamentárias. A solução encontrada foi a importação de pneus CONTINENTAL da República Checa, que a partir de agora irão equipar todas as viaturas entregues pelo Arsenal. (fotos 14 e 15)
O item mais importante no caso do EE-9 Cascavel é sem sombra de dúvida o seu armamento, razão pela qual é revisada também a torre e a torreta da seguinte forma:
Revisão completa da torre e torreta;
Substituição do reparo do canhão;
Execução de tiro e verificação de funcionamento do armamento principal.
Nestes tópicos é verificado se existe qualquer anormalidade com o canhão, que pode até ser condenado e substituído por outro fabricado no próprio Arsenal, sendo que para isto foi criada uma Seção de Armamento Pesado. (foto 16)
Feito tudo isto o veículo é remontado e exaustivamente testado, tanto nas suas partes tratoras como parte para uma série de tiros reais para verificação de todo o conjunto. Aprovado o mesmo recebe nova pintura, numeração e marcações do Exército Brasileiro, onde pude notar a volta do emblema antigo do Exército, ou seja o chamado "Espadinha" criado em 1983 e substituído pelo Brasão do Exército em 1995, e agora retornando.
No caso do EE-11 Urutu, este também é exaustivamente testado, principalmente no item navegação, que após aprovado recebe o mesmo procedimento do Cascavel. (foto 17)
A seguir o mesmo é devolvido à sua unidade de origem, que recebe um veículo praticamente novo, totalmente revisado e confiável. Até o fechamento desta artigo mais de 50 veículos( junho 2002), já foram completados ou estão em fase final de acabamento. (foto 18)
É bom lembrar que quando o Comandante do Exército em entrevista à DEFESANET, fevereiro 2002, mencionou a intenção do Exército em aumentar a vida útil destes veículos, o que pode agora ser confirmado "in loco" por nós, o que de certa forma não deixa de ser o renascimento de nossa indústria de material de defesa, pois além de atender o Exército, será possível também atender aos usuários dos produtos brasileiros em diversos países, como: Bolívia, Chile, Jordânia, Colômbia, Equador e muitos outros, que ainda operam veículos "Made in Brazil", até que haja uma definição sobre a futura família de blindados brasileiro, que sem dúvida precisa ser desenvolvida e fabricada pela indústria brasileira, evitando que num futuro possamos ser refém de suprimentos oriundos de terras estrangeiras, lembrando que parcerias são importantes, desde que haja transferência de tecnologia para a indústria nacional. Vale mencionar que, em maio último, na reunião entre os Ministérios da Defesa da Bolívia e Brasil, o assunto de revitalização dos blindados brasileiros operados pela Bolívia foi tema de pauta. (fotos 19, 20, 21 e 22)