ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

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Edu Lopes
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ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#1 Mensagem por Edu Lopes » Seg Jun 21, 2010 9:03 am

Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

Marco Antonio Rocha - O Estado de S.Paulo

Muitos políticos, quase todos, se dizem socialistas, até os de direita. Dezenas de partidos políticos no mundo ostentam no nome a palavra socialista. O socialismo é bandeira de inúmeros governantes há décadas. Por que, então, não há nenhum regime socialista solidamente instalado e consolidado? Haveria uma boa explicação sobre por que o socialismo não emplaca?

Há países ditos "socialistas" que não passam de ditaduras mesmo: de um só homem, como é o caso de Cuba; de um partido, como a China; de uma quadrilha, como a Coreia do Norte; de um bufão, como a Venezuela ou o Irã. É isso, então, o socialismo? Uma ditadura? Ou uma bouffonerie?

Claro que não, dirão os socialistas de toda parte. Então, por que não existe?

Todos os socialistas são contra o capitalismo na economia e contra o liberalismo na política, e parecem constituir maioria por toda parte. Então, o capitalismo já deveria ter sido extinto ou estar em extinção. Mas é o capitalismo que existe em tempo real e parece cada vez mais forte. Por quê? E o liberalismo, por que funciona?

Na semana passada, Dilma Rousseff encontrou-se em Paris com a secretária-geral Martine Aubry, do Partido Socialista (PS) francês, o maior partido da esquerda francesa. Desde Leon Blum, na década de 30, o PS francês já governou a França diversas vezes, sem nunca ter implantado o socialismo, ou algum regime que pudesse ser inequivocamente reconhecido como socialista. Por quê? Por que não é um partido revolucionário? Por que não sabe exatamente como implementar o socialismo? Por que não é socialista a não ser no nome? A propósito, Dominique Strauss-Kahn, do Partido Socialista francês, é também diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional, o maior guardião, segundo a esquerda, do capitalismo internacional. São fatos que justificam a suspeita de que todos os socialistas, quando estão no poder, praticam mesmo o bom e velho capitalismo. E até o administram melhor, em muitos casos, do que os capitalistas empedernidos.

As duas senhoras, Dilma e Martine, apareceram em belas fotos, trocando beijos e abraços. Em reunião fechada devem ter renovado mútuas juras de lutar pelo socialismo, de combater o capitalismo e o neoliberalismo.

A líder socialista francesa assegurou que há grande identidade política entre o PS e o PT. Deve haver, pois é suposto que Dilma seja socialista, já que militou numa agremiação guerrilheira de esquerda. Se bem que aquele era um grupo que, antes de mais nada, lutava para derrubar a ditadura militar. Não se sabe se a guerrilheira Dilma já era socialista. Na verdade, parece que nem petista é.

Depois de Martine, Dilma foi se encontrar com o presidente da França, Nicolas Sarkozy, um empedernido capitalista, cuja maior fama nasceu do fato de ser casado com Carla Bruni. Martine combate Sarkozy e garante que vai derrotá-lo nas eleições de 2012 ? com apoio da brasileira Rousseff: "Dilma nos disse que virá fazer a nossa (campanha), a do nosso candidato socialista", disse ela à imprensa, assegurando que também fará campanha por Dilma no Brasil. Temos aí a possível formação de uma nova internacional socialista, a Quinta Internacional, Dilma-Martine. Talvez por isso o encontro de Dilma com Sarkozy foi bastante frio e menos socialista. O presidente Sarkozy só quer vender aviões, mais nada.

O socialismo, desde Saint-Simon, Fourrier, Louis Blanc, Robert Owen, Marx, Engels, nos séculos 18 e 19, até chegar em Florestan Fernandes no Brasil do século 20, parece um ovo: não ofende ninguém, é bonito de se olhar, harmônico e encerra uma boa promessa. Dos ovos reais, a gente sabe que saem aves ou répteis. Do socialismo não se sabe o que pode sair, porque ainda não rompeu a casca. Isso facilita a vida dos políticos. Podem se declarar socialistas à vontade. Não os compromete, pois ninguém sabe do que se trata, mas parece que é uma coisa legal.

Já o capitalismo, não. Todos nós vivemos dentro dele. Sabemos que não é nada legal. Conhecemos todos os seus defeitos que os socialistas apontam: a busca do lucro pelo lucro; a vil exploração do trabalho humano, contida, um pouco, pelas leis trabalhistas; a volúpia em transformar em mercadoria vendável até o coração dos namorados e das mães. Tudo isso é odioso e visível. Torna fácil odiar o capitalismo e preferir o que é contra ele. É fácil também aspirar ao reino dos céus, quando se vive cercado das misérias da Terra. Bem o sabem os profiteurs dos Evangelhos que infestam as redes de TV.

De qualquer forma, na política é assim que la nave vá. Não se deve ser realista, dizendo que se vai fazer apenas o que for possível, apresentando as dificuldades e as propostas para superá-las. Nem adianta fazer belos discursos: a ordem é twittar, dizer cretinices pomposas em 140 toques. Churchill não poderia ter twittado seus chamamentos ao povo inglês contra Hitler, tinham mais de 140 toques. Dá mais lucro (político) twittar sonhos, como "construir o futuro", fazer o "Brasil de todos", "marchar para o socialismo". É o encanto da magia. Lula é o mago sedutor. Dilma, a auxiliar de palco, tentando ser sedutora sob as luzes da ribalta. Haja!

JORNALISTA

E-MAIL: MARCOANTONIO.ROCHA@GRUPOESTADO.COM.BR


Fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje ... 9580,0.php




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#2 Mensagem por Viktor Reznov » Ter Jun 22, 2010 10:21 pm

Nada mais benéfico pro discurso comunista do que desassociar o termo "socialismo" das ditaduras que se dão em países como Cuba e nos países da finada URSS.




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#3 Mensagem por tflash » Ter Jun 22, 2010 11:10 pm

O Socialismo é um termo tão vago que serve para qualquer forma de governo, desde que tenha politicas sociais. Nunca se esqueçam que o regime nazi era o Nacional-Socialismo.




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#4 Mensagem por P44 » Qua Jun 23, 2010 5:18 am

basta ver o exemplo do "partido socialista" português




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#5 Mensagem por tflash » Qua Jun 23, 2010 8:49 am

Exactamente! mais à direita que o CDS (direita tradicional) e PSD (Sociais democratas) Mas neste caso tudo tem a ver com a base de financiamento que no caso do partido socialista português é a banca e os grandes grupos económicos. O último governo da oposição, em Portugal, teve muitas peripécias a que o presidente não ligou e subitamente caiu quando o primeiro-ministro da altura resolveu taxar os bancos pela mesma tabela que as outras empresas (pagam metade dos impostos). O PSD, tradicionalmente mais à direita, é composto por muitos pequenos e médios empresários e o CDS, mais à direita, teve que se reposicionar junto dos ex-combatentes, reformados e trabalhadores mais conservadores.

Para concluir e não fugir ao tópico, existe uma tendência de aproximação ao sistema anglo-saxónico que se alterna em conservadores e liberais, com pouca doutrina ideológica quando se fala em organização da sociedade e politica económica. tudo o resto é retórica.




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#6 Mensagem por Marechal-do-ar » Qua Jun 23, 2010 9:17 pm

Edu Lopes escreveu:Há países ditos "socialistas" ... Irã
Há uma nova definição para os "ditos socialistas", ser inimigo dos EUA.

Parei de ler nessa parte, o jornalista já provou a própria ignorância.

Para certos povos os termos "comunista" e "socialista" nunca se aplicarão: italianos, ingleses (e descendentes), gregos, hebreus, turcos, árabes e persas, como o jornalista esqueceu disso e pôs o "inimigo dos EUA = socialista" na frente?




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#7 Mensagem por Túlio » Qua Jun 23, 2010 10:31 pm

Para muitos ianques o OBRAHMA é comuna, e agora? :? 8-]




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#8 Mensagem por MAZ543 » Qua Jun 23, 2010 10:46 pm

Túlio escreveu:Para muitos ianques o OBRAHMA é comuna, e agora? :? 8-]
Taxam o cara de comunista por que tenta fazer reformas em areas sensíveis, como a saúde por exemplo.Tenta impor algo inédito, que seria uma presença estatal onde não tinha, o engraçado é que sua politica beneficiaria os mais pobres que não tem um acesso a saúde por falta de condições e estes ajudam a critica-lo, por que pra americano o que é diferente do que eles conhecem é comunista, enquanto acho que a definição mais correta seria Populista.

Penso que essa idéia de comunismo é muito deturpada....assim como a do capitalismo, ou da democracia, por exemplo a China ela é comunista, capitalista ou Socialismo de Mercado como eles gostam? Ela é uma democracia Comunista ou uma ditadura Capitalista?

Muda-se os interesses muda-se as definições....




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#9 Mensagem por Túlio » Qua Jun 23, 2010 11:14 pm

A China é capitalista na economia e comuna na política, curiosa alternativa. Quanto ao OBRAHMA, duvido que se reeleja, um Vietnamistão arrasa com a carreira de qualquer um... 8-]




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#10 Mensagem por MAZ543 » Qua Jun 23, 2010 11:33 pm

Vietnamistão Rsssss, boa!!

A China realmente é muito curiosa, há muitos anos atrás quando estava na escola tinha algumas discussões com minha prof. de geografia a respeito de até quando o povo do interior seria burro de carga da elite da costa, penso que algumas rebeliões devam estourar no interior da China e logo serem abafadas pelo exercito, mas tenho a impressão que algumas vazem como foi o caso da província de Xiginalgumacoisa de maioria muçulmana, e hoje os rebeldes de lá devem estar ligados nos acontecimentos do Quirguistão que faz divisa com esta província e onde há membros desta etnia.

Eu acho que o serviço secreto Chinês acredita que parte destas revoltas devem ser financiadas pelos EUA:

Interesses da China

A China também tem muito com que se preocupar. Seu interesse está tanto em um Quirquistão estável e amigável, quanto em evitar que os EUA dominem a região. Pequim era o principal financiador de Askar Akayev, ex-presidente apoiado por Washington, que, no entanto, o abandonou assim que ele aceitou dinheiro chinês.

A principal arma da China para manter um pé no Quirquistão continua sendo financeira, e, assim como a Rússia, seu interesse é duplo: expandir o máximo possível sua influência na Ásia Central e, ao mesmo tempo, reduzir ao mínimo as chances de os Estados Unidos fazerem o mesmo.

Trata-se ainda de uma questão de segurança nacional. As fronteiras sino-quirguizes correm ao longo dos limites da politicamente sensível província de Xinjiang, onde, em julho de 2009, houve a revolta da etnia uigur.

"O Quirquistão é o mercado exportador número um para Xinjiang", analisa o especialista Torrike-Barton. "Trata-se de uma destinação lucrativa para as mercadorias e a mão-de-obra chinesa; portanto há uma dimensão econômica importante ligando os dois países. Mas, como no caso da Rússia, a principal preocupação chinesa é a segurança. Um Quirquistão instável, com uma população muçulmana recalcitrante, não ajuda a China a preservar a paz em Xinjiang e entre a comunidade uigur."
http://www.defesanet.com.br/10_06/10061 ... istao.html

Vamos ver até quando esta dualidade Capitalismo/Comunismo ira sobreviver na China....




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#11 Mensagem por Túlio » Qua Jun 23, 2010 11:37 pm

Sei lá, sem querer sair muito do tema mas lembro de um livro (delicioso) que me influenciou muito, 'A Boa Terra', de Pearl S. Buck, onde ela profere uma frase algo intrigante: "talvez a China nos salve!" ou algo assim.

Será? :? 8-]




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#12 Mensagem por MAZ543 » Qua Jun 23, 2010 11:40 pm

hahahahaha Vai saber.....Imagina uma queda dos EUA e a ascensão de uma China como potência global...sinistro! :shock:




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#13 Mensagem por Túlio » Qua Jun 23, 2010 11:46 pm

Diria que o caminho é esse mas que não vejo a China querendo hegemonia, talvez ela SALVE os compatriotas de Pearl S. Buck (ianque) de si próprios e seus demônios... :wink: 8-]




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#14 Mensagem por MAZ543 » Qua Jun 23, 2010 11:51 pm

Um texto interessante para refletir:

Irresponsabilidade fiscal, descontrole dos gastos públicos, elevados déficits orçamentários, déficit comercial, corrupção, inflação e estancamento econômico constituem alguns dos fatores fundamentais que levaram a Grécia à beira do default. Com uma dívida pública, como percentual do PIB, da ordem de 124,5%, a maior da União Européia, e um déficit fiscal de 11,3% projetado para 2010 (o segundo maior, atrás da Irlanda, com 12,4%), ela enfrentava e enfrenta enormes dificuldades, assim como, em menor grau, outros países da região, sobretudo Irlanda, Portugal e Espanha. Porém, as agências de classificação de risco (mais de cem, todas sob a influência de Wall Street) agravaram ainda mais a situação, rebaixando a classificação de solvabilidade da Grécia, com o que favoreceram, propositadamente, o ataque ao euro pelos que especulam com as moedas, nas bolsas de valores.

A erupção da crise econômica e financeira, que abala a Grécia e ameaça a Irlanda, Portugal, Espanha e toda a Eurozona (16 dos 27 Estados-membros da União Européia e outros 9 não-membros da UE que adotam o euro), constituiu um desdobramento, a terceira etapa da crise econômica e financeira deflagrada nos Estados Unidos, com a explosão do mercado imobiliário, no primeiro semestre de 2007, quando grandes corretoras, como Merrill Lynch e Lehman Brothers, suspenderam a venda de colaterais, e em julho do mesmo ano, bancos europeus registraram prejuízos com contratos baseados em hipotecas sub-prime.

A inadimplência de devedores hipotecários provocou a débâcle, afetando empréstimos de empresas, cartões de crédito etc. Em seguida, setembro de 2008, a crise atingiu o setor bancário, com a bancarrota e a dissolução do Lehman Brothers, o quarto banco de investimento dos Estados Unidos, após 158 anos de atividade. E, finalmente, comprometeu e envolveu os próprios Estados nacionais. Levou a Islândia, cujos bancos mantinham negócios num valor três vezes maior do que o PIB do país, a uma virtual bancarrota, com reflexo sobre o Reino Unido, seu principal credor. E, em fins de 2009, manifestou-se na Grécia, ameaçando a estabilidade de toda a Eurozona, dado que vários países não cumpriram as metas do Tratado de Maastricht para a unificação monetária, entre as quais controle do déficit orçamentário (até 3% do PIB),do endividamento público (até 60% do PIB).

A situação configura-se ainda mais grave, porquanto a eventual desestabilização da Eurozona poderia provocar uma crise sistêmica, devido à promiscuidade dos bancos alemães, franceses e também americanos com os Estados nacionais e outros bancos, mediante dívidas cruzadas. Se a Grécia e/ou Portugal deixassem de pagar aos bancos, a crise propagar-se-ia e cresceria como bola de neve. Por exemplo, de acordo com o Bank for International Settlements, os bancos portugueses devem 86 bilhões de dólares aos bancos espanhóis, que, por sua vez, devem 238 bilhões a instituições alemães, 200 bilhões aos bancos franceses e cerca de 200 bilhões aos bancos americanos.

A concessão de cerca de 1 trilhão de dólares à Grécia, prometida pela União Européia e o Fundo Monetário Internacional, não visou a ajudá-la, mas a salvar os bancos alemães, franceses e os investidores americanos, que provêem mais de 500 bilhões de dólares de empréstimos de curto prazo aos bancos europeus, sobretudo aos das nações mais débeis, para financiar diariamente suas operações.

Esse endividamento dos Estados com os bancos e dos bancos com outros bancos evidencia que, não obstante os fatores nacionais, domésticos, a crise que se agravou na Grécia e ameaça contagiar toda a Eurozona também é, em outra dimensão, uma conseqüência direta da crise dos Estados Unidos, dado que o sistema capitalista, entrançado pelo mercado mundial e a divisão internacional do trabalho, constitui um todo, interdependente, e não uma simples soma de economias nacionais.

A alta do preço do petróleo e do ouro, no mercado mundial, bem como a elevada valorização do euro refletiram a profunda crise que deteriorava e deteriora a economia americana. A valorização do euro, em decorrência da queda do dólar, afetou, porém, países como a Grécia, Irlanda e Portugal, que não possuem moeda própria e, conseqüentemente, não podem promover a desvalorização cambial, para reduzir os salários, compensar a perda da competitividade de suas exportações, ajustar as finanças e equilibrar a conta-corrente do balanço de pagamentos.

Apesar da enorme assimetria, a grave situação econômica e financeira da Grécia e alguns outros Estados na União Européia é muito similar à dos Estados Unidos, cuja dívida externa líquida, em 31 de dezembro de 2009, era da ordem de 13,76 trilhões de dólares, do mesmo tamanho que o seu PIB, calculado em 14,26 trilhões em 2009, calculado conforme a capacidade de seus poder de compra. A dívida pública dos Estados Unidos, em maio de 2010, era de cerca de 12, 9 trilhões, dos quais 8,41 trilhões em poder do público e 4,49 trilhões com os governos estrangeiros. Esse montante (12,9 trilhões de dólares) corresponde a cerca de 94% do PIB dos Estados Unidos, enquanto o da Eurozona é de 84%.
O problema fiscal nos Estados Unidos é extremamente grave. O antigo presidente do Federal Reserve (FED), Alan Greenspan, em outubro de 2009, declarou que não estava muito preocupado com a fraqueza do dólar, mas com os custos de longo prazo dos Estados Unidos, associado com a crescente elevação da dívida nacional, cuja relação se tornava progressivamente explosiva, como uma espiral, na qual o crescente pagamento dos juros aumentaria o déficit e a dívida, gerando novo aumento e assim por diante. O déficit do ano fiscal de 2009, terminado em 30 de setembro, mais do que triplicou o do ano anterior, atingindo montante recorde de 1,4 trilhão de dólares.

O presidente Barack Obama apresentou para o ano fiscal de 2010 um orçamento, com despesas de aproximadamente 3,5 trilhões e um déficit federal de 1,75 trilhão, o que significa que o governo americano terá de tomar empréstimos, aumentando a dívida pública, ou emitir mais dólares, uma vez que a poupança interna é insuficiente para atender aos seus gastos. Esse déficit fiscal se entrelaça com o crescente déficit comercial, que em 2009 representou mais de 40% (1,04 bilhão) do total do seu intercâmbio com outros países. E, nos primeiros três meses de 2010, continuou a crescer. Em março, o Departamento de Comércio anunciou um déficit de 40,4 bilhões, contra 39,4 bilhões em fevereiro.

A sustentabilidade dos déficits fiscal e comercial - denominados "déficits-gêmeos", não porque sejam iguais, mas porque se inter-relacionam - depende de contínuo influxo de capitais estrangeiros, oriundos, sobretudo das inversões da China, comprando bônus do Tesouro dos Estados Unidos.

Efetivamente são os bancos centrais de outros países que financiam o déficit na conta-corrente dos Estados Unidos, da ordem de 380,1 bilhões de dólares em 2009, mais de 6% do PIB, déficit este que, no primeiro trimestre de 2010, saltou para 115,6 bilhões de dólares, contra 102.3 bilhões de dólares, no mesmo período de 2009, e recresce cerca de 2,35 bilhões de dólares por dia. Se o influxo de capitais do exterior cessar, o Tesouro dos Estados Unidos não terá recursos, no correr de 2010, para refinanciar 2 trilhões de sua dívida de curto prazo, da qual 44% estão em poder de países estrangeiros.

Os Estados Unidos ocupam o primeiro lugar na lista dos países com a maior dívida externa líquida do mundo (13,7 trilhões de dólares), seguido pela Grã-Bretanha (9,6 trilhões), Alemanha (5,2 trilhões), França (5 trilhões) e Países Baixos (2,4 trilhões). Trata-se, portanto, de uma superpotência devedora, virtualmente em bancarrota. Somente não chegou à beira da insolvência porque pode emitir o dólar, que é a moeda internacional de reserva.

Mas a tendência do dólar é de declínio, tanto que, após desvalorizar-se 40% entre 2002 e 2008 e fortalecer-se 20% em relação ao euro, entre março e dezembro de 2008, durante a crise financeira, voltou a cair 20%, entre março e dezembro de 2009, devido à preocupação no mercado com a dívida externa dos Estados Unidos. Sua revalorização, como conseqüência da crise na Grécia e do enfraquecimento econômico da Eurozona, é conjuntural. O dólar está estruturalmente debilitado pelos déficits fiscal e cambial e pela elevada dívida externa líquida dos Estados Unidos. A perspectiva é de que, mais dias menos dias, deixe a condição de única moeda internacional de reserva, apesar da China e de serem os Estados Unidos o centro do sistema capitalista mundial. E, quando isto ocorrer, os Estados Unidos terão enormes dificuldades de pagar suas contas, por meio de empréstimos de outros países.

Em agosto de 2007, David M. Walker, chefe do Government Accountability Office (GAO), órgão do Congresso americano encarregado da auditoria dos gastos do governo, advertiu que o país estava sobre uma “plataforma abrasante” (burning platform) de políticas e práticas insustentáveis, escassez crônica de recursos para a saúde, problemas de imigração e compromissos militares externos, que ameaçavam eclodir se medidas não fossem em breve adotadas. Previu aumentos “dramáticos” nos impostos, redução nos serviços do governo e a rejeição em larga escala dos bônus do Tesouro americano como instrumento de reserva pelos países estrangeiros. E apontou “notáveis semelhanças” entre os fatores que resultaram na queda do Império Romano e a situação dos Estados Unidos, devido ao declínio dos valores morais e da civilidade política, à confiança e à excessiva dispersão das Forças Armadas no exterior, bem como à irresponsabilidade fiscal do governo americano.

Menos de um ano depois, Paul Craig Roberts, ex-secretário-assistente do Departamento do Tesouro, no governo de Ronald Reagan (1981-1989), afirmou, em artigo intitulado “The Collapse of American Power” e publicado no Wall Street Journal, que a superpotência - os Estados Unidos - não estava em condições de financiar suas próprias operações domésticas, muito menos suas “injustificáveis” guerras, se não fosse a bondade dos estrangeiros, que lhe emprestam dinheiro sem perspectiva de receber o pagamento. De fato, os Estados unidos só podem manter as guerras no Iraque e no Afeganistão, duas guerras perdidas, com o financiamento de outros países, principalmente China e Japão, que continuam a comprar bônus do Tesouro americano. Joseph E. Stiglitz (Premio Nobel de Economia) estimou que o total dos custos dessas duas guerras estende-se de 2,7 trilhões de dólares, em termos estritamente orçamentários, a um total de custos econômicos da ordem de5 trilhões de dólares. Não sem razão, The Economist, na edição de 27 de março 2008, publicou um artigo intitulado “Waiting for Armageddon”, no qual ressaltou que o aumento das corporações em bancarrota podia ser o sinal de que muito pior estava ainda por ocorrer. O pior que se pode esperar é default do próprio governo dos Estados Unidos, cujo sistema financeiro a China, com reservas em dólares de mais de 2,4 trilhões de dólares, tem condições de comprar.
Em tais circunstâncias, o default da Grécia, se ocorresse, não só abalaria toda a Eurozona. Também afetaria a estrutura econômica e financeira dos Estados Unidos, cuja política fiscal a longo-termo é insustentável. Mas o problema não decorre principalmente dos gastos com os serviços sociais e de saúde, como os conservadores republicanos e mesmo alguns democratas acusam. O câncer que corrói a economia americana é o militarismo, alimentado pelos profundos interesses do complexo industrial-militar, nos grandes negócios em que as grandes corporações e militares se associam, fomentando um clima de supostas ameaças, um ambiente de medo, com o propósito de compelir o Congresso a aprovar vultosos recursos para o Pentágono e outros órgãos vinculados à defesa.

A indústria bélica, com toda a cadeia produtiva, constitui outra bolha que, mais cedo ou mais tarde, vai explodir. O governo dos Estados Unidos, seja com o presidente Barack Obama ou seja quem o suceder, não terá recursos para subsidiá-la, eternamente, com a encomenda de armamentos pelo Pentágono, nem manter centenas de bases militares e milhares de tropas, em todas as regiões do mundo. Decerto, cortar esses gastos é muito difícil. Afetaria a economia de vários Estados americanos, localizadas, sobretudo, no sunbelt (Texas, Missouri, Florida, Maryland e Virginia), onde funcionam as indústrias de armamentos que empregam tecnologia intensiva de capital. Em tais circunstâncias, em meio a propinas, suborno, pagamento de comissões aos que propiciam as encomendas, e contribuições para a campanha eleitoral dos partidos políticos, o complexo industrial-militar, com enorme peso econômico e político, exerce forte influência sobre o Congresso americano e sobre toda a mídia, principalmente nas redes de televisão. Porém, o incomparável poderio militar dos Estados Unidos tem limites econômicos. Irresponsabilidade fiscal, descontrole dos gastos públicos, altos déficits orçamentários, contínuo déficit na balança comercial, elevado endividamento externo, corrupção inerente ao conluio entre indústria bélica e o Pentágono, representado pelo complexo industrial-militar, recessão - fatores similares aos que produziram a crise da Grécia – representam a maior ameaça e podem derrotar a superpotência. E essa extrema vulnerabilidade de sua economia, com possibilidade de insolvência, as agências de classificação de risco não apontam.

http://www.cartacapital.com.br/app/mate ... 2=9&i=7089




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Re: ARTIGO: Cadê esse socialismo que nunca emplaca?

#15 Mensagem por tflash » Qui Jun 24, 2010 9:49 am

Desde o 11 de Setembro que a coisa anda tremida. A melhor comparação será a de um desequilíbrio em a pessoa aumenta a velocidade, dá mais uns passos para a frente para evitar a queda que acaba por acontecer uns momentos depois.

Nos Estados Unidos, o povo ignorante acha que vive no país com melhor nível de vida do mundo. O caso do sistema de saúde é flagrante. Uma pessoa que faça um golpe na cabeça, tem que pagar mais de 100 dólares para ser tratada num hospital se não tiver seguro de saúde. Nós os Portugueses e os Brasileiros que somos extremamente críticos para os nossos países, podemos nos queixar da falta de hospitais em determinadas zonas mas não de termos que pagar a totalidade da despesa hospitalar.

Aliás, eu como Português tenho os tratamentos pagos nos EUA, se por acaso tiver um acidente por lá, em férias ou seja, tenho menos preocupações que os cidadãos daquele país.

Ora isto é visto por muitos como o estado a tirar a capacidade de decidir aos cidadãos de como e quando são tratados e tem razão no ponto em que eu quer queira quer não tenho uma parte substancial do meu vencimento desviada para a assistência médica e posterior aposentação.

Ora como isso vem na retórica dos estados comunistas, o americano médio vê isso como mau. Os partidos políticos e os opinion makers vendem a ideia que um sistema de saúde universal é mau porque é comunista e trás aumento de impostos. A parte do aumento de impostos é verdade mas a paz de espírito que me trás, saber que se tiver um acidente ou uma doença, recebo todo o tratamento disponível pela instituição onde me dirijo e não ter que ver a minha vida arruinada por isso, não tem preço.

De qualquer modo, quase 20 anos depois do desmembramento da União soviética, tem muita gente ali com medo dos comunistas.




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