Fuga de miliciano seria parte de plano para executar autoridades que atuam contra a quadrilha
RIO - O ex-PM Carlos Ari Ribeiro, de 35 anos, - que em tese, por já estar detido no Batalhão Especial Prisional (BEP), exigiria menos esforço da polícia no cumprimento de seu sexto mandado de prisão, na operação feita nesta quinta-feira para desarticular a maior milícia da Zona Oeste - foi justamente o miliciano que mais deu trabalho, fugindo de forma suspeita do presídio de Benfica, na madrugada desta sexta. Braço direito armado (matador) de Ricardo Teixeira da Cruz, o Batman, que chefia a quadrilha juntamente com os irmãos Jerônimo e Natalino Guimarães, Carlos é considerado um dos mais perigosos do bando: responde a 12 processos por homicídios, além de inquéritos. Segundo fontes da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança, a quadrilha tem como plano reunir matadores para executar delegados, promotores, juízes e um deputado que atuaram contra os milicianos. A fuga teria sido financiada pelo bando.
Indignado, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, deu um ultimato ao comando da PM, que administra o BEP, destinado apenas a policiais militares, para que prenda Carlos imediatamente.
- É um absurdo. É ridículo que fatos como esse aconteçam. A polícia gasta energia e recursos públicos para prender e desarticular essa quadrilha de milicianos, e um bandido perigoso como ele foge. Determinei ao coronel Álvaro (Garcia, subcomandante operacional da PM) que não meça esforços para prender esse bandido o mais rápido possível - disse o secretário, lembrando que o comandante-geral da PM, Mário Sérgio Duarte, está num evento em Porto Alegre (RS).
Capitão é preso por facilitação
Um inquérito policial-militar (IPM) foi instaurado nesta sexta pela Corregedoria da PM para apurar se o ex-cabo contou com ajuda interna para fugir da carceragem do BEP, conhecido pela facilidade com que os presos se comunicam por celular, comandando seus negócios de dentro da cadeia. Suspeito de negligência, um capitão da PM - que comandava 11 policiais encarregados de vigiar o BEP - foi preso em flagrante, acusado de ter facilitado a fuga.
O próprio secretário de Segurança não se convenceu com as explicações dos investigadores do caso:
- O que chegou para mim foi que a fuga ocorreu pela sala da Defensoria Pública, mas pedi uma investigação rigorosa. Tomaremos providências com relação ao BEP. Já estou vendo outro imóvel para a construção de uma unidade com mais segurança. O BEP não está nada bom. Não estamos aqui de brincadeira. É inconcebível que sejamos vítima da incompetência das pessoas. Já afastamos quem estava no comando do batalhão e prendemos o oficial de dia, mas não vamos parar por aí. Chega. Eles (a PM) vão ter que recapturar o preso.
Segundo a Polícia Militar, o miliciano estava numa cela individual, no segundo andar do BEP. Para chegar à rua, ele teria arrombado a porta de uma sala onde funciona a Defensoria Pública, retirado o aparelho de ar-condicionado e, pelo buraco da parede, pulado para um pátio interno, entre o prédio e o muro de cerca de seis metros de altura, com arame farpado, que cerca o batalhão. Ainda segundo a PM, o bandido subiu uma escada que leva a uma guarita e, com ajuda de uma corda improvisada, chegou à Rua Célio Nascimento. Lá, teria embarcado num veículo e fugido. Um policial viu a movimentação e chegou a fazer um disparo. Estranhamente, o aparelho de ar-condicionado foi recolocado no lugar - um indício de que alguém facilitou a fuga.
Em pelo menos dois pontos do BEP, câmeras filmam e gravam imagens. O corregedor da corporação, coronel Roberto Menezes, que chegou ao BEP por volta das 6h, disse que supostamente houve favorecimento:
- Lacramos o computador que armazena as imagens e vamos levar tudo para a corregedoria. Somente lá vou verificar se as imagens registraram o momento da fuga.
Há 280 presos no BEP, sendo que 40 são ex-policiais. A fuga de Carlos Ari foi a segunda ocorrida este ano. A primeira foi do ex-PM e miliciano Franklin Roosevelt, em abril. Carlos não deveria estar preso na unidade porque já tinha sido excluído da PM. No entanto, como explicou o secretário de Segurança, o miliciano estava no BEP por ter sido beneficiado por uma liminar da 2 Câmara Criminal, proibindo sua transferência.
A promotora Isabella Pena Lucas, da Auditoria de Justiça Militar, informou que o Ministério Público vem se empenhando para retirar todos os ex-PMs do BEP:
- O convívio de ex-PMs com policiais militares no BEP não é nada bom. Estamos tentando acabar com isso. O ex-PM contamina o policial, que é assediado pelos milicianos para entrar para o bando. O policial que é excluído passa a ser pessoa comum. Ao ganhar o benefício de continuar na cadeia para PMs, ganha status lá dentro.
A informação da Subsecretaria de Inteligência de que o bando planeja matar autoridades que agiram contra a milícia deixou em alerta as supostas vítimas. O deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), que presidiu a CPI das Milícias em 2008, na Alerj, mudou sua rotina:
- Ele (Carlos Ari) é citado no relatório da CPI como um dos mais violentos. O mais difícil de se prender, por ironia, é o que já estava preso. O governo tem que ser responsabilizado por isso. Agora, ele está saindo para executar as pessoas. Quem está na linha de frente do combate ao crime fica numa situação difícil. A gente se questiona se vale a pena se arriscar.
Delegados atuantes no combate às milícias também tentam redobrar os cuidados, apesar de a Chefia de Polícia Civil ter retirado os carros blindados e a escolta deles.
Carlão foi preso em flagrante em junho de 2010 com uma pistola que, segundo exame balístico, foi usada em diversos homicídios. Ele era lotado no 6º BPM (Tijuca). Em sua residência foram apreendidos ainda uma lancha, três carros e duas motos. Na ocasião da prisão, o delegado Fábio Barucke afirmou que o PM era suspeito de pelo menos 16 assassinatos na região. Ainda de acordo com o delegado, escutas telefônicas mostraram que o soldado iria comprar um terreno de R$ 200 mil em Campo Grande.
A operação policial desta quinta-feira prendeu duas mulheres e três ex-policiais militares que integravam a mesma milícia. A quadrilha é comandada pelo ex-deputado estadual Natalino Guimarães junto com o irmão, o ex-vereador Jerominho. Os dois cumprem pena no presídio federal de segurança máxima de Campo Grande desde 2008.
Segundo a denúncia do Ministério Público, os milicianos cometiam uma grande variedade de crimes, como homicídios, extorsões, posse e porte ilegais de armas, com o objetivo de "dominação territorial e econômica de toda a região por meio da violência e da imposição do terror". As principais atividades ilícitas da quadrilha, de acordo com os promotores, são o domínio do transporte alternativo; a exploração de máquinas de caça-níqueis; o monopólio da venda de gás a preços superfaturados; a cobrança de taxas de segurança; a redistribuição de sinal de TV (gatonet); e a exploração de depósitos clandestinos de combustível (GNV).
Outros milicianos já conseguiram escapar da cadeia
Essa não foi a primeira vez que integrantes dessa milícia fogem da cadeia. Considerado um dos principais matadores do grupo, o ex-PM Ricardo Teixeira Cruz, o Batman, fugiu pela porta da frente do presídio de segurança máxima Bangu 8, em outubro de 2008. A fuga do miliciano só foi notada durante a contagem de presos, feita 24 horas depois de ele ter escapado. Batman deixou a cela com a autorização para ir a uma consulta médica dentro do próprio Complexo de Gericinó. O miliciano foi resgatado por três homens, que usavam coletes da Secretaria de Administração Penitenciária e estavam num Palio branco. Imagens do circuito interno de segurança do presídio captaram o momento da fuga, que teria custado R$ 1 milhão. Na época, uma sindicância foi instaurada. A investigação, contudo, não comprovou se a fuga havia sido comprada.
Fonte:
http://oglobo.globo.com/rio/mat/2011/09 ... z1WuoyKvth
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