Governo quer ter "golden share" na indústria bélica
Daniel Rittner
Em troca de um novo regime tributário e regulatório que
exima a indústria bélica nacional das amarras da Lei de
Licitações, além de acabar com a descontinuidade das compras
oficiais, o Plano Estratégico de Defesa proporá a concessão de
"golden shares" (ações especiais) ao governo em grandes
empresas do setor.
O plano, que está em elaboração e será apresentado dia
7 de setembro, teve suas conclusões preliminares divulgadas
ontem pelos ministros da Defesa, Nelson Jobim, e de Assuntos
Estratégicos, Mangabeira Unger. Eles apregoaram a
"reorganização radical" da indústria de defesa, com proteção às
empresas nacionais do setor. Para isso, segundo Mangabeira, é
essencial aplicar regras que protejam essas empresas do "curtoprazismo
mercantil" e não as submetam ao "risco de
descontinuidade de compras governamentais".
"Não podemos tratá-las como se elas vendessem
qualquer produto nacional", disse Mangabeira. Indústrias como
Helibrás, Avibrás, a fabricante de pistolas Taurus e a Mectron,
que produz radares e mísseis, podem ser alvo da tentativa do
governo de obter ações especiais como compensação por um programa robusto de fomento. É uma
forma de "assegurar o poder estratégico do Estado", conforme definiu o ministro extraordinário.
É essa a lógica que prevalece, segundo ele, nas negociações para a transferência de tecnologia
com outros países. "A todos eles deixamos claro que não estamos interessados em comprar produtos,
mas em parcerias", disse Mangabeira, depositando suas maiores esperanças nas conversas com França
e Rússia.
A reformulação da indústria de armamentos faz parte do tripé em que se baseia o Plano
Estratégico de Defesa. O segundo eixo trata da obrigatoriedade do serviço militar e a eventual criação de
um serviço social. O terceiro ponto é o reaparelhamento das Forças Armadas em função do desenho de
seis cenários possíveis de emprego das tropas - o monitoramento das fronteiras terrestres e marítimas
em circunstâncias de paz; a invasão de fronteiras por forças paramilitares, com o apoio velado ou não de
um país vizinho; uma guerra assimétrica na Amazônia contra uma potência bélica; uma guerra em outro
continente, com reflexos para o Brasil e emprego efetivo ou potencial de armas nucleares; a participação
do Brasil em missões de paz das Nações Unidas; e operações internas para garantia da lei e da ordem
em grandes metrópoles.
O projeto F-X da aeronáutica, cancelado em 2005 e recém-retomado, pode ir de novo para a
gaveta. Desta vez, porém, para dar lugar a um programa mais ousado: o desenvolvimento, com uma
potência bélica, do protótipo de uma novíssima geração de caças, provavelmente envolvendo a Embraer.
O projeto inicialmente consistia na compra de 8 a 12 caças para modernizar a frota brasileira, a um custo
aproximado de US$ 700 milhões. Desde o ano passado, a aeronáutica retomou as sondagens a grandes
fabricantes, numa compra que poderia chegar a vários bilhões de reais.
Jobim revelou que duas alternativas serão postas à mesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A primeira é de fazer a aquisição de caças de quarta geração - como o Rafale francês ou o Sukhoi russo
- barganhando "ao máximo" a transferência de tecnologia. Outra opção é deixar essa compra de lado e
investir todos os recursos com quatro finalidades: a modernização dos sistemas de armas dos caças já
disponíveis na frota da FAB; o avanço de projetos próprios de veículos não-tripulados (primeiro de
monitoramento e, depois, de combate); investimentos "maciços" em recursos humanos na aeronáutica; e
o desenvolvimento de uma quinta geração de caças. É um projeto "de décadas, não de anos", em que o
objetivo "é mais aprender do que fabricar", disse Mangabeira.
Na Marinha, a prioridade total é o desenvolvimento do submarino de propulsão nuclear, mas
outras ações incluem a redistribuição territorial das tropas, hoje excessivamente concentradas no Rio de
Janeiro. No Exército, a intenção é priorizar a Força de Ação Estratégica Rápida, extremamente móvel e
flexível, que abrange 10% do contingente da Força. Jobim deixou clara a necessidade de reforçar a presença militar na Amazônia, onde o contingente militar é de 27.236 homens - quase 80% do Exército.
"Temos de redimensionar inclusive o tamanho do efetivo."
Alan Marques/Folha Imagem
Nelson Jobim: projeto de
aquisição de caças para a FAB
pode ser trocado por programa de
desenvolvimento de protótipo
MINISTÉRIO DA DEFESA
Assessoria de Comunicação Social
Resenha Diária do Jornal:
VALOR ECONÔMICO 10/4/2008
Em:
https://www.defesa.gov.br/enternet/clip ... ipping.pdf