Enviado: Ter Set 25, 2007 5:07 pm
DEFESA NACIONAL
Caixa só para pessoal
Maior das forças armadas, o Exército usou R$ 15,8 bilhões para bancar as despesas com soldos, pensões e aposentadorias em 2006. Os investimentos em tecnologia, manutenção e treinamento foram de R$ 1,1 bilhão
Leonel Rocha
Da Equipe do Correio
O Exército brasileiro está na reserva ou na burocracia. O governo gasta mais pagando as aposentadorias de soldados, cabos, sargentos e oficiais que já estão de pijama do que com os atuais combatentes da ativa. Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, em julho, o governo desembolsou R$ 395, 2 milhões para pagar os salários e encargos sociais dos que estão servindo à força. Com os inativos, a despesa foi bem maior. Ultrapassou R$ 405 milhões. Se forem incluídos nessa conta os pensionistas, a despesa com o pessoal cresce mais R$ 334,9 milhões. Além dos que passaram para a reserva, esses gastos do governo incluem as viúvas e as filhas dos militares que não casaram e recebem pensão da União.
A maior das organizações militares, com cerca de 200 mil pessoas, vem se transformando em uma grande repartição pública que nas últimas décadas se especializou em recuperar armamento ultrapassado e trata de administrar a própria folha de pagamento. Em 2006, o Exército pagou R$ 15,8 bilhões entre salários, aposentadorias e pensões. No mesmo período, investiu em tecnologia, armamento e treinamento da tropa menos de 10% disso, aproximadamente R$ 1,1 bilhão.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, está preocupado com a situação e promete investimentos maciços para reverter o quadro, dando uma nova forma ao Exército. “O plano nacional de defesa vai redefinir o papel das três forças para realocarmos os recursos para o novo aparelhamento das tropas”, disse Jobim ao Correio.
Os gastos com pessoal são grandes porque a força tem 23 mil oficiais e 39 mil sargentos e subtenentes. A base da tropa é formada por 126 mil cabos e soldados, sendo 56 mil recrutas. O Exército passou a recrutar cerca de 100 mil jovens para o serviço militar obrigatório a pedido do governo. O número ideal seria de 70 mil. O aumento no efetivo aconteceu porque a convocação de recrutas passou a ser mais um programa social na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva dentro das Forças Armadas. O projeto é conhecido como Soldado Cidadão.
O comandante do Exército, general Enzo Martins Peri, sugeriu ao Ministério da Defesa um orçamento de R$ 4,4 bilhões para 2008. Dinheiro para custeio e investimentos. Mas a proposta do governo ao Congresso se limitou a R$ 3,1 bilhões. Com pouco dinheiro para o que importa, a força registra suas cerca de 500 unidades com baixo nível de operacionalidade. As exceções são as brigadas especiais de pára-quedistas e outros comandos de ponta. Segundo dados levantados pela área administrativa, desde 1995, quando foi implantado o Plano Real, o orçamento do Exército vem se descolando do Índice de Preços ao Consumidor Ampliado(IPCA). Pelo medidor oficial da inflação, o orçamento para investimento deveria ser de R$ 2,8 bilhões, mas somente R$ 1,2 bilhão foi aplicado.
Comprometimento
Com dinheiro curto, o Exército fica com sua ação limitada e compromete a capacidade de defesa da infra-estrutura do país. Os cinco grupos de baterias antiaéreas, uma das principais armas da força, estão com sua atuação comprometida. Cada grupo tem uma área de responsabilidade, mas nenhum poderia responder com eficiência a um suposto — e inesperado, em todas as simulações — ataque inimigo dentro do Brasil. Os canhões foram fabricados para serem operados com a ajuda de computadores instalados na arma. Mas defeitos na parte eletrônica e a falta de dinheiro para a manutenção do equipamento tem deixado as baterias antiaéreas apenas com capacidade de mira e disparo manuais.
Uma dessas baterias está instalada no Pico do Couto, em Petrópolis (RJ), e é encarregada de proteger as antenas e radares do Cindacta 1. Outra bateria fica instalada em Santa Cruz, subúrbio no oeste do Rio de Janeiro. As primeiras baterias antiaéreas foram compradas pelo Exército na década de 1970. A força gasta, com manutenção, até 5% a cada ano do valor de uma arma nova. Quanto mais antiga, mais cara é a manutenção. Os antigos carros Urutus, por exemplo, construídos pela Egesa ainda nos anos 1970, estão sendo repotencializados pelo arsenal de guerra, em São Paulo, para serem reutilizados pela força. Por causa do dinheiro escasso, o Exército está comprando usado o carro de combate alemão Leopard 1. Enquanto isso, o Exército do Chile está comprando modelos novos do Leopard. São veículos de uma geração tecnológica à frente.
Comparação feita pelo departamento administrativo da força mostra que, desde o governo do marechal Castelo Branco, em 1964, que o orçamento do Exército vem caindo dentro do Orçamento da União. No segundo ano do governo Juscelino Kubistchek, os investimentos na força representavam quase 15% do orçamento do governo federal, incluindo autarquias e fundações. Depois de cair para menos de 6% no governo João Goulart, os investimentos receberam um incremento de recursos após o golpe militar, ultrapassando 12% no início da gestão Costa e Silva. De lá para cá, vem caindo sistematicamente. Atingiu o seu ponto mais baixo durante a gestão de Itamar Franco, quando chegou perto de meio por cento (veja ilustração).
A gestão de Lula registrou o segundo menor percentual do orçamento da força em comparação com os gastos totais da União. Para o próximo ano, a gestão petista promete elevar os investimentos e as despesas de custeio do Exército. Mas tudo dependerá do nível de execução da lei orçamentária. O gasto do Exército representou, no ano passado, 0,07% do Produto Interno Bruto (PIB) que é o conjunto das riquezas produzidas pelo país. Este percentual se mantém desde 2004. Mal dá para a massa de salários, aposentadorias e pensões dos militares.