A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
O Globo:
O pior dos mundos
Marcelo Coutinho
Desde o início do governo Lula, o Brasil adotou um padrão novo de posicionamento em questões
relacionadas aos direitos humanos, passando a votar a favor de países como Irã e Coreia do Norte. Não
foi a primeira vez que o Brasil beneficiou regimes de força, mas a partir de então consolidou uma política
que destoou cada vez mais das nações democráticas. Houve um acentuado declínio nos valores da
civilização na nossa política externa, embora os últimos meses de 2010 possam ser de regeneração
benigna.
A partir do fim de 2008, a diplomacia brasileira recrudesceu seu novo comportamento,
amplamente criticado pelos movimentos de defesa dos direitos humanos. Supostamente em nome de
mais diálogo e menos politização, o governo passou a liderar um processo de revisão dos procedimentos
na ONU, sugerindo que o mundo parasse de censurar os violadores contumazes.
Embora o discurso oficial se contradiga e oscile entre os ideais wilsonianos de paz e o
pragmatismo amoral da realpolitik, a política externa está mais para a mal engendrada weltpolitik,
caracterizada pela maior assertividade e pressa com que busca a projeção mundial. No afã de aparecer
como ator independente e garantir um lugar ao sol, o governo acabou inconfessadamente se associando
a ditaduras, ainda que não tenha trazido qualquer vitória internacional ou ganho concreto ao Brasil.
O governo Lula defendeu que países da periferia saiam do jugo dos EUA. Fez isso com a
pretensão de expandir a influência brasileira no mundo mediante a relação especial que desenvolveu
justamente com os desafetos de Washington, em sua maioria governos repressores de todo tipo. Para a
diplomacia comandada pelo ministro Celso Amorim, os EUA de algum modo atrapalham a plena
ascensão do Brasil, querendo limitá-lo à América do Sul.
As grandes potências temem que nações emergentes minem a ordem internacional na qual já
ocupam posição privilegiada. Tanto quanto os EUA e a Europa, na prática China e Rússia não gostariam
que o Brasil ascendesse como uma potência mundial. Não é estranho, portanto, que o Brasil tenha ficado
isolado no Conselho de Segurança da ONU, no qual as cinco potências se alinharam contra
Ahmadinejad, incluindo a França, com quem estabelecemos parceria estratégica e passamos a importar
material bélico fundamental, por exemplo, para a defesa do pré-sal.
Se o Brasil almeja de fato um assento permanente no principal foro de decisão político-militar do
mundo, não seria conveniente polarizar com as potências que, ao final, podem vetá-lo. Não só isolados,
podemos acabar também sendo excluídos de uma nova balança de poder. A ONU comemorará 70 anos
em 2015. Seria uma excelente oportunidade para fazer as reformas multilaterais, desde que tenhamos
uma estratégia diplomática mais consistente, capaz de explorar as brechas do sistema mediante
propostas flexíveis.
Por sua vez, quando o governo avança em territórios longínquos acaba por descuidar-se da
própria região. Colômbia e Venezuela tensionaram suas relações já bastante complicadas, e o Brasil não
exerceu o mesmo empenho pela mediação se comparado à polêmica nuclear iraniana. Não podemos
pretender uma liderança global sem exercê-la regionalmente, onde ela é mais possível. Basta observar a
evolução da ordem internacional para ver que um sistema de relações entre países não funciona bem, e
pode acabar muito mal, quando se abdica da liderança política.
Evidentemente, o Brasil não deve alardear sua liderança, pois isso costuma gerar efeitos
contrários. Mas tampouco devemos permitir ficar com o pior dos mundos, isto é, aumento da
instabilidade regional, desgaste no campo dos direitos humanos e deterioração na qualidade das
exportações. Lembremos as sucessivas quedas no saldo da balança comercial, que em nada se
coadunam com uma diplomacia realmente pragmática e interessada no pleno desenvolvimento do país.
Em vez de mandar carta aos países da ONU pedindo para aliviar a vida dos tiranos, o Itamaraty
deveria considerar os efeitos perversos de longo prazo, relacionados a uma política externa que de
algum modo apoia regimes de força. A infeliz frase "negócios são negócios" pode um dia ser usada
contra o Brasil, um país sem grande poder militar, com riquezas tão vastas quanto as suas
vulnerabilidades. Um mundo sem princípios não é do nosso interesse.
MARCELO COUTINHO é professor de Relações Internacionais da UFRJ.
O pior dos mundos
Marcelo Coutinho
Desde o início do governo Lula, o Brasil adotou um padrão novo de posicionamento em questões
relacionadas aos direitos humanos, passando a votar a favor de países como Irã e Coreia do Norte. Não
foi a primeira vez que o Brasil beneficiou regimes de força, mas a partir de então consolidou uma política
que destoou cada vez mais das nações democráticas. Houve um acentuado declínio nos valores da
civilização na nossa política externa, embora os últimos meses de 2010 possam ser de regeneração
benigna.
A partir do fim de 2008, a diplomacia brasileira recrudesceu seu novo comportamento,
amplamente criticado pelos movimentos de defesa dos direitos humanos. Supostamente em nome de
mais diálogo e menos politização, o governo passou a liderar um processo de revisão dos procedimentos
na ONU, sugerindo que o mundo parasse de censurar os violadores contumazes.
Embora o discurso oficial se contradiga e oscile entre os ideais wilsonianos de paz e o
pragmatismo amoral da realpolitik, a política externa está mais para a mal engendrada weltpolitik,
caracterizada pela maior assertividade e pressa com que busca a projeção mundial. No afã de aparecer
como ator independente e garantir um lugar ao sol, o governo acabou inconfessadamente se associando
a ditaduras, ainda que não tenha trazido qualquer vitória internacional ou ganho concreto ao Brasil.
O governo Lula defendeu que países da periferia saiam do jugo dos EUA. Fez isso com a
pretensão de expandir a influência brasileira no mundo mediante a relação especial que desenvolveu
justamente com os desafetos de Washington, em sua maioria governos repressores de todo tipo. Para a
diplomacia comandada pelo ministro Celso Amorim, os EUA de algum modo atrapalham a plena
ascensão do Brasil, querendo limitá-lo à América do Sul.
As grandes potências temem que nações emergentes minem a ordem internacional na qual já
ocupam posição privilegiada. Tanto quanto os EUA e a Europa, na prática China e Rússia não gostariam
que o Brasil ascendesse como uma potência mundial. Não é estranho, portanto, que o Brasil tenha ficado
isolado no Conselho de Segurança da ONU, no qual as cinco potências se alinharam contra
Ahmadinejad, incluindo a França, com quem estabelecemos parceria estratégica e passamos a importar
material bélico fundamental, por exemplo, para a defesa do pré-sal.
Se o Brasil almeja de fato um assento permanente no principal foro de decisão político-militar do
mundo, não seria conveniente polarizar com as potências que, ao final, podem vetá-lo. Não só isolados,
podemos acabar também sendo excluídos de uma nova balança de poder. A ONU comemorará 70 anos
em 2015. Seria uma excelente oportunidade para fazer as reformas multilaterais, desde que tenhamos
uma estratégia diplomática mais consistente, capaz de explorar as brechas do sistema mediante
propostas flexíveis.
Por sua vez, quando o governo avança em territórios longínquos acaba por descuidar-se da
própria região. Colômbia e Venezuela tensionaram suas relações já bastante complicadas, e o Brasil não
exerceu o mesmo empenho pela mediação se comparado à polêmica nuclear iraniana. Não podemos
pretender uma liderança global sem exercê-la regionalmente, onde ela é mais possível. Basta observar a
evolução da ordem internacional para ver que um sistema de relações entre países não funciona bem, e
pode acabar muito mal, quando se abdica da liderança política.
Evidentemente, o Brasil não deve alardear sua liderança, pois isso costuma gerar efeitos
contrários. Mas tampouco devemos permitir ficar com o pior dos mundos, isto é, aumento da
instabilidade regional, desgaste no campo dos direitos humanos e deterioração na qualidade das
exportações. Lembremos as sucessivas quedas no saldo da balança comercial, que em nada se
coadunam com uma diplomacia realmente pragmática e interessada no pleno desenvolvimento do país.
Em vez de mandar carta aos países da ONU pedindo para aliviar a vida dos tiranos, o Itamaraty
deveria considerar os efeitos perversos de longo prazo, relacionados a uma política externa que de
algum modo apoia regimes de força. A infeliz frase "negócios são negócios" pode um dia ser usada
contra o Brasil, um país sem grande poder militar, com riquezas tão vastas quanto as suas
vulnerabilidades. Um mundo sem princípios não é do nosso interesse.
MARCELO COUTINHO é professor de Relações Internacionais da UFRJ.
"A reconquista da soberania perdida não restabelece o status quo."
Barão do Rio Branco
Barão do Rio Branco
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Barão do Rio Branco x Celso Amorim
JOÃO DANIEL LIMA DE ALMEIDA
Não é trivial que, 98 anos após o falecimento do patrono da diplomacia brasileira --em pleno Carnaval, é bom lembrar-- um chanceler o tenha finalmente ultrapassado em tempo de permanência no cargo, ainda que de modo não-contínuo.
Ousar comparar os períodos do barão do Rio Branco (1902-12) e de Celso Amorim (1993-4 e 2003-10) há de levantar criticas. Críticas metodológicas, pois os puristas recusam a possibilidade de comparar períodos tão distintos da história nacional, e críticas político-ideológicas, naturais quando se tratam de personalidades vivas e atuantes, ainda mais se ombreadas a ícones, como é o caso do Barão. Ciente dos riscos, assumo a tarefa.
Três foram os principais desafios enfrentados pelo Barão do Rio Branco no período de sua chancelaria ao longo de quatro presidentes (Rodrigues Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da Fonseca): 1) A rivalidade com os argentinos; 2) A defesa contra o imperialismo europeu; e, 3) A resolução dos problemas de limites brasileiros.
O primeiro problema permaneceria mesmo após sua gestão, e muitas das tentativas do Barão em equalizá-lo não deram resultados de curto prazo. Com nosso principal vizinho multiplicaram-se tensões comerciais, de imigração e até militares, como se viu no episódio do reaparelhamento naval do Brasil.
O segundo problema foi significativamente equacionado ao longo de sua gestão. Não desapareceu, mas diminui dramaticamente. O Brasil passa a ser respeitado na Europa e não se repetem episódios como o da ocupação brasileira da Ilha de Trindade pelos ingleses (1895) ou intervenção naval como a que ocorreu durante a revolta da Armada (1893) ou anos depois, na Venezuela (1902). No episódio conhecido como "O Caso Panther", a maior potência militar do mundo, a Alemanha, pediu desculpas ao Brasil por ter desembarcado marinheiros em território nacional sem autorização. O Brasil de Rio Branco não seria tratado como uma colônia européia.
É no triunfo sobre o terceiro problema que repousam os louros e glórias de José Maria da Silva Paranhos Jr. Sucesso é pouco! Se até hoje falamos 1 barão para se referir a mil cruzeiros, se o nome da capital do Acre, da principal avenida do centro do Rio de Janeiro e da prestigiosa escola diplomática brasileira levam seu nome, se o carnaval de 1912 foi interrompido por sua morte, é sobretudo porque, graças a ele, o Brasil é o único pais do mundo que, tendo dimensões continentais, não tem problemas de fronteiras com seus vizinhos. Em menos de 10 anos todas foram negociadas de modo pacífico, sem recurso às armas.
Duas estratégias foram essenciais para estes sucessos: 1) O americanismo e 2) a diplomacia do prestígio. E são essas estratégias que permitem melhor a comparação entre o Barão e Celso Amorim, já que, é claro, nossos objetivos de inserção internacional mudaram em um século.
A construção de uma 'aliança especial' informal com os EUA, à época maior comprador do nosso café, permitiu ao Brasil se beneficiar pragmaticamente nas disputas regionais. A Doutrina Monroe norte-americana garantiria proteção diplomática e, eventualmente militar, contra o imperialismo. A neutralidade norte-americana garantiu que o Barão não tivesse que se preocupar com intervenções estadunidenses em nossas questões de fronteiras. Exemplo paradigmático dessa estratégia foi o caso do Acre, arrendado pelos bolivianos à uma empresa de capital norte-americano (Bolivian Syndicate) foi indenizada pelo Brasil antes que isso pudesse chamar atenção do governo de Washington. Hoje, se o barão estivesse vivo, se aproximaria da China, da Índia, da África do Sul, que ocupam papel análogo de potências emergentes no cenário internacional. A diferença é que, no primeiro caso, havia assimetria clara de poder desfavorável ao Brasil. Hoje o Brasil quer fazer parte do clube de modo igualitário.
Já a "diplomacia do prestígio" ecoa até hoje na boca do nosso novo recordista do século 21. Superamos o "complexo de vira-latas". A melhora da imagem internacional do Brasil à época significou a abertura (ou reabertura, dado que Campos Salles, por economia de recursos havia fechado várias) de novas legações no exterior, além de estimular a criação de legações estrangeiras no Rio de Janeiro. Hoje o foco está na África e Ásia, onde cada nova embaixada (dezenas foram abertas) representa um voto potencial para as pretensões políticas brasileiras em foros multilaterais. A participação do Brasil em conferências internacionais (como a famosa conferência de Haia, na qual Rui Barbosa foi nosso delegado), tendo o Brasil sediado várias delas guarda analogias com as variadas siglas (BRIC, IBAS, ASPA, CASA, etc..) e Gês dos quais o Brasil faz parte hoje. O primeiro cardeal brasileiro (Joaquim Arcoverde) e as amplas reformas urbanas e sanitárias da capital com Pereira Passos e Oswaldo Cruz para "civilizar" o Rio de Janeiro, a vitória no concurso de arquitetura na exposição de Saint Louis com o Palácio Monroe (desmontado no governo Geisel), guardam hoje paralelo importante com a conquista da sede da Copa e das Olimpíadas.
Política externa é política de Estado, não de governo. No Brasil, o Itamaraty é o mais perto que se conseguiu chegar de uma burocracia de tipo weberiano e isso é garantia de continuidades, mais que de rupturas, na história de nossa política exterior. É como guiar um transatlântico, onde correções de rumo devem ser planejadas cuidadosamente com o olhar em cartas e instrumentos cuja trajetória futura é o guia do presente, ao contrário do Jet Ski ou da lancha, escravas da conjuntura e dos metros seguintes. Nesse leme, dez anos é muito tempo e os resultados de longo prazo. Se o barão serviu de paradigma por mais de meio século (seu legado durou, no mínimo, até a PEI em 1961), me parece que o atual modelo de inserção internacional brasileiro veio para ficar e guiará o Brasil no século XXI. Não como "vira-latas" do passado, ou como os rottweillers e Pitt-bulls americanos e soviéticos da guerra-fria, mas como um São Bernardo, grande e pacífico, respeitado por seus méritos e prestígio e não somente por sua força.
João Daniel Lima de Almeida é mestre em Relações Internacionais pela PUC-RJ
http://www1.folha.uol.com.br/mundo/8061 ... orim.shtml
JOÃO DANIEL LIMA DE ALMEIDA
Não é trivial que, 98 anos após o falecimento do patrono da diplomacia brasileira --em pleno Carnaval, é bom lembrar-- um chanceler o tenha finalmente ultrapassado em tempo de permanência no cargo, ainda que de modo não-contínuo.
Ousar comparar os períodos do barão do Rio Branco (1902-12) e de Celso Amorim (1993-4 e 2003-10) há de levantar criticas. Críticas metodológicas, pois os puristas recusam a possibilidade de comparar períodos tão distintos da história nacional, e críticas político-ideológicas, naturais quando se tratam de personalidades vivas e atuantes, ainda mais se ombreadas a ícones, como é o caso do Barão. Ciente dos riscos, assumo a tarefa.
Três foram os principais desafios enfrentados pelo Barão do Rio Branco no período de sua chancelaria ao longo de quatro presidentes (Rodrigues Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da Fonseca): 1) A rivalidade com os argentinos; 2) A defesa contra o imperialismo europeu; e, 3) A resolução dos problemas de limites brasileiros.
O primeiro problema permaneceria mesmo após sua gestão, e muitas das tentativas do Barão em equalizá-lo não deram resultados de curto prazo. Com nosso principal vizinho multiplicaram-se tensões comerciais, de imigração e até militares, como se viu no episódio do reaparelhamento naval do Brasil.
O segundo problema foi significativamente equacionado ao longo de sua gestão. Não desapareceu, mas diminui dramaticamente. O Brasil passa a ser respeitado na Europa e não se repetem episódios como o da ocupação brasileira da Ilha de Trindade pelos ingleses (1895) ou intervenção naval como a que ocorreu durante a revolta da Armada (1893) ou anos depois, na Venezuela (1902). No episódio conhecido como "O Caso Panther", a maior potência militar do mundo, a Alemanha, pediu desculpas ao Brasil por ter desembarcado marinheiros em território nacional sem autorização. O Brasil de Rio Branco não seria tratado como uma colônia européia.
É no triunfo sobre o terceiro problema que repousam os louros e glórias de José Maria da Silva Paranhos Jr. Sucesso é pouco! Se até hoje falamos 1 barão para se referir a mil cruzeiros, se o nome da capital do Acre, da principal avenida do centro do Rio de Janeiro e da prestigiosa escola diplomática brasileira levam seu nome, se o carnaval de 1912 foi interrompido por sua morte, é sobretudo porque, graças a ele, o Brasil é o único pais do mundo que, tendo dimensões continentais, não tem problemas de fronteiras com seus vizinhos. Em menos de 10 anos todas foram negociadas de modo pacífico, sem recurso às armas.
Duas estratégias foram essenciais para estes sucessos: 1) O americanismo e 2) a diplomacia do prestígio. E são essas estratégias que permitem melhor a comparação entre o Barão e Celso Amorim, já que, é claro, nossos objetivos de inserção internacional mudaram em um século.
A construção de uma 'aliança especial' informal com os EUA, à época maior comprador do nosso café, permitiu ao Brasil se beneficiar pragmaticamente nas disputas regionais. A Doutrina Monroe norte-americana garantiria proteção diplomática e, eventualmente militar, contra o imperialismo. A neutralidade norte-americana garantiu que o Barão não tivesse que se preocupar com intervenções estadunidenses em nossas questões de fronteiras. Exemplo paradigmático dessa estratégia foi o caso do Acre, arrendado pelos bolivianos à uma empresa de capital norte-americano (Bolivian Syndicate) foi indenizada pelo Brasil antes que isso pudesse chamar atenção do governo de Washington. Hoje, se o barão estivesse vivo, se aproximaria da China, da Índia, da África do Sul, que ocupam papel análogo de potências emergentes no cenário internacional. A diferença é que, no primeiro caso, havia assimetria clara de poder desfavorável ao Brasil. Hoje o Brasil quer fazer parte do clube de modo igualitário.
Já a "diplomacia do prestígio" ecoa até hoje na boca do nosso novo recordista do século 21. Superamos o "complexo de vira-latas". A melhora da imagem internacional do Brasil à época significou a abertura (ou reabertura, dado que Campos Salles, por economia de recursos havia fechado várias) de novas legações no exterior, além de estimular a criação de legações estrangeiras no Rio de Janeiro. Hoje o foco está na África e Ásia, onde cada nova embaixada (dezenas foram abertas) representa um voto potencial para as pretensões políticas brasileiras em foros multilaterais. A participação do Brasil em conferências internacionais (como a famosa conferência de Haia, na qual Rui Barbosa foi nosso delegado), tendo o Brasil sediado várias delas guarda analogias com as variadas siglas (BRIC, IBAS, ASPA, CASA, etc..) e Gês dos quais o Brasil faz parte hoje. O primeiro cardeal brasileiro (Joaquim Arcoverde) e as amplas reformas urbanas e sanitárias da capital com Pereira Passos e Oswaldo Cruz para "civilizar" o Rio de Janeiro, a vitória no concurso de arquitetura na exposição de Saint Louis com o Palácio Monroe (desmontado no governo Geisel), guardam hoje paralelo importante com a conquista da sede da Copa e das Olimpíadas.
Política externa é política de Estado, não de governo. No Brasil, o Itamaraty é o mais perto que se conseguiu chegar de uma burocracia de tipo weberiano e isso é garantia de continuidades, mais que de rupturas, na história de nossa política exterior. É como guiar um transatlântico, onde correções de rumo devem ser planejadas cuidadosamente com o olhar em cartas e instrumentos cuja trajetória futura é o guia do presente, ao contrário do Jet Ski ou da lancha, escravas da conjuntura e dos metros seguintes. Nesse leme, dez anos é muito tempo e os resultados de longo prazo. Se o barão serviu de paradigma por mais de meio século (seu legado durou, no mínimo, até a PEI em 1961), me parece que o atual modelo de inserção internacional brasileiro veio para ficar e guiará o Brasil no século XXI. Não como "vira-latas" do passado, ou como os rottweillers e Pitt-bulls americanos e soviéticos da guerra-fria, mas como um São Bernardo, grande e pacífico, respeitado por seus méritos e prestígio e não somente por sua força.
João Daniel Lima de Almeida é mestre em Relações Internacionais pela PUC-RJ
http://www1.folha.uol.com.br/mundo/8061 ... orim.shtml
"O correr da vida embrulha tudo,
a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem."
João Guimarães Rosa
a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem."
João Guimarães Rosa
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
FSP:
Política externa
Objetivos do Itamaraty estão corretos, mas sua execução perdeu-se em maniqueísmos, contradições e exibicionismo que é necessário superar
Toda política de um Estado em face dos demais países implica conciliar duas vertentes nem sempre acordes. De um lado, o interesse nacional, manifesto em necessidades de ordem econômica e apoiado, em última análise, na capacidade militar. De outro, o respeito a princípios que deveriam valer para todos os Estados.
No âmbito da civilização ocidental, a que bem ou mal pertencemos, esses princípios são os direitos humanos, a autodeterminação dos povos e a resolução negociada, pacífica até o limite extremo, dos conflitos internacionais.
Quanto mais harmônica for a relação entre os dois termos daquele dilema, mais eficaz será a política externa que a expressa e mais promissora a contribuição do Estado que a adota para a humanidade. É sob esse prisma que se deve avaliar a administração das relações exteriores do Brasil.
O Itamaraty tem acertado, na gestão petista como na tucana, ao enfatizar que o mundo evolui para uma dinâmica multipolar de poder, e ao aproveitar oportunidades que propiciem a países em desenvolvimento maior peso nos rumos da política internacional.
Se os objetivos estão corretos, o mesmo não se pode dizer do modo de alcançá-los durante o período Lula. Desvirtuou-se nossa política externa ao ser empregada para aplacar frustrações da militância partidária doméstica, erro acentuado pelo maniqueísmo tosco que tantas vezes prevaleceu nas decisões do presidente e de seus auxiliares.
Poucas vezes fomos tão incongruentes. Adotamos petulante rigor democrático, por exemplo, na crise de Honduras, mesmo depois de o país centro-americano realizar eleições livres, ao passo que festejamos ditaduras repulsivas como a teocracia do Irã e cultivamos, por sentimentalismo ideológico, não apenas o regime fossilizado de Cuba como seus imitadores autoritários na América do Sul.
O acervo de votos do Brasil nos foros internacionais que tratam de direitos humanos acumula equívocos, omissões e derrotas.
Temos um contencioso amplo e inevitável com os Estados Unidos, que só tende a crescer conforme o Brasil ganha dimensão comercial e geopolítica. Nenhum motivo recomenda incrementar artificialmente, por mero exibicionismo diplomático, uma frente de atritos já em si considerável.
Em relação ao Oriente Médio, a presença de expressivas comunidades de origem judaica e árabe em nossa sociedade, conjugada à distância que nos aparta daquela área conflagrada, deveria ditar uma política isenta, limitada a apoiar a negociação entre as partes. Depois de frenéticas e fúteis gestões numa região onde não temos interesse, perdemos isenção e credibilidade.
Tais percalços foram compensados pelo prestígio internacional que apesar deles continua a cercar o presidente Lula, com base no forte simbolismo de sua trajetória pessoal. Um(a) novo(a) presidente terá ocasião de corrigir os rumos de nossa diplomacia, que precisa ser mais eficiente no apoio à expansão comercial do país e menos contraditória na aplicação de princípios universais.
Política externa
Objetivos do Itamaraty estão corretos, mas sua execução perdeu-se em maniqueísmos, contradições e exibicionismo que é necessário superar
Toda política de um Estado em face dos demais países implica conciliar duas vertentes nem sempre acordes. De um lado, o interesse nacional, manifesto em necessidades de ordem econômica e apoiado, em última análise, na capacidade militar. De outro, o respeito a princípios que deveriam valer para todos os Estados.
No âmbito da civilização ocidental, a que bem ou mal pertencemos, esses princípios são os direitos humanos, a autodeterminação dos povos e a resolução negociada, pacífica até o limite extremo, dos conflitos internacionais.
Quanto mais harmônica for a relação entre os dois termos daquele dilema, mais eficaz será a política externa que a expressa e mais promissora a contribuição do Estado que a adota para a humanidade. É sob esse prisma que se deve avaliar a administração das relações exteriores do Brasil.
O Itamaraty tem acertado, na gestão petista como na tucana, ao enfatizar que o mundo evolui para uma dinâmica multipolar de poder, e ao aproveitar oportunidades que propiciem a países em desenvolvimento maior peso nos rumos da política internacional.
Se os objetivos estão corretos, o mesmo não se pode dizer do modo de alcançá-los durante o período Lula. Desvirtuou-se nossa política externa ao ser empregada para aplacar frustrações da militância partidária doméstica, erro acentuado pelo maniqueísmo tosco que tantas vezes prevaleceu nas decisões do presidente e de seus auxiliares.
Poucas vezes fomos tão incongruentes. Adotamos petulante rigor democrático, por exemplo, na crise de Honduras, mesmo depois de o país centro-americano realizar eleições livres, ao passo que festejamos ditaduras repulsivas como a teocracia do Irã e cultivamos, por sentimentalismo ideológico, não apenas o regime fossilizado de Cuba como seus imitadores autoritários na América do Sul.
O acervo de votos do Brasil nos foros internacionais que tratam de direitos humanos acumula equívocos, omissões e derrotas.
Temos um contencioso amplo e inevitável com os Estados Unidos, que só tende a crescer conforme o Brasil ganha dimensão comercial e geopolítica. Nenhum motivo recomenda incrementar artificialmente, por mero exibicionismo diplomático, uma frente de atritos já em si considerável.
Em relação ao Oriente Médio, a presença de expressivas comunidades de origem judaica e árabe em nossa sociedade, conjugada à distância que nos aparta daquela área conflagrada, deveria ditar uma política isenta, limitada a apoiar a negociação entre as partes. Depois de frenéticas e fúteis gestões numa região onde não temos interesse, perdemos isenção e credibilidade.
Tais percalços foram compensados pelo prestígio internacional que apesar deles continua a cercar o presidente Lula, com base no forte simbolismo de sua trajetória pessoal. Um(a) novo(a) presidente terá ocasião de corrigir os rumos de nossa diplomacia, que precisa ser mais eficiente no apoio à expansão comercial do país e menos contraditória na aplicação de princípios universais.
"A reconquista da soberania perdida não restabelece o status quo."
Barão do Rio Branco
Barão do Rio Branco
Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Marino escreveu:FSP:
Política externa
Objetivos do Itamaraty estão corretos, mas sua execução perdeu-se em maniqueísmos, contradições e exibicionismo que é necessário superar
Toda política de um Estado em face dos demais países implica conciliar duas vertentes nem sempre acordes. De um lado, o interesse nacional, manifesto em necessidades de ordem econômica e apoiado, em última análise, na capacidade militar. De outro, o respeito a princípios que deveriam valer para todos os Estados.
No âmbito da civilização ocidental, a que bem ou mal pertencemos, esses princípios são os direitos humanos, a autodeterminação dos povos e a resolução negociada, pacífica até o limite extremo, dos conflitos internacionais.
Quanto mais harmônica for a relação entre os dois termos daquele dilema, mais eficaz será a política externa que a expressa e mais promissora a contribuição do Estado que a adota para a humanidade. É sob esse prisma que se deve avaliar a administração das relações exteriores do Brasil.
O Itamaraty tem acertado, na gestão petista como na tucana, ao enfatizar que o mundo evolui para uma dinâmica multipolar de poder, e ao aproveitar oportunidades que propiciem a países em desenvolvimento maior peso nos rumos da política internacional.
Se os objetivos estão corretos, o mesmo não se pode dizer do modo de alcançá-los durante o período Lula. Desvirtuou-se nossa política externa ao ser empregada para aplacar frustrações da militância partidária doméstica, erro acentuado pelo maniqueísmo tosco que tantas vezes prevaleceu nas decisões do presidente e de seus auxiliares.
Poucas vezes fomos tão incongruentes. Adotamos petulante rigor democrático, por exemplo, na crise de Honduras, mesmo depois de o país centro-americano realizar eleições livres, ao passo que festejamos ditaduras repulsivas como a teocracia do Irã e cultivamos, por sentimentalismo ideológico, não apenas o regime fossilizado de Cuba como seus imitadores autoritários na América do Sul.
O acervo de votos do Brasil nos foros internacionais que tratam de direitos humanos acumula equívocos, omissões e derrotas.
Temos um contencioso amplo e inevitável com os Estados Unidos, que só tende a crescer conforme o Brasil ganha dimensão comercial e geopolítica. Nenhum motivo recomenda incrementar artificialmente, por mero exibicionismo diplomático, uma frente de atritos já em si considerável.
Em relação ao Oriente Médio, a presença de expressivas comunidades de origem judaica e árabe em nossa sociedade, conjugada à distância que nos aparta daquela área conflagrada, deveria ditar uma política isenta, limitada a apoiar a negociação entre as partes. Depois de frenéticas e fúteis gestões numa região onde não temos interesse, perdemos isenção e credibilidade.
Tais percalços foram compensados pelo prestígio internacional que apesar deles continua a cercar o presidente Lula, com base no forte simbolismo de sua trajetória pessoal. Um(a) novo(a) presidente terá ocasião de corrigir os rumos de nossa diplomacia, que precisa ser mais eficiente no apoio à expansão comercial do país e menos contraditória na aplicação de princípios universais.
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
CLÓVIS ROSSI
Um silêncio covarde
Brasil se cala novamente a respeito da proteção dos direitos humanos, agora no Prêmio Nobel da Paz
Que ensurdecedor -e triste- silêncio do governo brasileiro em relação à concessão do Nobel da Paz ao dissidente chinês Liu Xiaobo.
Nem precisava manifestar "grande alegria", tal como o fez, no ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para se referir a idêntico prêmio para seu colega Barack Obama.
O Itamaraty alega que chefe de Estado premiado é uma coisa, dissidente é outra. É claro que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, mas parece-me muito mais digno manifestar alegria pela premiação de quem luta pelos direitos humanos do que pela do presidente de um país que estava -e continua- envolvido em duas guerras.
Para tornar ainda mais moral e eticamente inaceitável o silêncio, há o fato de que, na mensagem a Obama, Lula mencionara Martin Luther King e "sua luta pelos direitos civis". Ora, Liu também luta pelos direitos civis. Não merece idêntico respeito?
Convém lembrar também que o governo estaria obrigado até constitucionalmente a manifestar-se, posto que o artigo 4 da Constituição cita a "prevalência dos direitos humanos" entre os princípios a serem utilizados pelo Brasil em suas relações internacionais.
De que tem medo o governo Lula quando se trata de violações aos direitos humanos que envolvem ditaduras?
Os Estados Unidos mantêm com os chineses relações intensas, obtiveram deles até a aprovação das sanções ao Irã, gesto a que o Brasil se recusou.
Ainda assim, na mensagem que emitiu a propósito do Nobel para Liu, Obama ousou pedir ao governo chinês que "solte o sr. Liu o mais depressa possível".
Já o Brasil pediu ao Irã que libertasse a francesa Clotilde Reiss e, mais recentemente, uma americana, até por pedido do Departamento de Estado. Nem por isso, o Irã rompeu relações com o Brasil. Que custo teria já nem digo pedir a libertação de Liu mas, ao menos, soltar uma nota parabenizando-o?
Depois, as autoridades brasileiras resmungam quando o país é criticado por seu silêncio na questão de direitos humanos ou, pior ainda, por dar, mais de uma vez, a impressão de que apoia a repressão aos dissidentes no Irã ou em Cuba.
Crítica, de resto, feita até por acadêmicos que, no conjunto da obra, aplaudem a atuação da diplomacia brasileira.
Direitos humanos, convém repetir até a morte, não é uma questão interna de cada país. É universal.
Como pode um governo que paga indenizações a vítimas de uma ditadura - como, de resto, é justo que o faça- silenciar ante vítimas de outras ditaduras?
Apenas em nome dos negócios com a China? Não é eticamente aceitável, mas, ainda que o fosse, convém anotar cálculos de Kevin P. Gallagher, professor associado de Relações Internacionais da Boston University: para ele, 30% das exportações brasileiras de manufaturados estão sob ameaça direta da produção chinesa, pelo avanço desta nos mercados da América Latina e do Caribe, e mais 54% sob ameaça indireta, que é quando a fatia de mercado da produção latino-americana aumenta a um ritmo inferior ao da China.
Um silêncio covarde
Brasil se cala novamente a respeito da proteção dos direitos humanos, agora no Prêmio Nobel da Paz
Que ensurdecedor -e triste- silêncio do governo brasileiro em relação à concessão do Nobel da Paz ao dissidente chinês Liu Xiaobo.
Nem precisava manifestar "grande alegria", tal como o fez, no ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para se referir a idêntico prêmio para seu colega Barack Obama.
O Itamaraty alega que chefe de Estado premiado é uma coisa, dissidente é outra. É claro que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, mas parece-me muito mais digno manifestar alegria pela premiação de quem luta pelos direitos humanos do que pela do presidente de um país que estava -e continua- envolvido em duas guerras.
Para tornar ainda mais moral e eticamente inaceitável o silêncio, há o fato de que, na mensagem a Obama, Lula mencionara Martin Luther King e "sua luta pelos direitos civis". Ora, Liu também luta pelos direitos civis. Não merece idêntico respeito?
Convém lembrar também que o governo estaria obrigado até constitucionalmente a manifestar-se, posto que o artigo 4 da Constituição cita a "prevalência dos direitos humanos" entre os princípios a serem utilizados pelo Brasil em suas relações internacionais.
De que tem medo o governo Lula quando se trata de violações aos direitos humanos que envolvem ditaduras?
Os Estados Unidos mantêm com os chineses relações intensas, obtiveram deles até a aprovação das sanções ao Irã, gesto a que o Brasil se recusou.
Ainda assim, na mensagem que emitiu a propósito do Nobel para Liu, Obama ousou pedir ao governo chinês que "solte o sr. Liu o mais depressa possível".
Já o Brasil pediu ao Irã que libertasse a francesa Clotilde Reiss e, mais recentemente, uma americana, até por pedido do Departamento de Estado. Nem por isso, o Irã rompeu relações com o Brasil. Que custo teria já nem digo pedir a libertação de Liu mas, ao menos, soltar uma nota parabenizando-o?
Depois, as autoridades brasileiras resmungam quando o país é criticado por seu silêncio na questão de direitos humanos ou, pior ainda, por dar, mais de uma vez, a impressão de que apoia a repressão aos dissidentes no Irã ou em Cuba.
Crítica, de resto, feita até por acadêmicos que, no conjunto da obra, aplaudem a atuação da diplomacia brasileira.
Direitos humanos, convém repetir até a morte, não é uma questão interna de cada país. É universal.
Como pode um governo que paga indenizações a vítimas de uma ditadura - como, de resto, é justo que o faça- silenciar ante vítimas de outras ditaduras?
Apenas em nome dos negócios com a China? Não é eticamente aceitável, mas, ainda que o fosse, convém anotar cálculos de Kevin P. Gallagher, professor associado de Relações Internacionais da Boston University: para ele, 30% das exportações brasileiras de manufaturados estão sob ameaça direta da produção chinesa, pelo avanço desta nos mercados da América Latina e do Caribe, e mais 54% sob ameaça indireta, que é quando a fatia de mercado da produção latino-americana aumenta a um ritmo inferior ao da China.
"A reconquista da soberania perdida não restabelece o status quo."
Barão do Rio Branco
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
agora brasil tem que ser o paladino da justiça?
PQ eu so vi os EUA reclamarem. E todos sabem que a relação dos 2 anda +- tensa com uma micro-guerra comercial.
PQ eu so vi os EUA reclamarem. E todos sabem que a relação dos 2 anda +- tensa com uma micro-guerra comercial.
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
A política externa sem Lula
Sergio Leo
04/10/2010 Valor Econômico
Ao aproveitar a reunião do G-20, na Coreia, em novembro, para apresentar seu sucessor à comunidade internacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encerrará uma nova etapa da política externa brasileira, em que a crescente presença do Brasil nas instâncias de decisão mundiais foi impulsionada pela figura do carismático líder metalúrgico, capaz de persistir na via democrática para chegar ao poder e de combinar o respeito aos mercados com uma ativa política de distribuição de renda. Não à toa, Lula pretende fazer, de seu discurso na Coreia, um balanço de seu governo.
Há consenso entre os analistas que a saída de Lula obriga o próximo governo a modificar, se não a essência, a forma de atuação internacional. O Brasil de democracia consolidada, das enormes florestas, do petróleo no pré-sal, das imensas riquezas naturais e de atrativo mercado consumidor está destinado a ter presença importante no cenário internacional, mas quem o comandará a partir de 2011 não terá suas declarações recebidas com a mesma benevolência concedida ao presidente de metáforas exóticas e trânsito fácil, agora em fim de mandato.
Há, no Brasil, quem atribua o respeito adquirido pela política externa brasileira apenas à enorme popularidade de Lula também no exterior . É um equívoco. A influência e a visibilidade do Brasil nos órgãos multilaterais e nos eventos mundiais não se deve apenas à singularidade do presidente operário, o Lech Walesa que deu certo - na feliz definição do antecessor, Fernando Henrique Cardoso, em comparação com o ex-líder sindical polonês, que também foi presidente e mito internacional.
É grande a resistência à liderança brasileira nos países vizinhos
Houve e há muito do trabalho de respeitados diplomatas brasileiros na configuração da política externa dos últimos oito anos. Foram também os êxitos dessa política, nem sempre reconhecidos no país, que garantiram ao Brasil presença nas mesas de decisão do mundo - ainda que tenha sido em vão, até agora, o esforço do governo para ter cadeira cativa em uma das principais dessas mesas, o Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Faltou ao Brasil, no governo Lula, uma estratégia mais eficaz para prevenir e tratar as ameaças aos interesses nacionais surgidas nos países vizinhos, quase todos conturbados por profundas mudanças internas, reviravoltas políticas e, em alguns casos, na situação econômica. Ainda é grande a resistência à liderança brasileira, refletida na lentidão dos projetos sul-americanos de integração; e ainda surgem sem aviso ações contrárias à economia brasileira, como medidas protecionistas do principal sócio regional, a Argentina.
Seria injustiça, porém, negar os avanços. Com a criação de comissões de monitoramento de comércio com os sócios comerciais no continente, foram abortadas pela negociação preventiva discordâncias que poderiam se desdobrar em crises comerciais. Listado entre os governos confiáveis à comunidade financeira internacional, o Brasil conseguiu, nos últimos anos, evitar conflito direto com os chamados países "bolivarianos" de tendência estatista e agressiva retórica diplomática, estabelecendo com os governos desses países, onde é forte a interferência presidencial nos negócios, uma linha direta de defesa dos interesses de cidadãos e empresas brasileiras.
O esforço para institucionalizar mecanismos internacionais de decisão e solução de conflitos é, talvez, uma das principais marcas do governo que acaba, a ser herdada pelo que começará em 2011. Um dos resultados mais notáveis foi a transformação, em G-20 - com presença atuante do Brasil-, do G-7, o grupo de países ricos que, até a última crise financeira, decidia as ações conjuntas de governança econômica mundial. Nas negociações comerciais, o acordo de livre comércio entre Estados Unidos e Colômbia, assinado há quatro anos, e até hoje bloqueado no Congresso dos EUA, mostra o exagero dos que apontam a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) como oportunidade perdida para a economia brasileira. Não se pode culpar a diplomacia de Lula pelos impasses nas negociações internacionais comerciais, que, no caso da Organização Mundial do Comércio (OMC), até ressaltaram o protagonismo brasileiro, ainda que o único resultado prático tenha sido bloquear um acordo entre EUA e União Europeia, que ameaçava interesses nos países em desenvolvimento.
Na América do Sul, a heterogeneidade entre as economias e a situação política da Argentina (além de resistências no próprio setor privado brasileiro) impediram a consolidação do Mercosul. Mas evitou-se o retrocesso e houve pequenas conquistas, como a criação de um fundo, o Focem, para investimentos na integração, e um sistema para acabar com a cobrança dupla da tarifa de importação no bloco.
A crise da semana passada no Equador, tratada entre os vizinhos por meio da Unasul, uma iniciativa brasileira, mostra que o esforço institucional da diplomacia sob governo atual tem o potencial de deixar heranças positivas para a governabilidade da região. A reunião, que decidiu estabelecer uma "cláusula democrática" no continente, prescindiu até da presença de Lula, que, no Brasil, se empenhava na própria sucessão.
Sergio Leo é repórter especial e escreve às segundas-feiras
E-mail sergio.leo@valor.com.br
Sergio Leo
04/10/2010 Valor Econômico
Ao aproveitar a reunião do G-20, na Coreia, em novembro, para apresentar seu sucessor à comunidade internacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encerrará uma nova etapa da política externa brasileira, em que a crescente presença do Brasil nas instâncias de decisão mundiais foi impulsionada pela figura do carismático líder metalúrgico, capaz de persistir na via democrática para chegar ao poder e de combinar o respeito aos mercados com uma ativa política de distribuição de renda. Não à toa, Lula pretende fazer, de seu discurso na Coreia, um balanço de seu governo.
Há consenso entre os analistas que a saída de Lula obriga o próximo governo a modificar, se não a essência, a forma de atuação internacional. O Brasil de democracia consolidada, das enormes florestas, do petróleo no pré-sal, das imensas riquezas naturais e de atrativo mercado consumidor está destinado a ter presença importante no cenário internacional, mas quem o comandará a partir de 2011 não terá suas declarações recebidas com a mesma benevolência concedida ao presidente de metáforas exóticas e trânsito fácil, agora em fim de mandato.
Há, no Brasil, quem atribua o respeito adquirido pela política externa brasileira apenas à enorme popularidade de Lula também no exterior . É um equívoco. A influência e a visibilidade do Brasil nos órgãos multilaterais e nos eventos mundiais não se deve apenas à singularidade do presidente operário, o Lech Walesa que deu certo - na feliz definição do antecessor, Fernando Henrique Cardoso, em comparação com o ex-líder sindical polonês, que também foi presidente e mito internacional.
É grande a resistência à liderança brasileira nos países vizinhos
Houve e há muito do trabalho de respeitados diplomatas brasileiros na configuração da política externa dos últimos oito anos. Foram também os êxitos dessa política, nem sempre reconhecidos no país, que garantiram ao Brasil presença nas mesas de decisão do mundo - ainda que tenha sido em vão, até agora, o esforço do governo para ter cadeira cativa em uma das principais dessas mesas, o Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Faltou ao Brasil, no governo Lula, uma estratégia mais eficaz para prevenir e tratar as ameaças aos interesses nacionais surgidas nos países vizinhos, quase todos conturbados por profundas mudanças internas, reviravoltas políticas e, em alguns casos, na situação econômica. Ainda é grande a resistência à liderança brasileira, refletida na lentidão dos projetos sul-americanos de integração; e ainda surgem sem aviso ações contrárias à economia brasileira, como medidas protecionistas do principal sócio regional, a Argentina.
Seria injustiça, porém, negar os avanços. Com a criação de comissões de monitoramento de comércio com os sócios comerciais no continente, foram abortadas pela negociação preventiva discordâncias que poderiam se desdobrar em crises comerciais. Listado entre os governos confiáveis à comunidade financeira internacional, o Brasil conseguiu, nos últimos anos, evitar conflito direto com os chamados países "bolivarianos" de tendência estatista e agressiva retórica diplomática, estabelecendo com os governos desses países, onde é forte a interferência presidencial nos negócios, uma linha direta de defesa dos interesses de cidadãos e empresas brasileiras.
O esforço para institucionalizar mecanismos internacionais de decisão e solução de conflitos é, talvez, uma das principais marcas do governo que acaba, a ser herdada pelo que começará em 2011. Um dos resultados mais notáveis foi a transformação, em G-20 - com presença atuante do Brasil-, do G-7, o grupo de países ricos que, até a última crise financeira, decidia as ações conjuntas de governança econômica mundial. Nas negociações comerciais, o acordo de livre comércio entre Estados Unidos e Colômbia, assinado há quatro anos, e até hoje bloqueado no Congresso dos EUA, mostra o exagero dos que apontam a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) como oportunidade perdida para a economia brasileira. Não se pode culpar a diplomacia de Lula pelos impasses nas negociações internacionais comerciais, que, no caso da Organização Mundial do Comércio (OMC), até ressaltaram o protagonismo brasileiro, ainda que o único resultado prático tenha sido bloquear um acordo entre EUA e União Europeia, que ameaçava interesses nos países em desenvolvimento.
Na América do Sul, a heterogeneidade entre as economias e a situação política da Argentina (além de resistências no próprio setor privado brasileiro) impediram a consolidação do Mercosul. Mas evitou-se o retrocesso e houve pequenas conquistas, como a criação de um fundo, o Focem, para investimentos na integração, e um sistema para acabar com a cobrança dupla da tarifa de importação no bloco.
A crise da semana passada no Equador, tratada entre os vizinhos por meio da Unasul, uma iniciativa brasileira, mostra que o esforço institucional da diplomacia sob governo atual tem o potencial de deixar heranças positivas para a governabilidade da região. A reunião, que decidiu estabelecer uma "cláusula democrática" no continente, prescindiu até da presença de Lula, que, no Brasil, se empenhava na própria sucessão.
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"If the people who marched actually voted, we wouldn’t have to march in the first place".
"(Poor) countries are poor because those who have power make choices that create poverty".
ubi solitudinem faciunt pacem appellant
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Sinceramente? Acho isto uma babaquice. Como disse Sterrius, por quê o Brasil deve se juntar aos Estados Unidos como o Paladino da Justiça (não tinha um personagem de seriado de "bang-bang" com esse nome?) global? Isso tem cheiro de propaganda política para ganhar eleição, como o Serra - infelizmente - faz com aquela papagaiada sobre o Irã.Marino escreveu:CLÓVIS ROSSI
Um silêncio covarde
Brasil se cala novamente a respeito da proteção dos direitos humanos, agora no Prêmio Nobel da Paz
Que ensurdecedor -e triste- silêncio do governo brasileiro em relação à concessão do Nobel da Paz ao dissidente chinês Liu Xiaobo.
Hoje, o Brasil é o "Paladino da Justiça". Amanhã, será o "Policial do Mundo", desembarcando tropas, aqui e acolá, para "salvar a Democracia".
É mesmo? Vou lembrar disso, no dia que ocorrer algum problema de direitos humanos em Raposa Serra do Sol, e a OTAN começar a preparar tropas para um desembarque aeroterrestre, em grande escala, para "salvar os indiozinhos daqueles brasileiros maus".Direitos humanos, convém repetir até a morte, não é uma questão interna de cada país. É universal.
Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Como podemos ver a mídia PIG fica horrorizada de ver como Lula se recusa ser capacho dos EUA, isso é inadmissível, que erro imperdoável fazer isso com os coitadinhos dos EUA, nosso patrão, ops, aliado! É mesmo engraçado, eu mandaria essa galera passar uma temporada em Guantânamo!
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- rodrigo
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Para Vargas Llosa, Lula tem conduta 'esquizofrênica' no governo
Em visita ao Brasil após prêmio Nobel, peruano diz que postura democrática do presidente não se reproduz na política externa
Em sua primeira visita ao Brasil desde que foi agraciado com o prêmio Nobel de Literatura na semana passada, o escritor peruano Mario Vargas Llosa, 74, chamou de "esquizofrênica" a conduta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no governo brasileiro.
"Lula fez evolução notável na política interna. Há no Brasil um desenvolvimento que impressiona o mundo inteiro, conduzido por posições democráticas admiráveis. O que lamento é que (ele) não tenha uma política internacional equivalente", disse Vargas Llosa, que criticou a relação que Lula mantém com o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad.
"Lá (Irã) estão atirando pedras em mulheres adúlteras! Como (Lula) vai legitimar um tirano assassino que representa uma forma anacrônica de fanatismo? (...) Há razões políticas, geopolíticas, mas não há razão ética ou moral que justifique esse tipo de esquizofrenia na conduta de um governante", disse o peruano.
Ele ainda se disse "desconcertado, entristecido e indignado" com o encontro entre Lula e o líder cubano Raúl Castro em janeiro, quando o dissidente político cubano Orlando Zapata morreu em razão de uma greve de fome. "Por que um democrata no Brasil vai se abraçar com um ditador repelente como o sr. Castro no mesmo momento em que está morrendo um dissidente?"
Vargas Llosa falou nesta quarta-feira a funcionários do Grupo Abril, em São Paulo, em entrevista conduzida pelo jornalista Ricardo Setti. Ao longo de uma hora, ele tratou da sua reação ao Nobel, da relação entre política e literatura e dos motivos que o fazem estar "mais otimista" quanto aos destinos do mundo e da América Latina.
Correção política
Defensor do liberalismo na economia e na política, Vargas Llosa disse ter ficado "surpreso" com a notícia de que recebera o maior prêmio da literatura mundial, principalmente ao levar em conta os últimos ganhadores.
"A impressão é que eles não queriam dar o prêmio a pessoas controvertidas, principalmente do Terceiro Mundo. Preferiam os que seguiam uma certa correção política. Mas, posto que me deram o prêmio, parece que estavam errados", disse o peruano, provocando risos na plateia.
Vargas Llosa rejeitou a ideia de que a sua atuação política (ele escreve com frequência artigos e ensaios sobre o tema) afete negativamente a sua produção literária.
"A literatura não deve se afastar da vida. (...) Gostaria que a minha obra fosse como uma esponja que absorvesse tudo o que acontece no seu tempo. Não conheço grande literatura que tenha sido indiferente à política."
Desmonte do comunismo
Sobre os rumos da política mundial, o escritor disse estar hoje mais otimista do que há alguns anos, citando o "desmonte" do comunismo.
"Lembro-me de um discurso do Henry Kissinger (secretário de Estado americano entre 1973 e 1977), que não é um tonto, pouco antes da queda do Muro de Berlim (1989). Ele disse: 'Senhoras e senhores, tenhamos claro que o comunismo está aqui para ficar'. Mas ele desapareceu, e não porque foi derrotado pelo Ocidente, mas por uma putrefação interna, por uma incapacidade de organizar uma economia produtiva, porque o sistema de controle do pensamento e da vida o foi asfixiando."
Vargas Llosa também considera que a América Latina evoluiu substancialmente nos últimos anos, com a expansão e a consolidação da democracia.
"(Na América do Sul) hoje só temos uma semiditadura, a de Hugo Chávez, que foi derrotada nas últimas eleições e tem um fracasso econômico enorme. Dificilmente o regime vai sobreviver muito tempo."
Segundo o escritor, os avanços recentes fazem com que o continente "comece a recuperar o tempo perdido". Mas ele alerta que, apesar do progresso, "não se pode cair na ingenuidade, porque pode haver volta".
Experiência desoladora
Para o peruano, situação muito menos promissora que a América Latina tem a República Democrática do Congo, país que ele visitou durante a produção do seu último livro, O sonho do celta, ainda não publicado no Brasil.
A obra trata da vida do diplomata irlandês Roger Casement (1864-1916), que denunciou os abusos cometidos na colonização do então Congo belga pelo rei Leopoldo 2º, entre os séculos 19 e 20.
Vargas Llosa conta que a viagem ao país africano, que durou 15 dias, foi a experiência "mais desoladora, triste e deprimente" de sua vida.
"Vi um médico congolês que me disse: 'o problema número um deste país são os estupros. Aqui, há muitos anos que não se estupra por prazer sexual, o estupro é uma arma para humilhar o adversário. Te digo que num povoado não há uma só mulher que nunca tenha sido estuprada'. Ele me disse isso e começou a chorar de modo atroz."
Para Vargas Llosa, o cenário é tão grave que os prognósticos de que o país não tem solução "pode ser verdadeiro". "Mas, se é certo, a culpa maior, a responsabilidade principal de que o país tenha chegado a essa situação de espanto é a colonização belga, é o que os belgas fizeram ali", diz o escritor.
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Em visita ao Brasil após prêmio Nobel, peruano diz que postura democrática do presidente não se reproduz na política externa
Em sua primeira visita ao Brasil desde que foi agraciado com o prêmio Nobel de Literatura na semana passada, o escritor peruano Mario Vargas Llosa, 74, chamou de "esquizofrênica" a conduta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no governo brasileiro.
"Lula fez evolução notável na política interna. Há no Brasil um desenvolvimento que impressiona o mundo inteiro, conduzido por posições democráticas admiráveis. O que lamento é que (ele) não tenha uma política internacional equivalente", disse Vargas Llosa, que criticou a relação que Lula mantém com o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad.
"Lá (Irã) estão atirando pedras em mulheres adúlteras! Como (Lula) vai legitimar um tirano assassino que representa uma forma anacrônica de fanatismo? (...) Há razões políticas, geopolíticas, mas não há razão ética ou moral que justifique esse tipo de esquizofrenia na conduta de um governante", disse o peruano.
Ele ainda se disse "desconcertado, entristecido e indignado" com o encontro entre Lula e o líder cubano Raúl Castro em janeiro, quando o dissidente político cubano Orlando Zapata morreu em razão de uma greve de fome. "Por que um democrata no Brasil vai se abraçar com um ditador repelente como o sr. Castro no mesmo momento em que está morrendo um dissidente?"
Vargas Llosa falou nesta quarta-feira a funcionários do Grupo Abril, em São Paulo, em entrevista conduzida pelo jornalista Ricardo Setti. Ao longo de uma hora, ele tratou da sua reação ao Nobel, da relação entre política e literatura e dos motivos que o fazem estar "mais otimista" quanto aos destinos do mundo e da América Latina.
Correção política
Defensor do liberalismo na economia e na política, Vargas Llosa disse ter ficado "surpreso" com a notícia de que recebera o maior prêmio da literatura mundial, principalmente ao levar em conta os últimos ganhadores.
"A impressão é que eles não queriam dar o prêmio a pessoas controvertidas, principalmente do Terceiro Mundo. Preferiam os que seguiam uma certa correção política. Mas, posto que me deram o prêmio, parece que estavam errados", disse o peruano, provocando risos na plateia.
Vargas Llosa rejeitou a ideia de que a sua atuação política (ele escreve com frequência artigos e ensaios sobre o tema) afete negativamente a sua produção literária.
"A literatura não deve se afastar da vida. (...) Gostaria que a minha obra fosse como uma esponja que absorvesse tudo o que acontece no seu tempo. Não conheço grande literatura que tenha sido indiferente à política."
Desmonte do comunismo
Sobre os rumos da política mundial, o escritor disse estar hoje mais otimista do que há alguns anos, citando o "desmonte" do comunismo.
"Lembro-me de um discurso do Henry Kissinger (secretário de Estado americano entre 1973 e 1977), que não é um tonto, pouco antes da queda do Muro de Berlim (1989). Ele disse: 'Senhoras e senhores, tenhamos claro que o comunismo está aqui para ficar'. Mas ele desapareceu, e não porque foi derrotado pelo Ocidente, mas por uma putrefação interna, por uma incapacidade de organizar uma economia produtiva, porque o sistema de controle do pensamento e da vida o foi asfixiando."
Vargas Llosa também considera que a América Latina evoluiu substancialmente nos últimos anos, com a expansão e a consolidação da democracia.
"(Na América do Sul) hoje só temos uma semiditadura, a de Hugo Chávez, que foi derrotada nas últimas eleições e tem um fracasso econômico enorme. Dificilmente o regime vai sobreviver muito tempo."
Segundo o escritor, os avanços recentes fazem com que o continente "comece a recuperar o tempo perdido". Mas ele alerta que, apesar do progresso, "não se pode cair na ingenuidade, porque pode haver volta".
Experiência desoladora
Para o peruano, situação muito menos promissora que a América Latina tem a República Democrática do Congo, país que ele visitou durante a produção do seu último livro, O sonho do celta, ainda não publicado no Brasil.
A obra trata da vida do diplomata irlandês Roger Casement (1864-1916), que denunciou os abusos cometidos na colonização do então Congo belga pelo rei Leopoldo 2º, entre os séculos 19 e 20.
Vargas Llosa conta que a viagem ao país africano, que durou 15 dias, foi a experiência "mais desoladora, triste e deprimente" de sua vida.
"Vi um médico congolês que me disse: 'o problema número um deste país são os estupros. Aqui, há muitos anos que não se estupra por prazer sexual, o estupro é uma arma para humilhar o adversário. Te digo que num povoado não há uma só mulher que nunca tenha sido estuprada'. Ele me disse isso e começou a chorar de modo atroz."
Para Vargas Llosa, o cenário é tão grave que os prognósticos de que o país não tem solução "pode ser verdadeiro". "Mas, se é certo, a culpa maior, a responsabilidade principal de que o país tenha chegado a essa situação de espanto é a colonização belga, é o que os belgas fizeram ali", diz o escritor.
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"O correr da vida embrulha tudo,
a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem."
João Guimarães Rosa
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Todo mundo tem boas relações com a Arabia Saudita que apredeja mulheres.
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Tem certas pessoas que tem sutos esquisofrenicos e esta frase não entra na cabeças destes senhoresEDSON escreveu:Todo mundo tem boas relações com a Arabia Saudita que apredeja mulheres.
Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
Quem sofre de esquisofrênia é essa coisa, só fala asneira quando se refere a política, mais uma besta fera solta a exalar enxofre!rodrigo escreveu:Para Vargas Llosa, Lula tem conduta 'esquizofrênica' no governo
Em visita ao Brasil após prêmio Nobel, peruano diz que postura democrática do presidente não se reproduz na política externa
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Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
O Brasil ofereceu asilo a essa mulher que foi apedrejada....
Na União Soviética, o político é roubado por VOCÊ!!
Re: A Instituição que foi outrora a casa do Barão do Rio Branco
irlan escreveu:O Brasil ofereceu asilo a essa mulher que foi apedrejada....
O problema é que existem muitos países no mundo com pena de morte, cada um costuma seguir sua cultura no cumprimento dessa pena, e no mundo Mulçumano o apedrejamento é uma das formas de pena capital, se o Brasi for oferecer azilo a todo mundo que está condenado à morte, cuja a situação não concordamos, será um problema para nossa política externa.
Isso deve ter solução coletiva, não é posição de um único país que irá alterar isso. E vejam o que anda acontecendo no Afeganistão, se o Talibã voltar ao poder na marra, vai rolar muito sangue, vai faltar pedra...
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