A ideologia acima de tudo
Por Carlos Brickmann em 1/2/2011
Este colunista é do tempo em que sindicato existia para defender seus associados. Essa história de sindicato atacar seus associados, insultá-los, agredir a própria profissão que diz representar, é coisa nova.
Está no boletim Últimas Notícias, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, em comentário sobre ranking de circulação.
O texto começa com uma informação falsa: diz que a Folha de S.Paulo foi por 24 anos o periódico de maior circulação no país. Besteira: a revista Veja, por exemplo, é um periódico e sua circulação é maior do que a da Folha. E continua com uma infâmia contra colegas de profissão, muitos dos quais membros do sindicato que agora os insulta: "A informação, que deve ter tirado o sono da famiglia Frias e de de alguns de seus ‘calunistas’ de plantão (...)".
Calunistas? Que besteira é essa? O trocadilho que insinua serem nossos colegas fabricantes de calúnias traz alguma justificativa? Há alguma acusação objetiva? Há alguém que se sinta caluniado? Neste caso, o texto só se justificaria ao mostrar quem se sente caluniado e por qual dos colunistas. O resto é ideologia barata, de quem não sabe a diferença entre Karl e Groucho – e não conseguiu absorver o raciocínio do primeiro nem o humor do segundo.
Ideologia? Desculpe, caro colega. O Hermínio Saccheta era trotskista e jamais agrediu uma pessoa por pensar diferente dele. O Perseu Abramo era petista e nunca atacou pessoalmente um adversário político. O Audálio Dantas soube enfrentar tempos muito difíceis como presidente do nosso sindicato e nunca se deixou deslizar nessa baixaria.
O ataque aos colegas da Folha sem que se explicite o motivo não mostra ideologia: mostra falta de pensamento político, falta de educação, falta de compostura. Mostra aquele sentimento tão feio, a inveja. Nem todos podem chegar a colunistas da Folha, alguns por falta de oportunidade, outros até por injustiça. Mas o cavalheiro que escreveu a nota não poderia chegar lá, não apenas por ser incapaz de distinguir entre os vários tipos de publicação periódica, mas também por falta de conhecimento de nosso ferramental básico de trabalho, o idioma português (embora se arvore em conhecedor do italiano). Quem escreve "Sindicato dos Jornalista", dispensando o plural, tem mesmo de ficar a serviço de seus chefes ideológicos. Que outro emprego poderia conseguir nesta área?
O silêncio dos bons
Na direção do Sindicato dos Jornalistas existem colegas com os quais este colunista não concorda politicamente (e isso, aliás, não tem a menor importância: somos amigos assim mesmo), mas cuja competência e bom-caráter não podem ser colocados em dúvida. Como é que insultos a jornalistas passaram por eles? Provavelmente não lhes foram mostrados. Profissionais como Rose Nogueira, como Denise Fon, como o próprio presidente José Augusto de Oliveira Camargo (Guto), jamais deixariam pseudo-ideólogos agredir colegas usando a máquina do sindicato. Rose Nogueira é ligadíssima ao senador Eduardo Suplicy, por muitos anos colunista da Folha. E, no entanto, isso foi feito.
Brincando com números
A liderança em circulação não chega a ser um dado tão importante assim, exceto para fins publicitários. Nos velhos tempos, O Globo foi o campeão de vendas, mas hoje, com números mais baixos, tem muito mais prestígio. O Jornal do Brasil nunca vendeu tanto quanto O Globo, mas era muito mais influente. O Bild vende várias vezes mais que o Frankfurter Allgemeine Zeitung, mas quem influi é o FAZ. O News of the World vende quase três milhões de exemplares aos domingos, mas quem quer dar seu recado prefere aparecer no Times ou no Guardian. Este ângulo não pode ser ignorado quando se diz que o Super Notícias, jornal belorizontino, superou em 1.203 exemplares diários a Folha.
O importante da notícia, entretanto, não é a ultrapassagem, ou a diferença de circulação, ou a diferença de preço de capa. O importante é a alegria com que alguns colegas – inclusive do sindicato "dos jornalista" – receberam a informação. Tudo bem, deve haver gente que acha que um patrão é mais bonito do que outro.
Só que não é. Ah, a falta que faz um pouco de leitura!
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