LeandroGCard escreveu:Uma dúvida sincera; isto aqui é ruim porquê?
Se sempre trouxemos e ainda trazemos capital estrangeiro para tudo e todos parecem muito satisfeitos com isso, porque para a saúde especificamente isso seria o contrário?
[destacar]Contra a presença de capital estrangeiro na saúde.[/destacar]
Leandro G. Card
Caro Leandro, vou tentar explicar o porquê, mas o assunto é um pouco complexo e com várias vertentes:
O sistema adotado pelo SUS é o da seguridade social, ou seja, todos os cidadãos são cobertos por esse sistema de saúde mesmo aqueles que não contribuem para a previdência social. A maioria dos países desenvolvidos adota esse sistema ou o seguro social, a exceção dos EUA que adota o modelo residual.
Mas o que ocorre na prática no Brasil é que o financiamento para a saúde, em sua maioria não vem do governo. O setor privado corresponde a 56% de todo o gasto com a saúde, sendo que 34% equivale a gastos privados direto das famílias e 22% com planos e seguro de saúde.
Em 2002, o gasto total com saúde (governo federal, estados e municípios) foi de 50 bilhões de reais. Os gastos privados (planos de saúde, seguro saúde e gastos diretos) foi de 65 bilhões de reais.
Ou seja, no Brasil a cota do setor público nos gastos nacionais em saúde é de apenas 44%, sendo semelhante à cota norte-americana (também de 44%!). Equivalente a um país que dispõe de um sistema de saúde restritos a camadas da população.
Para efeito de comparação, a Inglaterra tem um gasto público com o setor saúde equivalente a 85% e apenas 3% com planos de saúde.
O que ocorre é que a saúde virou um mercado muito lucrativo. A classe C passa a contratar cada vez mais os planos de saúde e a iniciativa privada porque o SUS não consegue dar conta da quantidade de pacientes. O número de leitos cai cerca de 5% ao ano. Os hospitais particulares conveniados ao SUS e os que tem gerência particular (a grande maioria) estão sendo fechados por falta de repasses ou por valores insuficientes que não cobrem os gastos. Laboratórios veiculados ao SUS demoram semanas e até meses para entregar o resultado de exames.
Isso sem contar o gasto per capita em saúde. A média dos países da OCDE é de 2.394 dólares americanos (dados de 2003). Inglaterra tem uma média de US$ 2.231,00 e os EUA ua média de US$ 5.635,00. Nessa mesma época o Brasil teve um gasto público em saúde de R$303,17.
Por mais que aumente os valores, eles estão longe de serem os ideais. Eu não vou nem falar sobre a mudança na atenção à saúde que o Brasil está passando para não extender muito o assunto. Para resumir: O cobertor não é pequeno. Ele é minúsculo. E tem apenas um culpado nessa história: Os governos federais desde 88. Saúde não é prioridade, tem seu orçamento contigenciado e é negligenciada.
Dos 450 mil leitos hospitalares no Brasil (leitos de interação, regime ambulatorial, SRPA, UTI, etc.) cerca de 64% são privados. O ideal pelo nosso sistema de seguridade social deve ser de pelo menos 70% dos leitos públicos e com a mesma porcentagem de investimentos estatais na saúde. O que está acontecendo é que o governo brasileiro está tirando sua responsabilidade nessa questão, levando para o setor privado, aumentando os custos e sendo reféns das OSS (Organizações Sociais de Saúde) com sua má administração desse setor e com os planos de saúde que são porcamente regulados pela ANS. O governo constrói hospitais, alugam os equipamentos, compram os materiais e quem administra são organizações particulares. Se for para isso acontecer vamos ter que mudar nosso sistema de saúde para o modelo americano. Ao invés de nos aproximar-mos da Inglaterra, estamos nos aproximando dos EUA. É a privatização de um setor que deveria ser predominante estatal.
Quem apóia essa presença de capital estrangeiro é o SINDHOSP que se diz uma instituição filantrópica, mas se mostra defensora das empresas particulares frente ao SUS. Saúde não é comércio para os planos de saúde dominarem o mercado na mão de meia dúzia e com um modelo assistencial biomédico, sem a regulação com os planos fazendo o que bem entendem.
Isso sem contar a dependência externa de medicamentos, equipamentos e materiais hospitalares, sendo que os nacionais são muito mais baratos e com a mesma eficácia. Esse setor sofre assim como o setor de defesa na questão de pesquisa e desenvolvimento. As empresas farmacêuticas não tem a responsabilidade de manter uma linha ativa de produção de medicamentos e por várias vezes ocorre o fechamento dessas linhas, prejudicando os pacientes em tratamentos especiais (Ex: quimioterapia) além de parar a expotação de certos medicamentos para forçar um aumento no seu preço. Basicamente temos apenas dois grandes centros de pesquisa: Fiocruz e Butantam. As universidades voltam-se para a saúde coletiva e pouco pesquisam e investem na área hospitalar.