Gastos Públicos: a União já comprou cachaças, minhocas, chicletes...
É costume no fim de ano a realização de retrospectivas. Assim sendo, o Contas Abertas reuniu alguns documentos oficiais, no mínimo curiosos, casualmente encontrados no SIAFI – Sistema Integrado de Administração Financeira da Secretaria do Tesouro Nacional-STN, provenientes de vários órgãos da União, nos últimos dez anos.
Você, caro leitor, já imaginou a União comprando 24 garrafas de cachaça ou 47 toneladas de minhocas!? Pois, então, acredite nessa possibilidade... As cachaças foram compradas em 1995, pelo Comando Militar do Leste. As minhocas, adubaram os jardins do Superior Tribunal de Justiça em Brasília
As despesas são consideradas legais, ainda que possamos questioná-las quanto à prioridade. É certo que, mesmo com a eliminação desses dispêndios, não influenciaríamos no superávit fiscal ou na realização de importantes ações sociais. Mas, tais gastos causam espanto e demonstram que ainda existem "gorduras" no setor público.
Os gastos apresentados aconteceram em vários anos, de 1995 a 2005, portanto em diversos governos. Na prática ocorreram porque algum burocrata, amparado por definições abrangentes dos "programas" e "ações governamentais" julgou-se no direito de adquirir esses itens, supostamente em favor da operacionalização do serviço público.
Em 1995, dados oficiais do governo mostravam uso de verba do Fundo Social de Emergência para a compra de goiabada cascão e para pagamento de frete para o transporte de cristais oferecidos como presente ao presidente Bill Clinton (USA). Tais fatos mostraram que as despesas não eram sociais, nem de emergência. As denúncias levaram o governo a mudar o nome do Fundo. Os empenhos referentes a essas transações estão abaixo:
O Contas Abertas selecionou ainda outras "pérolas" para divertir os internautas nesses dias festivos. Vejam alguns exemplos de empenhos orçamentários oficiais clicando no item desejado:
ITEM
ÓRGÃO ADQUIRENTE
DATA DO EMPENHO
cachaça, suco de tomate, cerveja, whisky, ovo de codorna, bacon fatiado e leite condensado
Comando do Comando Militar do Leste
18/ago/1995
chiclete
Comando Aéreo de Treinamento
06/fev/1995
humus de minhoca
Superior Tribunal de Justiça
14/ago/1996
carroussel e gangorra de pranchas
Superior Tribunal de Justiça
02/jun/1997
pão de mel ao leite
Presidência da República
02/jan/1997
copo de cristal e xícara em porcelana
Tribunal de Contas da União
06/nov/1998
ração (postura) para os cisnes
Ministério das Relações Exteriores
28/jan/1999
charutos
Cerimonial
25/jun/1999
licor de uisque francês
Cerimonial
06/jun/2000
curso de aperfeiçoamento para o tratamento de piscinas
Presidência da República
15/set/2000
lanche dos magistrados
Justiça Federal – RJ
18/set/2000
tela anti-insetos
Supremo Tribunal Federal
25/set/2001
preservativos (masculino e feminino)
Secretaria do Superior Tribunal de Justiça
22/mai/2001
banheiro químico (locação)
Presidência da República
03/nov/2005
Nos últimos anos, o Tribunal de Contas da União (TCU), vem ampliando seu raio de atuação, fiscalizando não apenas a legalidade do gasto como também a sua qualidade ou prioridade.
Recentemente o TCU condenou os desvios de utilização da CIDE – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – aquela que pagamos quando abastecemos os nossos veículos a gasolina ou a díesel – que tem sido aplicada em várias finalidades diferentes da sua destinação legal.
Recursos exclusivamente destinados à infra-estrutura de transportes, a projetos ambientais e para subsídiar preços, estão sendo empregados em pagamentos de pessoal, xícaras, camisetas para coral, diárias, almoço de conselheiros, copeiragem, festividades e homenagens, aquisição de porteiro eletrônico, recarga de extintores, etc.
Um fato positivo é que o Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI), registra todas as "compras", permitindo que as mais estranhas sejam descobertas e eventualmente questionadas. O fato negativo é que, já há alguns anos, certos burocratas vem omitindo, no SIAFI, a descrição minuciosa dos itens adquiridos. A Controladoria Geral da União (CGU) e o TCU devem evitar que isso ocorra, impedindo a desejada transparência. Ao que se saiba, ninguém nos últimos anos foi punido, quer por comprar indevidamente, quer por esconder o que comprou.
Os exemplos apresentados pelo Contas Abertas são de certa forma anedóticos e com valores insignificantes frente aos dispêndios globais da União. Os ordenadores de despesa, porém, devem ficar atentos pois o Contas Abertas estará fiscalizando esses lançamentos esdrúxulos, com a expectativa de contribuir para o necessário aprimoramento da qualidade e da prioridade dos gastos públicos.
Fátima Xavier
Do Contas Abertas
Fonte:
http://contasabertas.uol.com.br/noticias/detalhes_noticias.asp?auto=1281