Re: ESTRATÉGIA NAVAL
Enviado: Qui Jan 29, 2009 8:46 pm
Vamos ver se ajuda na compreensão deste termo tão mal aplicado.
A DISSUASÃO
A compreensão do conceito de dissuasão, além de seu evidente interesse acadêmico, tem para o Brasil uma relevância particular derivada do papel principal que ocupa na Política de Defesa Nacional. Com efeito, a mesma, em seu capítulo 6, Orientações Estratégicas, item 6.2, declara que:
“A vertente preventiva da Defesa Nacional reside na valorização da ação diplomática como instrumento primeiro de solução de conflitos e em postura estratégica baseada na existência de capacidade militar com credibilidade, apta a gerar efeito dissuasório” (PDN, 2005).
Se o Brasil não é o agressor em um conflito, se aspira a obter seus objetivos pela via da negociação e dos acordos, sua alternativa a uma Estratégia de Força é uma Estratégia de Dissuasão, significando uma estratégia que renuncia empregar a força, ou a ameaça do uso da mesma, dentro de uma relação, que se orienta a criar e manter uma condição de paz e que tenta assegurar que a alternativa política que adotem seus oponentes, ou competidores, seja da mesma natureza.
O objetivo de uma estratégia de dissuasão é então desincentivar, ou melhor, reduzir a alternativa do uso da força como opção aceitável por parte de um adversário, para impor-nos sua vontade em um assunto em disputa.
Segundo Beaufre:
“A dissuasão tende a impedir que uma potência adversa tome a decisão de empregar suas armas ou, mais genericamente, que atue ou reaja frente a uma situação dada, mediante a existência de um conjunto de dispositivos que constituam uma ameaça suficiente. Portanto, o que se busca com esta ameaça é um resultado psicológico” (Beaufre, pág. 35).
A dissuasão, portanto, não reprime fisicamente a um inimigo, mas o reprime psicologicamente. Baseia-se na criação na mente do oponente de um efeito psicológico que funciona em dois tempos: ao obrigá-lo a fazer um cálculo das reais possibilidades de vencer, que surge na comparação de suas capacidades com as nossas, e no temor aos riscos de um possível conflito, que emerge de uma combinação do cálculo anterior com outros elementos intangíveis, tais como o prestígio militar de nossas Forças Armadas, da determinação brasileira de afrontar a ameaça, da formação cultural do povo no tema defesa, da eventual duração de uma guerra e da instabilidade criada no Sistema Internacional após o término do conflito.
Nas palavras de Raymond Aron em sua obra Paz e Guerra Entre as Nações:
“Ser dissuadido quer dizer: preferir a situação resultante da inação à que resultaria da ação, na hipótese de que esta acarretasse as conseqüências previstas, isto é, no plano das relações internacionais, a execução de uma ameaça implícita ou explícita. Um Estado será tanto mais sensível à dissuasão quanto mais acreditar na execução da ameaça pelo adversário; quanto maiores forem os danos causados por essa execução e quanto mais aceitável parecer a alternativa da inação” (Aron, pág. 519).
O êxito da dissuasão depende, portanto, de três fatores: um psicológico, significando que quem dissuade convence o agressor potencial de que sua ameaça é séria; um técnico, que ocorrerá na hipótese de que a ameaça seja concretizada; e um político, que se baseia na relação custo/benefício das vantagens ou desvantagens que resultariam, para o Estado objeto da dissuasão, de sua ação ou inação.
O fator técnico varia com o progresso dos armamentos; o fator político depende das circunstâncias diplomáticas e também das armas que estão em jogo; e o fator psicológico é função dos outros dois e do resultado, muitas vezes indeterminado previamente, da prova de vontades.
Quanto às forças navais, em tempos de incerteza, sem ameaças claras, um Poder Naval será avaliado por suas capacitações para atuar em diferentes cenários. Será avaliado pela existência de um poder armado adequado, balanceado e preparado, que inspire credibilidade quanto ao seu emprego e o evidencie, por atos de presença ou demonstrações de força, quando e onde for oportuno. A dissuasão é realizada pela existência de meios críveis, adestrados, armados, mostrados em operações com outros países, em exercícios e visitas a países amigos e até em reportagens em meios especializados, em participação em operações de paz, de ajuda humanitária, como observadores militares, enviando pessoal para intercâmbios de cursos, seminários, etc.
As forças navais (principalmente os meios de superfície) têm a extraordinária capacidade de poderem atuar externamente, em tempos de paz, “mostrando a bandeira” em outros países (ação de presença), sem que isso seja considerado uma agressão, tornando o Poder Naval particularmente útil à projeção do país no cenário internacional. De fato, o Poder Naval é o único componente do Poder Militar que possui a característica da versatilidade.
O fato é que as operações navais multinacionais são excelentes instrumentos de aproximação e, ao mesmo tempo, de dissuasão. Assim é que, todos os estrategistas importantes, como Geofrey Till ou Richard Hill, defendem o emprego do Poder Naval em apoio à Política Externa do país. Contrariamente, a fragilidade do Poder Naval tende a enfraquecer as posições internacionais brasileiras nos fóruns de discussão internacionais.
Nunca é demais repetir que a dissuasão exige que o poder militar inspire credibilidade e que o provável oponente acredite nisso. Trata-se de atuar no psicológico do mesmo, em um trabalho contínuo de demonstração de capacidade operacional, garantindo que exista a percepção externa de nosso poder de retaliação e de decisão. A dissuasão não ocorrerá apenas pelo efeito da demonstração de capacidade militar. Outros fatores serão indispensáveis para sua ocorrência, exigindo atitudes e ações de todas as expressões do Poder Nacional como, por exemplo, vontade política determinada, existência da crença de que, se necessário, o país atuará energicamente, empregando o Poder Militar na defesa dos interesses nacionais, demonstrando que o povo acredita em seu governo e estará disposto ao sacrifício necessário decorrente de um conflito perante uma ameaça à soberania nacional.