Em tempos de tecnologia furtiva, vantagem rima com linha de montagem
8 de julho de 2011, em Análise, Tecnologia, por Nunão
http://www.aereo.jor.br/2011/07/08/em-t ... -montagem/
http://www.wired.com/dangerroom/2011/07 ... advantage/
Segundo artigo do site Danger Room, as linhas de montagem dos EUA representam as vantagens reais do país em tecnologia furtiva
No último dia 6 de julho, esse instigante artigo de David Axe foi publicado no site Danger Room. O Poder Aéreo traduziu o texto que traz pontos bem interessantes para discussão, sobre temas que volta e meia são discutidos por aqui, como ganhos de escala, custos de caças furtivos e o futuro da nova geração de aviões de combate, com a chegada do T-50 russo, do J-20 chinês e de outros desenvolvimentos pelo mundo. Bom debate a todos!
Por mais de 20 anos, a Força Aérea dos EUA (USAF) teve o monopólio mundial da tecnologia de furtividade ao radar (stealth) e, com ela, uma grande vantagem sobre qualquer rival. Várias gerações de caças e bombardeiros furtivos, dos primeiros F-117, passando pelos já ‘clássicos’ B-2 dos anos 1990 e chegando aos atuais F-22, contribuíram para vencer guerras, derrubar regimes e exercer a influência dos EUA ao redor do mundo.
Então algo aconteceu. Em apenas dois anos, os Estados Unidos aparentemente perderam seu monopólio de aviões de combate furtivos para a Rússia, a China e diversos outros países que já voaram ou deverão voar seus próprios protótipos de caças ‘stealth’. Os aviões furtivos norte-americanos ainda são melhores e muito mais numerosos que os de qualquer outro país, e assim será por um bom tempo. Mas não estão mais sozinhos.
Isso poderá trazer grandes implicações para os EUA e o mundo. Ou não.
Há evidências de que a maioria dos países está apenas blefando com seus planos para caças furtivos. Assim, a predominância dos EUA nessa área poderia continuar, apenas um ligeiramente diminuída.
O primeiro competidor dos aviões furtivos ao radar dos EUA foi o russo T-50, que debutou em Janeiro de 2010. As fotos do chinês J-20 apareceram 11 meses depois. Incitados pelo T-50 e o J-20, diversos países asiáticos anunciaram seus próprios planos para caças ‘stealth’. A Índia assinou contrato para uma versão do T-50, enquanto Japão e Coreia do Sul iniciaram projetos próprios de aeronaves furtivas.
A corrida para os aviões furtivos não mostra sinais de diminuir o ritmo. Há rumores de que um segundo jato ‘stealth’ chinês poderia iniciar seus testes a qualquer momento.
Mas não está claro quantos desses novos caças furtivos entrarão um dia em produção em larga escala. De fato, é possível que alguns deles nem estejam sendo pensados para entrar em serviço na linha de frente.
Essa é a ironia escondida na corrida para aeronaves furtivas. Enquanto aparentemente os EUA perderam sua liderança no projeto e fabricação de aviões de combate ‘invisíveis’, a escalada global para esse tipo de aeronave poderia acabar trabalhando a favor dos Estados Unidos, criando um mercado que não existia antes para esses caças de última geração. Um mercado que apenas os EUA poderiam realmente dar-se ao luxo de explorar.
A chave para tudo isso é a escala.
Uma coisa é projetar um avião furtivo viável, ou mesmo demonstrar um protótipo ou dois. Algo totalmente diferente é produzir em massa caças furtivos prontos para o combate, a um preço que as forças aéreas do mundo possam comprar. ‘Falar não custa nada’, dizia meu antigo chefe e co-fundador do ‘Danger Room’, Sharon Weinberger. ‘Mas aviões militares custam’.
É possível que apenas os Estados Unidos tenham capacidade industrial e mercado doméstico suficientes para tornar seus aviões furtivos economicamente viáveis no mercado mundial. Esse é justamente o raciocínio por trás do F-35 ‘Joint Strike Fighter’ (caça de ataque conjunto) da Lockheed Martin, que é o quarto (mas não o último) avião furtivo dos EUA.
A USAF, a US Navy (Marinha dos EUA) e o USMC (Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA) poderiam comprar uns 3.000 caças F-35 nos próximos 30 anos. Nenhum outro país possui tantos caças, quanto mais planos para substituí-los por modelos furtivos. Robert Gates, ex-secretário de defesa dos Estados Unidos, disse há dois anos que ‘ele (o F-35) é um avião versátil, que custa menos da metade do que um F-22, e que pode ser produzido em quantidade com todas as vantagens advindas da economia de escala’.
Gates expressou um argumento contundente (mesmo levando-se em conta que o F-35 acabou se revelando não tão barato quanto ele esperava). Com a maior parte dos custos de desenvolvimento sendo paga pelo Governo dos Estados Unidos, e com o investimento da Lockheed protegido por grandes encomendas domésticas, o F-35 está numa posição de ser o primeiro caça furtivo para exportação, relativamente acessível, dos Estados Unidos e também do mundo. Diversos países já fizeram encomendas, e muitos outros deverão segui-los.
Alguns poderão questionar se um avião com preço de 100 milhões de dólares a unidade, fora os custos de desenvolvimento e apoio, é de fato economicamente viável. E eles estão corretos em mostrar seu ceticismo. Mas o J-20 chinês poderá custar, no fim das contas, mais ainda do que o F-35, isso se chegar a ser produzido em larga escala. O Japão já paga mais do que 100 milhões de dólares por cada um de seus aviões de combate F-2, que não são furtivos ao radar. E provavelmente teria que gastar o dobro disso por cada unidade de seu planejado caça furtivo ‘ATD-X’.
Governos de outros países estão preocupados com os altos custos para desenvolver e adquirir caças ‘stealth’ localmente. E é por isso que a maioria deles provavelmente não tem intenção de se aventurar em programas locais de aviões de combate. Ao contrário, vários países estão trabalhando com tecnologia furtiva como uma forma de barganha política, e também para dar experiência prática a suas indústrias aeroespaciais. O objetivo é montar parcerias com outros países na área de tecnologia ‘stealth’.
O Japão é um exemplo. Ninguém acredita seriamente que o Governo Japonês está preparado para alocar 5% de seu orçamento de defesa atual na compra de um punhado de caças furtivos ATD-X, a serem produzidos no país. O Pentágono provavelmente acabará gastando apenas 3% de seu orçamento para uma frota muito maior, proporcionalmente, de caças F-35. A produção de um caça furtivo de desenvolvimento próprio poderia lever o poder militar japonês à falência.
É mais provável que o Governo Japonês esteja empregando apenas alguns milhões de dólares do orçamento para refinar tecnologia furtiva básica, com a meta de provar à Lockheed que a indústria japonesa merece participar da produção do F-35, se e quando o Japão decidir, formalmente, a aquisição da aeronave. O mesmo pode ser dito da Coréia do Sul, que também poderia adquirir o F-35 e deseja produzir partes do jato. Vale a pena ficar de olho onde vão acabar os componentes de tecnologia furtiva desses países. Mas nem o Japão nem a Coréia do Sul deverão construir uma frota de rivais para os aviões de combate ‘stealth’ dos EUA.
A Rússia também poderá se tornar mais uma fabricante de componentes de tecnologia furtiva do que de caças furtivos. Pode-se supor que o Governo Russo sempre quis que a Índia ajudasse a pagar pelo desenvolvimento dos caças ‘stealth’ T-50, na medida em que a Rússia, provavelmente, não poderia custear sozinha o T-50.
Resta a China. Apesar de haver especulações de que o Governo Chinês possa tentar vender caças furtivos ao Paquistão, até o momento a China está seguindo sozinha no caminho da tecnologia furtiva. Se os chineses poderão dar-se ao luxo de adquirir uma grande quantidade de caças furtivos, é algo que ainda não sabemos. Produto Interno Bruto com crescimento de dois dígitos pode não durar para sempre.
Tirando os diletantes do caminho, restam apenas três países construindo caças furtivos viáveis, e somente dois – Estados Unidos e China – capazes de produzi-los por si mesmos. Se existir um mercado para 4.000 aviões de combate ‘stealth’ ao longo das próximas três décadas, provavelmente 3.500 serão modelos dos EUA.
Não chega a ser um monopólio, mas é algo bem parecido. A vantagem dos EUA na tecnologia furtiva ao radar poderá deixar de ser tão acachapante quanto já foi, mas poderia se manter ainda por décasdas. Tudo isso graças, principalmente, aos custos incrivelmente altos dessa tecnologia.