Re: Iraque - Noticias de Guerra
Enviado: Qua Jul 06, 2016 6:35 pm
.Inquérito demoliu argumentos de Blair para justificar invasão no Iraque
Por Ana Fonseca Pereira
06/07/2016 - 11:35
(actualizado às 19:16)
Comissão que investigou participação britânica diz que a guerra "não era o último recurso" e acusa antigo primeiro-ministro de ter exagerado deliberadamente a ameaça que representava o regime de Saddam Hussein.
Treze anos é pouco tempo para escrever a História de uma guerra que mudou o Médio Oriente, deixou marcas profundas nos países que nela participaram e destapou novas ameaças. Mas o relatório da comissão de inquérito ao envolvimento britânico na invasão do Iraque – um trabalho ciclópico de 2,6 milhões de palavras – promete moldar durante décadas a narrativa oficial. E o veredicto é muito severo para o governo de Tony Blair, alegando que o antigo primeiro-ministro decidiu a invasão sem ter antes esgotado todas as outras opções disponíveis e exagerou, de forma deliberada, a ameaça que o regime de Saddam Hussein representava.
Se o tempo é curto para fazer História, uma eternidade parece ter passado desde que, na madrugada de 20 de Março de 2003, o Presidente norte-americano, George W. Bush, anunciou na televisão que a guerra para derrubar Saddam tinha começado, perante o que dizia ser a recusa do líder iraquiano em entregar as armas de destruição maciça.
No Iraque, pelo menos 150 mil pessoas morreram desde então (outras estimativas apontam para 600 mil), o ditador desapareceu, mas com ele desapareceu a máquina do Estado – hoje o país continua em guerra, ameaçado pelo terrorismo, as tensões sectárias e a paralisia das instituições políticas. Os Estados Unidos retiraram em 2011, somando quase cinco mil soldados mortos, mas apesar de as forças americanas terem regressado em 2014 para combater o autoproclamado Estado Islâmico, Washington arrumou a guerra na prateleira do passado – o Presidente Barack Obama, eleito em 2008, votara contra a guerra e fez da retirada um ponto de honra.
Em Londres, o Governo também mudou de mãos e as preocupações são hoje outras. Mas como escrevia segunda-feira o Financial Times a participação no conflito assombra ainda a política britânica. Pelas sequelas que deixou na política externa (hoje menos favorável ao intervencionismo, como se viu em 2013 quando o Parlamento recusou intervir na Síria) e sobretudo na credibilidade dos políticos. Feridas que Gordon Brown, sucessor de Blair em Downing Street, quis fechar quando, em 2009, pediu a John Chilcot, um antigo alto quadro da função pública, que investigasse as circunstâncias em que foi decidida a participação britânica na guerra e a forma como a operação e o pós-invasão foram planeados e executados.
Ninguém pensou que demorasse tanto – as famílias dos 179 soldados mortos chegaram a fazer um ultimato para que o relatório fosse publicado –, mas cinco anos depois das últimas audições (e foram mais de uma centena) Chilcot não gorou as expectativas de quem queria ouvir um veredicto claro sobre o que o Governo britânico de então fez e deixou por fazer. “As conclusões são claras como água, civilizadas – mas sem sombra de dúvida totalmente condenatórias – ainda que talvez não haja grandes surpresas”, escreveu Laura Kuessenberg, editora de Política da BBC. O jornal Guardian chamou-lhe “veredicto demolidor”; o Telegraph uma “crítica devastadora”.
"Informações erradas"
Na apresentação do relatório, Chilcot começou por dizer que Saddam “era sem sombra de dúvidas um ditador brutal”, mas afirmou que Londres avançou para a guerra sem que o regime iraquiano constituísse uma “ameaça iminente”. “Concluímos que o Reino Unido escolheu participar na invasão do Iraque sem antes terem sido esgotadas as opções pacíficas para o desarmamento” do regime de Saddam. “A acção militar, naquele momento, não era o último recurso.”
Blair, tal como Bush, insistiram sempre no contrário – que o ditador iraquiano tinha falhado sucessivos prazos para se desfazer dos seus arsenais químicos e biológicos e que, deixá-lo mais tempo em Bagdad, era arriscar que as armas pudessem cair nas mãos de terroristas. Arsenais que os inspectores das Nações Unidas duvidavam já então que existissem e que, meses depois da invasão, se provou que Saddam não tinha.
“É agora claro que a política para o Iraque foi feita com base em informações e avaliações erradas. Informações que não foram questionadas, quando o deviam ter sido”, disse Chilcot. Uma falha que é, em primeiro lugar, dos serviços secretos que trabalharam sempre com base na presunção de que as armas existiam, sem nunca terem questionado esse pressuposto.
https://www.publico.pt/mundo/noticia/in ... 39?frm=ult
Por Ana Fonseca Pereira
06/07/2016 - 11:35
(actualizado às 19:16)
Comissão que investigou participação britânica diz que a guerra "não era o último recurso" e acusa antigo primeiro-ministro de ter exagerado deliberadamente a ameaça que representava o regime de Saddam Hussein.
Treze anos é pouco tempo para escrever a História de uma guerra que mudou o Médio Oriente, deixou marcas profundas nos países que nela participaram e destapou novas ameaças. Mas o relatório da comissão de inquérito ao envolvimento britânico na invasão do Iraque – um trabalho ciclópico de 2,6 milhões de palavras – promete moldar durante décadas a narrativa oficial. E o veredicto é muito severo para o governo de Tony Blair, alegando que o antigo primeiro-ministro decidiu a invasão sem ter antes esgotado todas as outras opções disponíveis e exagerou, de forma deliberada, a ameaça que o regime de Saddam Hussein representava.
Se o tempo é curto para fazer História, uma eternidade parece ter passado desde que, na madrugada de 20 de Março de 2003, o Presidente norte-americano, George W. Bush, anunciou na televisão que a guerra para derrubar Saddam tinha começado, perante o que dizia ser a recusa do líder iraquiano em entregar as armas de destruição maciça.
No Iraque, pelo menos 150 mil pessoas morreram desde então (outras estimativas apontam para 600 mil), o ditador desapareceu, mas com ele desapareceu a máquina do Estado – hoje o país continua em guerra, ameaçado pelo terrorismo, as tensões sectárias e a paralisia das instituições políticas. Os Estados Unidos retiraram em 2011, somando quase cinco mil soldados mortos, mas apesar de as forças americanas terem regressado em 2014 para combater o autoproclamado Estado Islâmico, Washington arrumou a guerra na prateleira do passado – o Presidente Barack Obama, eleito em 2008, votara contra a guerra e fez da retirada um ponto de honra.
Em Londres, o Governo também mudou de mãos e as preocupações são hoje outras. Mas como escrevia segunda-feira o Financial Times a participação no conflito assombra ainda a política britânica. Pelas sequelas que deixou na política externa (hoje menos favorável ao intervencionismo, como se viu em 2013 quando o Parlamento recusou intervir na Síria) e sobretudo na credibilidade dos políticos. Feridas que Gordon Brown, sucessor de Blair em Downing Street, quis fechar quando, em 2009, pediu a John Chilcot, um antigo alto quadro da função pública, que investigasse as circunstâncias em que foi decidida a participação britânica na guerra e a forma como a operação e o pós-invasão foram planeados e executados.
Ninguém pensou que demorasse tanto – as famílias dos 179 soldados mortos chegaram a fazer um ultimato para que o relatório fosse publicado –, mas cinco anos depois das últimas audições (e foram mais de uma centena) Chilcot não gorou as expectativas de quem queria ouvir um veredicto claro sobre o que o Governo britânico de então fez e deixou por fazer. “As conclusões são claras como água, civilizadas – mas sem sombra de dúvida totalmente condenatórias – ainda que talvez não haja grandes surpresas”, escreveu Laura Kuessenberg, editora de Política da BBC. O jornal Guardian chamou-lhe “veredicto demolidor”; o Telegraph uma “crítica devastadora”.
"Informações erradas"
Na apresentação do relatório, Chilcot começou por dizer que Saddam “era sem sombra de dúvidas um ditador brutal”, mas afirmou que Londres avançou para a guerra sem que o regime iraquiano constituísse uma “ameaça iminente”. “Concluímos que o Reino Unido escolheu participar na invasão do Iraque sem antes terem sido esgotadas as opções pacíficas para o desarmamento” do regime de Saddam. “A acção militar, naquele momento, não era o último recurso.”
Blair, tal como Bush, insistiram sempre no contrário – que o ditador iraquiano tinha falhado sucessivos prazos para se desfazer dos seus arsenais químicos e biológicos e que, deixá-lo mais tempo em Bagdad, era arriscar que as armas pudessem cair nas mãos de terroristas. Arsenais que os inspectores das Nações Unidas duvidavam já então que existissem e que, meses depois da invasão, se provou que Saddam não tinha.
“É agora claro que a política para o Iraque foi feita com base em informações e avaliações erradas. Informações que não foram questionadas, quando o deviam ter sido”, disse Chilcot. Uma falha que é, em primeiro lugar, dos serviços secretos que trabalharam sempre com base na presunção de que as armas existiam, sem nunca terem questionado esse pressuposto.
https://www.publico.pt/mundo/noticia/in ... 39?frm=ult