Re: Missão de Paz no Haiti
Enviado: Seg Jan 18, 2010 9:03 am
OESP, Segunda-Feira, 18 de Janeiro de 2010
Em meio a debate internacional, casos de violência se alastram
Saques, linchamentos e indícios de execuções sumárias ameaçam chegada de ajuda às vítimas do terremoto
Lourival SantAnna, enviado especial em Porto Príncipe
Enquanto militares e representantes dos Estados Unidos e do Brasil tentam acertar a estratégia para a atuação no Haiti, as condições de segurança vão se deteriorando em Porto Príncipe. Com as prisões e instalações da polícia destruídas pelo terremoto, ampliaram-se ontem os casos de saque e linchamentos e surgiram indícios de execuções sumárias. Corpos encontrados nas ruas traziam sinais de fuzilamento à queima-roupa. Quatro deles tinham as mãos amarradas para trás e um deles, os pés atados. Fontes da área de segurança ouvidas pelo Estado confirmaram a prática de execuções pela polícia haitiana. A polícia atribui os assassinatos a criminosos.
Os cinco corpos foram encontrados nos bairros de Bel Air e Boudon. Um deles teve o rosto desfigurado por um tiro de calibre 12 na têmpora. Havia também marcas de espancamento. Aparentemente, eles foram mortos na manhã ou madrugada, segundo pessoas que os encontraram. "São ladrões, saqueadores, gente que se aproveita da situação", disse um haitiano. "A prisão foi destruída pelo terremoto. A polícia não está prendendo os bandidos. Está executando."
Pelo menos um caso de linchamento foi registrado por fotógrafos em Petionville, distrito da capital. Um suposto saqueador foi espancado até a morte e teve o corpo arrastado, nu, pelas ruas.
Na noite de sábado, o carro do Estado passou por um veículo da polícia parado na rua. Depois de se distanciar algumas centenas de metros, os repórteres ouviram um disparo. A rua estava inteiramente deserta. "Tem havido execuções, mas não é a polícia", garantiu o policial Jimmy Pierre. "São bandidos, ex-presidiários, que estão matando e botando a culpa na polícia."
O prédio da Direção Departamental do Oeste (que tem jurisdição sobre a capital), em frente ao palácio presidencial destruído pelo terremoto, foi severamente atingido, e desocupado. Policiais informaram que o comando foi transferido para o quartel-general do Corpo de Bombeiros. Mas suas salas também estavam vazias. De pé ao lado de uma viatura em frente ao QG dos bombeiros, Pierre disse que os policiais estão prendendo os criminosos em instalações alternativas, e apontou para janelas do prédio: "Lá mesmo existem presos." Não soube dizer quantos.
No fim da tarde de sábado, dezenas de pessoas disputavam alimentos e produtos de higiene arrancados dos escombros de lojas na Grande Rue, uma das principais ruas comerciais de Porto Príncipe. A multidão ocupava toda a avenida. Dois jipes com militares da missão de paz da ONU despontaram ao longe. A multidão começou a correr. Os militares passaram dando tiros para o alto.
Aparentemente, essas pessoas tinham chegado tarde demais para entrar na fila do Estádio Sylvio Cator, a poucas quadras dali, onde o Exército brasileiro em conjunto com paraquedistas americanos estava distribuindo comida. Ao atingir 3 mil pessoas na fila, os portões do estádio foram fechados. Na primeira distribuição maciça de alimentos depois do terremoto, foram doadas 29 toneladas, recolhidas pela ONG IMO. A partir de ontem a missão da ONU mudou de estratégia, e foram feitas várias distribuições, e em menor quantidade, para atingir mais famílias. O subtenente-general Ken Keen, subchefe do Comando Sul do Exército dos EUA, estimou ontem que o número de mortos no terremoto pode chegar a 200 mil.
Depois de vários dias fechado, o comércio de Porto Príncipe tem voltado gradualmente a funcionar, embora a grande maioria das lojas permaneça com as portas trancadas.
A cada dia se veem mais pessoas trabalhando e fazendo compras. Conforme as atividades normais são retomadas, aumentam as situações de tensão, como conflitos nos postos de gasolina. Eles se mantêm fechados pela maior parte do tempo. Quando o combustível é entregue, formam-se filas imensas, e começam as brigas entre os motoristas.
"A ajuda humanitária está revertendo o quadro, com reflexos diretos na segurança", disse o coronel João Batista Carvalho Bernardes, comandante do Batalhão Brasileiro de Força de Paz no Haiti. "A população vai se acalmar ao receber água, comida e medicamentos."
Outra prioridade é recolher os corpos espalhados pelas ruas da capital. A operação, também a cargo do Exército brasileiro, teve início no sábado, depois de autorização da ONU. Eles são fotografados e descritos em relatórios individuais, para facilitar o reconhecimento posterior pelas famílias, que podem retirá-los mais tarde para enterro definitivo.
Segundo o secretário de Estado para Alfabetização, Carol Joseph, mais de 70 mil corpos já foram enterrados em valas comuns.
Em meio a debate internacional, casos de violência se alastram
Saques, linchamentos e indícios de execuções sumárias ameaçam chegada de ajuda às vítimas do terremoto
Lourival SantAnna, enviado especial em Porto Príncipe
Enquanto militares e representantes dos Estados Unidos e do Brasil tentam acertar a estratégia para a atuação no Haiti, as condições de segurança vão se deteriorando em Porto Príncipe. Com as prisões e instalações da polícia destruídas pelo terremoto, ampliaram-se ontem os casos de saque e linchamentos e surgiram indícios de execuções sumárias. Corpos encontrados nas ruas traziam sinais de fuzilamento à queima-roupa. Quatro deles tinham as mãos amarradas para trás e um deles, os pés atados. Fontes da área de segurança ouvidas pelo Estado confirmaram a prática de execuções pela polícia haitiana. A polícia atribui os assassinatos a criminosos.
Os cinco corpos foram encontrados nos bairros de Bel Air e Boudon. Um deles teve o rosto desfigurado por um tiro de calibre 12 na têmpora. Havia também marcas de espancamento. Aparentemente, eles foram mortos na manhã ou madrugada, segundo pessoas que os encontraram. "São ladrões, saqueadores, gente que se aproveita da situação", disse um haitiano. "A prisão foi destruída pelo terremoto. A polícia não está prendendo os bandidos. Está executando."
Pelo menos um caso de linchamento foi registrado por fotógrafos em Petionville, distrito da capital. Um suposto saqueador foi espancado até a morte e teve o corpo arrastado, nu, pelas ruas.
Na noite de sábado, o carro do Estado passou por um veículo da polícia parado na rua. Depois de se distanciar algumas centenas de metros, os repórteres ouviram um disparo. A rua estava inteiramente deserta. "Tem havido execuções, mas não é a polícia", garantiu o policial Jimmy Pierre. "São bandidos, ex-presidiários, que estão matando e botando a culpa na polícia."
O prédio da Direção Departamental do Oeste (que tem jurisdição sobre a capital), em frente ao palácio presidencial destruído pelo terremoto, foi severamente atingido, e desocupado. Policiais informaram que o comando foi transferido para o quartel-general do Corpo de Bombeiros. Mas suas salas também estavam vazias. De pé ao lado de uma viatura em frente ao QG dos bombeiros, Pierre disse que os policiais estão prendendo os criminosos em instalações alternativas, e apontou para janelas do prédio: "Lá mesmo existem presos." Não soube dizer quantos.
No fim da tarde de sábado, dezenas de pessoas disputavam alimentos e produtos de higiene arrancados dos escombros de lojas na Grande Rue, uma das principais ruas comerciais de Porto Príncipe. A multidão ocupava toda a avenida. Dois jipes com militares da missão de paz da ONU despontaram ao longe. A multidão começou a correr. Os militares passaram dando tiros para o alto.
Aparentemente, essas pessoas tinham chegado tarde demais para entrar na fila do Estádio Sylvio Cator, a poucas quadras dali, onde o Exército brasileiro em conjunto com paraquedistas americanos estava distribuindo comida. Ao atingir 3 mil pessoas na fila, os portões do estádio foram fechados. Na primeira distribuição maciça de alimentos depois do terremoto, foram doadas 29 toneladas, recolhidas pela ONG IMO. A partir de ontem a missão da ONU mudou de estratégia, e foram feitas várias distribuições, e em menor quantidade, para atingir mais famílias. O subtenente-general Ken Keen, subchefe do Comando Sul do Exército dos EUA, estimou ontem que o número de mortos no terremoto pode chegar a 200 mil.
Depois de vários dias fechado, o comércio de Porto Príncipe tem voltado gradualmente a funcionar, embora a grande maioria das lojas permaneça com as portas trancadas.
A cada dia se veem mais pessoas trabalhando e fazendo compras. Conforme as atividades normais são retomadas, aumentam as situações de tensão, como conflitos nos postos de gasolina. Eles se mantêm fechados pela maior parte do tempo. Quando o combustível é entregue, formam-se filas imensas, e começam as brigas entre os motoristas.
"A ajuda humanitária está revertendo o quadro, com reflexos diretos na segurança", disse o coronel João Batista Carvalho Bernardes, comandante do Batalhão Brasileiro de Força de Paz no Haiti. "A população vai se acalmar ao receber água, comida e medicamentos."
Outra prioridade é recolher os corpos espalhados pelas ruas da capital. A operação, também a cargo do Exército brasileiro, teve início no sábado, depois de autorização da ONU. Eles são fotografados e descritos em relatórios individuais, para facilitar o reconhecimento posterior pelas famílias, que podem retirá-los mais tarde para enterro definitivo.
Segundo o secretário de Estado para Alfabetização, Carol Joseph, mais de 70 mil corpos já foram enterrados em valas comuns.