'Não tenho medo de vocês',
diz Kirchner aos militares
Agência Estado
"Que fique bem claro, que, como presidente da República, não tenho medo! Não tenho medo de vocês!". Com estas palavras, pronunciadas pessoalmente diante de 5 mil oficiais e soldados, além de outros surpresos milhões de telespectadores argentinos que assistiam às cerimônias do Dia do Exército transmitidas ao vivo, o presidente Néstor Kirchner indicou que está determinado a realizar uma depuração na mentalidade das Forças Armadas.
Kirchner anunciou que os militares terão que freqüentar aulas sobre direitos humanos e sustentou que os insatisfeitos e os indisciplinados terão que abandonar os quartéis. A repreensão em tom de desafio protagonizada por Kirchner dentro de um quartel é inédita na história do país.
No discurso, realizado no Colégio Militar de El Palomar, Kirchner criticou os oficiais que, vestindo o uniforme do Exército, participaram na semana passada de uma manifestação a favor do terrorismo de Estado praticado pela última ditadura militar (1976-83). No protesto, realizado na frente do monumento aos mortos na Guerra das Malvinas, na Praça San Martín, em pleno centro portenho, os participantes, aos gritos, chamaram o chefe do Exército, o general Roberto Bendini - que é amigo de Kirchner - de "traidor" e "lacaio". Uma das oradoras, Cecilia Pando, esposa de um ex-oficial, disse que Kirchner tinha um "pensamento hemiplégico". Os simpatizantes da ditadura expulsaram com socos e chutes jornalistas que estavam presentes.
Com a irritação acumulada de vários dias, o presidente declarou que a defesa do terrorismo de Estado constitui "apologia do delito". Kirchner citou uma série de heróis do Exército do século XIX e XX para compará-los aos generais da ditadura respaldados na manifestação: "queremos o Exército de San Martín, Mosconi e Savio, e não daqueles que assassinaram seus próprios irmãos como fizeram Galtieri, Viola e Videla".
O presidente também desferiu críticas contra oficiais dos serviços de inteligência da Base Almirante Zar, da Marinha, que estiveram recentemente envolvidos em um escândalo de espionagem de políticos, jornalistas e intelectuais.
Segundo Kirchner, o governo não tolerará falta de disciplina nos quartéis. Minutos antes, o general Bendini, no mesmo tom do presidente, havia declarado que não aceitaria "atos que conspirem contra a coesão" das Forças Armadas. "O respeito pelas instituições e pela dignidade das pessoas deve ser exercido sempre. Aqueles que não estiverem de acordo, podem se retirar".
Reuters 29 Maio 2006
Kirchner diz não se intimidar
com ato de militares rebeldes
Por Lucas Bergman
BUENOS AIRES (Reuters) - O presidente argentino, Néstor Kirchner, disse na segunda-feira não temer os militares rebeldes que na semana passada celebraram a morte de guerrilheiros de esquerda na década de 1970, acirrando o confronto que o governo mantém com as Forças Armadas.
Kirchner aproveitou o Dia do Exército para criticar os militares da ativa e da reserva que participaram da cerimônia, na qual jornalistas foram agredidos.
"Incorreram-se em condutas, ações e palavras às quais não seria temerário dizer que raiam a apologia do delito, ao reivindicar o terrorismo de Estado", disse Kirchner. Os militares que participaram do evento sofreram sanções disciplinares.
Desde que assumiu o cargo, em maio de 2003, Kirchner conseguiu revogar leis que protegiam agentes repressores da última ditadura militar (1976-83), reformou dezenas de generais ligados àquele período e manteve sempre uma fria relação com as Forças Armadas.
"Quero que fique claro que, como presidente da nação argentina, não tenho medo", disse Kirchner, que deixou imediatamente a cerimônia militar, sem assistir ao desfile.
Seis militares da ativa participaram na quarta-feira do ato público em uma praça do centro de Buenos Aires, assistido por cerca de 3.000 pessoas, a maioria militares da reserva e civis.
Milhares de pessoas morreram por razões políticas durante a ditadura, período em que os militares sequestraram, torturaram e mataram impunemente. Entidades de direitos humanos dizem que 30 mil pessoas desapareceram naquela época.
Kirchner disse que deseja um Exército subordinado ao poder de origem popular, e "não daqueles que assassinaram seus próprios irmãos, que foram Videla, Galtieri, Viola e Bignone", referindo-se aos quatro militares que governaram a Argentina durante a ditadura.
Jorge Rafael Videla, Leopoldo Galtieri, Roberto Viola e Reinaldo Bignone foram os sucessivos presidentes militares do país durante a ditadura.
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