Contratação de fumacês provoca polêmica no Rio
Condomínios defendem o uso, mas Fiocruz alerta que resistência do ‘Aedes’ aumenta
Por Marcio Menasce / Vera Araújo, 17/02/2016 - O Globo
RIO - Até alguns atrás, quando se ouvia um zumbido forte e um cheiro diferente invadia a casa, todo mundo sabia: era hora do fumacê. Hoje, em meio à explosão de casos de dengue e zika, doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, muita gente se pergunta: por onde ele anda? O veículo tem aparecido pouco em alguns bairros e está no centro de uma polêmica. Por um lado, condomínios contratam empresas particulares para espalhar inseticida pelas áreas comuns e apregoam sua eficácia. Por outro, pesquisadores alertam que o uso indiscriminado do produto químico não é eficiente porque torna o mosquito mais resistente. Apesar desse alerta, quem contrata o fumacê diz que não vai parar de fazê-lo.
— Sou síndico há oito anos do Barramares. Antes disso já contratávamos uma empresa particular para espalhar inseticida. O fumacê vem de duas a três vezes por semana e tem dado resultado. Ainda não escutei qualquer reclamação de morador e não vi nenhum pegar dengue ou zika. Logo depois que o carro passa, diminui a quantidade de mosquitos voando. Todo mundo percebem isso. Certa vez, o veículo da firma veio só uma vez em uma semana, por causa de um feriado, e moradores reclamaram muito, dizendo que já havia mais mosquitos — afirma Luiz Iootty, síndico-geral do condomínio na Barra.
O subsíndico do Edifício Rosa da Barra, Sylvio Pinho, também afirma não ter dúvidas sobre a eficácia do fumacê. Segundo ele, desde 2007, quando assumiu a administração do condomínio, não há registros de moradores com dengue ou zika. De duas a três vezes por semana, uma empresa espalha inseticida no local, serviço que custa aos moradores R$ 800 por mês. A orientação é que todos mantenham as janelas abertas.
João Lane, técnico agrícola e administrador do Sítio Santo Antônio, em Areal, na Região Serrana, é outro que defende o fumacê. Segundo ele, como há criação de cavalos no local, só a circulação do veículo evita a proliferação de mosquitos:
— Estou há 16 anos no sítio e sempre peço um fumacê uma vez por semana. Aqui, nunca registramos casos de dengue ou zika, e olha que temos muitas bromélias.
Inseticidas perdem efeito
A pesquisadora da Fiocruz Denise Valle afirma que o uso indiscriminado de fumacês pode aumentar a população de mosquitos imunes a inseticidas:
— Dos cinco inseticidas aprovados pelo Ministério da Saúde, o Aedes aegypti já é imune a quatro. Apenas um, chamado Malathion, ainda é eficaz, mas, se for usado em excesso, logo perderá efeito.
Segundo a pesquisadora, até 2000, usava-se compostos conhecidos como organofosforados para controle de larvas e Aedes aegypti adultos, mas, com o tempo, o produto perdeu a eficácia. O Ministério da Saúde decidiu então usar inseticidas diferentes, do grupo chamado de piretroides. São os mesmos encontrados em supermercados, e o mosquito também ficou imune a eles.
— Em vez dos 30 anos que as larvas demoraram para criar resistência aos organofosforados, os mosquitos adultos ficaram imunes aos piretroides em apenas três, por causa do uso massivo desses produtos — diz Denise.
A Secretaria municipal de Saúde destaca que o fumacê não sumiu das ruas e que seu uso é racionalizado. De acordo com o órgão, 120 veículos espalharam inseticida este ano em 325 roteiros em todas as regiões da cidade. Os roteiros são conjuntos de ruas determinados de acordo com dados epidemiológicos e com a incidência de casos de doenças relacionadas ao Aedes aegypt.
Este é o problema da falta de cultura dos brasileiros, neste caso especificamente com relação aos aspectos mais básicos da teoria da evolução. É evidente que após passar o fumacê a quantidade de mosquitos diminui. O problema é que nas próximas gerações ela não diminuirá mais, ao passo que os de seus competidores e predadores sim. Aí a situação será muito pior, mas as pessoas não tem ideia disso.
Leandro G. Card