Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

Assuntos em discussão: Exército Brasileiro e exércitos estrangeiros, armamentos, equipamentos de exércitos em geral.

Moderadores: J.Ricardo, Conselho de Moderação

Mensagem
Autor
Piffer
Sênior
Sênior
Mensagens: 1930
Registrado em: Qui Fev 16, 2006 11:07 pm
Agradeceram: 1 vez

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#106 Mensagem por Piffer » Sáb Nov 14, 2009 9:15 pm

Clermont escreveu:PORQUE O REFORÇO AFEGÃO IRÁ FALHAR.

Por Conn Hallinan, 14 de novembro de 2009.

Antes que a administração Obama compre a estratégia de escalada do general Stanley McChrystal, poderia passar algum tempo examinando o combate de Dananeh em 12 de agosto, uma inóspita comuna de 2 mil habitantes, encarapitada na entrada do vale de Naw Zad, na província sulista de Helmand, Afeganistão.

Dananeh é um exemplo de manual do por quê a contra-insurgência não irá funcionar neste país, tanto como um estudo sobre pensamento militar se originando direto de Alice no País das Maravilhas de Lewis Carrol.

Cidades estratégicas.

De acordo com o comando americano, o propósito do ataque era tomar uma cidade “estratégica”, cortar as “linhas de suprimento do Taliban”, e assegurar a área para as eleições presidenciais. Tomar Dananeh também “flanquearia os insurgentes”, “isolando-os” nas montanhas e florestas circunvizinhas.

O que há de errado com este cenário?

Primeiro, o conceito de uma cidade “estratégica” com 2 mil pessoas, num vasto país com dezenas de milhares de aldeias como Dananeh é bizarro.

Segundo, os Talibans não tem “flancos”. Eles são uma força irregular, fluída, não uma companhia de infantaria enterrada numa posição fixa. “Flanquear” um inimigo é algo que você fazia contra a Wehrmacht na Segunda Guerra Mundial.

Terceiro, as “linhas de suprimento do Taliban” não são auto-estradas e cruzamentos ferroviários. São trilhas de cabras.

Quarto, “isolar” o Taliban nas montanhas e florestas circunvizinhas? Obviamente, ninguém no Pentágono parece ter notado que isto seria o equivalente a jogar o coelho Pernalonga dentro de um depósito de cenouras. Montanhas e florestas são onde o Taliban se movimenta mais livremente.


Nesta parte inicial do texto, dá a impressão que o autor está "carteando" um pouco. Não dá para generalizar o planejamento das operações de acordo com uma ideia pré-concebida de combate de contra-insurgência, principalmente nestes níveis mais baixos.

Na maioria dos casos, quando uma operação dessas dá errado, a principal causa são informações imprecisas (ou totalmente equivocadas mesmo) e não o planejamento tático de quem realmente executou a ação.

Acho que o principal ponto onde o texto peca é por não dar nenhuma informação sobre o inimigo e generalizar que o efetivo do inimigo é mínimo e não necessita de uma quantidade considerável de suprimentos.

O próprio contra-ataque pesado que as forças sofreram já vai de encontro a isso. Os relatos das campanhas soviéticas no Afeganistão dão contra de acampamentos com centenas de combatentes, hospitais, instalações como padarias e cozinhas montadas nessas bases.

A Operação Anaconda, no início do conflito, foi uma resposta após o fracasso da Tora Bora. Nesta época se viu que o inimigo era bem mais numeroso e organizado do que se imaginava e que seria necessário o emprego de tropas convencionais na campanha. Foi montada uma operação clássica de martelo-e-bigorna (tão atual como o flanqueamento, que o autor diz ser da 2ª GM - onde era bem mais comum o ataque frontal) e o efetivo do inimigo também surpreendeu os aliados.

Abraços,




Carpe noctem!
Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceu: 632 vezes
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#107 Mensagem por Clermont » Qui Jan 07, 2010 11:07 pm

AUFTRAGSTAKTIK E INNERE FÜHRUNG : marcas registradas da liderança alemã.

Major-general Werner Widder, Exército alemão – Military Review. setembro-outubro de 2002.

Em maio de 1940, a tomada da fortaleza belga de Eben Emael foi criticamente importante para a bem-sucedida condução da campanha francesa pela Wehrmacht alemã na Segunda Guerra Mundial. E, mesmo assim, a preparação e conduta desta operação especial foi confiada a um 1º tenente dos pára-quedistas que, na época, eram um ramo da força aérea. À sua disposição estavam, somente, 77 pára-quedistas. No próprio começo desta operação, o planador do líder da força de assalto, Oberleutnant Rudolf Witzig, foi forçado a fazer um pouso de emergência num campo próximo a Colônia, que estava, aproximadamente, 100 km do objetivo. As aeronaves remanescentes voaram e desembarcaram no interior de Eben Emael. Os pára-quedistas completaram sua missão, mas sob a liderança de um sargento-ajudante (Oberfeldwebel Wenzel).

Durante a aproximação para desembarque para Eben Emael, um outro planador teve de pousar aproximadamente 60 km de seu objetivo. O líder da seção de assalto, sargento-ajudante Meier, tomou uma ação decisiva ao confiscar duas viaturas e abrir caminho através das colunas das divisões do ataque principal, concentradas na fronteira. Alcançando Maastricht, ele atravessou o Rio Mosa e avançou para Eben Emael. Ele foi impedido de assaltar a fortaleza pelo canal que a rodeava. Portanto, decidiu, por sua própria conta, atacar as forças belgas nas vizinhanças da fortaleza. Ferido no curso da luta, Meier capturou 121 soldados belgas, a quem entregou no dia seguinte contra recibo, como prova de que havia feito tudo ao seu alcance para completar a missão. Neste meio tempo, Witzig tinha localizado outra aeronave para rebocar seu planador. Decolando de novo rumo a Eben Emael, ele desembarcou no interior da fortaleza, imediatamente assumindo o comando da sua força de assalto, e obtendo a rendição da fortaleza belga.

O término bem-sucedido desta operação foi um pré-requisito, absolutamente necessário para assegurar o rápido avanço da Wehrmacht através do Rio Mosa e, portanto, foi essencial para a rápida conclusão da campanha francesa. A iniciativa e capacidade de comando de batalha de um 1º tenente e de um sargento foram postos à prova, e ambos saíram de modo excelente, pelo que ambos receberam a Cruz de Cavaleiro da Cruz de Ferro, na época, a mais elevada condecoração por bravura da Alemanha.

A ação em Eben Emael, é um exemplo, particularmente bom, de Auftragstaktik – um princípio de liderança das Forças Armadas alemãs praticado há duzentos anos. Auftragstaktik é um princípio de comando e controle que evoluiu durante os séculos XIX e XX. Os manuais táticos e operacionais do Exército alemão, repetidamente, referem-se a Auftragstaktik e a chamam “princípio proeminente de comando e controle do Exército”. Em 1998, Auftragstaktik foi codificada, mais uma vez, no Regulamento do Exército alemão 100/100 (Restrito), “Comando e Controle em Batalha”, a bíblia do Exército alemão.

As origens da Auftragstaktik.

Auftragstaktik não foi uma idéia introduzida no pensamento militar alemão por decreto. Longe de ser simples ou rápida, sua adoção foi um processo difícil, de longa duração. Os começos da Auftragstaktik podem ser datados de 1806, seguindo-se a desastrosa derrota dos prussianos em Jena e Auerstädt. A forma moderna de guerrear de Napoleão, mostrou as deficiências e a necessidade de modernizar o Exército prussiano.

A reforma inicial foi avançada pelos regulamentos de adestramento de infantaria de 1812, nos quais a conduta de batalha arrastada foi abolida e, ao menos para os níveis mais elevados de liderança, a iniciativa, pensamento e ação independentes tornaram-se importantes fatores. Para os níveis mais baixos de comando, as táticas de coluna, com seus maciços corpos de tropa, continuaram a impor severos limites na conduta da batalha.

Em meados do século XIX, o fuzil de retrocarga começou a substituir o, de longe, menos eficaz fuzil de antecarga. O primeiro representou uma revolução na tecnologia de armamentos. Esta revolução em assuntos militares foi o ponto de partida para uma transformação da infantaria e foi um desenvolvimento que apontou a direção, estabelecendo o curso para a eventual adoção da Auftragstaktik.

As guerras alemãs de unificação de 1864 contra a Dinamarca, de 1866 contra a Áustria, e de 1870-71 contra a França, provaram que os avanços em armamentos tinham deixado para trás os avanços táticos e doutrinários. Para reimpor alguma forma de comando e controle, tornou-se, então, importante desenvolver um novo conceito que, de um lado permitisse alguma independência de ação, enquanto, de outro, impedisse ação mal conduzida por líderes de nível mais baixo.

Um dos primeiros a reconhecer os sinais dos tempos e tirar as conclusões corretas foi o marechal-de-campo Helmuth von Moltke, chefe do estado-maior geral do Exército prussiano, de 1857 a 1888. Moltke é considerado na Alemanha como o criador do comando e controle de nível operacional e pai espiritual dos princípios operacionais. Moltke também desempenhou um papel decisivo no desenvolvimento da Auftragstaktik.

Em seus escritos, seus memorandos, suas publicações mas, em particular, em sua vida diárias como líder, Moltke sempre promoveu a introdução da Auftragstaktik. Uma de suas principais preocupações era forjar o atuação e pensamento independente entre seus subordinados:

”Diversas são as situações sob a qual um oficial tem de agir baseando-se em sua própria visão da situação. Seria errado se ele tivesse de esperar por ordens, em momentos quando nenhuma ordem pode ser dada. Porém, mais produtivo são suas ações quando ele age dentro do quadro da intenção de seu comandante.”


Ao dizer isto, Moltke salientava um princípio-chave da Auftragstaktik: o subordinado deve agir dentro da linha de conduta da intenção do seu superior. Conhecendo a intenção de seu superior, o subordinado, portanto, trabalha para atingi-la.

Os anos após 1871 foram caracterizados por duas tendências conflitantes. Os táticos convencionais, ou Normaltaktikers, eram apoiadores de rédeas firmes que desejavam especificar as ações de batalha das tropas, até o mínimo detalhe. Os apoiadores de rédeas firmes argumentavam que ordens detalhadas iriam se contrapor ao efeito dispersivo trazido pelos armamentos modernos e a suposta independência sem restrições nos níveis mais baixos de comando.

De outro lado, estavam os Auftragstaktikers, apoiadores do comando orientado para a missão, que exigiam a independência das pequenas unidades que, eles diziam, era a conseqüência necessária dos armamentos modernos. Os apoiadores do comando orientado para a missão não emitiam ordens detalhadas para limitar a liberdade de ação dos níveis inferiores de comando, mas, antes, designavam para cada unidade, sua tarefa, claramente definida – sua missão. De 1914, até hoje, Auftragstaktik tem tido um lugar firme na filosofia de comando e controle do Exército alemão.

Embora, por todo o século XIX, o princípio da Auftragstaktik estivesse sendo incorporado na doutrina militar alemã, ela ainda encontrava resistência. O termo “Auftragstaktik” primeiro veio à luz no início dos anos 1890. Ele foi cunhado por aqueles que estavam ressentidos com o processo já que o termo devia demonstrar desdém. A Auftragstaktik foi considerada uma ameaça a disciplina militar e, portanto, por extensão, a todas as coisas militares.

Auftragstaktik e Innere Führung.

A liderança militar do Exército alemão dos dias de hoje reconhece duas pedras de toque: o conceito de Innere Führung e o princípio de Auftragstaktik. Innere Führung é, hoje em dia, inseparavelmente ligado com Auftragstaktik.

Innere Führung. A imagem comum de homem do Exército alemão é a de que o soldado é uma pessoa livre. Sua dignidade individual é respeitada, da mesma forma como seus direitos básicos e direitos à liberdade. Estes direitos são garantidos para todos os cidadãos e, portanto, também para os soldados. Apenas o cidadão responsável agirá por sua própria vontade livre e responsabilidade para com a comunidade. Ele reconhece que os valores da comunidade têm de ser defendidos, mesmo com o risco da própria vida.

Na Bundeswehr, esta imagem de homem encontra sua expressão conceitual no que é chamado de Innere Führung, significando liderança e educação cívica. Innere Führung é o empenho dos soldados alemães com padrões ético-morais. Innere Führung é a cultura corporativa, e ela integra a Bundeswehr na sociedade alemã.

Auftragstaktik. O Regulamento 100/100 descreve Auftragstaktik muito sucintamente:

Auftragstaktik é o princípio proeminente de comando e controle no Exército. Ele baseia-se em confiança mútua e exige de cada soldado empenho sem hesitações no cumprimento do dever.”


Os desafios para o líder são diversos já que o regulamento afirma que:

”O líder militar informa qual é sua intenção, estabelece objetivos alcançáveis claros e fornece as forças e recursos requeridos. Ele somente ordenará detalhes concernentes a execução se medidas que servem o mesmo objetivo tiverem de ser harmonizadas, se restrições políticas ou militares exigirem isto. Ele fornece latitude aos líderes subordinados na execução de suas missões.


Assim, Auftragstaktik é mais do que dar uma missão para um subordinado e esperar que ele a execute. Antes, é dever do superior especificar o objetivo e o quadro dentro do qual o subordinado tem de cumprir a missão. O comandante fornece todos os recursos exigidos para levar à cabo a missão. Isto, por sua vez, significa que a execução em si mesma, torna-se responsabilidade do executor. Suas habilidades, criatividade e empenho serão os elementos-chave da execução. Portanto, Auftragstaktik não é, meramente, uma técnica de emissão de ordens, mas um tipo de liderança que está, inextricavelmente vinculado a uma certa imagem de homens como soldados.

Auftragstaktik em operações de paz.

Embora Auftragstaktik fosse desenvolvida durante a guerra e mostrado seu valor em batalha, ela tem um papel em operações de paz. O Manual 100/100 declara:

”Os princípios da Auftragstaktik também se aplicam às operações de paz, mas estão sujeitos a restrições únicas, que, com freqüência, limitam, seriamente, a liberdade de ação no terreno.”


As restrições únicas podem ser vistas na dimensão política destas operações.

O fator CNN. Em suas memórias, recém-publicadas, o general do Exército dos Estados Unidos Wesley K. Clark, ex Comandante Supremo Aliado da Europa, e o general Dr. Klaus Reinhardt, ex-comandante da Força do Kosovo, descreveram certo número de intervenções políticas em suas áreas de responsabilidade. Clark relembra que havia acabado de dar uma conferência de imprensa em conexão com ataques aéreos da OTAN no Kosovo, em abril de 1999, quando o Presidente da Junta de Chefes de Estado-Maior (CJCS ou Chairman, Joint Chiefs of Staff), general Hugh Shelton o chamou naquela noite e disse,

“O secretário de defesa pediu-me que lhe desse orientação verbal, portanto, aqui vai: ‘Tire a merda da sua cara da televisão. Nada de mais entrevistas, ponto final. É isso.’ Eu queria informar-lhe do modo como ele falou. Você teria alguma pergunta?”


Operações de paz em particular estão sujeitas a intensa cobertura da mídia. Cada ação que um soldado tome é transmitida para as salas de estar em tempo quase real, e os líderes políticos precisam responder por estas ações, imediatamente. A pressão sobre a liderança política para agir ou para se explicar é, particularmente, aguda. Esta pressão, freqüentemente, gera uma tendência para querer controlar tudo. Esta tendência, freqüentemente, encontra sua expressão na interferência direta com a liderança tática e operacional no terreno, como foi o caso com Clark.

A mentalidade ocidental nada-de-baixas. Esta mentalidade prevalecente nas sociedades livres é, naturalmente, algo a ser aprovado, em princípio. Nenhum líder militar deseja baixas entre seus homens. “Cuide de seus soldados” é máxima que líderes militares, em todos os escalões de comando, seguem, incluindo o antigo CJCS general Colin Powell. No contexto da presença da mídia, entretanto, até mesmo baixas mínimas podem ter sérias implicações de dimensão estratégica. Relembrem as terríveis imagens de outubro de 1993, em Mogadíscio, Somália. Estas imagens levaram os Estados Unidos e, subseqüentemente, a ONU a retirarem seu empenho militar da Somália.

O soldado como participante estratégico. Durante as missões de paz, é, com freqüência, importante manter o princípio da imparcialidade, em particular, sob circunstâncias difíceis. Neste ambiente, o ainda fumacento pavio do barril de pólvora pode ser, rapidamente, reacendido, e a força de paz pode tornar-se a inimiga de uma ou outra facção. Uma tal perda de credibilidade pode ter sérias implicações políticas. A partir disso, em contraste com a guerra, as ações de até mesmo um único soldado em missões de paz podem ter significação estratégica. Como resultado, a liderança política tem um elevado interesse em levar à frente suas intenções particulares tão longe quanto possível. O resultado político pode depender da ação correta ou errada de um único soldado num posto de controle. Portanto, condução política detalhada é vista como garantia para o sucesso, com o resultado de que os militares tem um campo de ação limitado.

As regras de engajamento. Missões de paz não são mais operações únicas. Elas, atualmente, são mais prováveis do que a luta real. A fronteira entre guerra e paz está tornando-se, cada vez mais, obscurecida. Hoje, no Afeganistão, pode-se ver a concorrente condução de uma operação de combate e uma operação de paz. Estas últimas são sempre complexas, prolongadas e frustrantes. O sucesso total de uma missão, eminentemente, repousa sobre muitos pequenos sucessos, que promovem confiança e reconciliação e ajudam a superar o ódio e o derramamento de sangue. Regras de engajamento, estreitamente definidas, limitam o campo de ação de uma missão de paz e tem a intenção de garantir a segurança dos contingentes multinacionais enquanto estes desempenham suas tarefas complexas e sensíveis.

”Nós [o Exército alemão] não temos serventia nenhuma para soldados sem vontade própria que obedecem seus líderes incondicionalmente. Nós precisamos de homens auto-confiantes que usem toda sua inteligência e personalidade em nome da intenção do comandante superior.”


Um autor alemão escreveu estas palavras em 1906, e elas ainda são válidas hoje, no difícil ambiente das missões de paz e na presença de novas formas de guerra moderna, tais como o terrorismo. Durante operações de paz, em particular, os soldados precisam fazer mais do que, simplesmente, obedecerem ordens e disparar suas armas individuais. Todo líder militar, em cada escalão de comando, sustenta que possui os melhores soldados. Se é assim, deve ser-lhe permitido provar isto. Portanto, está fora de questão que um coronel ou mesmo um general, se auto-nomeie líder de um GC para controlar o tráfego num cruzamento rodoviário, ou para instruir um líder de patrulha sobre sua missão.

Auftragstaktik no século XXI.

Como mencionado antes, a Auftragstaktik foi provocada por uma revolução nos assuntos militares, trazida pela invenção do fuzil de retrocarga e outros desenvolvimentos na tecnologia do armamento no século XIX. Hoje, a questão é, terão os assuntos militares, de novo, alcançada um tal ponto revolucionário? Alguns autores consideram a tecnologia de informações uma tal marca d’água.

Tecnologia de informações. No que concerne à tecnologia de informações, as Forças Armadas dos Estados Unidos não tem par. Embora outros estejam desenvolvendo e implementando tecnologia de informações, eles ainda estão muito atrás, mancando e a Bundeswehr está, atualmente, mancando das duas pernas. No futuro, será cada vez mais possível transmitir dados em tempo real. A precisa localização de um líder de patrulha será visualizada por todos os escalões de comando; observações e informações de todo o tipo estarão disponíveis para todos os escalões, ao mesmo tempo. Excelentes oportunidades para superar o inimigo desdobrar-se-ão: “Veja Primeiro – Compreenda Primeiro – Aja Primeiro – Mate Primeiro” é o fundamento básico do recém-publicado Papel Branco do Exército dos Estados Unidos, Concept for the Objective Force.

A transmissão da informação não representa mais um problema; o desafio da informação está em seu processamento. Se o tempo que alguém ganha por meio de uma transmissão em tempo real é dispendido recebendo, processando e avaliando a informação, apenas para descobrir que a informação está atrasada, é irrelevante ou redundante, então, o tempo foi desperdiçado e a tecnologia da informação, rapidamente, se transforma num ônus.

Portanto, nesta conexão, duas coisas são importantes. Primeiro, o manejo da informação precisa ser aprendido e praticado. Informações relevantes precisam ser distinguidas de informações irrelevantes. As informações precisam ser coletadas, avaliadas e distribuídas horizontalmente e verticalmente, de modo a serem úteis para os destinatários. Segundo, a característica distintiva da liderança não é a mera posse de um meio de informações; ela é ter a habilidade e a vontade de avaliar a informação que o meio contém. Em nenhum escalão de comando poderá a avaliação ser dispensada. Isto quer dizer que ordens precisam ser adaptadas ao escalão de comando para a qual elas são emitidas.

Auftragstaktik estabelece o quadro para a recepção e disseminação de informações com significação. Ela força o comandante superior a avaliar a informação e convertê-la em ordens para os escalões de comando subordinados. Auftragstaktik mantém a chave para a administração da informação e, portanto, por extensão, para o bem-sucedido comando e controle.

Micro-gerenciamento. A disponibilidade de recursos tecnológicos para gerenciar informações deu origem a um comportamento que é, em particular, conspícuo nos escalões mais elevados do comando, denominado, micro-gerenciamento. Estes escalões mais elevados, com freqüência, e incorretamente, acreditam que sabem mais do que os escalões de comando mais baixos. Por conseguinte, os primeiros interferem, diretamente, com os últimos, com a intenção louvável de tornar suas informações disponíveis para todo mundo. Por conseguinte, para traduzir a vantagem em informações em real vantagem em tempo, os escalões de comando intermediários são ultrapassados, e a informação é enviada, diretamente, para o destinatário desejado, enquanto o escalão, realmente responsável, só é incluído, na maior parte das vezes, como informação para endereço. Em tal situação, o escalão de comando, realmente responsável, degenera-se num administrador de informações, enquanto o escalão superior envolve-se em questões de excessivo detalhe. Já, sob Napoleão, o perigo de “ordre, contreordre, désordre” existe. Hoje, este perigo está ligado com o micro-gerenciamento.

É inaceitável que escalões subordinados sejam desconsiderados e que os escalões mais elevados ultrapassem os escalões intermediários de comando e interfiram com decisões táticas no terreno. Em acréscimo as implicações para a liberdade de ação e as operações dos soldados, emergem riscos para os escalões militares de comando táticos e operacionais.

Hoje, observamos uma crescente dispersão das batalhas, operações, campanhas e até mesmo da própria guerra. Enquanto, no passado, o núcleo das operações consistia de uma campanha direcionada para esmagar o inimigo numa área, relativamente, definida, hoje a situação é menos distinta, mais difusa e mais difícil. Apesar disso, a relação entre espaço, tempo, força e informação, continua a ser crítica.

O comandante que tenta especificar cada coisa está condenado a se perder em detalhes. Ele perderá o caminho das coisas e fracassará. E mais, o comandante que desce para exercer o comando e controle nos escalões subordinados, perderá o apoio de seus homens e solapará as bases de ação deles.

Transparência. A visão do campo de batalha transparente é realística, em princípio. Da perspectiva tecnológica quase tudo é possível hoje. “Veja Primeiro – Entenda Primeiro – Aja Primeiro – Mate Primeiro” (“See First—Understand First—Act First—Finish Decisively”) é a linha de conduta. Ela implica que a velocidade é necessária para ser o “primeiro”.Mas sobre que velocidade se está falando aqui? Ela não é a velocidade em transmitir a informação do líder de patrulha para a seção E2 divisionária. Antes, é a velocidade no planejamento que é parte do trabalho de estado-maior em todos os escalões, e naturalmente, é a velocidade da decisiva tomada de decisão do líder. Estes são os fatores que impulsionarão a velocidade da ação.

O que é importante é ultrapassar o ciclo de decisão do inimigo. As próprias decisões têm de ser tomadas e implementadas no tempo certo e precisam ser válidas por um certo período de tempo. E mais, os escalões de comando subordinados precisam ser capazes de manter o passo com o ritmo de decisões dos escalões mais elevados de comando. No fio cortante da cadeia de decisão está a companhia Panzer que tem de contra-atacar vinda da reserva. Ela, simplesmente, não pode ser movida em tempo real, da área de concentração para o local onde o contra-ataque deve ter lugar.

Por conseguinte, é importante para o comandante militar desenvolver o que Carl von Clausewitz chamava “Takt des Urteils” ou o “tato do julgamento”, de tal forma que o julgamento do comandante acelerará o processo de comando e controle quando combinado com tecnologia moderna. A história da guerra é cheia de exemplos de pessoas que confiaram na sofisticação de sua própria tecnologia, enquanto negligenciavam suas doutrinas de treinamento e comando e controle. Clausewitz continuará a estar certo quando ele iluminou o nevoeiro da guerra e a fricção como características-chave da guerra, inerentes ao sistema.

Confiança única em imagens de satélite, apenas gerará sucesso parcial. Como regra geral, o indivíduo no terreno – o especialista em HUMINT, o “boina verde”, o controlador aéreo avançado – fornece a informação decisiva para desfechar o golpe crucial. O processo de tomada de decisão poderá, apenas, ser acelerado, decisivamente e de forma sustentável, se aceitarmos o nevoeiro da guerra como uma faceta inerente ao sistema, mesmo num ambiente de total imersão em informações. O maior desafio para o comando e controle na era da informação será reconhecer onde a transparência será exigida e onde não será necessária. De outra forma, o tempo ganho por intermédio de sofisticados elementos será novamente desperdiçada.

Enquanto a Auftragstaktik tem provado seu valor por mais de dois séculos, ela ainda é um princípio moderno de liderança. O fundamento decisivo para a Auftragstaktik é o treinamento de tempo de paz com foco deliberado no treinamento de soldados para pensar independentemente e para agir de acordo com a intenção do comandante superior. O objetivo especificado do superior, sua confiança nas capacidades de seus subordinados, a aceitação, sua e de seus subordinados, das respectivas responsabilidades e a sua liberdade para agir são as quatro pilares fundamentais da Auftragstaktik de um lado e o seu segredo, de outro. O ônus, entretanto, ainda permanece com o comandante, que precisa fornecer os meios necessários para cumprir a missão.

Auftragstaktik baseia-se sobre uma imagem de homem que valoriza sua dignidade e liberdade individual, e que faz uso deles para obter força superior. Este conceito ainda é válido para o século XXI. Baseado na premissa de que a liderança encampa dois aspectos – ser um modelo de exemplo e aceitar responsabilidades – a liderança exige competência, força de caráter, confiança, iniciativa, julgamento, autoconfiança, e capacidade de tomada de decisões, em todos os escalões de comando. Apenas a Auftragstaktik permite a exploração significativa das mais sofisticadas tecnologias, e apenas a Auftragstaktik permite a maestria dos cada vez mais complexos desafios do século XXI. E mais importante, é preciso o encorajamento dos superiores e a coragem dos subordinados para fazer a Auftragstaktik trabalhar.


_________________________________________________

O major-general Werner Widder do Exército alemão é o general-comandante do Comando de Doutrina e Treinamento do Exército alemão, Colônia, Alemanha. Serviu como comandante da 13ª Divisão Panzergrenadier, Leipzig, Alemanha; chefe de estado-maior do Quartel-General das Forças de Estabilização, Sarajevo, Bósnia-Herzegovina; chefe do estado-maior IV Korps, Potsdam, Alemanha; e comandante da 41ª Brigada Panzer, Eggesin, Alemanha.




Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceu: 632 vezes
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#108 Mensagem por Clermont » Dom Jan 24, 2010 5:39 pm

O MITO DA CONTRAINSURGÊNCIA parte I.

Por Jeff Huber, janeiro de 2010.

O fabuloso manual de campanha de contrainsurgência (FM 3-24) é um retumbante volume de 281 páginas de insensatez. Mesmo a lenda de sua origem é uma fabricação. O general David Petraeus, ex-comandante das forças no Iraque e, agora, encarregado do Comando Central, supostamente, “escreveu o livro”, mas este foi, realmente, colocado junto a partir de material plagiado em 2004 pelo Dr. Conrad Crane e outros na Escola de Guerra do Exército.

Isto foi durante o período de tempo no qual o “Rei Davi” Petraeus estava encarregado do treinamento das forças iraquianas, uma temporada durante a qual ele perdeu o rastro de 190 mil fuzis AK-47 e pistolas e outros equipamentos de combate que, sem dúvidas, acabou nas mãos dos militantes. A parte do manual que Petraeus “escreveu” foi sua assinatura na carta de endosso do manual, quando ele estava no comando do Centro de Armas Combinadas do Exército dos Estados Unidos, em 2006.

Não há nada de novo nas Forças Armadas sobre generais recebendo créditos pelo trabalho duro de subalternos, naturalmente, em especial quando o general em questão é um gênio em ascensão da autopromoção, como o “General do Teflon” Petraeus. E o plágio é tão comum nas publicações militares que é a norma, não a exceção. Como eu costumava dizer na minha época de serviço na ativa, se você, realmente, acha que os chefões querem que você seja criativo, você está lelé da cuca. A doutrina militar está eivada com palavreado do tipo “copy-and-paste” que recua décadas, algumas vezes mais de um século, refletindo a perspectiva especializada de especialistas que morreram há tanto tempo atrás que ninguém pode dizer quem eram. Desta forma, ninguém fica de cara grande por ter tido uma idéia original que não funcionou.

Isto é muito da razão que nós, quase sempre executamos táticas e estratégias que se aplicam a guerras outras que não estas que estamos, atualmente, travando. Nossa presente doutrina de contrainsurgência (COIN) é um exemplo perfeito. Ela é inadequada de muitas formas, mas quatro aspectos dela estão, particularmente, em contradição com as atuais condições no terreno.

Filhos bastardos.

O manual COIN salienta,

”O objetivo primário de qualquer operação COIN é forjar o desenvolvimento de uma eficaz governança por um governo legítimo.”


Nós, claramente, fracassamos em atingir estes objetivos, seja no Iraque ou no Afeganistão, e é provável que não consigamos atingi-los, em ambos os países, a não ser que apareçamos com uma presença de tropas, de seis dígitos, por tempo o bastante para influenciar o fundo genético local.

O governo do Iraque, de controle xiita, liderado pelo primeiro-ministro Nouri al-Maliki, é uma catástrofe. Como o chefe da Equipe de Conselheiros do Comando de Operações de Bagdá, coronel Timothy Reese, recentemente observou, “A ineficácia e corrupção dos ministros [do governo iraquiano] são legendários.” A campanha anticorrupção é uma farsa, nada mais do que uma ferramenta de campanha de Maliki. O governo do Iraque está fracassando em aperfeiçoar sua infraestrutura elétrica e sua indústria petrolífera. Não há nenhum progresso na resolução da situação de Kirkuk. Milicianos sunitas não estão sendo levados para o serviço governamental como prometido. A reconciliação sunita está, “provavelmente andando para trás”. A violência e a intimidação política é “desvairada na comunidade civil, tanto como nas instituições militares e legais.” Um recente estudo pela Transparency International elenca o Iraque como o 5º mais corrupto país no mundo. Isto o faz quase tão corrupto quanto o Afeganistão.

O Afeganistão é o 2º país mais corrupto no mundo, ultrapassado nesta categoria, apenas, pela Somália, um país do qual, dificilmente, poderá se dizer ter um governo, afinal de contas. Embora o presidente afegão Hamid Karzai se mantenha no poder, ao roubar duas eleições, a administração Obama passou por cima de tudo ao declará-lo o líder “legítimo” do Afeganistão. Karzai é um antigo senhor da guerra que tem laços de sangue com indústira do ópio. Obama disse a Karzai para ficar limpo, para começar um “novo capítulo”, mas se o nosso presidente, realmente, acredita que Karzai mudará, precisa cair na real.

Treinamento do Exército, Senhor.

O manual COIN enfatiza a necessidade para utilizar as forças da nação hospedeira numa variedade de funções, seja como força de “manutenção” numa estratégia de limpar, manter e construir; como parte de uma “força combinada”; ou como a força principal apoiada num grau “limitado” por forças americanas. O problema com a teoria é que ela presume um certo nível de competência e integridade, ou, pelo menos, um potencial para vir a se tornar competente e íntegra, da parte das forças da nação hospedeira, virtudes que vemos pouco nas forças de segurança do Iraque e Afeganistão.

O cel. Reese observa sobre o exército do Iraque, que, “se em algum momento existiu uma janela onde as sementes de uma cultura militar profissional pudessem ser implantadas, ela já passou de há muito tempo.” A corrupção no corpo de oficiais, ele diz, é “desvairada”, como são o compadrismo e o nepotismo. A preguiça é “endêmica”, e a falta de iniciativa é “legião”. Reese descreve a “ineficiência” do exército e da força de polícia nacional do Iraque como “quase total”.

Mohammed Hussein, o cabeça da equipe do bureau de Bagdá do New York Times, lamenta, “Alguns dirão, provavelmente, que o governo livrou-se da violência sectária... [mas] após seis anos, nós temos o mesmo resultado como ainda houvesse uma guerra sectária: iraquianos estão sendo mortos à sangue-frio.”

Notícias piores: parece que o exército e a polícia do Iraque foram infiltrados por militantes. O próprio Maliki revelou que mais de 45 membros de suas forças de segurança estavam envolvidos nos ataques à bomba de dezembro, em Bagdá, que mataram 112 pessoas.

Falando de falta de confiança, as forças afegãs são, totalmente, um show do Velho Oeste. Numa recente confrontação entre tropas afegãs e ocidentais, um soldado afegão, a quem foi recusado acesso a um heliponto, onde um helicóptero estava prestes a descer, ergueu seu fuzil e começou a apertar o gatilho, ferindo dois soldados italianos e matando um médico de combate americano. Quando comandantes de companhia americanos encontram suas contrapartes afegãs, usam blindagens corporais e capacetes, e mantém junto de si um destacamento armado de segurança.

David Wood do Politics Daily descreve numerosos outros relatos de forças afegãs atacando e matando ou ferindo integrantes das forças americanas e da OTAN.

Quando se trata de combate, o Taliban, rotineiramente, chuta o traseiro das forças uniformizadas afegãs. Os infelizes comandantes do exército afegão lamentam que a polícia esteja na folha de pagamento do Taliban. A polícia e o Taliban são “da mesma área”, diz o general Abdul Rahman Rahmani. “Eles estão de conluio, um com o outro”.

O general Stanley McChrystal, comandante das forças americanas e da OTAN no Afeganistão, disse que o sucesso da missão “exigirá uma parceria expandida, baseada em confiança,” com o exército e a força policial afegãos.

Isto soa como se Stan, The Man, também precise cair na real.


(continua...)




felipexion
Sênior
Sênior
Mensagens: 3548
Registrado em: Sex Ago 17, 2007 11:06 am
Localização: Bahia!
Agradeceu: 74 vezes
Agradeceram: 87 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#109 Mensagem por felipexion » Dom Jan 24, 2010 5:49 pm

Clermont, mais um belo texto!
Não se esqueça de postar a outras partes!




[centralizar]Mazel Tov![/centralizar]
Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceu: 632 vezes
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#110 Mensagem por Clermont » Sex Jan 29, 2010 7:00 pm

O MITO DA CONTRAINSURGÊNCIA parte II – A busca por informações humanas.

Por Jeff Huber, janeiro de 2010.

Na parte I, eu observei que as duas exigências-chave para nossa doutrina de contrainsurgência – um governo legítimo da nação hospedeira e uma competente e confiável força de segurança da nação hospedeira – nunca serão atingidas no Iraque ou Afeganistão. A parte II ilustrará a falta de informações confiáveis em nossas lamentáveis guerras.

O manual de campanha de contrainsurgência que o general David Petraeus, supostamente, escreveu, diz, “Contrainsurgência (COIN) é um empreendimento conduzido por informações.” Esta é uma má notícia para nós, porque nossos sistemas de inteligência, tanto no Iraque quanto no Afeganistão podem ser melhor descritos como ações do Inspetor Closeau.

O Centro para uma Nova Segurança Americana (CNAS), recentemente, publicou um relatório intitulado Consertando a Inteligência: Um Esquema para Tornar a Inteligência Relevante no Afeganistão. Os autores, que incluem o major-general Michael T. Flynn subchefe de inteligência do estado-maior no Afeganistão, nos conta que o aparato de inteligência no Afeganistão é “incapaz de responder a questões fundamentais sobre o ambiente no qual as forças aliadas e americanas operam.”

O general Stanley McChrystal, comandante das forças americanas e da OTAN no Afeganistão, diz, “Nossos líderes superiores – o presidente da Junta de Chefes de Estado-Maior, o secretário de defesa, Congresso, o presidente dos Estados Unidos – não estão obtendo as informações corretas para tomar decisões a partir delas.”

Por mais trágico que tenha sido o incidente, não se pode evitar contemplar o ataque suicida no Afeganistão que matou sete agentes da CIA e feriu outros seis, em 30 de dezembro, como um exemplo primário do que Flynn e McChrystal estão falando. É divertido escutar Joe Scarborough da MSNBC ecoar a mais recente enrolação de suas “fontes internas” na divisão de desculpas da CIA, fontes internas que tem contado à mídia aberta as mesmas fábulas que vem dizendo a Joe.

Foi o que eles sempre temeram, disse Joe, um agente duplo ganhando sua confiança e voltando-se contra eles, mas a narrativa do ataque à bomba muda tão rápido quanto as razões pelas quais invadimos o Iraque mudaram durante a administração Bush.

Não está, inteiramente claro, para quem o homem-bomba, um jordaniano chamado Humam Khalil Abu-Mulal al-Balawi, realmente, estava trabalhando, ou se ele era um agente duplo, triplo ou quádruplo, ou alguém que, simplesmente, estava louco da vida com os americanos.

Quando a estória irrompeu, al-Balawi era um soldado do Exército Nacional afegão, que entrou num ginásio e detonou sua bomba, e o Taliban estava por trás do complô (o Taliban assumiu o crédito pelo ataque à bomba).

Em 4 de janeiro, anônimas “autoridades de inteligência ocidentais” contaram à NBC que al-Balawi era um médico jordaniano, agente duplo para a al-Qaeda. Em 5 de janeiro, a Associated Press relatou que anônimas “autoridades em terrorismo” disseram que al-Balawi era um “suspeito agente duplo jordaniano”.

Al-Balawi era um conhecido simpatizante da al-Qaeda que havia postado numerosas mensagens na Web que apoiavam o grupo terrorista, disseram as autoridades em terrorismo. Portanto, os jordanianos enfiaram as algemas no bom doutor e o trancafiaram, coagindo-o a ajudá-los e a seus companheiros da CIA para capturar ou matar Ayman al-Zawahiri, o braço direito de Osama bin-Laden. A Jordânia tem se engajado fortemente com a CIA, ao torturar prisioneiros que a Agência entregou ao seu país, ilegalmente. Agora, a inteligência jordaniana está tentando lavar as mãos da coisa toda, principalmente, imagina-se, porque al-Balawi também conseguiu matar seu supervisor jordaniano Ali bin Zaid, um membro da família real jordaniana, a quem a inteligência da Jordânia afirmava estar envolvido em “trabalho humanitário”.

Um dos agentes da CIA mortos era considerado como um dos especialistas com mais conhecimentos sobre a al-Qaeda. Você poderia imaginar que um especialista em al-Qaeda teria sabido que al-Balawi era um simpatizante escancarado da al-Qaeda e teria insistido que ele fosse revistado ao entrar nas instalações, independente do quanto os jordanianos dissessem que ele era um grande sujeito. Mas não.

O fator Loucademia de Polícia na narrativa continua crescendo como bola de neve. Em 7 de janeiro, o Times de Londres, de Rupert Murdoch, relatou que anônimas “autoridades da inteligência americana” acreditavam que o ataque tinha sido planejado pelo “círculo interno” de Osama bin Laden.

Então, apareceu um vídeo póstumo em 9 de janeiro no qual al-Balawi disse que o ataque era uma vingança pelo chefe do Taliban paquistanês Baitullah Mehsud, que foi morto em agosto, por um ataque de drones da CIA. No vídeo, al-Balawi está sentado com o sucessor de Mehsud.

O diretor da CIA Leon Panetta rejeito as acusações de que as mortes no atentado foram resultado de um trabalho ruim, mas veteranos da CIA discordam. Um antigo oficial de campo disse do incidente, “Isto foi trabalho ruim? Mas é claro.”

“O trabalho que foi desenvolvido através durante muitos anos atrás, é passado,” disse outro veterano de campo da CIA. “Agora, é um prazo militar no qual você não tem tempo para validar e vetar fontes. ... a parte de espionagem tornou-se quase estranha.”

Ouvimos de várias vozes entre os criadores de guerra que o atentado comprova o quanto o Taliban afegão, o Taliban paquistanês e a al-Qaeda estão de conluio, mas tudo que isto comprova é que não temos noção do que se passa na região e que nós, provavelmente, nunca encontraremos fontes confiáveis de inteligência humana (HUMINT) nesta parte do mundo. Você pode contar nos dedos de uma cascavél o número de pessoas que tanto possam falar as línguas locais quanto passar num exame de segurança.

Falar de boa HUMINT não é a única coisa que obstaculiza nossas agências de inteligência. Os drones espiões voando sobre o Afeganistão estão fornecendo mais vídeos primários de informação do que podemos lidar. De acordo com o New York Times, um grupo de “jovens analistas” estacionado n Base da Força Aérea de Langley, na Virgínia e alhures, observa cada segundo de filmagens ao vivo, mas somente uma pequena fração do vídeo armazenado é utilizada para posterior análise. A Força Aérea planeja adicionar mais 2500 novos analistas para ajudar a lidar com o volume de dados. É de se imaginar onde as Força Aérea pretende achar 2500 analistas de imagem treinados e o quão jovens eles serão.

Estou disposto a reconhecer que a CIA e o resto de nosso aparato de inteligência no Afeganistão parecem ineficazes somente porque a tarefa deles é impossível. Mas isto apenas serve p ara reforçar que a missão total – contrainsurgência – está sendo, doutrinariamente, direcionada para algo que é impossível obter, daí tornando a própria contrainsurgência uma missão impossível.


______________________

(continua...)




Avatar do usuário
Claude
Júnior
Júnior
Mensagens: 75
Registrado em: Sáb Abr 12, 2008 6:20 pm
Agradeceu: 4 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#111 Mensagem por Claude » Sex Jan 29, 2010 8:04 pm

O amigo Clermont está mais uma vez de parabéns. Este tópico é sem dúvida um dos de maior nível do DB.




Piffer
Sênior
Sênior
Mensagens: 1930
Registrado em: Qui Fev 16, 2006 11:07 pm
Agradeceram: 1 vez

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#112 Mensagem por Piffer » Sex Jan 29, 2010 9:27 pm

O último parágrafo é emblemático. Não dá para culpar quem está fazendo uma coisa impossível de se fazer. O erro é bem mais embaixo (ou em cima?)

Abraços,




Carpe noctem!
Loki
Sênior
Sênior
Mensagens: 880
Registrado em: Seg Jan 05, 2009 2:19 pm
Agradeceu: 7 vezes
Agradeceram: 4 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#113 Mensagem por Loki » Sáb Jan 30, 2010 12:04 am

Clermont, como vai? Após ler seus excelentes posts, fiquei com uma dúvida, confesso que não li as demais páginas do tópico, mas agradeceria um comentário seu, ou sua visão sobre a seguinte questão:

Enxergo uma proximidade na atuação brasileira para a COIN, seja no Haiti ou na amazonia legal muito mas para o legado do cel David Galula, que para o (ao meu ver) FM 3-24 que teoricamente teriam a mesma base.

Eu acho o enfoque do Cel Galula, de atuação de parceria e melhoria da comunidade em questão, muito mais eficaz e eficiente que a atuação descrita tão claramente em seus post sobre as operações de Contra insurgência americana.

forte abraço




Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceu: 632 vezes
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#114 Mensagem por Clermont » Sáb Jan 30, 2010 4:33 pm

Loki escreveu:Clermont, como vai, após ler seus excelentes posts, fiquei com uma dúvida, confesso que não li as demais páginas do tópico, mas agradeceria um comentário seu, ou sua visão sobre a seguinte questão:

Enxergo uma proximidade na atuação brasileira para a COIN, seja no Haiti ou na amazonia legal muito mas para o legado do cel David Galula, que para o (ao meu ver) equivocado FM 3-24 que teoricamente teriam a mesma base.

Eu acho o enfoque do Cel Galula, de atuação de parceria e melhoria da comunidade em questão, muito mais eficaz e eficiente que a atuação descrita tão claramente em seus post sobre a Contra insurgência americana.
Saudações, Deus do Mal e Príncipe dos Feiticeiros.

Pra falar a verdade, nunca tinha ouvido – ou lido – falar deste coronel Galula. Mas, felizmente, neste século, em Midgard, nós dispomos deste maravilhoso “pai dos burros” chamado Wikipedia. (http://en.wikipedia.org/wiki/David_Galula).

Lendo este texto da Wikipedia, e tendo lido, apenas, esparsos fragmentos, do tão falado manual americano, não saberia dizer se o pensamento do coronel francês é, assim, tão diferente do que que preconiza o manual americano. Óbvio que, somente, um especialista no assunto poderia dar a palavra final. No fundo, a teoria da contrainsurgência é, relativamente simples. A teoria, bem entendido, pois a prática já são outros quinhentos.

Veja-se algumas destas recomendações de Galula (da Wikipedia):
”O objetivo da guerra é conquistar o apoio da população, de preferência a controlar território.”

“O apoio da população pode ser perdido. A população precisa ser, eficazmente, protegida para permiti-la cooperar sem temor de retribuição do partido oponente.”

“A imposição da ordem deve ser feita, progressivametne, removendo ou rechaçando os oponentes armados, então, ganhando o apoio da população e, eventualmente, reforçando posições, ao construir infraestrutura e estabelecer relacionamentos de longo prazo com a a população. Isto deve ser feito, área por área, utilizando um território pacificado como base de operações para conquistar uma área vizinha.”
Difícil achar que algum manual de contrainsurgência contradiga tais recomendações. Aliás, se tivessem perguntado ao Sun-Tzu o que ele achava, talvez ele dissesse que é puro bom senso. Por isto, no texto que eu postei, o autor faz referência ao fato de que, muita coisa em doutrina militar é tirada, quase, letra por letra, de textos e autores de muitos anos passados. Mas, isto não é uma simples questão de falta de originalidade. É, tão só, reconhecer que, desde que o homem tem sentido a necessidade de atacar outros homens em busca de suas mulheres, de suas terras, e qualquer outras coisitas, todo tipo de método e ardil para conquistar tais objetivos – ou para defender-se de tais pretensões - tem sido meditado e levado à efeito.

Vou dar um exemplo prático: lembra-se do Maurício de Nassau? O governador do “Brazil Holandês”? Pois bem, se ele tivesse sido apresentado ao coronel Gandula, digo, Galula, provavelmente, teria apreciado muito o francês e o convidado para um jantar. Isto porque o pensamento do coronel se encaixa, perfeitamente, no método de ação de Nassau.

E qual era este? Manter a boa-vontade e a cooperação dos habitantes portugueses (claro que este termo, na época, também incluía os nativos da terra que, depois, viriam a ser os brasileiros) da “Nova Holanda”, impedindo-os de cooperar com os portugueses dos territórios sob controle luso-espanhol. E esta boa-vontade foi obtida da seguinte forma: evitando-se ofender a fé religiosa católica dos portugueses, tentando implantar formas de conduta calvinistas; evitando-se ofender a fé dos bolsos dos portugueses, tentando lhes tosquiar a pele, aumentando impostos. Aliás, sobre impostos, vejam o que Nassau disse, no seu discurso de despedida do Brasil, aconselhando os sucessores:
"A palavra imposto soa muito mal; não os aumentem, mesmo que seja para pagar as dívidas do Estado".
Acho que Nassau não seria aceito nem no PT, e nem no PSDB...

E, encaixando-se num dos itens de Galula, Nassau deu início a uma série de construções de infraestrutura que, em pouco anos, tornaram a Recife holandesa como a cidade mais bem construída de toda o Novo Mundo.

E qual a forma de mensurar o resultado da ação de Nassau em termos de “contrainsurgência”, um termo desconhecido para ele, pelo menos, em forma, não em conteúdo?

Quando surgiram boatos de que Nassau abandonaria o comando da Nova Holanda, vários senhores de terra pernambucanos enviaram uma carta aberta para que ele permanecesse, e não os abandonasse. Alguém poderia pensar: “Mas que filhas da mãe traidores!” Acontece que, entre eles estavam vários dos mais importantes cabeças da Insurreição Pernambucana, anti-holandesa, dos anos seguintes. Incluindo, um dos maiores de todos, João Fernandes Vieira.

E, algumas das várias razões que deram origem à Insurreição, foi a atitude dos novos dirigentes holandeses que fizeram o contrário de Nassau. Não só passaram a arrochar os impostos e cobrar dívidas dos senhores de engenho, como passaram a atacar a fé católica do povo simples. Não por coincidência, a Insurreição ficou conhecida, na época, como a Guerra da Divina Libertação.

E o resto da história é Guararapes...

Então, se a teoria é conhecida há tanto tempo, porque não é posta em prática, sempre, e não se vence todas estas guerras de contrainsurgência, com a mão nas costas?

Eu desconfio de que a raiz esteja, no próprio conceito de “contrainsurgência” na forma como este conceito teórico, lida com cada realidade particular. Por exemplo, a sabedoria dos conselhos do coronel Galula parecem à toda prova. Porém, tal sabedoria foi forjada a partir dos ensinamentos da situação dos franceses na Argélia. O fato é que tal situação, era fruto de todo um longo processo histórico. Os franceses estavam na Argélia desde meados do século XIX. Tinham todo um aparato administrativo, cultural, político, econômico e militar, solidamente implantado. Eles não eram, de forma alguma, alienígenas na Argélia. Existia um grande número de franceses que viviam lá, há gerações; muitos argelinos locais eram leais à França. Não me parece que uma mensagem radical islâmica fizesse parte do cenário local de luta contra a presença francesa.

Ou seja, condições totalmente opostas a dos americanos no Afeganistão e no Iraque.

E outra coisa, tanto num caso (a Argélia) e noutro (Afeganistão/Iraque) no meu modo de ver, o termo “contrainsurgência” é sinônimo de guerra colonial/imperialista. Algo que seria totalmente distinto da situação do Brasil, no caso eventual de o MST virar um movimento de guerrilha armada. Em tal caso, um governo brasileiro, legítimo, por ter sido sancionado nas urnas, estaria conduzindo um movimento de contrainsurgência, por meio de seu braço militar de combate terrestre, o Exército brasileiro.

Quanto ao Haiti, nunca me passou pela cabeça que pudesse ser considerado em termos de contrainsurgência. Tanto quanto eu saiba, aquilo lá é uma missão de manutenção da paz (traduzindo-se, em termos de “paz política interna”). Os poucos – ou muitos, não sei – tiros que os brasileiros andaram dando lá, tem a mesma característica básica dos tiros que o BOPE desfecha em favelas: ou seja, durante uma missão policial contra foras-da-lei comuns.

Agora, se amanhã – por pura magia, já que, depois do terremoto, o Haiti já era, para todo o sempre -, aparecesse um movimento político local, que conseguisse arregimentar determinado número de haitianos, para pegarem em armas contra a presença dos “maléficos invasores brasileiros”, seria um caso teórico de se preparar para uma contrainsurgência. Evidente – pelo menos pra mim! – que, no dia em que tal coisa acontecesse, não poderia haver a menor dúvida de que todos os brasileiros – militares e civis – teriam de ser retirados, imediatamente, como se nunca na vida, tivéssemos ouvido falar na palavra, “Haiti”.

Isto seria muito mais econômico, em dinheiro e em vidas, do que perder tempo, elaborando complexos métodos operacionais de contrainsurgência para "cumprir o dever que Deus determinou ao Brasil, de salvar o pobre povo haitiano".




Loki
Sênior
Sênior
Mensagens: 880
Registrado em: Seg Jan 05, 2009 2:19 pm
Agradeceu: 7 vezes
Agradeceram: 4 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#115 Mensagem por Loki » Sáb Jan 30, 2010 10:09 pm

Obrigado Clermont, muito elucidativo!

Sobre o periodo Holandês, só complementaria que a política de ocupação notadamente a de Nassau, na medida que desenvolveu meu querido Pernambuco, com suas construções de infraestrutura, planejamento urbano e grande incentivo cultural em praticamente todas as disciplinas da época, proporcionou um amargo prejuizo aos investidores holandeses da companhia.

Comparei com o Haiti pela possibilidade do reaparecimento da milicia armada (ex-forças armadas haitianas) dada a fragilidade das instituições no momento, que acho uma situação grave e mais preocupante que os bandidos armados.

abraço




Avatar do usuário
Clermont
Sênior
Sênior
Mensagens: 8842
Registrado em: Sáb Abr 26, 2003 11:16 pm
Agradeceu: 632 vezes
Agradeceram: 644 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#116 Mensagem por Clermont » Qua Fev 03, 2010 7:52 am

O MITO DA CONTRAINSURGÊNCIA parte III final – Economia da Farsa.

Por Jeff Huber, janeiro de 2010.

Nas partes I e II discuti como as exigências de nossa doutrina de contrainsurgência por um governo confiável da nação hospedeira, uma confiável força de segurança da nação hospedeira e informações confiáveis são impossíveis de serem conseguidas em nossas presentes guerras. A terceira e última parte da série enfoca a futilidade da contrainsurgência em si mesma como ferramenta da política externa americana.

Nossos esforços de contrainsurgência (COIN) no Iraque e Afeganistão estão condenados por incompetentes governos e forças de segurança das nações hospedeiras, e uma incapacidade de produzir informações confiáveis sobre culturas sobre as quais temos pouca ou nenhuma compreensão. De maior preocupação, entretanto, é que nosso esforço COIN tem pouco ou nada a ver com nosso objetivo de segurança nacional de proteger a pátria do terrorismo.

Um caso de arrepiar.

“Missão arrepiante” é a expansão incremental de um projeto ou missão além de seus objetivos originais até que a missão termine em falha catastrófica.

A desculpas esfarrapadas que recebemos da administração Bush/Cheney pela invasão do Iraque eram a ameaça do programa de armas de destruição em massa de Saddam Hussein (ele não tinha nenhum) e a não tão sutil implicação de que ele estava envolvido nos ataques do 11 de Setembro. (Ele não estava. Entre os americanos, que ainda engolem esta isca, com anzol e tudo para o complô do 11 de Setembro, está a comentarista da Fox News e ex-candidata a vice-presidente Sarah Palin.)

Nós conseguimos, com sucesso, o objetivo militar de chutar Hussein do poder, mas falhamos em nos preparar para as não planejadas conseqüências de um guerra civil de estilo insurgência que ainda prevalece quase sete anos após a derrubada encenada da estátua de Saddam Hussein em Bagdá. Há toda razão para esperar que o Pentágono e/ou o presidente do Iraque Nouri al-Maliki jogue a cartada da desculpa da segurança para manter as tropas americanas no Iraque, além do prazo de dezembro de 2011, prescrito no acordo do estatuto de forças. O general Ray Odierno, “o Boi do Deserto”, comandante no Iraque, foi gravado – graças ao estenógrafo, Thomas E. Ricks – como desejando ver “uma força, provavelmente, entre 30 mil ou 35 mil soltados americanos no Iraque, até 2014 ou 2015.

Bush e o resto das gralhas pró-guerra justificaram nosso prolongado envolvimento no Equívoco da Mesopotâmia ao proclamar que o Iraque era a “frente central na guerra ao terror,” mas ele nunca foi qualquer coisa do tipo. A Al-Qaeda do Iraque (AQI) era uma franquia bastarda da al-Qaeda de Osama bin-Laden que podia compreender uns 850 combatentes de tempo integral, cuja importância na insurgência do Iraque foi, deliberadamente, exagerada pela diretório de propaganda do Pentágono durante a administração Bush. A AQI nunca teria existido se não tivéssemos invadido o Iraque e decapitado um regime que havia conseguido manter o balaio de gatos da sociedade iraquiana sob controle, e se algum dia deixarmos o Iraque, ele não terão nenhum interesse em nos seguir até aqui.

Poderíamos ser tentados a contemplar nossa expedição ao Afeganistão como sendo mais relevante para nossos objetivos de contraterrorismo e segurança nacional, mas seria um erro. O projeto Afeganistão tem sido uma bomba desde seu começo, em outubro de 2001. O objetivo declarado da Operação ENDURING FREEDOM era capturar Osama bin Laden e outros elementos de alto-posto na al-Qaeda, destruindo, inteiramente, esta organização.

Não chegamos perto em momento algum de conseguir este fim. Ao invés, permitimos que bin Laden e seus principais seguidores escapulissem em Tora Bora (uma falta de consideração, suponho) e então, proclamamos ter derrotado o governante Taliban. Nós instalamos um senhor da guerra com laços com o negócio do ópio, Hamid Karzai, no trono afegão, tornando-o, em essência, o “prefeito de Cabul”. Seu governo tem menos que zero influência fora da cidade capital; o respeitado Conselho Internacional sobre Segurança e Desenvolvimento, em Londres, diz que o Taliban tem uma “presença permanente” em 80 % do país.

O general Stanley McChrystal, o companheiro ungido em COIN do “Rei Davi” Petraeus, que é o comandante das forças americanas e da OTAN no Afeganistão, conseguiu manipular o presidente Obama em escalar sua guerra de modo a conduzir uma operação de contrainsurgência “clássica” e “bem-suprida”, como descrita no manual de campanha FM 3-24, que como já discutido é uma doutrina derrotada infestada com falácias internas.

Economia da farsa.

Nossa doutrina de contrainsurgência, especialmente, a forma como a estamos conduzindo, distorce, virtualmente, cada princípio de guerra aceito e fundamento da arte operacional sobre a mesa. Ela, em especial, viola os vitais princípios de objetivo e economia de forças

Nossas duas operações COIN com força total não eliminaram a al-Qaeda como ameaça à pátria americana, como o recente caso do cueca-bomba ilustra plenamente. Nossas guerras ao terror nem mesmo estão ocorrendo nos lugares certos. Saddam Hussein não tinha envolvimento algum com o 11 de Setembro, e o bando de pistoleiros que se chama al-Qaeda no Iraque, principalmente, consiste de iraquianos desgostosos que não tem interesse ou potencial nenhum para prejudicar os americanos que não estejam, atualmente, ocupando o país deles. Os atacantes do 11 de Setembro não eram afegãos. Quinze deles vieram da Arábia Saudita, dois dos Emirados Árabes Unidos, um do Egito e um do Líbano.

Mesmo assim, estamos executando operações de construção de nações em apoio de dois dos mais corruptos regimes no mundo. Neste ritmo, logo estaremos trocando as fraldas de déspotas do Terceiro Mundo durante décadas.

O cueca-bomba foi, supostamente, treinado no Iêmen pela al-Qaeda na Península Arábica, mas ele não era do Iêmen, e sim da Nigéria. Mas, o furioso neocon Joe Lieberman diz que o Iêmen é, agora, “um dos centros da luta” contra o terrorismo e que “se não agirmos preventivamente, o Iêmen se tornará nossa guerra de amanhã”, e seus colegas fazedores de guerras dizem, “Ámen, Irmão Joe.”

Realmente, como Joe está ciente, o Iêmen é a guerra de hoje. Nós já desdobramos “treinadores” (Forças Especiais) e coletores de inteligência (CIA) para o país, e já o bombardeamos com porta-aviões e mísseis de cruzeiro. Joe e seus comparsas falcões, aparentemente, querem um reforço de botas no chão para comparar-se com aqueles que já, tolamente, já realizamos no Iraque e Afeganistão.

Se enviarmos um número significativo de soldados para o Iêmen, iremos ter mais do mesmo. O Iêmen não é, de modo algum, uma nação tão corrupta quanto o Iraque ou Afeganistão; A Transparência Internacional o ranqueia como a 25ª nação mais corrupta de 180 elencadas, opondo-se ao Afeganistão e Iraque, que são, respectivamente, a segunda e a quinta. Mas, o presidente do Iêmen, Ali Abdullah Saleh, tem o mesmo tipo de problemas com insurgência que Hamid Karzai e Nouri al-Maliki têm. Ele tem militantes xiitas e sunitas no norte e rebeldes separatistas no sul.

De novo, vamos ficar atolados na insurgência de alguém mais, pelo benefício de negar santuário a um punhado de islamo-hooligans. Referindo-se a força total da al-Qaeda na Península Arábica, o ministro do exterior iemenita Abu Bakr al-Qirbi diz que há, “talvez”, duzentos ou trezentos deles.

O Conselheiro de Segurança Nacional do presidente Obama, James Jones, admite que há menos de 100 al-Qaedas vagando pelo Afeganistão, e uma autoridade superiora da inteligência, em Cabul, estima que há 300 al-Qaedas nas áreas tribais do Paquistão. Os 850 al-Qaedas “pirateados” no Iraque, não representam uma ameaça terrorista para a América, portanto, eles não contam se estamos, realmente, conduzindo uma guerra ao terror com o propósito de proteger a pátria.

O custo de nossas guerras no Iraque e Afeganistão, atingiu o topo de $ 1 trilhão. Nós ainda mantemos 115 mil soldados no Iraque, que contribuem pouco para a guerra contra o terrorismo, exceto como recrutadores para terroristas.

Stan, The Man, com o plano para o Afeganistão divisa uma eventual escalada de forças que incluirá meio milhão de soldados dos Estados Unidos, da OTAN e afegãos, para o propósito de conduzir uma campanha de contrainsurgência que poderá continuar por décadas, para negar um santuário seguro para menos de 400 terroristas.

Estudiosos e especialistas militares discordam sobre, o quê exatamente, os vários termos utilizados na arte da guerra significam, mas ninguém sugeriria que isto sendo feito no além-mar reflete, economia de força.

Isto é, especialmente verdadeiro quando se considera que uma análise histórica conduzida pela RAND Corporation oferece prova indiscutível de que a ação militar é um meio impotente para conter o terrorismo: soluções políticas e policiais dão conta de 83 % de “vitórias” sobre grupos terroristas. Ação militar tem sido eficaz, somente, em 7 % dos estudos de casos de terrorismo, datando desde 1968.

A única forma que a nossa doutrina de contrainsurgência se relaciona com a economia é como meio para justificar a conduta de infindáveis pequenos conflitos, em apoio da Longa Guerra do Pentágono, como desculpa para manter um grande Exército, em face dos desafios econômicos.

E o valor econômico da Longa Guerra é a desculpa perfeita para matar a reforma da saúde e a reforma da educação e a Segurança Social e o Medicare, e cada outro “programa social” no orçamento federal, exceto, pelos maior programa social de todos: o complexo militar-industrial.


________________________________________________

O comandante [capitão-de-fragata], da Marinha dos Estados Unidos (reformado), Jeff Huber, escreve para o Pen and Sword.




Avatar do usuário
cabeça de martelo
Sênior
Sênior
Mensagens: 39615
Registrado em: Sex Out 21, 2005 10:45 am
Localização: Portugal
Agradeceu: 1146 vezes
Agradeceram: 2870 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#117 Mensagem por cabeça de martelo » Ter Mar 02, 2010 9:52 am

Miguel Silva Machado escreveu:O artigo aqui apresentado decorre da experiência do Comando de um Esquadrão de Reconhecimento no Teatro de Operações do Kosovo, entre Agosto de 2000 a Abril de 2001. Além do interesse histórico que tem, muitos dos ensinamentos obtidos são intemporais e têm aplicação nos dias de hoje.


http://www.operacional.pt/kosovo-as-ope ... o-e-busca/

Imagem




"Lá nos confins da Península Ibérica, existe um povo que não governa nem se deixa governar ”, Caio Júlio César, líder Militar Romano".

O insulto é a arma dos fracos...

https://i.postimg.cc/QdsVdRtD/exwqs.jpg
Avatar do usuário
Ilya Ehrenburg
Sênior
Sênior
Mensagens: 2449
Registrado em: Ter Set 08, 2009 5:47 pm
Agradeceram: 1 vez

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#118 Mensagem por Ilya Ehrenburg » Ter Mar 02, 2010 9:22 pm

A única forma que a nossa doutrina de contrainsurgência se relaciona com a economia é como meio para justificar a conduta de infindáveis pequenos conflitos, em apoio da Longa Guerra do Pentágono, como desculpa para manter um grande Exército, em face dos desafios econômicos.

E o valor econômico da Longa Guerra é a desculpa perfeita para matar a reforma da saúde e a reforma da educação e a Segurança Social e o Medicare, e cada outro “programa social” no orçamento federal, exceto, pelos maior programa social de todos: o complexo militar-industrial.

________________________________________________

O comandante [capitão-de-fragata], da Marinha dos Estados Unidos (reformado), Jeff Huber, escreve para o Pen and Sword.
A citação acima, foi originalmente postada pelo colega Clermont.


Então, que se parem as máquinas.
Que se largue tudo!
Mostra o texto, inequívoco, redigido por um Capitão de Fragata, que a direita imperialista é podre, solerte, falsa, vampiresca, covarde, insidiosa, pérfida e demoníaca.
Cães! São todos eles cães sarnentos!

Direitistas deste fórum: calem-se!
Porta-vozes do caos e da mentira.
Vivia à esquerda, viva o socialismo. Morte ao império!




Não se tem razão quando se diz que o tempo cura tudo: de repente, as velhas dores tornam-se lancinantes e só morrem com o homem.
Ilya Ehrenburg


Uma pena incansável e combatente, contra as hordas imperialistas, sanguinárias e assassinas!
Avatar do usuário
Moccelin
Sênior
Sênior
Mensagens: 4849
Registrado em: Qua Abr 11, 2007 11:53 am
Localização: Três Corações - MG
Agradeceram: 2 vezes

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#119 Mensagem por Moccelin » Ter Mar 02, 2010 11:48 pm

Afff...




The cake is a lie...
Don Pascual
Sênior
Sênior
Mensagens: 814
Registrado em: Qui Mar 10, 2005 1:19 am
Localização: Paranavaí-PR

Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#120 Mensagem por Don Pascual » Qua Mar 03, 2010 12:46 am

Afff..[x2]




Responder