Fogo posto por "mão criminosa"? Queimadas e fogueiras? Reacendimentos de incêndios? Uso de maquinaria? Queda de raios? O Polígrafo analisou os dados oficiais dos últimos 10 anos em busca de uma resposta conclusiva.
A associação entre incêndios florestais e a denominada “mão criminosa” é bastante comum. Esta é apontada, muitas vezes, como a principal causa da destruição de milhares de hectares de área florestal em Portugal. Na maior parte dos casos, esta acusação surge nas redes sociais associada a notícias de incêndios de grandes dimensões ou a publicações em que se critica a suposta brandura das molduras penais aplicadas a incendiários.
Não é portanto de estranhar que o “fogo posto” seja considerado por muitos como a principal causa dos incêndios rurais ou florestais em Portugal. Mas será mesmo assim?
Segundo o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), “é possível agregar o universo das causas investigadas em cinco grandes grupos em função do tipo de causa, consoante seja: negligente, desconhecida, intencional, natural ou resultado de um reacendimento”.
Desde 2001 que o ICNF disponibiliza, sob a forma de relatórios anuais, informação relativa a áreas ardidas e a ocorrências registadas e investigadas. Estes documentos visam a análise de dados como a localização, o tipo de vegetação das áreas queimadas e a percentagem de incêndios por tipo de causa apurada.
Entre 2009 e 2018, a média de incêndios investigados cuja causa corresponde ao uso indevido de fogo foi de 41%. Esta percentagem corresponde aos fogos provocados por queimadas, destacando-se as queimadas extensivas de sobrantes florestais ou agrícolas que representam, por si só, 16% do número médio de incêndios no referido período temporal. Seguem-se as queimadas extensivas para a gestão de pasto que registaram uma média de 12% enquanto causa de fogos rurais. Mais residual, dentro do uso indevido de fogo, é a percentagem média de queimas de lixo (2%), realização de fogueiras (6%) e queimas de amontoados de sobrantes florestais ou agrícolas (5%) que deram origem a ocorrências.Entre 2009 e 2018, a média de incêndios investigados cuja causa corresponde ao uso indevido de fogo foi de 41%. Esta percentagem corresponde aos fogos provocados por queimadas, destacando-se as queimadas extensivas de sobrantes florestais ou agrícolas que representam, por si só, 16% do número médio de incêndios no referido período temporal.
Ou seja, os dados do ICNF relativos às principais causas de incêndio, nos últimos 10 anos, revelam que, quando se conseguiu apurar o motivo da ignição, a negligência (através do uso indevido do fogo) foi a principal causa dos incêndios rurais.
Por sua vez, a “mão criminosa” é, em termos médios, a segunda maior causa dos incêndios florestais, no mesmo período, em Portugal. O incendiarismo “enquadra motivações como o vandalismo, a provocação dos meios de combate aos incêndios, as manobras de diversão ou os conflitos com vizinhos e vinganças”, segundo informa o ICNF.
Em média, nos últimos 10 anos, o “fogo posto” foi a causa de 27% dos incêndios cuja origem foi possível apurar através da investigação da Guarda Nacional Republicana – Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (GNR/SEPNA). Para estes números desconsideram-se os indivíduos inimputáveis que, por terem perturbações de ordem mental e psicológica, sentem-se compelidos a praticar o crime de incêndio florestal.
Além das duas causas já mencionadas, os reacendimentos provocam um número significativo de ocorrências registadas pelo ICNF. Nos anos de 2010 e 2011 esta foi a segunda causa mais comum dos incêndios registados e investigados. Na média dos últimos 10 anos, os reacendimentos são a terceira causa de incêndio mais frequente em Portugal.
Os acidentes com maquinaria e transportes e a ignição natural por queda de raios são eventos menos comuns que motivaram, no seu conjunto, 6% do número médio de fogos florestais entre 2009 e 2018.
No último relatório provisório do ICNF de 2019 indica-se que das 5.627 investigações conclusivas, 34% dizem respeito ao uso indevido de fogo, 29% ao incendiarismo e 10% a reacendimentos. Em 2020, o 4º Relatório Provisório de Incêndios Rurais regista, no período compreendido entre 1 de janeiro e 15 de agosto, um total de 3.728 incêndios rurais investigados. Segundo o mesmo relatório, as causas mais frequentes de incêndio em 2020 são “o incendiarismo – imputáveis (32%), queimadas de sobrantes florestais ou agrícolas (16%), queimas de amontoados de sobrantes florestais ou agrícolas (8%) e queimadas para gestão de pasto para gado (7%). Conjuntamente, as várias tipologias de queimadas e queimas representam 31% das causas apuradas”.
Mediante a análise da base de dados nacional de incêndios rurais, concluimos que a principal causa dos fogos florestais, nos últimos 10 anos, consiste na negligência e uso indevido de fogo, com destaque para a realização de queimas e queimadas. Em resposta a tal facto, a Lei n.º 76/2017 de 17 de agosto, que altera o Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios (SDFCI), veio reforçar sanções existentes e aumentar o valor das coimas imputáveis a pessoas singulares e coletivas que realizem queimadas não autorizadas.Os dados do ICNF relativos às principais causas de incêndio, nos últimos 10 anos, revelam que, quando se conseguiu apurar o motivo da ignição, a negligência (através do uso indevido do fogo) foi a principal causa dos incêndios rurais.
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