Michael Haag - The Templars: History and Myth.
As novas da formação da Grande Loja maçônica de Londres (1717) e das atividades dos franco-maçons britânicos logo se difundiram pela Europa. Por volta de 1730, lojas maçônicas tinham sido fundadas nos Paises-Baixos, França, Alemanha e alhures, freqüentemente, por representantes da Grande Loja de Londres que viajavam ao exterior com este propósito, mas algumas vezes por residentes locais que eram inspirados pela Grande Loja mas não estavam sob sua direção. Porém, se a Franco-Maçonaria se provou popular na Europa, ela era também, alienígena e perturbadora para alguns. Ela não surgiu das velhas organizações de artesãos da França, Alemanha e outros no continente, que de há muito tinham cessado de existir. Ao invés, ela era importada da Grã-Bretanha, lar da Revolução Gloriosa de 1688 que havia definitivamente reduzido os poderes do rei e dividido a autoridade entre a monarquia, parlamento e o judiciário, e que havia instituído um grau de tolerância religiosa. A Grã-Bretanha era amplamente admirada pelo povo da Europa como uma nação tolerante e progressistas, mas suas instituições e invenções, não menos a Franco-Maçonaria, eram profundamente desconfiadas pelos governantes autocráticos europeus e pela Igreja Católica.
Embora os franco-maçons na Grã-Bretanha fossem uma organização fraternal inócua, em grande parte de classe média, cujas lojas cumpriam uma função social similiar a da cafetaria de Londres, elas adquiriram um culto de secretismo e vincularam isto ao misterioso conhecimento associado com o Templo de Salomão. Anteriormente, Agrippa tinha vinculado os Templários a feitiçaria e aos poderes do oculto. O que faltava eram estes elementos serem costurados juntos num poderoso mito ocultista, e foi isto o que aconteceu quanto os franco-maçons foram diretamente vinculados aos Templários - o que ocorreu não na Grã-Bretanha, mas na Europa continental.
O primeiro passo foi tomado em 1736 ou 1737 por um escocês chamado Andrew Michael Ramsey, um exilado jacobita vivendo na França que, sendo chanceler da Grande Loja francesa, introduziu um fictício fundo cruzado aos Franco-Maçons e noções de classe aristocráticas. A Franco-Maçonaria britânica era de natureza democrática; seus membros incluíam artesãos e aristocratas, profissionais, homens instruídos e comerciantes de classe média, todos contentes em darem-se as mãos uns aos outros. Mas dar a mão, nem pertencer a uma instituição que havia surgido de origens proletárias apelava a classe alta da sociedade francesa. As alta e pequena nobrezas da França queriam reconhecimento das distinções sociais, e as queriam reforçadas por estilo, nostalgia e romance. Ramsey deu isso a elas aos borbotões, sugerindo que os pedreiros livres também haviam sido cavaleiros guerreiros na Terra Santa, e longo ele converteu os franco-maçons franceses numa antiga e cavalheiresca sociedade secreta internacional. "Nossos ancestrais, os cruzados, que chegaram de todas as partes da cristandade para a Terra Santa, queriam agrupar pessoas de cada nação numa singular confraria espiritual", anunciou Ramsay em sua Oração para a Loja de São João, em Paris, datada variadamente 27 de dezembro de 1736 ou 21 de março de 1737.
Na versão do passado de Ramsay, os cruzados tinham tentado restaurar o Templo de Salomão num ambiente hostil e tinham divisado um sistema de sinais e rituais secretos para protegerem contra seu inimigo muçulmano, que, de outro modo, infiltraria suas posições e cortaria suas gargantas. Ramsay também disse que, após o colapso de Outremer, os cruzados retornaram a suas terras natais na Europa e estabeleceram lojas maçônicas lá. Mas estas e seus ritos foram negligenciados com o passar do tempo e foi somente entre os escoceses que os Franco-Maçons preservaram seu antigo esplendor:
"Desde a época em que a Grã-Bretanha tornou-se a base de nossa Ordem, a conservadora de nossas leis e a depositária de nossos segredos... Das Ilhas Britânicas, a Real Arte é, agora, repassada para a França... Neste feliz era, quando o amor da paz tornou-se a virtude dos heróis, esta nação, uma das mais espirituais na Europa, tornar-se-á o centro da Ordem. Ela vestirá nossa obra, nossos estatutos, nossos costumes com graça, delicadeza e bom gosto, qualidades essenciais da Ordem, da qual a base é sabedoria, força e beleza de gênio. Será, futuramente, em nossa Lojas, como foi nas escolas públicas, que os franceseses aprenderão, sem viajarem, as características de todas as nações e que os estrangeiros experimentarão que a França é o lar de todas as nações."
Nessa época, Ramsay nada disse sobre Templários, talvez porque ele poderia ter ofendido a ainda poderosa monarquia francesa e a Igreja. Em 1749, no entanto, seis anos após sua morte, a monumental obra de Ramsay, "Os Princípios Filosóficos da Religião Natural e Revelada", foi publicada em Glasgow, e nela Ramsay dizia, "todo maçom é um cavaleiro templário", uma observação que não seria esquecida.
O vínculo cruzado foi posteriormente desenvolvido na Alemanha, por volta de 1760, quando um francês, que se fazia passar por um nobre escocês, e se dizia chamar George Frederick Johnson, afirmou ter acesso direto aos segredos templários. Isso também servia aos gostos locais, já que a Alemanha era uma sociedade antiquada, dominada por noções de hierarquia que resistiam às idéias racionalistas e igualitárias inerentes à Franco-Maçonaria britânica. Uma conexão espúria com os Templários proveu os franco-maçons alemães de uma atmosfera gótica e um forte gosto do oculto.
De acordo com a mistura histórica de Johnson, os mestres templários tinham gasto seu tempo no Oriente aprendendo os segredos e adquirindo os tesouros dos judeus essênios, posteriormente famosos pelos Manuscritos do Mar Morto, e as pessoas com as quais João, O Batista, provavelmente tivera alguma associação. Este aprendizado e este tesouro foram repassados de um mestre para outro, e assim acabaram de posse de Jacques de Molay - que, de acordo com a estória, também ostentava o home de Hirão. Na noite anterior a sua execução, Jacques de Molay teria dito a um grupo de templários que, de algum modo, ainda estavam à solta, para entrarem na cripta do Templo de Paris e fugirem com o tesouro, que consistiria do candelabro de sete braços roubado do Templo pelo imperador romano, Tito, a coroa do Reino de Jerusalém e um sudário. Estes foram levados para o porto atlântico de La Rochelle, de onde dezoito galeras templárias escaparam para a Ilha de Mull, onde todos passaram a se chamar franco-maçons. Os franco-maçons escoceses, dizia Johnson, o falso escocês, eram herdeiros diretos dos Templários.
Então, veio a Revolução Francesa em 1789, que chocou o público europeu até o âmago. Num esforço para compreende estes eventos dramáticos, muitos aceitaram a ficção de que organizações secretas estiveram manipulando os acontecimentos públicos.
A vingança de Jacques de Molay.
Jacques de Molay foi queimado até a morte em Paris, na noite de 18 de março de 1314. O único relato de uma testemunha ocular da queima de Molay, escrito por um monge anônimo, diz que ele foi para a morte "com tranqüilidade de mente e de vontade". Não há nenhuma referência contemporânea a ele pronunciar alguma maldição, porém desde então se diz que, enquanto as chamas engolfavam o último Mestre dos Templários, ele gritou por vingança e chamou o rei e o papa para comparecem ao lado dele diante do tribunal de Deus, dentro de um ano e um dia. Menos de cinco semanas depois, em 20 de abril, o papa Clemente V morreu de longa e dolorosa doença que o havia afligido por todo seu pontificado. E ainda neste mesmo ano, o rei Filipe IV morreu, em 29 de novembro, depois de cair do cavalo enquanto caçava.
A suposta sobrevivência secreta dos Templários através dos séculos abriu caminho para agentes da Ordem tirarem sua vingança pela queima de Jacques de Molay. Com um sentido de profecia, devendo tudo a uma visão retrospectiva, Jacques de Molay era agora lembrado por ter lançado sua maldição sobre as cabeças do rei e do papa. A queda da casa real francesa dos Capetos, e a humilhação da Igreja Católica na França, viriam com a Revolução Francesa - trazida por uma conspiração secreta controlada pelos Templários trabalhando por intermédio dos Franco-Maçons. De qualquer forma, esta era crença de alguns elementos conservadores extremistas na França, entre eles Charles de Gassicour, o autor de "Le Tombeau de Jacques de Molay", publicado em 1796. Descrevendo a morte na guilhotina de Luís XVI, Gassicour apresenta alguém se levantando e gritando, "Jacques de Molay, você está vingado!" - um odioso franco-maçom ou um templário, cuja organização subversiva havia derrubado a ordem estabelecida. Gassicour também afirmava que Jacques de Molay tinha fundado quatro lojas, uma em Edinburgh; que os Templários/Franco-Maçons eram vinculados a Ordem dos Assassinos e o Velho da Montanha; que eles apoiaram Oliver Cromwell; e que eles tinham assaltado a Bastilha.
Outros acrescentaram suas vozes a estória. Por exemplo, em 1797, o abade Augustin Barruel publicou "Memórias", seu relato da Revolução Francesa, que ele explicava afirmando que a Franco-Maçonaria tinha derivado dos Templários após a supressão destes, quando:
"(...) um certo número de cavaleiros culpados, tendo escapado da proscrição, uniram-se para a preservação de seus horrendos mistérios. Ao seu ímpio código, eles acrescentaram o voto e vingança contra os reis e sacerdotes que destruíram sua Ordem, e contra toda a religião que anatematizou seus dogmas. Eles fizeram adeptos que transmitiram, de geração para geração, o mesmo ódio ao Deus dos cristãos, e aos reis, e aos sacerdotes."
Dirigindo-se diretamente aos franco-maçons, ele continuava:
"Estes mistérios desceram sobre vocês, e vocês continuam a perpetuar sua impiedade, seus votos e seus juramentos. Tal é a sua origem. O lapso de tempo e a mudança dos modos variaram uma parte de seus símbolos e seus assustadores sistemas; mas a essência deles permanece, os votos, os juramentos, o ódio e as conspirações são as mesmas."
Uns poucos anos depois, Barruel acrescentou os judeus à conspiração, vendo-os como o poder real por detrás dos Templários e dos Franco-Maçons e os manipuladores últimos dos eventos europeus - uma teoria da conspiração que culminou nas câmaras de gás do Terceiro Reich.
Barruel estava exilado da França revolucionária e publicou suas "Memórias" em Londres, onde ele foi político o bastante para agradecer ao governo britânico por conceder-lhe asilo e escreveu que suas afirmações de perigosas atividades franco-maçônicas não se aplicavam aos respeitáveis franco-maçons da Grã-Bretanha. O governo britânico concordava. Preocupado com o vírus da revolução da França, em 1799, ele aprovou o Ato das Sociedades Ilegais, embora este especificamente excluísse os Franco-Maçons.
(continua...)