Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

Assuntos em discussão: Exército Brasileiro e exércitos estrangeiros, armamentos, equipamentos de exércitos em geral.

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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#181 Mensagem por Lirolfuti » Qua Jul 03, 2013 1:57 pm

A simulação de combate no adestramento do Exército Brasileiro


Alessandro Fagundes de Souza
Capitão de Cavalaria


1. Considerações Iniciais

A falta de investimentos e de qualidade na instrução, treinamento e adestramento, tanto no nível individual como coletivo, sabidamente geram resultados desastrosos: militares mal preparados; tropa mal treinada, desmotivada e, frequentemente, desviada da atividade-fim para outras tarefas secundárias.

Sabe-se, que a capacitação técnica e tática exigida de cada indivíduo envolvido no contexto das ações no campo de batalha moderno é uma característica cada vez mais marcante no cenário mundial. O emprego de meios com alto grau de avanço tecnológico demanda, mais do que nunca, uma preparação específica para o desempenho de qualquer função crítica em combate.

Neste contexto, a capacitação em sistemas complexos e custosos tem na simulação de combate um importante aliado. Os benefícios do emprego dos simuladores têm sido extraordinários. São unânimes as opiniões de que os simuladores têm alavancado as capacidades dos recursos humanos aplicarem o poder de combate, especialmente da tropa blindada.

A qualidade do preparo de uma tropa é diretamente proporcional à qualidade dos meios empregados. Cada centavo investido em simulação tem retorno garantido: permite treinar o operador tanto em situações normais como em situações extremas, que somente poderiam ser vividas em operações reais, com extremo risco aos operadores e ao equipamento, e com elevados custos operacionais.

São óbvios os benefícios trazidos pela simulação de combate: melhor qualidade de instrução, treinamento e adestramento; economia de recursos de diversas fontes; otimização do tempo disponível; desenvolvimento e adequação da doutrina militar; redução dos riscos inerentes à atividade militar; maior controle metodológico e didático sobre o exercício, dentre outros.

Com base no exposto, uma conclusão parcial salta aos olhos: possuir Centros de Instrução e Adestramento, com modernos meios de simulação, pode proporcionar um salto de qualidade no preparo das Forças Armadas Brasileiras.


2. Simulação de combate: cenário atual

Conforme estabelece a Portaria Nr 209 – EME, de 21 de dezembro de 2005, a simulação de combate, no âmbito do Exército Brasileiro, é organizada e pode ser conduzida por meio de três modalidades distintas:

a. Simulação Viva: modalidade na qual são envolvidas pessoas reais, operando sistemas reais, no mundo real, com o apoio de sensores, dispositivos apontadores “laser” e outros instrumentos que permitem acompanhar o elemento e simular os efeitos dos engajamentos.

Os Dispositivos de Simulação de Engajamento Tático (DSET) simulam, por meio de feixes laser, a trajetória balística da munição e o acerto do impacto, permitindo o engajamento de alvos estacionários ou em movimento, assim como o duelo entre blindados. Os DSET são os equipamentos mais proeminentes desta categoria. Este tipo de simulação é a que está mais próxima da realidade, dado que um mínimo de recursos reais é simulado.

Atualmente o CIBld possui 42 (quarenta e dois) equipamentos DSET BT/41 da empresa Sueca SAAB, sendo que 22 (vinte e dois) estão distribuídos às Seções de Instrução de Blindados (SIB) dos RCC, sendo 4 (quatro) no 1º RCC; 4 (quatro) no 4º RCC; 7 (sete) no 3º RCC; e 7 (sete) no 5º RCC.

b. Simulação Virtual: modalidade na qual são envolvidas pessoas reais, operando sistemas simulados, ou gerados em computador. Essa modalidade substitui sistemas de armas, veículos, aeronaves e outros equipamentos cuja operação exija elevado grau de adestramento, ou que envolva riscos e/ou custos elevados para operar. Dentro desse ramos de simulação, é possível classificar os simuladores dentro dos seguintes tipos:

1) Simuladores de Procedimentos: são equipamentos que reproduzem os MEM reais – ou as partes mais importantes destes materiais – com o objetivo de treinar o indivíduo ou a guarnição, para utilização normal ou degradada do equipamento real. Os simuladores de procedimento visam, principalmente, possibilitar a interação do homem com a máquina, devendo ser utilizado intensamente nas fases iniciais de treinamento. O Exército Brasileiro conta com dois tipos de simuladores de procedimentos:

a) Simulador de Procedimento de Torre (SPT): equipamento que treina a guarnição da VBC à exceção do motorista. O CIBld possui 3 (três) SPT, sendo um destinado ao treinamento de mecânicos. Os demais SPT são distribuídos da seguinte forma: 1 (um) para cada RCC e 1 (um) na AMAN.

b) Simulador de Procedimento de Motorista (SPM): equipamento destinado ao treinamento do motorista. O CIBld, todos os RCC, e todos os RCB à exceção do 20º RCB – dotado de M60 – possuem 1(um) equipamento cada.

2) Treinadores Sintéticos: são simuladores que integram um cenário virtual à periféricos de computadores similares às partes mais importantes do equipamento real. É amplamente utilizado no treinamento tático de guarnições e pelotões. O Exército Brasileiro conta com dois tipos de treinadores sintéticos:

a) Treinador Sintético Portátil (TSP): permite simular uma guarnição de carro de combate, e treinar os operadores em cada uma de suas funções de forma integrada, com exceção do municiador. Foi adquirido um conjunto para cada RCC, além de mais 3 (três) conjuntos para o Centro de Instrução de Blindados CIBld.

b) Treinador Sintético de Blindados (TSB): permite simular em ambiente confinado o comandante do carro e o atirador e, no seu exterior, o motorista. Podem ser integradas aos TSP, aumentando assim o valor da tropa a ser treinada. Somente o CIBld possui o referido equipamento, que se encontra na Seção de Simuladores do referido EE.

3) Simulador de Aprendizagem: são programas de simulação virtual que, instalados em computadores, possibilitam o desenvolvimento da área cognitiva – conhecimento – dos instruendos, sem a necessidade de periféricos especiais ou similares ao equipamento real. O objetivo principal deste sistema de simulação, como o próprio nome diz, é fazer com que os militares aprendam atitudes que devem ser realizadas no campo de batalha e as reações que deverão ser tomadas em contato com o inimigo.

Devido às suas características, este tipo de simulação é utilizada no treinamento e adestramento tático de frações das mais diversas naturezas, especialmente no nível pelotão e subunidade.

O Centro de Instrução de Blindados possui uma sala com 37 (trinta e sete) computadores em rede que, por meio do programa “Steel Beasts” da empresa e-sim games, viabiliza a simulação tática de aprendizagem de até uma SU, de mesma natureza, ou constituída sob a forma de Força Tarefa.

c. Simulação Construtiva: simulação envolvendo tropas e elementos simulados, operando sistemas simulados, controlados por pessoas reais, normalmente numa situação de comandos constituídos. Também conhecida pela designação de “jogos-de-guerra”. A ênfase dessa modalidade é a interação entre pessoas, divididas em forças oponentes que se enfrentam sob o controle de uma direção de exercício.

No âmbito da 3ª Divisão de Exército, sediada em Santa Maria - RS, encontramos no Centro de Aplicação de Exercícios de Simulação de Combate (CAESC), o elemento responsável pela condução e treinamento dos elementos envolvidos, com base na utilização dos programas Sistema de Adestramento de Batalhões e Regimentos (SABRE) e Sistema de Adestramento de Brigadas (SISTAB).


3. Emprego da Simulação no adestramento do EB

Ao longo dos últimos anos, o CIBld vem se consolidando como um centro de excelência no emprego da simulação de combate em atividades de instrução, treinamento e adestramento das tropas blindadas e mecanizadas do Exército Brasileiro.

A qualidade e o desenvolvimento de uma metodologia específica para o emprego dos simuladores em atividade de instrução se deve, não só à ampla gama de equipamentos disponíveis neste Centro, mas sim, e principalmente, pela larga experiência adquirida pelo seu corpo discente e pelo montante de lições aprendidas na prática dos exercícios de simulação.

De uma maneira geral, o emprego dos meios de simulação do CIBld atendem a dois grandes grupos de clientes: o próprio CIBld, no desenvolvimento de suas atividades de ensino; e os demais EE e OM operacionais, por meio da condução de exercícios táticos em ambiente virtual, PCI, entre outras atividades.

a. No âmbito do CIBld as atividades de simulação desenvolvidas são inseridas no contexto didático dos cursos e estágios que são conduzidos por este estabelecimento de ensino. Nos anos de 2012 e 2013 as atividades mais relevantes que contaram com os meios de simulação na atividade de instrução foram:

1) Estágio Tático Sobre Lagarta: voltado para a formação tática dos comandantes de FT SU Bld, Cmt Pel CC e Pel Fuz Bld, desenvolve-se ao longo de 6 (seis) semanas, e utiliza os seguintes meios de simulação em apoio à instrução: Simulador Virtual de Aprendizagem “Steel Beasts”, TSB e DSET.

2) Estágio Tático de Pelotão de Exploradores: voltado para a formação tática dos comandantes de Pel Exp, desenvolve-se ao longo de 3 (três) semanas, com aplicação e execução de planejamentos táticos no Simulador Virtual de Aprendizagem “Steel Beasts”.

3) Estágio Tático de Cavalaria Mecanizada: voltado para a formação tática dos comandantes de Esqd e Pel C Mec, desenvolve-se ao longo de 3 (três) semanas, com larga aplicação e execução de diversos planejamentos táticos no Simulador Virtual de Aprendizagem “Steel Beasts”, incluindo duas inovações, que foi a constituição de uma Força Oponente (FOROP) viva, mobiliada com instrutores deste Centro; e a realização de um Exercício em Ambiente Virtual de Longa Duração, com 48 (quarenta e oito) horas de execução contínua.

4) Curso de Operação da VBC CC Leopard 1A5: voltado para a formação dos operadores da referida Vtr, bem como da sua guarnição, dura 9 (nove) semanas e emprega largamente os Simuladores de Procedimento de Torre e de Motorista, os Treinadores Sintéticos Portátil e de Blindados e os DSET para a consecução dos objetivos didáticos do curso.

5) Curso Avançado de Tiro: voltado para a formação Instrutor Avançado de Tiro, militar especialista no sistema de armas da VBC CC Leopard 1A5, dura 6 (seis) semanas e emprega largamente os diversos simuladores disponíveis no CIBld, em especial os Treinadores Sintéticos de Blindados e os DSET.

6) Curso de manutenção de torre e de chassi da VBC CC Leopard 1A5: voltado para a formação do mecânico de chassi e de torre da VBC CC Leopard 1A5, utiliza o Simulador de Procedimento de Torre – versão de manutenção, na condução das instruções do curso.

b. Para os demais EE e OM operacionais, as atividades de simulação procuram atender diversas demandas por iniciativa dos próprios interessados ou por meio de coordenação dos Comandos Militares de Áreas ou dos Órgãos de Direção Setorial, especialmente o COTer. Nestes casos, são 4 (quatro) as atividades mais relevantes conduzidas com meios de simulação do CIBld:

1) Exercício Tático em Ambiente Virtual – Adestramento das FT SU Bld: conduzido em caráter experimental em 2012, no âmbito da 6ª Bda Inf Bld, e em caráter oficial em 2013, conforme previsto no PIM/COTer do corrente ano, o Exercício Tático em Ambiente Virtual utiliza como base o Simulador Virtual de Aprendizagem “Steel Beasts”, e visa proporcionar às OM Blindadas do Exército Brasileiro, a oportunidade de conduzir o adestramento de uma FT valor SU, composta por Pel CC, Pel Fuz Bld, Pel Eng, OA e Seç Cmdo. Todo o planejamento tático é conduzido pelos militares da própria OM, assim como a avaliação e identificação de oportunidades de melhoria, contando com o apoio da equipe de instrução da Seção de Simulação do CIBld.

2) Certificação dos Pelotões CC: atividade prevista pelo PIM/COTer 2013, foi conduzida no corrente ano em caráter inicial com o 1º e o 4º RCC. Com duração de uma semana para cada Pelotão a ser certificado, os militares integrantes do Pelotão são submetidos à uma série rigorosa de Exercícios Táticos conduzidos nos Treinadores Sintéticos de Blindados e nas próprias VBC, com apoio dos DSET. Com um alto grau de exigência, e conduzido por Instrutores Avançados de Tiro deste Centro, a atividade de Certificação caracteriza o pleno preparo e aptidão daquela fração às mais diversas atividades de emprego operacional, inclusive o combate.

3) PCI com outros Estabelecimentos de Ensino: conduzidos conforme a solicitação de cada EE, normalmente se caracterizam pelo emprego do Simulador Virtual de Aprendizagem “Steel Beasts” com a condução de operações militares em ambiente virtual.

4) PCI com OM operacionais: conduzidos conforme a solicitação de cada OM, normalmente se materializam na utilização do Simulador Virtual de Aprendizagem “Steel Beasts” quando no nível SU, e dos TSP e TSP no nível Pel CC.

Depois de uma análise, ainda que superficial, fica fácil visualizar a importância do emprego dos meios de simulação. O resultado direto da simulação aplicada à instrução é a excelência em formação e especialização de instrutores e monitores dos corpos de tropa, por meio dos cursos e estágios do CIBld, assim como o elevado grau de adestramento alcançado no desenvolvimento de Exercícios Táticos em Ambiente Virtual e nas Certificações dos Pelotões CC. O alto padrão operacional atingido individual ou coletivamente reflete de forma clara essa afirmação.

4. Simulação: o futuro a curto prazo

O processo de aprendizagem e de acúmulo de experiências quanto ao emprego da simulação ainda está longe do fim, mas já serve como base para o desenvolvimento de novas metodologias e até mesmo para o desenvolvimento de equipamentos de simulação nacionais.

O crescente intercâmbio de conhecimentos e experiências com Exércitos de Nações Amigas, por meio de congressos, reuniões, demonstrações e visitas, bem como da interação com outros órgãos e empresas ligadas à área, em feiras nacionais e internacionais também proporcionam uma aquisição de conhecimento relevante para o nosso Exército.

Novas iniciativas já em andamento dão mostra dessa maturidade, não só por parte do CIBld, mas também por outros órgãos, como o CTEx e a Div Sml / COTer, entre outros. Na esteira desse desenvolvimento e na busca pela ampliação do emprego de simuladores no âmbito do Exército Brasileiro, é por oportuno destacar alguns projetos:

a. Projeto Integração de Simuladores da Força Terrestre: projeto desenvolvido pela Divisão de Simulação do COTer, em parceria com CIAvEx, CIBld e CTEx, visa desenvolver estudos que viabilizem a integração de simuladores dotados de diferentes sistemas operacionais, buscando a interoperabilidade entre os equipamentos e sistemas já existentes e entre os que porventura venham a ser adquiridos, assim como garantir a interação de diferentes funções de combate num mesmo cenário virtual.

b. Projeto TSB nacional: liderado pelo CIBld, em parceria com a Fundação Trompowski, e executado pela empresa nacional RSD, de São José dos Campos, o TSB nacional tem por base o sistema de simulação VBS2, e visa reduzir custos de aquisição e manutenção desse tipo de equipamento, bem como desenvolver a indústria nacional de defesa.

c. Simulador de Apoio de Fogo (SAFO): a ser desenvolvido pela empresa espanhola TECNOBIT, será construído na área da sede do CISM em Santa Maria, e visa o treinamento do sistema operacional apoio de fogo, tendo como requisito contratual a compatibilidade e integração com os demais sistemas de simulação em uso no Exército Brasileiro.

d. Centro de Avaliação e Adestramento (CAA): com um núcleo inicial constituído para o estudo e desenvolvimento de um CAA, terá por base a sede do CISM, e terá como objetivo viabilizar o adestramento e a avaliação nível SU e OM, com emprego de diversos meios de simulação, em especial no ramo da simulação viva.

e. Projeto SIGUA: liderado pelo CIBld em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), visa desenvolver um sistema de simulação com base no novo blindado sobre rodas adotado pelo Exército Brasileiro, o GUARANI, a partir de tecnologia 100% nacional, viabilizando o treinamento operacional e tático das futuras tropas mecanizadas da Força Terrestre.

f. Projeto modernização BT/41: também em parceria com a UFSM, visa modernizar os DSET BT/41, substituindo a aquisição dos resultados por meio de impressora, por um sistema moderno, georreferenciado, capaz de mostrar em tempo real os resultados obtidos pelas VBC em uma central de controle. Essa modernização representaria um salto tecnológico de 20 (vinte) anos, e uma redução de custos significativa, em comparação com equipamentos similares no mercado mundial.

5. Conclusão

É notório que o investimento em instrução e treinamento militar baseado em simulação gera resultados efetivos à curto, médio e longo prazo. Um exemplo notório dessa assertiva foi o salto de qualidade na preparação dos recursos humanos da tropa blindada, em especial dos RCC, com o advento do Projeto Leopard, que viabilizou a aquisição de equipamentos de simulação de ponta, colocando o Exército Brasileiro em um grupo muito seleto de nações: as que são capazes de operar e manter um blindado moderno.

Cabe agora prosseguir nesse caminho, difundindo e amplificando o uso de simuladores, adquirindo meios e sistemas de simulação e viabilizando a execução de Exercícios Táticos em ambiente virtual e atividades de Certificação de Pelotões, como já vem sendo feito, entretanto buscando-se uma abrangência cada vez maior, de modo a gerar os necessários efeitos multiplicadores nas unidades operacionais.

ALESSANDRO FAGUNDES DE SOUZA - O autor é Capitão de Cavalaria do Exército Brasileiro, da turma de 2000 da AMAN, servindo atualmente no Centro de Instrução de Blindados, desempenhando a função de Chefe da Seção de Simulação do CIBld.
http://www.defesanet.com.br/leo/noticia ... rasileiro/




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#182 Mensagem por arcanjo » Qui Jul 11, 2013 1:52 pm

11 de Julho, 2013 - 10:25 ( Brasília )

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A abrangente concepção de emprego da Força Terrestre

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Tenente-Coronel Moises da Paixão Junior

O Estado-Maior do Exército (EME) apresentou, no início do ano de 2013, o novo conceito operacional para o emprego da Força Terrestre Brasileira: Operações no Amplo Espectro. Tal iniciativa não só busca acompanhar a evolução dos conflitos no século XXI, mas também propõe adaptações importantes em definições consagradas na literatura doutrinária mundial, por entender, acertadamente, que possuímos uma realidade própria na interpretação do termo Defesa Nacional.

A nova proposta constitui-se em mais um marco na evolução da organização, do preparo e do emprego de nossos meios de combate. Nesse sentido, visualizam-se três importantes momentos na Instituição ao longo dos últimos trinta anos: o primeiro, por ocasião da FT 90, com os reflexos iniciais já no ano de 1986, talvez um dos esforços de transformação de curto prazo de maior impacto na Força (criação dos Grandes Comandos Militares, mecanização de diversas Unidades, aquisição e repotencialização de blindados, implantação da Aviação do Exército, ampliação das escolas militares etc.); um segundo momento quando da adoção da Doutrina Delta, na metade da década de 90, rompendo com consagrados conceitos ainda decorrentes da Segunda Guerra Mundial; e o momento atual, ocasião em que o Estado-Maior do Exército (EME) conduz mais um ambicioso Processo de Transformação da Força, ao mesmo tempo em que apresenta um novo conceito doutrinário para seu emprego, intitulado Operações no Amplo Espectro.

O presente artigo pretende ampliar o debate a respeito do tema, por meio da adição de ideias, lições aprendidas, dados coletados de edições da Military Review, citações e honestas opiniões pessoais, baseadas na vivência profissional e no que acompanho diariamente no desempenho da função de Oficial de Ligação do Exército Brasileiro junto ao Centro de Armas Combinadas (CAC) do Exército dos Estados Unidos da América (EUA), no Forte Leavenworth/Kansas.

OPERAÇÕES NO AMPLO ESPECTRO

“Convém organizar as Forças Armadas em torno de capacidades, não em torno de inimigos específicos. O Brasil não tem inimigos no presente. Para não tê-los no futuro, é preciso preservar a paz e preparar-se para a guerra.”

Estratégia Nacional de Defesa

A designação “Operações no Amplo Espectro” enfatiza que os conflitos atuais envolvem não somente o combate entre oponentes armados. As operações constituem-se, também, na aplicação dos meios de combate, de forma simultânea ou sucessiva, combinando atitudes ofensiva, defensiva, de pacificação, de Garantia da Lei e da Ordem, de apoio às instituições governamentais e internacionais e de assistência humanitária, em ambiente interagências.

É interessante considerar que a maioria dos argumentos utilizados para justificar alterações na estrutura de uma Força ou em sua doutrina normalmente se ampara nas previsões sobre as ameaças futuras, em evoluções na natureza da guerra ou em consumado hiato tecnológico que ameace, pela obsolescência, seus equipamentos militares. Em nosso caso, tal iniciativa ocorre em meio à consolidação de termos militares utilizados por exércitos com larga experiência expedicionária e paralelamente aos projetos de modernização da Força Terrestre desencadeados no decorrer de 2012.

Coerentemente, as adaptações propostas para a doutrina buscam atender às nossas realidades. O termo amplo espectro assegura nosso preparo para as ações ofensivas e defensivas, garantindo assim a necessária dissuasão no nosso contexto regional. O novo conceito enquadra também as Operações de Pacificação, ou seja, nosso envolvimento em ações complexas, normalmente desenvolvidas em centros urbanos, tais como a seus instruendos em um ambiente multilíngue.

As operações nos centros urbanos sugerem, ainda, que um erro tático cometido por um integrante da tropa normalmente tem repercussão imediata no contexto estratégico do ambiente operacional e, principalmente, na opinião pública nacional.

O Tenente-Coronel C. A. Klinguelfus destaca o seguinte a respeito da atuação da Força de Pacificação na cidade do Rio de Janeiro, nos anos de 2010 e 2011:

“Desde o início das operações se fez todo o possível para, em conjunto com o Poder Público, responder às necessidades dos moradores. Assim, foram reparados os prejuízos causados pelas operações militares e houve o acompanhamento das obras de infraestrutura e restauração dos serviços básicos, iniciativas mediadas pela Seção de Assuntos Civis — tudo com o propósito de estender a visão positiva da Força de Pacificação. Mesmo com tais ações, mais cedo ou mais tarde, a presença constante das tropas do Exército nas ruas tende a produzir desgaste no relacionamento destas com os moradores locais, caso a retirada demore a ocorrer”.

O engajamento militar isolado não mais garante a vitória. Ele simplesmente estabelece as condições mínimas para o sucesso estratégico, o qual é moldado em uma fase de estabilização, a mais decisiva de um conflito. O gráfico a seguir mostra a nova face dos conflitos: A título de comparação, a figura enquadra o conflito no Haiti e a atuação da Força de Pacificação no Estado do Rio de Janeiro.

Desconsiderando, logicamente, eventuais imprecisões quanto aos prazos do eixo horizontal8, bem como a falta de dados estatísticos detalhados para o perfeito traçado da linha do nível de violência no gráfico, observa-se que o conflito pode ser dividido em três fases, na seguinte sequência: intervenção, estabilização e normalização.

• A primeira, a de intervenção, é a fase considerada indispensável. É a fase da ascendência do poder militar sobre a diplomacia, geralmente o período do confronto armado de alta intensidade contra um oponente identificado. Os objetivos desta fase podem ser a vitória militar, o fim do confronto entre grupos beligerantes ou a entrada com sucesso do poder militar no teatro de operações. Aqui se enquadra a maioria das ações de emprego conjunto das forças singulares.

• A segunda fase é considerada decisiva, pois nela a Força estabelece as condições para o sucesso estratégico, ou seja, o retorno da paz. Denominada fase de estabilização, ela é conduzida no terreno, no coração dos centros urbanos. É a fase mais demorada, na qual são priorizados os esforços de reconstrução, diante da segurança proporcionada por uma força terrestre, e do trabalho de diversos atores não militares. O soldado aqui deve possuir a capacidade de adaptar-se e, fundamentalmente, saber dialogar. O sucesso ou o fracasso nessa fase é frequentemente determinado por ações desencadeadas em seu início.

• A terceira fase é a de normalização, quando as bases dos sistemas político, judiciário e social são aceitas pelos protagonistas do conflito. A progressiva retirada da Força em favor de uma autoridade legítima, da força de segurança local e de atores não militares caracteriza o sucesso da operação militar.

Adicionalmente, podemos perceber que a área elíptica em roxo na figura representa o espaço de batalha ou ambiente operacional para a combinação de atitudes, ou seja, para as Grandes Unidades empregarem seus elementos de manobra na condução de operações ofensivas e defensivas, de pacificação, de GLO, de ajuda humanitária, etc. É também o espaço de atuação interagências e de parceiros multinacionais.

O quadro 1 resume o emprego das operações previstas no amplo espectro, dependendo do ambiente interno ou externo:

O CAMPO DE BATALHA DO SÉCULO XXI

“Em uma época em que todos têm um celular com câmera e são capazes de registrar uma operação desproporcional, como poderá uma Força Armada fugir ao julgamento moral e a uma condenação estrategicamente contraproducente?” Fromm, Pryer e Cutright.

O ambiente operacional visualizado nos conflitos atuais possui, dentre outras, as seguintes características principais:
• O oponente prefere conduzir o combate no interior dos centros urbanos, pois este oferece uma variedade de vantagens físicas para o defensor. Além disso, o ambiente urbano tende a reduzir as vantagens tecnológicas conduzidas pelo atacante.

• A mídia encontra-se presente, com capacidade de instantaneamente divulgar o que está acontecendo, impactando a opinião pública, de forma positiva ou negativa, e, assim, o moral da tropa.

• O oponente utiliza equipamentos celulares e dispositivos portáteis de comunicações para coordenar suas ações e agilizar a transmissão de informações sobre a situação e os deslocamentos da tropa.

• Faz-se uso das mídias sociais para ampliar o número de seguidores e provocar grande concentração pública em local e hora predeterminados pelo oponente.

• A população é o terreno a ser conquistado por ambos os lados. É necessário influenciá-la, pois a sua reação em favor da operação é essencial para a conquista do objetivo estratégico.

• O oponente busca imiscuir-se no meio da população, contando com ela para obter informações e abrigo.

• São utilizados explosivos improvisados, obstáculos rudimentares e outras ferramentas para canalizar ou dificultar o avanço da tropa.

• A presença de ONGs, agências governamentais ou internacionais neutras, sérias, organizadas, dotadas de espírito público e dispostas a efetivamente contribuir para a solução de óbices que estejam interferindo na condução da operação. Por outro lado, é também comum à presença momentânea de determinados atores/entidades que aparecem no ambiente operacional normalmente querendo emprestar seu prestígio pessoal/institucional (ou suposto) na solução de determinada questão, quando na realidade buscam aproveitar, única e exclusivamente, a cobertura realizada pela mídia no local dos eventos para deixar registrada a sua imagem junto às diversas audiências.

Na obra Concrete Hell — Urban warfare from Stalingrad to Iraq (“Inferno de concreto – combate urbano - de Stalingrado ao Iraque”, em tradução livre), Dimarco acrescenta: “O moderno combate urbano, em muitos aspectos, não é tão diferente dos combates praticados ao longo da história das guerras. Dada a forma como o combate tem evoluído nas últimas décadas do século XX, muitos especialistas acreditam que o complexo campo de batalha urbano será o ambiente comum dos conflitos no século XXI. Se esse for o caso, então a história militar está indo ‘de volta para o futuro’, revelando que o combate urbano é comum e, na realidade, mais comum na história das guerras que a clássica batalha em campo aberto.”

O ambiente urbano é difícil de conquistar, manter e controlar. Ele confina o combate, forçando o Exército a operar de forma diferente da manobra em campo aberto. É o local onde o oponente, utilizando o combate assimétrico, espera derrotar ou resistir a um exército moderno.

Assim, como consequência, pode-se também considerar que as forças militares entraram na era da condução das operações no meio da população, e esta espera ordem, segurança e respeito.

O CONCEITO DA “GUERRA EM TRÊS BLOCOS” (THREE BLOCK WAR)

“Enquanto ninguém pode enxergar o futuro, é possível, no mínimo, indicar poucas direções a respeito das prováveis tendências.” Martin Van Creveld

O termo “Guerra em Três Blocos” foi concebido pelo general Charles C. Krulak quando comandou o Corpo de Fuzileiros Navais do Exército dos EUA (1995-1999). Baseado nos desafios enfrentados pelos Marines em estados falidos, tais como a Somália e a Iugoslávia na década de 90, Krulak imaginou o futuro campo de batalha como urbano, assimétrico, com poucas distinções entre combatentes e não combatentes, e com diversos eventos e atividades ocorrendo mais ou menos ao mesmo tempo e em um espaço de terreno limitado:

Em um momento no tempo, nossos militares estarão distribuindo alimentos e roupas para refugiados civis, provendo assistência humanitária. No momento seguinte, estarão entre duas facções tribais conduzindo operações de paz e, finalmente, também se envolverão em uma batalha altamente letal de meia intensidade — tudo isso no mesmo dia [...] tudo isso no interior de três blocos da mesma cidade. Isso será o que chamamos de guerra em três blocos”.
Mais recentemente, no documento “Em direção às Operações Terrestres 2021: Estudos sobre o Conceito de Emprego da Força”, as Forças Armadas do Canadá retomam o conceito:

“As tropas devem estar preparadas para conduzir uma variedade de operações (intenso combate em uma área, operações de estabilização em outra e ajuda humanitária em uma terceira) [...] O Afeganistão ilustra as demandas da guerra em três blocos”.

Dentre as diversas literaturas sobre o tema, ressalto a concepção de Dimarco quando ele conclui sobre o combate urbano no século XXI:

“[...] a guerra em três blocos visualiza que em um bloco viaturas blindadas e o poder aéreo atuam com ataques convencionais para destruir o [oponente] ou conquistar uma posição no terreno. No bloco seguinte, a presença de forças militares garante o funcionamento de infraestruturas vitais e a segurança de civis contra ataques de forças [adversas]. Em um terceiro bloco, uma Unidade militar foca no treinamento e policiamento conjunto com a polícia nacional, apoia a reconstrução da infraestrutura e do
[restabelecimento] das instituições civis voltadas para a governança, em estreita coordenação com o governo e a população local”.

Uma leitura atenta do acima exposto pode nos aproximar do reconhecido trabalho realizado pela tropa brasileira no Haiti desde 2004. Ao longo dos oito anos como integrante da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti, e desde a década de 50 enviando tropas de paz e observadores militares para diversos países, pode-se considerar que a Força Terrestre brasileira foi desenvolvendo uma doutrina própria de preparo e emprego para missões dessa natureza.

Hoje, a capacidade de mobilização e a coleção de destacados resultados em todas as missões de que participa despertam o interesse e a admiração de diversos exércitos. A partir de junho de 2013, o batalhão brasileiro no Haiti contará com uma fração do Exército canadense, valor pelotão, além de rotineiramente também operar com integrantes dos exércitos do Paraguai, Bolívia e Peru.

A experiência no Haiti permitiu criar uma doutrina de pacificação genuinamente nacional, aprendida e aperfeiçoada dia a dia na condução contínua e simultânea de patrulhas a pé, motorizadas ou mecanizadas (ação de presença), inserindo a participação da polícia local (legitimidade, transmissão de valores, profissionalismo e técnicas) em ações conjuntas; na execução de trabalhos de engenharia (visibilidade e compromisso com o desenvolvimento); no contato com a população (respeito e solidariedade); e no trabalho em parceria com as agências da ONU, ONGs e instituições locais (interagências).
Essas atividades, aliadas às características do soldado brasileiro, dentre as quais se destacam a resistência, adaptabilidade e solidariedade, conferem estreita ligação com uma expressão muito difundida naquele país: “É o jeito brasileiro de construir a paz”.

PROVÁVEIS IMPACTOS DAS OPERAÇÕES NO AMPLO ESPECTRO NA FORÇA TERRESTRE

“O Exército, embora seja empregado de forma progressiva nas crises e conflitos armados, deve ser constituído por meios modernos e por efetivos muito bem adestrados. O Exército não terá dentro de si uma vanguarda. O Exército será, todo ele, uma vanguarda.”
Estratégia Nacional de Defesa

O conceito “Operações no Amplo Espectro” discutido neste artigo define os tipos de operações que poderão ser desencadeadas e o ambiente do campo de batalha considerado. Doravante, acredito que o próximo passo será explicar como as lições já aprendidas, decorrentes de nossas operações finalizadas ou em curso, agora codificadas em doutrina, os nossos meios e o reequipamento institucional anunciado irão integra-se em um só conjunto para orientar o melhor emprego da Força Terrestre.

Nesse sentido, é possível projetar que:

- Será necessário estudar o impacto do processo de reequipamento em curso na Força nas variantes ofensiva, defensiva e pacificação. A mecanização da infantaria, os novos radares e meios de defesa antiaérea e o modelo do fuzil IA2 apropriado para determinada operação (7,62 mm ou 5,56 mm) são exemplos que deverão demandar estudos e experimentações doutrinárias de modo a definir a melhor forma de emprego dessas capacidades.
- A tendência de atuar no meio da população do ambiente operacional exige que as Unidades, antes voltadas exclusivamente para o combate convencional, sejam também equipadas e adestradas para o emprego de recursos não letais.

- A integração das tropas blindadas e mecanizadas no ambiente de pacificação, dotadas também de capacidade não letal, ampliará o tema “emprego de blindados em ambiente urbano”. As operações militares recentes no Estado do Rio de Janeiro atestam a importância desses meios como elementos que facilitam a entrada em locais onde o acesso é difícil, devido ao terreno, à exposição das forças de segurança, ou a ambos.

- Os Projetos Estratégicos do Exército Brasileiro, em particular o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras Terrestres (SISFRON) e o Sistema Integrado de Proteção de Estruturas Estratégicas Terrestres (PROTEGER), irão exigir prontidão e pronta resposta. Portanto, considerando a dimensão continental do Brasil, recursos que assegurem a mobilidade orgânica e a estratégica serão essenciais para responder com eficiência a qualquer ameaça direcionada ao patrimônio sob a guarda desses sistemas. Para confirmar isso, ressalta-se o previsto na Estratégia Nacional de Defesa com relação à concepção do Exército como vanguarda:

“Na paz, significa a versatilidade com que se substitui a presença — ou a onipresença — pela capacidade de se fazer presente (mobilidade) à luz da informação (monitoramento/controle). Na guerra, exige a capacidade de deixar o inimigo em desequilíbrio permanente, surpreendendo-o por meio da dialética da desconcentração e da concentração de forças [...]”.

Considerações finais

Enquanto no passado os objetivos pretendidos na solução de um conflito tendiam a depender diretamente dos resultados dos combates, atualmente as conquistas militares nos campos de batalha do século XXI somente criam as condições mínimas para o sucesso estratégico. Por essa razão, a Força Terrestre estáampliando, por meio das Operações de Amplo Espectro, a sua forma de combater, indo além das tradicionais ações ofensivas e defensivas, combinando simultaneamente outras atitudes no mesmo espaço geográfico, para também enquadrar iniciativas que promovam o sucesso estratégico esperado ao fim de um conflito.

A transição da Força para o novo conceito doutrinário não será uma tarefa difícil para o Exército Brasileiro. A questão crítica, no momento, concentra-se na atual mobilidade da tropa para atender ao princípio da onipresença e no tempo necessário para as Unidades atingirem um nível de adestramento no Amplo Espectro, empregando, com segurança, os diversos novos meios previstos no processo de reequipamento institucional.

s desafios identificados acima servirão de estímulos motivadores para o aperfeiçoamento profissional de nossos jovens oficiais e sargentos, sendo combustível suficiente para também desencadear estudos e debates em nossas escolas, nos centros de instrução e no recém-criado Centro de Doutrina do Exército, em torno de ideias destinadas a promover a atualização doutrinária.

Por fim, acredito que podemos perfeitamente adaptar, no âmbito do Exército cujo Patrono é orgulhosamente reconhecido como “O Pacificador”, o pensamento do General alemão Carl Von Clausewitz: “Operações no Amplo Espectro incluem também a continuação das grandes operações de combate por outros meios”.
-x-

Publicado Originalmente: DOUTRINA militar TERRESTRE e m r e v i s t a | Ano 001 | Edição 002 | Abril a Junho/ 2013 - Centro de Doutrina do Exército

O Autor: O Ten Cel Art Paixão é o atual Chefe da Seção de Integração e Coordenação da Divisão de Planejamento, do Centro de Doutrina do Exército. Foi instrutor dos Cursos de Artilharia da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) e da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO).

Ao longo de sua carreira, participou da elaboração e revisão de diversas publicações de Doutrina Militar Terrestre (DMT), destaque para o Manual de Campanha C6-82 – Obuseiro L118 (Light Gun) e a atual Edição, ano de 2012, das Instruções Gerais para a Organização e o Funcionamento do Sistema de Doutrina Militar Terrestre (SIDOMT).


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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#183 Mensagem por cabeça de martelo » Sex Ago 02, 2013 1:00 pm

04-07-2013
O Apoio de Combate nas unidades escalão Batalhão de Infantaria Mecanizado: Possíveis tendências de evolução

No âmbito das jornadas de Infantaria de 2013, o 1º e 2º BIMec elaboraram o documento:

O Apoio de Combate nas unidades de escalão Batalhão de Infantaria Mecanizado:
Possíveis tendências de evolução.

Em síntese, considera-se que a harmonização dos vetores de desenvolvimento do apoio de combate - DOTLMPFII - para a obtenção de efeitos relacionados com o emprego de forças em todo o espetro do conflito, se pode e deve aperfeiçoar.

Gestor de Projeto: Major Jesus, Oficial de Operações, 1ºBIMec
Trabalho realizado pelo 1ºBIMec e 2ºBIMec da Brigada Mecanizada
:arrow: http://www.exercito.pt/sites/1BIMec/Pub ... ntaria.pdf




"Lá nos confins da Península Ibérica, existe um povo que não governa nem se deixa governar ”, Caio Júlio César, líder Militar Romano".

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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#184 Mensagem por Lirolfuti » Seg Ago 26, 2013 3:21 pm

Como equipar? Blindados sobre rodas ou lagartas? Reflexões após visita a uma brigada Stryker, nos EUA.



Tenente-Coronel Marcelo Carvalho Ribeiro


Após breve visita oficial integrando uma comitiva do Estado-Maior do Exército ao III Corpo de Exército dos EUA, o autor apresenta algumas considerações a respeito do treinamento e do emprego de blindados naquele país.

1. INTRODUÇÃO

Em função de distintos e incertos cenários estratégicos onde podem vir a atuar, as forças armadas de qualquer país do mundo pensam e repensam constantemente o "Como Equipar" , tema que exige bastante estudo e reflexão, em função do forte impacto que a decisão causa no orçamento, na doutrina de emprego e na própria estrutura orgânica das forças. Uma decisão mal tomada custa muito ao contribuinte, além de se por em risco a capacidade operativa das Forças.

Após breve visita ao III Corpo de Exército dos EUA, serão apresentadas a seguir mais algumas idéias e comentários a respeito do tema, em complemento aos já apresentados em artigo publicado no dia 01 de agosto (Artigo: Como equipar? Blindados sobre rodas ou lagartas? O dilema vivido pelo Exército Brasileiro).

.

2. ASPECTOS OBSERVADOS

a.Generalidades

Em se tratando de geração de novas capacidades, o intercâmbio de informações e idéias entre forças armadas de distintos países sempre foi de suma importância para se chegar a bons resultados. Neste sentido, o Exército Brasileiro realizou, na semana de 19 a 23 de agosto , um intercâmbio com o Exército dos EUA, onde tratou de duas áreas específicas: a simulação de combate e o treinamento da tropa blindada.

A comitiva do Estado -Maior do Exército foi até o Fort Hood, Texas, na sede do III Corpo de Exército, cujas divisões integram o grosso da força blindada estadunidense. Apelidado de Phantom Corps (Corpo Fantasma), aquela Grande Unidade é a que preserva o maior núcleo de forças convencionais dos EUA.

Apesar de contar com um orçamento de cerca de U$ 2 milhões por dia, os recursos recebidos pelas tropas aquarteladas em Fort Hood foram bastante reduzidos nestes últimos anos, o que aumenta seu desafio por manter-se operacional com uma força convencional de seus aproximadamente 45.000 militares.

A troca de experiências, neste contexto, foi bastante interessante, em particular neste momento em que nossa Força Terrestre passa por um processo de transformação. Seguem-se algumas idéias que podem apontar sobre alguns de nossos dilemas vividos quando refletirmos nosso "Como Equipar".

b. Manutenção de um Núcleo Convencional

Apesar de estar imerso em uma realidade de conflitos não convencionais, o Exército dos EUA realiza um grande esforço por manter operante seu núcleo convencional. É uma imensa gama de equipamentos e militares que é manutenida constantemente, sofre modernizações e realiza treinamentos diários, dando-se prioridade aos pequenos escalões.

Destaca-se, neste esforço, o largo emprego da simulação de combate, nas vertentes virtual, construtiva e viva. Com isso, reduz-se o número dos meios utilizados e aumenta-se a qualidade do adestramento. Sazonalmente, realizam-se exercícios de grandes escalões.

Este núcleo duro convencional é, indubitavelmente, uma tropa que atua com meios sobre-lagartas, os M1 Abrams, como carro de combate principal, e os M2 Bradley, para a Infantaria, apoiados pelo fogo com os obuseiros auto-propulsados Paladin e por uma gama de veículos blindados de apoio de engenharia e de apoio logístico, em sua maioria aproveitando-se os antigos M113 e M577. Compoem ainda este núcleo duro uma gama de veículos sobre roda, os HUMVEE e disitintos tipos de caminhão para prestar o apoio logístico necessário.

Seria o caso do Exército Brasileiro pensar sobre a necessidade ou não de se criar um núcleo convencional, dotado de meios blindados e mecanizado o mais próximo do estado da arte possível? Caso positivo, o principal desafio seria saber dimensioná-lo corretamente em face das possíveis ameaças e áreas de atuação em território nacional. Para treiná-lo e equipá-lo são necessários vultosos recursos.

c. Brigada Stryker: vocação não convencional


Neste momento em que a Força Terrestre brasileira reflete sobre a organização de suas brigadas mecanizadas (infantaria e cavalaria), é interessante ressaltar que, embora a Brigada Stryker tenha sido desenhada para cumprir ações de amplo espectro, a impressão que nos passou durante a visita é que a Brigada Stryker está mais apta a realizar ações de combate não convencional.

Conversamos bastante com um dos comandantes de Regimento, um tenente-coronel e algum de seus subordinados, todos usando seu tradicional chapéu da cavalaria americana, e deixaram na comitiva esta forte impressão. Neste sentido, dois detalhes chamaram bastante a atenção: primeiro, a utilização da viatura Stryker com canhão de 105 mm, usada mais como veículo de apoio para a infantaria (para abertura de buracos nas paredes, permitindo assim a entrada em edifícios) do que propriamente em suas missões clássicas de combate contra blindados ou infantaria.

Outro detalhe foi que o reconhecimento quase já não é mais realizado por tropas de cavalaria pois, segundo o comandante, este perdeu o sentido de ser, em função do emprego da aviação e meios como helicópteros, radares, veículos aéreos não tripulados, dentre outrosA dosagem de viaturas Stryker nas subunidades é de 9 Viaturas de Transporte (foto x) e 3 Vtr 105 mm. Isto leva o EB a refletir sobre a constituição das Brigadas de Infantaria Mecanizadas.

O discutido Regimento de Carros de Combate, no entender deste autor, perde completamente seu sentido de ser, já que este tipo de brigada estaria mais voltado, supostamente, a um combate não convencional.

d. Viaturas sobre rodas: mobilidade estratégica e redução de custos

Indubitavelmente, a redução de custos foi o principal fator levantado a respeito da adoção da Vtr Stryker, além da ampla mobilidade por estradas. É um equipamento que permite o combate noturno, de fácil manutenção e que proporciona alto nível de proteção da tropa. Entretanto, ressalte-se que apesar da excepcional qualidade do meio, sua limitada mobilidade através campo, principalmente por terrenos mais lamacentos, foi citada constantemente como limitador.

Reforçando esta tese, todas as viaturas Stryker são dotadas de cabo de aço e guincho, além do costumeiro cambão para reboque. É mais uma viatura blindada de transporte de pessoal, com limitadas capacidades para o combate convencional.

Quanto a viatura Canhão 105 mm, perguntei a todos se não seria melhor, ao invés de possuir três militares e carregamento automático, a guarnição ser de quatro militares. Todos foram unânimes em dizer que sim, inclusive porque o carregamento automático leva até 7 segundos, em quanto que um carregador bem adestrado pode fazê-lo em até 4 segundos, além da guarnição do carro contar com mais um membro para a sobrevivência (serviços de manutenção, guarda, etc).

e. Viaturas Sobre Lagartas : Combate Convencional e confiabilidade

Pelos quesitos de segurança, mobilidade, potência de fogo e precisão do armamento, os militares estadunidenses confirmaram que, sem sombra de dúvida, não há meio mais eficaz que aqueles sobre lagartas. A confiabilidade neste meio é muito maior. Obviamente esta impressão se baseia nos meios blindados ali existentes, que são de excelente qualidade e última geração, mas esta impressão nos permite visualizar que por aqui a coisa não deve ser tão diferente.

Durante a visita, foi possível visualizar o exaustivo treinamento de tiro realizado por uma tropa valor companhia blindada ( veículos sobre lagarta). O detalhe que impressionou foi a quantidade de linhas de tiro disponíveis , com alvos automatizados e com equipamentos para seu controle, além de sua qualidade: cerca de 20 de diferentes configurações. O EB possui somente uma linha de tiro deste tipo, funcionando no polígono de tiro do Barro Vermelho, em Saicã, no município de Rosário do Sul-RS.

f. Simulação, Simulação , Simulação...

Qualquer que seja a decisão a ser adotada pelo EB para dotar as suas tropas blindadas, a qualidade do "Como Treinar" passará necessariamente pelos simuladores de todos os tipos possíveis. Em Forte Hood, eles seguem concentrados no Close Combat Tactical Center (CCTT) – Centro de Treinamento de Combate Aproximado - que realiza o treinamento virtual tanto para as tropas dotadas de um tipo de blindado ou outro.

Os treinamentos em simuladores não estão mais tão custosos, e até um exército aparentemente sem problemas orçamentários está tirando proveito disso: prova disso foi o treinamento de técnicas escolta de comboios que presenciamos, em veículos "mockup" de madeira, usando o software comercial VBS 2.

Como gestoras da simulação, seguem empresas contratadas, que apoiam os militares nos treinamentos e realizam a manutenção e upgrades de softwares tão necessários.
Neste sentido, confirma-se que a linha de ação adotada pelo COTER e pelo o Centro de Instrução de Blindados para o treinamento de militares em simuladores vem sendo similar à adotada pelos EUA.

A futura criação, em Santa Maria, do Centro de Adestramento, vai ampliar ainda mais estas capacidades. A nova iniciativa so EB requer empresários empreendedores que aceitem o desafio e óbvios recursos orçamentários para impulsionar este grande projeto, atualmente gerenciado pelo Comando da 3ª Divisão de Exército, em Santa Maria-RS.

3.CONCLUSÃO

A visita ao Fort Hood foi bastante proveitosa, e nos levou a refletir . Os diversos ensinamentos colhidos vem num momento muito adequado, no qual a Força Terrestre realiza estudos para sua transformação.

O dilema do EB sobre o "Como Equipar", no caso da adoção de blindados sobre rodas ou lagartas, deve passar por analises muito mais profundas, do simples dilema tático – operacional "que tipo de viatura adotar", para um nível mais estratégico-operacional : "que tamanho de núcleo convencional o EB deve adotar?", e ainda com que apoios (fogo, engenharia, anti-aéreos, logísticos, etc) contar.

Afinal de contas, como dizia o General do Exercito Alemão que desenhou as tropas blindadas de seu país durante a II Guerra, Heinz Guderian em seu Clássico Panzer Leader:

“Os carros de combate, atuando junto com a infantaria, não são capazes de provocar per se os efeitos desejados, se as demais armas que o apóiam não atingirem os mesmos padrões de velocidade e mobilidade em terrenos variados” (Guderian, Heinz. Panzer Leader) .

Como conclusão final e curiosidade, deixo para apreciação de todos uma foto da comitiva retirada no museu da 1ª Divisão de Cavalaria, de um Urutu apreendido das forças iraquianas durante a operação "Iraque Freedom".

-x-

O autor: Tenente-Coronel Marcelo Carvalho Ribeiro de Cavalaria do Exército Brasileiro, da turma de 1990 da AMAN, e comanda o Centro de Instrução de Blindados (CI Bld).

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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#185 Mensagem por FCarvalho » Sex Nov 22, 2013 1:04 am

Eu achei este texto muito interessante. Muito boa leitura.



abs.




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#186 Mensagem por MILEO » Dom Nov 24, 2013 11:15 pm

Pessoal, aqui vai minha participação no tópico:

http://www.cdoutex.eb.mil.br/images/vid ... ceitos.mp4

Recomendo fortemente que assistam, muito interessante a palestra.

Abraços.




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#187 Mensagem por cabeça de martelo » Sáb Out 04, 2014 8:43 am

DEBATE “QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA”

A antiga “instalação sem preparação da posição”, vulgo “queda na máscara”, foi pensada e ministrada aos militares num exército que tinha acabado de adquirir a espingarda automática HK-G3 e estava em operações nas antigas colónias. Durante a guerra da ultramar, as operações militares ai levadas a cabo eram, em grande parte, todas realizadas em terreno arborizado, onde tendo em conta um dos fatores de decisão, o terreno, a “queda na máscara” era perfeitamente adequada à situação ai vivida.
Com o fim da guerra fria e com o aumento dos conflitos armados em regiões urbanas, foi necessário adaptar esta técnica individual de combate ao terreno onde se realiza o combate.
O 1BIMec no decorrer do seu ciclo treino operacional deparou-se com uma problemática ao nível da Técnica Individual de Combate (TIC):

“QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA vs QUEDA NA MASCARA
TRADICIONAL”.

Para saber que técnica a adotar levantaram-se os parâmetros que sustentariam a escolha de mudar ou de continuar. Os fatores que tivemos em conta foram: prontidão em combate, segurança, fadiga e risco de lesão.
A prontidão em combate é, ao nível do atirador, a capacidade/tempo que este tem para reagir perante uma ameaça. Ao analisarmos as duas técnicas, tendo por base que um atirador médio demora cerca de 4 segundos a adquirir/disparar e acertar no alvo, constatamos que este é o tempo que um atirador demora a executar a QUEDA NA MASCARA TRADICIONAL. Contrariamente, o atirador quando executa a QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA demora menos de 4 segundos, logo anula a probabilidade de ser atingindo e potencia a possibilidade de atingir deixando de ser um alvo remunerador.
Analisando o terceiro fator, a segurança, podemos constatar que na execução da QUEDA NA MASCARA TRADICIONAL, descrita na ficha de instrução TIC (00) 02-05, o combatente em nenhuma altura da execução tem a arma pronta a fazer fogo, ou seja, está mais vulnerável durante a execução. Na QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA temos a grande vantagem que durante a execução temos sempre a arma a apontar na direção do alvo. Será complicado fazer tiro ajustado, no entanto podemos fazer fogo de supressão durante a execução. Estas técnicas são empregues quando a probabilidade de contacto é iminente ou já em contacto efetivo.
Na probabilidade de contacto iminente se usarmos a técnica da QUEDA NA MASCARA TRADICIONAL podemos por em causa a surpresa e a deteção da força, devido ao ruido inerente da execução da mesma.
Em contrapartida a QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA pode ser executada de forma mais silenciosa. Neste parâmetro a QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA revelou-se a escolha mais acertada tendo em conta o fato de, no momento da execução da técnica, é possível responder ao fogo.
Queremos deixar também um dado importante que diz respeito à segurança, ao nível das coronhas da espingarda automática HK G3. No 1BIMec a grande maioria das coronhas partidas, derivam da técnica da QUEDA NA MASCARA TRADICIONAL. No entanto este fator não foi analisado porque não conseguimos aferir se este dado deriva da má
execução da técnica ou do avançado estado de idade do material.
Quanto à fadiga analisámos as duas técnicas tentando dividir a execução em tempos bem definidos. A fadiga assume um papel importante pois vai ter influência diretamente no militar quer ao nível do tiro, quer ao nível da distância percorrida.

Na QUEDA NA MASCARA TRADICIONAL está implícito na ficha de instrução TIC (00) 02- 05 que a execução tem 5 tempos:
“1º tempo - Assentar os 2 pés simultaneamente no chão (...);
2ºtempo - Cair sobre os joelhos (...);
3º tempo - lançar a coronha da arma
para a frente, estendendo bem o braço (...);
4º tempo - deitar o corpo para a frente;
5º tempo - Com o corpo bem colocado no terreno, assentar a coronha da arma no ombro e tomar a posição de tiro deitado.

Na QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA podemos constatar com o nosso treino que a execução desta técnica tem 3 tempos:
1º tempo – baixar a frente, pondo a mão contrária ao que é atirador no solo,
2º assentar o corpo no solo;
3º tempo - Assumir a posição de atirador deitado.

Comparando os tempos necessários para a execução das duas técnicas podemos concluir que na QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA é menos desgastante fisicamente pois tem menos tempos de execução. Isso tem vindo a ser comprovado com o nosso treino operacional. Notamos que com a adoção desta técnica os militares mantêm mais facilmente o ímpeto durante o assalto, tem uma silhueta para o inimigo mais pequena e que durante a execução da técnica mantêm sempre os olhos e a arma na direção da ameaça.
Por último temos o risco de lesão, que é um fator que pode ser determinante no potencial de combate aos baixos escalões, pois não é expectável ter uma baixa na execução de uma das técnicas.
Esta análise foi feita com a colaboração do Tenente de Medicina Gilberto, que recentemente foi colocado no 1BIMec para integrar a KFOR.
O risco de lesão vai depender sempre da variável terreno. No entanto, analisando as duas técnicas temos uma dicotomia de conceitos: o choque dos joelhos e amortecer com a mão.
Anatomicamente o joelho não possui capacidade para absorver convenientemente o impacto causado pelo peso do corpo. O que significa que, cada vez que o joelho embate numa superfície com um coeficiente de rigidez semelhante sendo esse movimento animado com uma energia cinética elevada, o resultado mais provável serão microtraumatismos.
A curto e médio prazo vão originar a degeneração da articulação. O tipo de lesões que advêm desta prática podem repercutir-se ao nível do menisco, ligamentos articulares e rótula. O tempo de recuperação de uma lesão no joelho pode variar entre 2 semanas a 6 meses de repouso.
Este prazo poderá ser alargado se for necessário intervenção cirúrgica, mais a fisioterapia necessária. Quanto à mão, esta possui uma anatomia muito mais favorável para suportar o peso do corpo, em comparação com o joelho, advindo esse fato de possuirmos um antepassado quadrúpede.

Concluindo a análise deste parâmetro facilmente chegamos à conclusão que na QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA o risco de lesão é menor. Com esta nossa análise e com a experiencia adquirida ao longo do ciclo de treino operacional o 1BIMec optou pela adoção da QUEDA NA MÁSCARA MODIFICADA, com a plena convicção que mudamos em prol do soldado e tentamos melhorar o treino operacional.

Referências:
• PDE 3-07-14 Manual CAE do Exército Português, Ficha de instrução TIC (00) 02-05;
• NEP 3.01.11 do 1BIMec;
• Tática de Pelotão e Secção de Atiradores – EPI 1993;
• PDE – 3-00 Operações

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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#188 Mensagem por cabeça de martelo » Qui Nov 20, 2014 12:03 pm

A participação dos Comandos na ISAF / Pedro Meneses

O presente trabalho de investigação versa sobre o tema «A Participação dos Comandos na ISAF».
O objectivo desta investigação será a descrição e a análise do enquadramento legal que permite a presença da ISAF no Afeganistão e da forma como esta força se desenvolveu no território. Pretende-se, também, descrever e analisar a tipologia das missões desempenhadas pelas Companhias de Comandos no Afeganistão, bem como apurar quais as principais potencialidades e dificuldades tácticas e logísticas verificadas por estas unidades no Teatro de Operações Afegão.
Assim, esta investigação iniciar-se-á com uma componente teórica, fundamentada numa pesquisa bibliográfica, seguida de uma componente prática, correspondente à realização de inquéritos que permitam obter respostas para a questão central em apreço.
Estas duas componentes culminam com as Conclusões resultantes do processo de investigação.
O presente trabalho de investigação aplicada permitiu concluir que as Companhias de Comandos foram escolhidas para operar no Teatro de Operações Afegão por se constituírem como forças de intervenção ligeiras com uma grande flexibilidade de emprego. Esta flexibilidade de emprego deve-se à capacidade de auto-sustentação de 72 horas, associada a um correcto apoio logístico e à grande capacidade técnica e táctica desta tipologia de força.

:arrow: http://comum.rcaap.pt/bitstream/1234567 ... %20TIA.pdf

Com os resultados da questão n.º 2, de um modo geral, conclui-se que o equipamento individual era adequado e em número suficiente. No entanto, casos pontuais houve em que tal não acontecia, designadamente no que se refere ao modelo de colete balístico distribuído inicialmente, que acabou por ser substituído por um outromais adequado. Verifica-se ainda que não foi distribuída uma mochila de assalto para operações aeromóveis ou para operações de curta duração. Esta questão foi colmatada com a aquisição de exemplares no TO ou com recurso a coletes tácticos de maior capacidade. É também referido, pelos Oficiais que participaram nas primeiras QRF, que o sistema de hidratação utilizado era o «cantil». Já nas FND mais recentes o que se utilizava era o sistema tipo «camelbak».
Tendo em conta os meios utilizados e a conflitualidade que se vive no Afeganistão, verificamo que a Pistola Walther P38 é inadequada, fundamentalmente pela sua reduzida capacidade de carregamento. Também a Espingarda Automática G3 se revela como inadequada, pelo seu peso e, essencialmente, pelas suas grandes dimensões, que dificultam os movimentos dos militares nas viaturas. Não obstante, esta espingarda automática possui o calibre que os inquiridos consideram correcto para o TO. As metralhadoras ligeiras do tipo MG3 são consideradas fiáveis, mas inadequadas pelo seu peso excessivo, que torna a sua utilização em operações apeadas difícil. As armas anti-carro, no TO, são consideradas irrelevantes face à inexistência de ameaça blindada ou inadequadas pela excessiva capacidade. Das respostas, pode inferir-se que seria preponderante a existência de espingardas de precisão.
No que se refere ao apoio sanitário, a força era apoiada pelo módulo sanitário existente no Destacamento de Apoio de Serviços da FND. Os meios de evacuação sanitária postos à disposição das CCmds, por norma, não eram adequados por falta de blindagem. Esta situação apenas foi corrigida relativamente ao habitáculo do condutor das auto-matas na QRF projectada em 2010. A evacuação sanitária por meio aéreo, fornecida pela ISAF, revelou-se pouco
eficiente. Tal dificuldade devia-se às restrições colocadas pelas caveat das demais forças e pela dificuldade que a ISAF tinha em gerir estes recursos.




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#189 Mensagem por FCarvalho » Dom Dez 28, 2014 1:14 am

"As Forças Armadas jamais devem ser consideradas como uma simples reserva de mão-de-obra à disposição do Estado, para seu emprego político. Empregá-las dessa forma constitui um grave erro estratégico que poderá redundar em prejuízos de elevados custos e difícil reparação."
Gen Ex R1 Carlos Alberto Pinto Silva
Eis uma sentença fulcral para a manutenção dos fundamentos básicos e indispensáveis a vida militar institucional. Principalmente aqui no Brasil.

abs.




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#190 Mensagem por Clermont » Ter Jun 30, 2015 8:28 pm

ANÁLISE DA LIDERANÇA OPERACIONAL DE ROMMEL.


INTRODUÇÃO.

Não há dúvida de que o marechal-de-campo Erwin Rommel foi um líder excepcional. Ele possuía e exibia muitas das qualidades exigidas para ter sido um notável líder operacional.

Por que, então, às vezes, ele aparentou ser um tão pobre líder operacional? "Liderança Operacional" é um termo que aplica-se aos comandantes e seus estados-maiores que estão preocupados com a aplicação prática da arte operacional. Esta "preocupa-se tanto com a teoria quando a prática do planejamento, preparação, condução e sustentação de maiores operações e campanhas visando o cumprimento de objetivos estratégicos ou operacionais num teatro."

Este documento avaliará a liderança operacional do marechal-de-campo Erwin Rommel durante seu primeiro ano de comando do Corpo África alemão - Afrika Korps - e discutir razões pelas quais ele fracassou como um bem-sucedido líder operacional, mesmo tendo possuído muitas das qualidades exigidas para ter sido um excepcional.

Através das pesquisas torna-se muito evidente que Rommel falhou em fazer duas coisas: ele não se preocupava com o apoio logístico operacional para suas forças e ele falhou em compreender a primazia da política e estratégia. Ele falhou em fazer a transição dos objetivos estratégicos de seus superiores para os objetivos operacionais no teatro. Ao invés, ele desenvolveu e tentou implementar seus próprios objetivos operacionais, por conseqüência, tentando forçar a liderança da Alemanha a aceitar objetivos estratégicos novos. Ele tentou atingir estes objetivos operacionais através de meios táticos negligenciando, totalmente, a arte operacional exigida para cumprir tais objetivos. Essas duas falhas provocaram a eventual perda da África do Norte e pesaram na derrota total da Alemanha.

Deficiências adicionais que Rommel apresentou foram sua falta eficaz de coordenação ou desenvolvimento de unidade de esforços com seus aliados italianos; e que ele, pessoalmente, assumia o comando de operações táticas em numerosas ocasiões provocando confusão e incerteza entre suas forças.

A razão pela qual Rommel é visto como um grande líder deve-se a seus feitos como líder tático; no entanto, tivesse sido ele um melhor líder operacional, a guerra na África do Norte podia ter se desenvolvido muito diferentemente do que foi.


PANO DE FUNDO.

A guerra na África do Norte estava indo mal para os italianos. Hitler temia que se eles perdessem a Líbia, a aliança do Eixo seria severamente afetada. Adicionalmente, isto liberaria forças britânicas no Egito para lutar alhures, e daria a estas mais aeródromos na África do Norte que poderiam causar graves danos aos interesses alemães. Hitler não tinha intenção de transformar a África do Norte em outra grande frente, especialmente levando-se em conta que seu objetivo estratégico era a Rússia. O que ele queria era assistir os italianos para defenderem a Líbia, tanto para mantê-los como aliados e dentro da guerra, e para manter as tropas britânicas longe de seus flancos meridionais. O que Hitler não queria ou precisava era de outro objetivo estratégico para diminuir suas escassas forças. Já que a Líbia estava a mais de 2 mil quilômetros de Berlim, Hitler necessitava de um comandante que pudesse atuar de modo semi-independente, que possuísse excepcionais iniciativa, vigor, originalidade e ousadia para apoiar um aliado moral e fisicamente fraco. Hitler escolheu Rommel porque este possuía estas qualidades. Infortunadamente, estas mesmas qualidades eventualmente o tornariam um ônus para o objetivo estratégico de Hitler.

Rommel chegou em Trípoli, em fevereiro de 1941; imediamente começou a planejar para atacar e expulsar os britânicos da Líbia. Em março, ele iniciou sua ofensiva, que durou até maio. Ele rechaçou os britânicos para o Egito, mas foi contido em Tobruk, onde os britânicos estavam bem enterrados e fortificados. Os numerosos assaltos sobre Tobruk resultaram em grandes perdas para Rommel. Este então retirou-se e reforçou suas defesas ao redor de Tobruk. O contra-ataque britânico a partir de Tobruk foi muito custoso para eles, devido à inteligência, engenhosa utilização de artilharia e defesas enterradas de Rommel. A ofensiva CRUSADER aliada, em novembro de 1941, pegou Rommel de surpresa, e eventualmente o empurrou para a retirada rumo à Tripoli.

De muitos modos, Rommel exibia as qualidades de um excepcional líder operacional.

Ele desenvolveu no Afrika Korps um forte senso de identidade e sensação de unidade. Tanto que sua autoconfiança tornou-se um potente multiplicador de forças, pois eles sabiam que, sob Rommel, podiam conseguir qualquer coisa. Para eles, Rommel era um deus. Como não idolatrariam Rommel? Ele era o soldado ideal, destemido, inventivo, incansável, competente. Sua inesgotável energia permitia-lhe em todo canto e fazer qualquer coisa. Ele era um general dos praças, lutando ao lado deles na frente, ao invés de na retaguarda. Ele tinha o mesmo efeito sobre seus inimigos, que lhe atribuiam a posse de poderes sobrenaturais. Isto levou o comandante-chefe britânico (Força do Oriente Médio) a ordenar a seus comandantes, por razões psicológicas, a pararem de referirem-se a Rommel como se este fosse um "super-homem".


TRAÇOS DE CARÁTER.

Caráter é, talvez, o fator mais importante de um líder operacional bem-sucedido. Os traços de personalidade que Rommel possuía eram aqueles necessários para um líder operacional.

Aqueles que mais sobressaíam-se eram sua coragem moral, ousadia, conhecimento profissional, iniciativa, dureza, habilidade para motivar, habilidade para pensar grande e sua liderança pelo exemplo pessoal.

Sua coragem moral era sem paralelos. Rommel e seu Afrika Korps eram creditados por lutarem pelas regras e por serem cavalheiros. Rommel recusou-se a obedecer uma ordem de Hitler para "massacrar" todos os soldados inimigos que fossem descobertos em missões de comandos, mesmo que se rendessem. Rommel tratava todos os prisioneiros de guerra justa e humanamente.

Não há dúvida de que Rommel possuía ousadia incrível. Esta foi exibida nas manobras de combate e nos riscos pessoais aos quais ele se expunha diariamente. Um exemplo de sua ousadia foi o lançamento de uma bem-sucedida contra-ofensiva em março de 1941 contra os recentes ganhos britânicos na Cirenaica. Ele sentiu que os britânicos estavam exauridos e em processo de reorganização após sua prolongada ofensiva através da Cirenaica. Portanto, ele desfechou uma contra-ofensiva após estar no terreno por somente seis semanas e com menos da metade de suas forças esperadas. A ousadia de Rommel permitia-lhe explorar toda oportunidade ofensiva que se apresentasse a ele.

Outro exemplo de sua ousadia foi o ataque contra Mersa Brega. Seus superiores tinham ordenado que Rommel não atacasse Mersa Brega até sua segunda divisão panzer chegar em maio de 1941. Rommel, no entanto, atacou e conquistou-a em março de 1941 porque ele raciocinava que, por volta de maio as defesas inimigas poderiam ser inexpugnáveis.

A engenhosidade de Rommel e conhecimento profissional eram inigualáveis. Rommel utilizou uma velha arma de um modo novo, ao empregar canhões antiaéreos de 88 mm numa função antitanque. Essa técnica provou-se desastrosa para os britânicos. Adicionalmente, Rommel desenvolveu novas técnicas de batalha ao fazer uso de canhões antitanque na linha de frente com os tanques, utilizando uma linha antitanque como surpresa defensiva.

Rommel também exibia grande iniciativa e criatividade. Quando a divisão panzer de Rommel chegou à noite, ele imediatamente ordenou a descarga de todos os tanques e equipamento, mesmo embora isto pudesse atrair um ataque aéreo já que o descarregamento exigiria o uso de holofotes. Isto foi feito para que a divisão estivesse preparada para desdobramento no início da manhã seguinte. Rommel estava muito consciente de ser mais fraco do que as forças britânicas, entretanto ele queria manter os britânicos ocupados tentando adivinhar qual era sua força total.

Sendo assim, quando Rommel desfilou suas forças, após desembarcá-las em Trípoli, ele fez com que seus tanques dirigissem várias vezes em volta do quarteirão, antes de rolarem para o leste, de modo a causar a impressão de que ele dispunha de uma quantidade infindável de tanques. Em outra dissimulação, Rommel ordenou a construção de um grande número de tanques falsos, feitos de madeira e montados sobre automóveis Volkswagen. De novo isso foi feito para Rommel aparentar ser tão forte quanto possível e deste modo induzir cautela aos britânicos, impedindo um ataque até Rommel estar totalmente preparado.


TAREFAS OPERACIONAIS.

Há certas tarefas operacionais que um líder operacional precisa cumprir com êxito para ser considerado bem-sucedido. O planejamento operacional, treinamento operacional e o emprego e sustentação das forças de combate de Rommel serão avaliados para determinar o quão bem-sucedido ele foi como líder operacional. Embora hajam mais tarefas do que as elencadas, apenas estas serão avaliadas já que são consideradas as razões pelas quais Rommel obteve sucesso ou o fracasso em batalha.

1 - Planejamento Operacional.

O ataque contra Tobruk em abril de 1941 foi mal concebido e planejado por Rommel. O ataque foi imposto aos seus comandantes com muito pouca informação e conduzido com pouco apoio. Rommel forçou o ataque porque falsamente acreditava que os britânicos estavam em fuga e ele queria infligir tanto dano quanto possível às forças em retirada.

Ele agiu como líder tático ao invés de um líder operacional. Rommel ansiosamente acreditou em cada informação de rádio e fotográfica que indicasse uma saída britânica de Tobruk, e igualmente desconsiderou toda informação que mostrasse outra coisa. O ataque foi tão mal planejado que o comandante da divisão panzer subordinada a Rommel que já havia perdido 120 de 161 tanques no assalto, recusou uma ordem de Rommel para assaltar Tobruk, de novo, até reconhecimento aerofotográfico, ataques de bombardeiros de mergulho, cobertura aérea e aviões de reconhecimento fossem disponibilizados. Rommel fracassou em tomar Tobruk, e as baixas resultantes exigiram que o Afrika Korps assumisse uma posição defensiva.

Outro ataque mal planejado foi a "Corrida para a Cerca" de Rommel durante a ofensiva CRUSADER britânica em novembro de 1942. A "cerca" era a fronteira entre o Egito britânico e a Líbia italiana. Quando a "corrida" de Rommel começou ele quase tinha vencido a batalha da CRUSADER; no entando, no momento e que a "corrida" terminou a balança tinha pesado contra ele.

Ele fracassou devido a sua impaciência, falta de planejamento e deficiência de logística. Rommel forçou o ataque devido ao seu desejo de aniquilar o inimigo em retirada. Infortunadamente, ele não levou em consideração o apoio logístico exigido, ou o fato de que seus homens estavam exauridos, ou que seus tanques necessitavam de reparos. Embora seu estado-maior e comandantes divisionários recomendassem contra o ataque, Rommel foi inflexível e assumiu pessoalmente a conduta da ação. Devido a sua impaciência Rommel fracassou em compreender as posições inimigas e foi incapaz de manter a comunicação com seu quartel-general e com seus comandantes divisionários. Devido ao pobre planejamento de Rommel, os britânicos foram capazes de forçá-lo a sua primeira retirada de volta para Trípoli.

O problema de Rommel é que ele contemplava a campanha norte-africana como uma grande batalha. Ele pensava mais em termos de nível tático que do nível operacional. Deixemos de lado o fato de que Rommel não devia estar travando uma tal guerra ofensiva, já que esta contrariava o objetivo estratégico da Alemanha; se, entretanto, o objetivo operacional fosse tomar o Canal de Suez, Rommel estava lutando de forma totalmente errada. Ele estava agindo como um comandante tático. Ele estava indo de batalha em batalha ao invés de recuar um passo, e dar uma boa olhada no grande quadro. Se tivesse feito isto, teria ficado evidente que ele precisava de mais suprimentos e recursos, por conseqüência, ele necessitaria de superioridade aérea e controle do mar de forma a obter seu objetivo. Rommel falhou em perguntar e responder quatro questões fundamentais:

"Quais metas ou condições ao nível operacional precisam ser obtidas de modo a satisfazer os objetivos estratégicos da nação?"

"Qual a seqüência de ações precisa ser planejada e executada para alcançar estas metas operacionais?"

"Como devem os recursos das forças conjuntas serem aplicados para cumprir tal seqüência?"

"Quais são os prováveis custos e riscos derivados?"

2 - Treinamento Operacional.

Muito pouco treinamento operacional estava disponível para Rommel devido às ações quase imediatas e avanços constantes empreendidos contra os britânicos após a chegada na África do Norte. No entanto, quando o tempo estava disponível, Rommel o usou, efetivamente, para conduzir amplo treinamento de corpo. Enquanto as forças britânicas estavam sendo contidas em Tobruk, Rommel desdobrou as forças do Eixo de forma que uma resposta flexível pudesse deter qualquer ataque britânico em seus flancos; adicionalmente, o Afrika Korps passou por rigoroso treinamento para um assalto contra Tobruk usando tanques e canhões antitanque juntos. Devido ao seu constante treinamento, os homens de Rommel eram capazes de coordenar seus ataques mesmo quando a situação mudava. Isso permitia à Rommel ter "um rápido contragolpe concentrado."

3 - Emprego e Sustentação das Forças de Combate.

Se Rommel tivesse os recursos adicionais e apoio logístico necessário, seu emprego de forças, na maior parte do seu primeiro ano, teria sido correto. O fato de que ele foi capaz de vencer batalhas sem apoio logístico adicional é um tributo à sua proficiência tática, ousadia e iniciativa. Infortunadamente, isto foi às custas do desnecessário dispêndio de suas forças e recursos. Na maioria de suas batalhas, Rommel estava excessivamente distendido. Ele baseava-se em equipamento e suprimentos inimigos capturados para continuar seus avanços e para ressuprir suas forças. Parecia que Rommel lidava com emergências logísticas à medida em que ocorriam ao invés de planejar e preparar-se adequadamente antes de entrar em batalha, de modo a impedir o surgimento daquelas emergências.

A logística operacional foi uma das principais razões por Rommel fracassar como líder operacional. Ele não punha ênfase e prioridade o bastante na logística. Enquanto estava na África, Rommel por duas vezes avançou 3 mil quilômetros de Trípoli até o Egito e por duas vezes fugiu do Egito para Trípoli, tudo devido à falta de apoio logístico. Trípoli era a principal base de suprimento de Rommel. Quanto mais ele se afastava de sua base principal, mais difícil era estabelecer estações de suprimento avançadas. Rommel declarou que a razão para desistir de perseguir o inimigo quase sempre devia-se à dificuldade da intendência em ser capaz de estender as rotas de suprimentos, e da intendência não utilizar de iniciativa e improvisação para aumentar tais rotas. Aqui ele lança a culpa sobre a intendência por não prover os suprimentos necessários para cumprir os objetivos. No entanto, é responsabilidade do comandante operacional assegurar que os suprimentos estejam disponíveis. A falta de preocupação de Rommel com a logística era estarrecedora. Quando questionado por seu superior como supriria e alimentaria o corpo panzer adicional que havia requisitado, Rommel respondeu: "Isto é bem imaterial para mim. Isto é da sua alçada."

O ataque abortado de Rommel contra Tobruk em maio de 1941 e sua derrota na "cerca" deveram-se ao seu fraco apoio logístico, em adição ao seu pobre planejamento. Rommel deveria ter estado mais ciente de sua situação logística e menos preocupado com a situação tática.


PRIMAZIA DA POLÍTICA E DA ESTRATÉGIA.

A política determina a estratégia militar. Esta última, por sua vez, determina os objetivos estratégicos e operacionais. O objetivo de Rommel, como determinado pelo Alto-Comando alemão, era apoiar os italianos e assegurar que não se retirassem para Trípoli sem lutar. Felizmente para os Aliados, Rommel decidiu que mudaria sua missão e, talvez, criaria um novo leque de possibilidades para a estratégia alemã. Numa clara violação de suas ordens, Rommel informou seu estado-maior que seu objetivo era o Canal de Suez. Ele não compreendia que mesmo se fosse capaz de alcançar o canal não teria sido capaz de mantê-lo. Teriam sido necessárias três coisas para realizar seu objetivo.

Malta precisaria estar sob controle do Eixo; ele precisaria de superioridade aérea e ele precisaria assegurar as linhas marítimas de modo a obter proteção, suprimentos e recursos.

Rommel não poderia conseguir nada disso, já que estavam fora de seu controle. Não importa o quanto vitorioso ele fosse na África do Norte, ele necessitaria da assistência de seus superiores para alcançar seu próprio objetivo. Já que este não era o objetivo de seus superiores parece evidente que ele não receberia a assistência necessária para seguir em frente. Ele esperava que, uma vez tendo chegado ao Canal de Suez, seus superiores ou se veriam forçados a dar-lhe mais apoio ou que acabariam enxergando que o objetivo de Rommel era melhor que o limitado objetivo norte-africano deles e, por conseqüência, mudariam ou incrementariam seu objetivo estratégico. Rommel queria que a estratégia alemã incluísse a conquista do Oriente Médio. Ele acreditava que se pudesse ultrapassar o Canal de Suez, juntamente com o sucesso na Rússia, a Turquia poderia ser persuadida a juntar-se às potências do Eixo, desta forma dando à Alemanha acesso e o possível controle do petróleo do Oriente Médio.

Enquanto reportava o seu progresso ao quartel-general de Hitler, em março de 1941, Rommel foi informado pelo comandante-chefe do Exército, de que "não há intenção alguma de desfechar um golpe decisivo na África em futuro próximo". Rommel, então, instântanea e metodicamente, procedeu a desconsidear estas ordens claras e cautelosas, tão logo retornou à África. Ele era incapaz de ver que seu papel na grande estratégia da Alemanha deveria ser um papel menor.

É tarefa da liderança operacional apontar para a liderança política que certos fins militares não podem ser cumpridos, ou fornecer alternativas a estes fins militares se um outro pode ser cumprido mais eficientemente. No entanto, um comandante operacional não pode conduzir operações que afetem adversamente a estratégia nacional ou o objetivo estratégico colimado. O comandante precisa aceitar o objetivo e cumprí-lo. Rommel nunca aceitou o fato de que a campanha norte-africana seria apenas um objetivo operacional menor e não o objetivo que traria a vitória para a Alemanha. Já que não aceitava o objetivo estratégico de seus superiores, ele tentou, desesperadamente, influenciar a decisão deles ao ganhar batalhas, e requisitar forças e material adicionais para continuar perseguindo seu objetivo operacional pessoal. Isso, é claro, afastaria recursos vitais do real objetivo estratégico na Rússia. Rommel não podia enxergar isto e, por conseguinte, danificou seriamene as chances da Alemanha para atingir seu objetivo estratégico. Por ultrapassar suas ordens, Rommel causou uma situação na qual suas decisões tiveram implicações estratégicas adversas, e para a qual ele não tinha suprimentos adequados para lidar.


OUTROS FATORES.

Rommel falhou em informar e coordenar suas planejadas operações em numerosas ocasiões com seus superiores e aliados italianos. Ele basicamente queria lidar tão pouco quanto possível com os italianos. Por causa de sua falta de coordenação, Rommel fracassou em utilizar eficientemente, a unidade de esforços que teria, grandemente, incrementado sua eficácia e capacidades. Um excelente exemplo desta falta de unidade de esforços foi o ataque contra Tobruk em abril de 1941, no qual ele falhou em informar os italianos sua intenção de atacar a posição. Tivesse Rommel informado os italianos, poderia ter recebido valiosos e detalhados planos para a fortificação em Tobruk, já que os italianos a tinham construído. Como se passou, Rommel não recebeu os planos até depois da batalha.

Em diversas ocasiões Rommel, pessoalmente, liderou o ataque contra o inimigo. Isso causou severa confusão e dificuldades entre seu estado-maior, comandantes divisionários e tropas. Claramente, Rommel poderia ter servido melhor ao Afrika Korps ao fornecer liderança e coordenação da retaguarda ao invés de estar preocupado com questões táticas em lugar das operacionais.


(continua...)




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#191 Mensagem por Wingate » Qua Jul 01, 2015 6:28 pm

Clermont escreveu:ANÁLISE DA LIDERANÇA OPERACIONAL DE ROMMEL.


INTRODUÇÃO.

Não há dúvida de que o marechal-de-campo Erwin Rommel foi um líder excepcional. Ele possuía e exibia muitas das qualidades exigidas para ter sido um notável líder operacional.

Por que, então, às vezes, ele aparentou ser um tão pobre líder operacional? "Liderança Operacional" é um termo que aplica-se aos comandantes e seus estados-maiores que estão preocupados com a aplicação prática da arte operacional. Esta "preocupa-se tanto com a teoria quando a prática do planejamento, preparação, condução e sustentação de maiores operações e campanhas visando o cumprimento de objetivos estratégicos ou operacionais num teatro."

Este documento avaliará a liderança operacional do marechal-de-campo Erwin Rommel durante seu primeiro ano de comando do Corpo África alemão - Afrika Korps - e discutir razões pelas quais ele fracassou como um bem-sucedido líder operacional, mesmo tendo possuído muitas das qualidades exigidas para ter sido um excepcional.

Através das pesquisas torna-se muito evidente que Rommel falhou em fazer duas coisas: ele não se preocupava com o apoio logístico operacional para suas forças e ele falhou em compreender a primazia da política e estratégia. Ele falhou em fazer a transição dos objetivos estratégicos de seus superiores para os objetivos operacionais no teatro. Ao invés, ele desenvolveu e tentou implementar seus próprios objetivos operacionais, por conseqüência, tentando forçar a liderança da Alemanha a aceitar objetivos estratégicos novos. Ele tentou atingir estes objetivos operacionais através de meios táticos negligenciando, totalmente, a arte operacional exigida para cumprir tais objetivos. Essas duas falhas provocaram a eventual perda da África do Norte e pesaram na derrota total da Alemanha.

Deficiências adicionais que Rommel apresentou foram sua falta eficaz de coordenação ou desenvolvimento de unidade de esforços com seus aliados italianos; e que ele, pessoalmente, assumia o comando de operações táticas em numerosas ocasiões provocando confusão e incerteza entre suas forças.

A razão pela qual Rommel é visto como um grande líder deve-se a seus feitos como líder tático; no entanto, tivesse sido ele um melhor líder operacional, a guerra na África do Norte podia ter se desenvolvido muito diferentemente do que foi.


PANO DE FUNDO.

A guerra na África do Norte estava indo mal para os italianos. Hitler temia que se eles perdessem a Líbia, a aliança do Eixo seria severamente afetada. Adicionalmente, isto liberaria forças britânicas no Egito para lutar alhures, e daria a estas mais aeródromos na África do Norte que poderiam causar graves danos aos interesses alemães. Hitler não tinha intenção de transformar a África do Norte em outra grande frente, especialmente levando-se em conta que seu objetivo estratégico era a Rússia. O que ele queria era assistir os italianos para defenderem a Líbia, tanto para mantê-los como aliados e dentro da guerra, e para manter as tropas britânicas longe de seus flancos meridionais. O que Hitler não queria ou precisava era de outro objetivo estratégico para diminuir suas escassas forças. Já que a Líbia estava a mais de 2 mil quilômetros de Berlim, Hitler necessitava de um comandante que pudesse atuar de modo semi-independente, que possuísse excepcionais iniciativa, vigor, originalidade e ousadia para apoiar um aliado moral e fisicamente fraco. Hitler escolheu Rommel porque este possuía estas qualidades. Infortunadamente, estas mesmas qualidades eventualmente o tornariam um ônus para o objetivo estratégico de Hitler.

Rommel chegou em Trípoli, em fevereiro de 1941; imediamente começou a planejar para atacar e expulsar os britânicos da Líbia. Em março, ele iniciou sua ofensiva, que durou até maio. Ele rechaçou os britânicos para o Egito, mas foi contido em Tobruk, onde os britânicos estavam bem enterrados e fortificados. Os numerosos assaltos sobre Tobruk resultaram em grandes perdas para Rommel. Este então retirou-se e reforçou suas defesas ao redor de Tobruk. O contra-ataque britânico a partir de Tobruk foi muito custoso para eles, devido à inteligência, engenhosa utilização de artilharia e defesas enterradas de Rommel. A ofensiva CRUSADER aliada, em novembro de 1941, pegou Rommel de surpresa, e eventualmente o empurrou para a retirada rumo à Tripoli.

De muitos modos, Rommel exibia as qualidades de um excepcional líder operacional.

Ele desenvolveu no Afrika Korps um forte senso de identidade e sensação de unidade. Tanto que sua autoconfiança tornou-se um potente multiplicador de forças, pois eles sabiam que, sob Rommel, podiam conseguir qualquer coisa. Para eles, Rommel era um deus. Como não idolatrariam Rommel? Ele era o soldado ideal, destemido, inventivo, incansável, competente. Sua inesgotável energia permitia-lhe em todo canto e fazer qualquer coisa. Ele era um general dos praças, lutando ao lado deles na frente, ao invés de na retaguarda. Ele tinha o mesmo efeito sobre seus inimigos, que lhe atribuiam a posse de poderes sobrenaturais. Isto levou o comandante-chefe britânico (Força do Oriente Médio) a ordenar a seus comandantes, por razões psicológicas, a pararem de referirem-se a Rommel como se este fosse um "super-homem".


TRAÇOS DE CARÁTER.

Caráter é, talvez, o fator mais importante de um líder operacional bem-sucedido. Os traços de personalidade que Rommel possuía eram aqueles necessários para um líder operacional.

Aqueles que mais sobressaíam-se eram sua coragem moral, ousadia, conhecimento profissional, iniciativa, dureza, habilidade para motivar, habilidade para pensar grande e sua liderança pelo exemplo pessoal.

Sua coragem moral era sem paralelos. Rommel e seu Afrika Korps eram creditados por lutarem pelas regras e por serem cavalheiros. Rommel recusou-se a obedecer uma ordem de Hitler para "massacrar" todos os soldados inimigos que fossem descobertos em missões de comandos, mesmo que se rendessem. Rommel tratava todos os prisioneiros de guerra justa e humanamente.

Não há dúvida de que Rommel possuía ousadia incrível. Esta foi exibida nas manobras de combate e nos riscos pessoais aos quais ele se expunha diariamente. Um exemplo de sua ousadia foi o lançamento de uma bem-sucedida contra-ofensiva em março de 1941 contra os recentes ganhos britânicos na Cirenaica. Ele sentiu que os britânicos estavam exauridos e em processo de reorganização após sua prolongada ofensiva através da Cirenaica. Portanto, ele desfechou uma contra-ofensiva após estar no terreno por somente seis semanas e com menos da metade de suas forças esperadas. A ousadia de Rommel permitia-lhe explorar toda oportunidade ofensiva que se apresentasse a ele.

Outro exemplo de sua ousadia foi o ataque contra Mersa Brega. Seus superiores tinham ordenado que Rommel não atacasse Mersa Brega até sua segunda divisão panzer chegar em maio de 1941. Rommel, no entanto, atacou e conquistou-a em março de 1941 porque ele raciocinava que, por volta de maio as defesas inimigas poderiam ser inexpugnáveis.

A engenhosidade de Rommel e conhecimento profissional eram inigualáveis. Rommel utilizou uma velha arma de um modo novo, ao empregar canhões antiaéreos de 88 mm numa função antitanque. Essa técnica provou-se desastrosa para os britânicos. Adicionalmente, Rommel desenvolveu novas técnicas de batalha ao fazer uso de canhões antitanque na linha de frente com os tanques, utilizando uma linha antitanque como surpresa defensiva.

Rommel também exibia grande iniciativa e criatividade. Quando a divisão panzer de Rommel chegou à noite, ele imediatamente ordenou a descarga de todos os tanques e equipamento, mesmo embora isto pudesse atrair um ataque aéreo já que o descarregamento exigiria o uso de holofotes. Isto foi feito para que a divisão estivesse preparada para desdobramento no início da manhã seguinte. Rommel estava muito consciente de ser mais fraco do que as forças britânicas, entretanto ele queria manter os britânicos ocupados tentando adivinhar qual era sua força total.

Sendo assim, quando Rommel desfilou suas forças, após desembarcá-las em Trípoli, ele fez com que seus tanques dirigissem várias vezes em volta do quarteirão, antes de rolarem para o leste, de modo a causar a impressão de que ele dispunha de uma quantidade infindável de tanques. Em outra dissimulação, Rommel ordenou a construção de um grande número de tanques falsos, feitos de madeira e montados sobre automóveis Volkswagen. De novo isso foi feito para Rommel aparentar ser tão forte quanto possível e deste modo induzir cautela aos britânicos, impedindo um ataque até Rommel estar totalmente preparado.


TAREFAS OPERACIONAIS.

Há certas tarefas operacionais que um líder operacional precisa cumprir com êxito para ser considerado bem-sucedido. O planejamento operacional, treinamento operacional e o emprego e sustentação das forças de combate de Rommel serão avaliados para determinar o quão bem-sucedido ele foi como líder operacional. Embora hajam mais tarefas do que as elencadas, apenas estas serão avaliadas já que são consideradas as razões pelas quais Rommel obteve sucesso ou o fracasso em batalha.

1 - Planejamento Operacional.

O ataque contra Tobruk em abril de 1941 foi mal concebido e planejado por Rommel. O ataque foi imposto aos seus comandantes com muito pouca informação e conduzido com pouco apoio. Rommel forçou o ataque porque falsamente acreditava que os britânicos estavam em fuga e ele queria infligir tanto dano quanto possível às forças em retirada.

Ele agiu como líder tático ao invés de um líder operacional. Rommel ansiosamente acreditou em cada informação de rádio e fotográfica que indicasse uma saída britânica de Tobruk, e igualmente desconsiderou toda informação que mostrasse outra coisa. O ataque foi tão mal planejado que o comandante da divisão panzer subordinada a Rommel que já havia perdido 120 de 161 tanques no assalto, recusou uma ordem de Rommel para assaltar Tobruk, de novo, até reconhecimento aerofotográfico, ataques de bombardeiros de mergulho, cobertura aérea e aviões de reconhecimento fossem disponibilizados. Rommel fracassou em tomar Tobruk, e as baixas resultantes exigiram que o Afrika Korps assumisse uma posição defensiva.

Outro ataque mal planejado foi a "Corrida para a Cerca" de Rommel durante a ofensiva CRUSADER britânica em novembro de 1942. A "cerca" era a fronteira entre o Egito britânico e a Líbia italiana. Quando a "corrida" de Rommel começou ele quase tinha vencido a batalha da CRUSADER; no entando, no momento e que a "corrida" terminou a balança tinha pesado contra ele.

Ele fracassou devido a sua impaciência, falta de planejamento e deficiência de logística. Rommel forçou o ataque devido ao seu desejo de aniquilar o inimigo em retirada. Infortunadamente, ele não levou em consideração o apoio logístico exigido, ou o fato de que seus homens estavam exauridos, ou que seus tanques necessitavam de reparos. Embora seu estado-maior e comandantes divisionários recomendassem contra o ataque, Rommel foi inflexível e assumiu pessoalmente a conduta da ação. Devido a sua impaciência Rommel fracassou em compreender as posições inimigas e foi incapaz de manter a comunicação com seu quartel-general e com seus comandantes divisionários. Devido ao pobre planejamento de Rommel, os britânicos foram capazes de forçá-lo a sua primeira retirada de volta para Trípoli.

O problema de Rommel é que ele contemplava a campanha norte-africana como uma grande batalha. Ele pensava mais em termos de nível tático que do nível operacional. Deixemos de lado o fato de que Rommel não devia estar travando uma tal guerra ofensiva, já que esta contrariava o objetivo estratégico da Alemanha; se, entretanto, o objetivo operacional fosse tomar o Canal de Suez, Rommel estava lutando de forma totalmente errada. Ele estava agindo como um comandante tático. Ele estava indo de batalha em batalha ao invés de recuar um passo, e dar uma boa olhada no grande quadro. Se tivesse feito isto, teria ficado evidente que ele precisava de mais suprimentos e recursos, por conseqüência, ele necessitaria de superioridade aérea e controle do mar de forma a obter seu objetivo. Rommel falhou em perguntar e responder quatro questões fundamentais:

"Quais metas ou condições ao nível operacional precisam ser obtidas de modo a satisfazer os objetivos estratégicos da nação?"

"Qual a seqüência de ações precisa ser planejada e executada para alcançar estas metas operacionais?"

"Como devem os recursos das forças conjuntas serem aplicados para cumprir tal seqüência?"

"Quais são os prováveis custos e riscos derivados?"

2 - Treinamento Operacional.

Muito pouco treinamento operacional estava disponível para Rommel devido às ações quase imediatas e avanços constantes empreendidos contra os britânicos após a chegada na África do Norte. No entanto, quando o tempo estava disponível, Rommel o usou, efetivamente, para conduzir amplo treinamento de corpo. Enquanto as forças britânicas estavam sendo contidas em Tobruk, Rommel desdobrou as forças do Eixo de forma que uma resposta flexível pudesse deter qualquer ataque britânico em seus flancos; adicionalmente, o Afrika Korps passou por rigoroso treinamento para um assalto contra Tobruk usando tanques e canhões antitanque juntos. Devido ao seu constante treinamento, os homens de Rommel eram capazes de coordenar seus ataques mesmo quando a situação mudava. Isso permitia à Rommel ter "um rápido contragolpe concentrado."

3 - Emprego e Sustentação das Forças de Combate.

Se Rommel tivesse os recursos adicionais e apoio logístico necessário, seu emprego de forças, na maior parte do seu primeiro ano, teria sido correto. O fato de que ele foi capaz de vencer batalhas sem apoio logístico adicional é um tributo à sua proficiência tática, ousadia e iniciativa. Infortunadamente, isto foi às custas do desnecessário dispêndio de suas forças e recursos. Na maioria de suas batalhas, Rommel estava excessivamente distendido. Ele baseava-se em equipamento e suprimentos inimigos capturados para continuar seus avanços e para ressuprir suas forças. Parecia que Rommel lidava com emergências logísticas à medida em que ocorriam ao invés de planejar e preparar-se adequadamente antes de entrar em batalha, de modo a impedir o surgimento daquelas emergências.

A logística operacional foi uma das principais razões por Rommel fracassar como líder operacional. Ele não punha ênfase e prioridade o bastante na logística. Enquanto estava na África, Rommel por duas vezes avançou 3 mil quilômetros de Trípoli até o Egito e por duas vezes fugiu do Egito para Trípoli, tudo devido à falta de apoio logístico. Trípoli era a principal base de suprimento de Rommel. Quanto mais ele se afastava de sua base principal, mais difícil era estabelecer estações de suprimento avançadas. Rommel declarou que a razão para desistir de perseguir o inimigo quase sempre devia-se à dificuldade da intendência em ser capaz de estender as rotas de suprimentos, e da intendência não utilizar de iniciativa e improvisação para aumentar tais rotas. Aqui ele lança a culpa sobre a intendência por não prover os suprimentos necessários para cumprir os objetivos. No entanto, é responsabilidade do comandante operacional assegurar que os suprimentos estejam disponíveis. A falta de preocupação de Rommel com a logística era estarrecedora. Quando questionado por seu superior como supriria e alimentaria o corpo panzer adicional que havia requisitado, Rommel respondeu: "Isto é bem imaterial para mim. Isto é da sua alçada."

O ataque abortado de Rommel contra Tobruk em maio de 1941 e sua derrota na "cerca" deveram-se ao seu fraco apoio logístico, em adição ao seu pobre planejamento. Rommel deveria ter estado mais ciente de sua situação logística e menos preocupado com a situação tática.


PRIMAZIA DA POLÍTICA E DA ESTRATÉGIA.

A política determina a estratégia militar. Esta última, por sua vez, determina os objetivos estratégicos e operacionais. O objetivo de Rommel, como determinado pelo Alto-Comando alemão, era apoiar os italianos e assegurar que não se retirassem para Trípoli sem lutar. Felizmente para os Aliados, Rommel decidiu que mudaria sua missão e, talvez, criaria um novo leque de possibilidades para a estratégia alemã. Numa clara violação de suas ordens, Rommel informou seu estado-maior que seu objetivo era o Canal de Suez. Ele não compreendia que mesmo se fosse capaz de alcançar o canal não teria sido capaz de mantê-lo. Teriam sido necessárias três coisas para realizar seu objetivo.

Malta precisaria estar sob controle do Eixo; ele precisaria de superioridade aérea e ele precisaria assegurar as linhas marítimas de modo a obter proteção, suprimentos e recursos.

Rommel não poderia conseguir nada disso, já que estavam fora de seu controle. Não importa o quanto vitorioso ele fosse na África do Norte, ele necessitaria da assistência de seus superiores para alcançar seu próprio objetivo. Já que este não era o objetivo de seus superiores parece evidente que ele não receberia a assistência necessária para seguir em frente. Ele esperava que, uma vez tendo chegado ao Canal de Suez, seus superiores ou se veriam forçados a dar-lhe mais apoio ou que acabariam enxergando que o objetivo de Rommel era melhor que o limitado objetivo norte-africano deles e, por conseqüência, mudariam ou incrementariam seu objetivo estratégico. Rommel queria que a estratégia alemã incluísse a conquista do Oriente Médio. Ele acreditava que se pudesse ultrapassar o Canal de Suez, juntamente com o sucesso na Rússia, a Turquia poderia ser persuadida a juntar-se às potências do Eixo, desta forma dando à Alemanha acesso e o possível controle do petróleo do Oriente Médio.

Enquanto reportava o seu progresso ao quartel-general de Hitler, em março de 1941, Rommel foi informado pelo comandante-chefe do Exército, de que "não há intenção alguma de desfechar um golpe decisivo na África em futuro próximo". Rommel, então, instântanea e metodicamente, procedeu a desconsidear estas ordens claras e cautelosas, tão logo retornou à África. Ele era incapaz de ver que seu papel na grande estratégia da Alemanha deveria ser um papel menor.

É tarefa da liderança operacional apontar para a liderança política que certos fins militares não podem ser cumpridos, ou fornecer alternativas a estes fins militares se um outro pode ser cumprido mais eficientemente. No entanto, um comandante operacional não pode conduzir operações que afetem adversamente a estratégia nacional ou o objetivo estratégico colimado. O comandante precisa aceitar o objetivo e cumprí-lo. Rommel nunca aceitou o fato de que a campanha norte-africana seria apenas um objetivo operacional menor e não o objetivo que traria a vitória para a Alemanha. Já que não aceitava o objetivo estratégico de seus superiores, ele tentou, desesperadamente, influenciar a decisão deles ao ganhar batalhas, e requisitar forças e material adicionais para continuar perseguindo seu objetivo operacional pessoal. Isso, é claro, afastaria recursos vitais do real objetivo estratégico na Rússia. Rommel não podia enxergar isto e, por conseguinte, danificou seriamene as chances da Alemanha para atingir seu objetivo estratégico. Por ultrapassar suas ordens, Rommel causou uma situação na qual suas decisões tiveram implicações estratégicas adversas, e para a qual ele não tinha suprimentos adequados para lidar.


OUTROS FATORES.

Rommel falhou em informar e coordenar suas planejadas operações em numerosas ocasiões com seus superiores e aliados italianos. Ele basicamente queria lidar tão pouco quanto possível com os italianos. Por causa de sua falta de coordenação, Rommel fracassou em utilizar eficientemente, a unidade de esforços que teria, grandemente, incrementado sua eficácia e capacidades. Um excelente exemplo desta falta de unidade de esforços foi o ataque contra Tobruk em abril de 1941, no qual ele falhou em informar os italianos sua intenção de atacar a posição. Tivesse Rommel informado os italianos, poderia ter recebido valiosos e detalhados planos para a fortificação em Tobruk, já que os italianos a tinham construído. Como se passou, Rommel não recebeu os planos até depois da batalha.

Em diversas ocasiões Rommel, pessoalmente, liderou o ataque contra o inimigo. Isso causou severa confusão e dificuldades entre seu estado-maior, comandantes divisionários e tropas. Claramente, Rommel poderia ter servido melhor ao Afrika Korps ao fornecer liderança e coordenação da retaguarda ao invés de estar preocupado com questões táticas em lugar das operacionais.


(continua...)
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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#192 Mensagem por Clermont » Qui Jul 02, 2015 2:30 pm

ROMMEL COMO TÁTICO.

Rommel tem sido louvado como um brilhante tático e competente estrategista, mas certamente não sem falhas. Os contemporâneos que tiveram de trabalhar com ele debaixo da adversidade, com freqüência tinham muito poucas palavras gentis a respeito de Rommel e suas habilidades. Após o retorno de Paulus de sua inspeção dos feitos de Rommel na África do Norte e também considerando os relatórios submetidos por Alfred Gause, Halder concluiu:

"Os defeitos de caráter de Rommel fazem dele muito difícil de se agüentar, mas ninguém se importa em sair em aberta oposição devido a sua brutalidade e o apoio que ele tem no alto escalão."


Outros mencionavam seu estilo de liderança, que esperava muito de seus comandantes, ao mesmo tempo em que não estava aberto a criticismo ou objeções. Ele tinha pouca paciência com subordinados que não faziam seu trabalho apropriadamente. Apenas três semanas após assumir o comando da 7ª Divisão Panzer em fevereiro de 1940, Rommel encontrou um comandante de batalhão com baixo desempenho e exonerou o homem do comando, dando-lhe noventa minutos para ir embora. Esse estilo de gerenciamento certamente mandou um sinal de que ele exigia o máximo de seus homens, mas também tendia a criar uma sensação de ressentimento entre alguns de seus oficiais.

Friedrich Wilhelm von Mellenthin, que serviu no estado-maior de Rommel durante a campanha na África, escreveu que este correu grandes riscos em várias ocasiões, apostando batalhas inteiras sobre decisões tomadas quase no calor do momento e com informações incompletas. Ele citou o contra-ataque de Rommel durante a Operação CRUSADER, como um tal momento. Outros que serviram sob Rommel na África, mais notavelmente o general Fritz Bayerlein, disseram que ele correu riscos mas somente após ter pesado cuidadosamente os riscos e recompensas potenciais. O próprio Rommel tinha consciência de sua crescente reputação como apostador e acrescentou cuidadosas notas em seus documentos, explicando e defendendo suas ações, especialmente no que concernia a sua decisão de avançar para o Egito durante sua ofensiva de verão de 1942.

Enquanto alguns agressivos subordinados, como Hans von Luck, louvavam sua liderança da frente, Mellenthin questionava esse estilo de liderança por levar, com freqüência, à ausência de envolvimento de seus oficiais de estado-maior na luta, ao invés de mantê-los com uma visão geral da situação. Suas conseqüentes longas ausências do QG também significavam que os subordinados tinham de tomar decisões sem consultar Rommel, levando à confusão.

Na França, o agressivo avanço de Rommel através das linhas franco-britânicas, desconsiderando a segurança de seus flancos e retaguarda, teve sucesso em grau notável. Seus ousados ataques freqüentemente levavam formações inimigas maiores a renderem-se mas sua agressividade, no entanto, causava ressentimento entre colegas oficiais, que sentiam que Rommel, às vezes, agia de forma temerária demais e falhava em manter seus subordinados e colegas comandantes apropriadamente informados de suas intenções. Ele também foi criticado por clamar muito da glória para si mesmo, negligenciando o apoio de outros elementos da Werhmacht e rebaixando os feitos de outras unidades.

Rommel venceu muitas batalhas na África em 1941 e 1942 contras forças britânicas que sempre o superavam numericamente e em geral tinham melhores linhas de suprimento, devido á ação agressiva. Em várias ocasiões ele violou ordens diretas para não atacar. Mas sua ansiedade para avançar contra o Egito, quando o necessário apoio logístico estava faltando, significou que esses avanços ultimamente falharam com grandes perdas. Rommel percebia "oportunidades únicas" em capturar o Egito e talvez o Oriente Médio. Esse resultado definitivamente teria um impacto enorme sobre o curso da guerra, mas essa grande visão nunca foi apoiada por Hitler nem pelo Estado-Maior Geral em Berlim na extensão desejada por Rommel.

O próprio Rommel apenas tardiamente reconheceu que seus contínuos problemas de suprimento não eram resultado da intransigência ou lerdeza dos italianos, que lidavam com o transporte de seus suprimentos, mas resultavam de suas agressivas ações ao estender excessivamente suas linhas de comunicação. Em sua análise dos aspectos logísticos da Campanha da África do Norte, o historiador militar Martin van Creveld escreveu:

Dado que a Wehrmacht era apenas parcialmente motorizada sem o apoio de uma indústria automobilística realmente forte; que a situação política necessitava que fosse carregado o muito inútil lastro italiano; que a capacidade dos portos líbios era tão pequena, as distâncias a serem vencidas tão vastas; parece claro que, apesar de todo o brilhantismo tático de Rommel, o problema de suprir uma força do Eixo para um avanço rumo ao Oriente Médio era insolúvel. ... O repetido desafio de Rommel às suas ordens e as tentativas de avançar além de uma razoável distância de suas bases foram, portanto, equívocos e nunca deveriam ter sido tolerados.


O general britânico Harold Alexander comandou as forças aliadas no Oriente Médio confrontando Rommel no Egito (a partir de agosto de 1942) e mais tarde comandou o 18º Grupo de Exércitos na Tunísia. Em seu relatório oficial sobre a campanha na África, ele escreveu de Rommel:

Ele era um tático da maior habilidade, com uma firme compreensão de cada detalhe do emprego de blindados em ação, e muito rápido em agarrar a fugidia oportunidade e o ponto de virada crítico de uma ação móvel. Eu sinto certas dúvidas, no entando, sobre sua habilidade estratégica, em particular se ele compreendia plenamente a importância de um sólido plano administrativo. Mais feliz enquanto controlava uma força móvel diretamente debaixo de seus olhos ele tinha a tendência a abusar do sucesso imediato sem suficiente consideração pelo futuro.


Sir David Hunt, um dos oficiais de inteligência de Alexander, expressou o ponto de vista que:

...seu dom real era o comando de um regimento blindado, talvez de uma divisão e que seu teto máximo era um corpo blindado.


Durante o cerco de Tobruk, Rommel desfechou custosos ataques durante o primeiro mês do sítio. O nível de perdas incorrido levou Rommel a ter várias discussões com seus comandantes de unidades e também com o alto-comando alemão. Na verdade, algumas fontes indicam que o chefe do estado-maior, Halder, teve de enviar Friedrich Paulus para a África para colocar um freio em Rommel, embora este sustentasse que havia compreendido a futilidade de mais ataques contra a fortaleza por sua própria conta.


CONCLUSÃO.

No primeiro ano de Rommel na África do Norte, o Afrika Korps teve alguns sucessos formidáveis empurrando as forças aliadas para trás. Estes sucessos deveram-se, em grande parte, à liderança tática de Rommel ao custo desnecessário de forças e equipameno. Embora Rommel possuísse e exibisse extraordinárias qualidades de liderança operacional, ele fracassou como um tal tipo de líder devido a não apreender a importância da logística operacional e porque ele fracassou em entender a primazia da política e da estratégia.

Rommel era dono dos traços de caráter necessários para ser um grande líder operacional; entretanto ele continuamente pensava como um líder tático. Sua falta de unidade de esforços com seus aliados italianos e seu desejo de liderar da frente afetaram, seriamente, sua habilidade para coordenar e dirigir suas forças com mais eficiência. Já que ele agia mais como um líder tático do que um líder operacional, Rommel foi incapaz de apreender o grande quadro. Tivesse sido ele um melhor líder operacional, seus sucessos não teriam sido tão custosos em vidas e recursos, e ele poderia, possivelmente, ter salvado a Alemanha de perder a África do Norte, e a teria auxiliado a atingir seu objetivo estratégico na Rússia.


PERCEPÇÃO POPULAR.


Rommel foi extraordinariamente bem-conhecido em seu tempo de vida, não apenas pelo povo alemão mas também por seus adversários. Histórias populares de seu cavalheirismo e façanhas táticas renderam-lhe o respeito de muitos oponentes, incluindo Claude Auchinleck, Winston Churchill, George S. Patton e Bernard Montgomery. Rommel, por sua parte, era tanto amável quanto respeitoso de seus adversários. Hitler contava Rommel entre seus generais favoritos. Ele esteve entre os poucos comandantes do Eixo (outros sendo Isoroku Yamamoto e Reinhard Heydrich) diretamente visados para assassinato pelos planejadores aliados. No entanto, ao contrário dos outros dois, a tentativa contra a vida de Rommel foi um fracasso.

O Afrika Korps nunca foi acusado de qualquer crime de guerra, e o próprio Rommel referia-se à luta na África do Norte como Krieg ohne Hass - guerra sem ódio. Numerosos exemplos existem do cavalheirismo de Rommel para com os prisioneiros-de-guerra aliados, tais como seu desafio à infame Ordem dos Comandos de Hitler, após a captura dos tenentes Roy Woodridge e George Lane como parte da Operação FORTITUDE. Ele também recusou obedecer a ordem de Hitler para executar PGs judeus.

Durante o tempo de Rommel na França, Hitler ordenou-lhe a deportação da população judia do país; Rommel desobedeceu. Várias vezes, ele escreveu cartas protestando contra o tratamento dos judeus. Quando o major britânico Geoffrey Keyes foi morto durante uma fracassada incursão comando para matar ou capturar Rommel por trás das linhas alemãs, este ordenou que fosse sepultado com plenas honras militares. Também, durante a construção da Muralha do Atlântico, Rommel determinou que os trabalhadores franceses não fossem usados como escravos, mas fossem remunerados por seu trabalho.

Seus colegas militares também desempenharam sua parte na perpetuação da legenda de Rommel. Seu antigo subordinado, Kircheim, embora privadamente um crítico do desempenho de Rommel, não obstante, explicou: "graças à propaganda, primeiro por Goebbels, então por Montgomery e finalmente, depois dele ter sido envenenado, por todas as antigas potências inimigas, Rommel tornou-se um símbolo das melhores tradições militares. Qualquer criticismo público dessa personalidade legendária prejudicaria a estima na qual o soldado alemão é mantido".

Depois da guerra, quando o alegado envolvimento na trama para matar Hitler tornou-se conhecido, sua estatura foi reforçada enormemente entre as antigas nações aliadas. Rommel era freqüentemente considerado, em fontes ocidentais, como um general que, embora um leal alemão, estava disposto a confrontar Hitler. O lançamento do filme The Desert Fox: The Story of Rommel (1951) ajudou a aumentar mais ainda a sua reputação como um dos mais amplamente conhecidos e benquistos líderes no Exército alemão. Em 1970, um destróier da classe Lütjens foi batizado FGS Rommel em sua honra.

________________________________

Extraído de "Erwin Rommel Battles and Campaigns 1940-1944 Illustrated" - Castle Rock Publishing.




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#193 Mensagem por Wingate » Qui Jul 02, 2015 5:04 pm

Clermont escreveu:ROMMEL COMO TÁTICO.

Rommel tem sido louvado como um brilhante tático e competente estrategista, mas certamente não sem falhas. Os contemporâneos que tiveram de trabalhar com ele debaixo da adversidade, com freqüência tinham muito poucas palavras gentis a respeito de Rommel e suas habilidades. Após o retorno de Paulus de sua inspeção dos feitos de Rommel na África do Norte e também considerando os relatórios submetidos por Alfred Gause, Halder concluiu:

"Os defeitos de caráter de Rommel fazem dele muito difícil de se agüentar, mas ninguém se importa em sair em aberta oposição devido a sua brutalidade e o apoio que ele tem no alto escalão."


Outros mencionavam seu estilo de liderança, que esperava muito de seus comandantes, ao mesmo tempo em que não estava aberto a criticismo ou objeções. Ele tinha pouca paciência com subordinados que não faziam seu trabalho apropriadamente. Apenas três semanas após assumir o comando da 7ª Divisão Panzer em fevereiro de 1940, Rommel encontrou um comandante de batalhão com baixo desempenho e exonerou o homem do comando, dando-lhe noventa minutos para ir embora. Esse estilo de gerenciamento certamente mandou um sinal de que ele exigia o máximo de seus homens, mas também tendia a criar uma sensação de ressentimento entre alguns de seus oficiais.

Friedrich Wilhelm von Mellenthin, que serviu no estado-maior de Rommel durante a campanha na África, escreveu que este correu grandes riscos em várias ocasiões, apostando batalhas inteiras sobre decisões tomadas quase no calor do momento e com informações incompletas. Ele citou o contra-ataque de Rommel durante a Operação CRUSADER, como um tal momento. Outros que serviram sob Rommel na África, mais notavelmente o general Fritz Bayerlein, disseram que ele correu riscos mas somente após ter pesado cuidadosamente os riscos e recompensas potenciais. O próprio Rommel tinha consciência de sua crescente reputação como apostador e acrescentou cuidadosas notas em seus documentos, explicando e defendendo suas ações, especialmente no que concernia a sua decisão de avançar para o Egito durante sua ofensiva de verão de 1942.

Enquanto alguns agressivos subordinados, como Hans von Luck, louvavam sua liderança da frente, Mellenthin questionava esse estilo de liderança por levar, com freqüência, à ausência de envolvimento de seus oficiais de estado-maior na luta, ao invés de mantê-los com uma visão geral da situação. Suas conseqüentes longas ausências do QG também significavam que os subordinados tinham de tomar decisões sem consultar Rommel, levando à confusão.

Na França, o agressivo avanço de Rommel através das linhas franco-britânicas, desconsiderando a segurança de seus flancos e retaguarda, teve sucesso em grau notável. Seus ousados ataques freqüentemente levavam formações inimigas maiores a renderem-se mas sua agressividade, no entanto, causava ressentimento entre colegas oficiais, que sentiam que Rommel, às vezes, agia de forma temerária demais e falhava em manter seus subordinados e colegas comandantes apropriadamente informados de suas intenções. Ele também foi criticado por clamar muito da glória para si mesmo, negligenciando o apoio de outros elementos da Werhmacht e rebaixando os feitos de outras unidades.

Rommel venceu muitas batalhas na África em 1941 e 1942 contras forças britânicas que sempre o superavam numericamente e em geral tinham melhores linhas de suprimento, devido á ação agressiva. Em várias ocasiões ele violou ordens diretas para não atacar. Mas sua ansiedade para avançar contra o Egito, quando o necessário apoio logístico estava faltando, significou que esses avanços ultimamente falharam com grandes perdas. Rommel percebia "oportunidades únicas" em capturar o Egito e talvez o Oriente Médio. Esse resultado definitivamente teria um impacto enorme sobre o curso da guerra, mas essa grande visão nunca foi apoiada por Hitler nem pelo Estado-Maior Geral em Berlim na extensão desejada por Rommel.

O próprio Rommel apenas tardiamente reconheceu que seus contínuos problemas de suprimento não eram resultado da intransigência ou lerdeza dos italianos, que lidavam com o transporte de seus suprimentos, mas resultavam de suas agressivas ações ao estender excessivamente suas linhas de comunicação. Em sua análise dos aspectos logísticos da Campanha da África do Norte, o historiador militar Martin van Creveld escreveu:

Dado que a Wehrmacht era apenas parcialmente motorizada sem o apoio de uma indústria automobilística realmente forte; que a situação política necessitava que fosse carregado o muito inútil lastro italiano; que a capacidade dos portos líbios era tão pequena, as distâncias a serem vencidas tão vastas; parece claro que, apesar de todo o brilhantismo tático de Rommel, o problema de suprir uma força do Eixo para um avanço rumo ao Oriente Médio era insolúvel. ... O repetido desafio de Rommel às suas ordens e as tentativas de avançar além de uma razoável distância de suas bases foram, portanto, equívocos e nunca deveriam ter sido tolerados.


O general britânico Harold Alexander comandou as forças aliadas no Oriente Médio confrontando Rommel no Egito (a partir de agosto de 1942) e mais tarde comandou o 18º Grupo de Exércitos na Tunísia. Em seu relatório oficial sobre a campanha na África, ele escreveu de Rommel:

Ele era um tático da maior habilidade, com uma firme compreensão de cada detalhe do emprego de blindados em ação, e muito rápido em agarrar a fugidia oportunidade e o ponto de virada crítico de uma ação móvel. Eu sinto certas dúvidas, no entando, sobre sua habilidade estratégica, em particular se ele compreendia plenamente a importância de um sólido plano administrativo. Mais feliz enquanto controlava uma força móvel diretamente debaixo de seus olhos ele tinha a tendência a abusar do sucesso imediato sem suficiente consideração pelo futuro.


Sir David Hunt, um dos oficiais de inteligência de Alexander, expressou o ponto de vista que:

...seu dom real era o comando de um regimento blindado, talvez de uma divisão e que seu teto máximo era um corpo blindado.


Durante o cerco de Tobruk, Rommel desfechou custosos ataques durante o primeiro mês do sítio. O nível de perdas incorrido levou Rommel a ter várias discussões com seus comandantes de unidades e também com o alto-comando alemão. Na verdade, algumas fontes indicam que o chefe do estado-maior, Halder, teve de enviar Friedrich Paulus para a África para colocar um freio em Rommel, embora este sustentasse que havia compreendido a futilidade de mais ataques contra a fortaleza por sua própria conta.


CONCLUSÃO.

No primeiro ano de Rommel na África do Norte, o Afrika Korps teve alguns sucessos formidáveis empurrando as forças aliadas para trás. Estes sucessos deveram-se, em grande parte, à liderança tática de Rommel ao custo desnecessário de forças e equipameno. Embora Rommel possuísse e exibisse extraordinárias qualidades de liderança operacional, ele fracassou como um tal tipo de líder devido a não apreender a importância da logística operacional e porque ele fracassou em entender a primazia da política e da estratégia.

Rommel era dono dos traços de caráter necessários para ser um grande líder operacional; entretanto ele continuamente pensava como um líder tático. Sua falta de unidade de esforços com seus aliados italianos e seu desejo de liderar da frente afetaram, seriamente, sua habilidade para coordenar e dirigir suas forças com mais eficiência. Já que ele agia mais como um líder tático do que um líder operacional, Rommel foi incapaz de apreender o grande quadro. Tivesse sido ele um melhor líder operacional, seus sucessos não teriam sido tão custosos em vidas e recursos, e ele poderia, possivelmente, ter salvado a Alemanha de perder a África do Norte, e a teria auxiliado a atingir seu objetivo estratégico na Rússia.


PERCEPÇÃO POPULAR.


Rommel foi extraordinariamente bem-conhecido em seu tempo de vida, não apenas pelo povo alemão mas também por seus adversários. Histórias populares de seu cavalheirismo e façanhas táticas renderam-lhe o respeito de muitos oponentes, incluindo Claude Auchinleck, Winston Churchill, George S. Patton e Bernard Montgomery. Rommel, por sua parte, era tanto amável quanto respeitoso de seus adversários. Hitler contava Rommel entre seus generais favoritos. Ele esteve entre os poucos comandantes do Eixo (outros sendo Isoroku Yamamoto e Reinhard Heydrich) diretamente visados para assassinato pelos planejadores aliados. No entanto, ao contrário dos outros dois, a tentativa contra a vida de Rommel foi um fracasso.

O Afrika Korps nunca foi acusado de qualquer crime de guerra, e o próprio Rommel referia-se à luta na África do Norte como Krieg ohne Hass - guerra sem ódio. Numerosos exemplos existem do cavalheirismo de Rommel para com os prisioneiros-de-guerra aliados, tais como seu desafio à infame Ordem dos Comandos de Hitler, após a captura dos tenentes Roy Woodridge e George Lane como parte da Operação FORTITUDE. Ele também recusou obedecer a ordem de Hitler para executar PGs judeus.

Durante o tempo de Rommel na França, Hitler ordenou-lhe a deportação da população judia do país; Rommel desobedeceu. Várias vezes, ele escreveu cartas protestando contra o tratamento dos judeus. Quando o major britânico Geoffrey Keyes foi morto durante uma fracassada incursão comando para matar ou capturar Rommel por trás das linhas alemãs, este ordenou que fosse sepultado com plenas honras militares. Também, durante a construção da Muralha do Atlântico, Rommel determinou que os trabalhadores franceses não fossem usados como escravos, mas fossem remunerados por seu trabalho.

Seus colegas militares também desempenharam sua parte na perpetuação da legenda de Rommel. Seu antigo subordinado, Kircheim, embora privadamente um crítico do desempenho de Rommel, não obstante, explicou: "graças à propaganda, primeiro por Goebbels, então por Montgomery e finalmente, depois dele ter sido envenenado, por todas as antigas potências inimigas, Rommel tornou-se um símbolo das melhores tradições militares. Qualquer criticismo público dessa personalidade legendária prejudicaria a estima na qual o soldado alemão é mantido".

Depois da guerra, quando o alegado envolvimento na trama para matar Hitler tornou-se conhecido, sua estatura foi reforçada enormemente entre as antigas nações aliadas. Rommel era freqüentemente considerado, em fontes ocidentais, como um general que, embora um leal alemão, estava disposto a confrontar Hitler. O lançamento do filme The Desert Fox: The Story of Rommel (1951) ajudou a aumentar mais ainda a sua reputação como um dos mais amplamente conhecidos e benquistos líderes no Exército alemão. Em 1970, um destróier da classe Lütjens foi batizado FGS Rommel em sua honra.

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Extraído de "Erwin Rommel Battles and Campaigns 1940-1944 Illustrated" - Castle Rock Publishing.
Outro filme de guerra feito em Hollywood que mostrava o cavalheirismo de Rommel para com seus adversários foi "Cinco covas no Egito" (Five Graves to Cairo), filmado em 1943, isto é, ainda durante o conflito:

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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#194 Mensagem por Clermont » Qui Jul 02, 2015 5:23 pm

Wingate escreveu:Outro filme de guerra feito em Hollywood que mostrava o cavalheirismo de Rommel para com seus adversários foi "Cinco covas no Egito" (Five Graves to Cairo), filmado em 1943, isto é, ainda durante o conflito:
Nesse filme, o "Rommel" não é assim, tão "cavalheiro". Nem com mulheres e nem com seus aliados italianos. 8-]




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Re: Doutrinas táticas, operacionais e estratégicas.

#195 Mensagem por EDSON » Sex Fev 26, 2016 8:08 am

Os segredos por trás dos avanços sírios
Publicado em 26 de fevereiro de 2016 por César A. Ferreira
Imagem: Iran News.
Por: César A. Ferreira

Não se pode atribuir apenas ao poder aeroespacial russo as recentes vitórias das armas sírias, pois a vitória depende, sempre, da infantaria, necessária para ocupar o terreno.

Pode-se perguntar e seria justo fazê-lo, do motivo que levou uma força em retraimento, que cedia terreno frente à pressão inimiga, passar de uma hora, para outra, em uma força em progressão, vitoriosa, cujo moral se eleva a cada metro conquistado. Pois, isto se deu com o Exército Árabe Sírio, cuja desagregação era prevista por alguns “especialistas” para as calendas de outubro de 2015, mas que, no entanto, exibe-se hoje robustecido e aguerrido. Os motivos para isso são muitos, complexos, mas compreensíveis e uma análise rápida permitirá ao leitor formar um panorama capaz de desvendar os segredos por trás desta nova dinâmica combativa do EAS.

Antes do suporte russo

O Exército Árabe Sírio começou a guerra como toda força preparada para combates contra equivalentes regulares em campo aberto. Isto é interessante observar, pois o Exército Árabe Sírio contou em sua história com a utilização do ambiente urbano como um elemento vital para o sucesso do combate travado contra as forças invasores da IDF no Vale do Bekaa em 1982. Todavia, nesta presente “guerra civil”, que então se iniciava, o EAS viu-se surpreendido, e respondeu com erros clássicos, tal como o uso isolado de Carros de Combate em vielas estreitas, com edificações altas, portanto, propícias à emboscadas, que ocorriam com certa frequência dado que a experiência dos combatentes insurgentes neste tipo de combate era muita, pois não pouco deles serem oriundos da Chechênia, ou seja, veteranos dos confrontos contra o Exército da Federação Russa.

A presença de instrutores iranianos da Guarda Revolucionária Islâmica ajudou aos sírios a recompor suas formações, reciclar e rever a formação de comandantes de campo, focando no aprimoramento dos oficiais de patente mediana, tenentes e capitães, além da adoção de conceitos que premiavam as decisões advindas do aprendizado provindo do combate, algo que diferia, em muito, da verticalidade típica do comando de estilo soviético, ainda muito presente e apreciado nas armas sírias.

Apesar dos esforços dos instrutores da Força Quds, o problema do treinamento entre os infantes sírios persistia. Pouco além dos elementos da Guarda Republicana, Forças Especiais ou das Divisões Blindadas mais tradicionais eram capazes de exibir coordenação tática com a Força Aérea e a artilharia de campo. As ocorrências de deserções se avolumavam, bem como as reclamações constantes sobre soldo e material, reveladoras de uma moral declinante. Ainda assim, o regime conseguiu manter a linha costeira, Holms e Damasco, mesmo que subsistisse um foco ao sul da capital, bem como a perda da fronteira no sul, junto ao Golan, cedido para Frente Nusra devido ao providencial auxílio da artilharia da IDF.

O quadro desolador, todavia, detinha alguns fatores que permitiam observar o desenrolar dos eventos futuros com alguma esperança: a entrada no conflito de combatentes experientes do Hezzbollah, primeiramente na franja da fronteira libanesa, o comportamento da Força Aérea Síria, de extrema fidelidade, e da decisão curda (YPG/YPJ) de vir a dar combate a toda e qualquer facção extremista islâmica na Síria.

Buratino-resultado
A imagem reflete uma pira funerária, não é possível haver sobreviventes nesta barragem efetuada pelas baterias de foguetes TOS-1 Buratino. Imagem: internet.
O suporte russo

Como é bem sabido foi a partir de um comunicado do General Soleimani aos seus equivalentes russos, informando que as estradas para a costa estavam agora abertas, a partir da queda de Salma, bem como pela perda das elevações ao norte da província de Latakia para os rebeldes turcomanos, que se deu a decisão russa de enviar uma força expedicionária (grupo aéreo). Os turcomanos, é importante dizer, são uma minoria que até então se mantivera fiel, ou neutra no conflito, mas que fora armada pelos serviços secretos turcos e tomara posição contra o regime. Informado, Putin ordenou a intervenção russa, composta pelo efetivo aéreo, bastante limitado, e um grupo de fuzileiros navais, estes responsáveis pela defesa da base.

A presença russa na base de Hmeimeem é a parte visível deste apoio, mas não menos vital, porém não noticiado é o suporte logístico fornecido não só ao grupo militar presente, mas à Republica Árabe da Síria, como nação, representado na recuperação de estruturas de manutenção e reparo de blindados, então inoperantes, do envio de peças para manutenção e aumento da disponibilidade em rampa dos vetores da Força Aérea Síria, de armas como obuses e suas respectivas munições, em grande quantidade, o mesmo para bombas aéreas, cuja carência forçava a adoção de improvisações extremas, como a confecção de “bombas barril”. Soma-se ao suporte logístico o envio de derivados de petróleo, combustíveis e lubrificantes, vitais para um exercito em campanha, e acima de tudo, de equipamento para infantes, de coletes e capacetes balísticos a armas leves e munições. Forças Spetnaz, como elementos de ligação e designação em solo de alvos, também foram vistos, além da instalação de um centro de coordenação na Base Aérea de Hmeimeem. Os russos fizeram-se acompanhar por instrutores, visto que a desagregação do EAS, relatada por Soleimani não era de todo desconhecida pela vasta representação diplomática russa mantida na Síria, mas, a opinião deste diferia um tanto, pois pautados pela própria experiência na Chechênia, concluíram os russos que o problema do EAS era, sobretudo, moral, e que isto poderia ser resolvido se adotadas as medidas urgentes para fortalecer a arma necessária em uma campanha onde o combate urbano se faz presente: a infantaria.

A infantaria síria foi premiada com novos equipamentos individuais, como citado, formação mais acurada e severa, preparação psicológica, inclusive, para aceitação de baixas em combate, inevitáveis no confronto urbano, restabelecimento e aumento na capacidade de atendimento aos feridos, com ampliação das alas médicas/hospitalares e da regularização dos insumos médicos (remédios, bandagens e outros equipamentos), preparação específica dos médicos militares e civis, para focar além dos traumas, observando, também os atendimentos de ordem psicológica, respiratória e do trato gastrointestinal, males recorrentes em combates em ambientes urbanos.

Em relação à tropa em si, o reforço na qualificação do comando de pequenas frações, fraqueza já observada pelos iranianos, foi abordada como prioridade, bem como a elevação geral da capacidade do combatente sírio com reforço na disciplina e incentivo ao julgamento individual (iniciativa). Os melhores recrutas sempre são destinados às formações de elite do EAS, as quais frequentemente estão na linha de frente, ademais, atenção especial é focalizada na formação de elementos de ligação e designação de alvos, comunicação e sinalização, visto que suporte aéreo aproximado é tido como necessário, quando não fundamental. Outra constatação é a mimetização da flexibilidade das formações insurgentes pelo EAS, de tal maneira que a utilização de motocicletas, hoje, é tida como mais eficiente entre os combatentes governamentais do que entre os insurgentes. O uso de caminhonetes com canhões ZU/2 (23mm) montados na carroceria é comum, isto, sem abandonar a ação cirúrgica dos canhões de 30mm dos veículos blindados, apoiados pelas peças de 125mm dos Carros de Combate (T-72, T-90), que fazem uso de munição HE de maneira recorrente. Outra arma muito vista, é o uso das veneráveis “Shilkas” (ZSU-23/4), desprovidas de sensores e utilizadas como apoio a infantaria. Costumam ser mortais contra snipers, devido a precisão da plataforma e a mira secundária, óptica, mantida nos veículos.

TOS-1Buratino
TOS-1 Buratino em lançamento. Imagem: Sputnik News.
Refletindo a experiência russa na Chechênia, passaram os sírios, quando de fronte a um ponto forte no perímetro urbano, que por ventura não pode ser contornado, a varrer com canhões de tiro rápido os andares intermediários das construções, isto, quando tal edificação não é de maneira prévia um alvo visitado pelos bombardeiros russos, ou sírios. O uso do míssil Kornet contra fortificações é comum, devido ao fato desta arma conter uma versão com cabeça de guerra termobárica específica para este uso/alvo. A coordenação com o efetivo aéreo é enfatizada, o que reflete, mês a mês, na melhoria do suporte aéreo aproximado (Close Air Suport –CAS, ing), em geral proporcionado por helicópteros de ataque Mi-24P/Mi-35M, ou por aeronaves Su-25. O reforço da Rainha das Batalhas, ou seja, a artilharia, nas formações sírias também se impôs como uma das chaves do sucesso. Veículos Lança – Foguetes BR-21 Grad e TOS-1 Buratino (terríveis contra forças dispersas e sem abrigo no campo, visto que realizam fogo de saturação de área) são visto com constância nos combates, o mesmo para obuses, devido a presença dos MSTA-B (2A65, 152mm, rebocado), o que elevou sobremaneira a capacidade dos grupos de artilharia de campanha do Exército Árabe Sírio.

Há muito que fazer. No tocante a infantaria faz-se necessário a elevação da qualidade combatente de uma maneira geral, dentro das formações, para se evitar a dependência constante do socorro fornecido pelas unidades de elite, estas de comprovada qualidade e experiência de combate, caso, por exemplo, da 103ª Brigada de Infantaria da Guarda Republicana, 4ª Divisão Mecanizada ou da Força Tigre. Um número maior de Carros de Combate T-90 seria desejável, bem como do reforço dos esquadrões de helicópteros de ataque. Entretanto, compreende-se, que o tesouro russo não é infinito, e que a guerra síria deverá ser ganha pelo seu povo, na forma do Exército Árabe Sírio, com o devido valor pago em sangue. Isto, aliás, explica o real motivo do exército turco em não entrar profundamente no território sírio: o terreno entrecortado, com a presença de vales e elevações favorece a um defensor determinado, caso do Exército Árabe Sírio, que agora se encontra bem dotado de armas ATGW… Ou seja, a possibilidade de imobilização e destruição de colunas blindadas é real, e isto seria uma humilhação desnecessária para aquele que é em números o maior exército da OTAN.




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