Sds.
Clermont escreveu:ME SEGURA!
Por Uri Avnery - 7.11.11.
Todo mundo conhece a cena da escola: um menino pequeno discute com um menino maior. "Me segura," ele grita para os camaradas, "antes que eu quebre a cara dele!"
Nosso governo parece se comportar deste modo. Todo dia, através de todos os canais, ele grita que está partindo, a qualquer instante, para quebrar a cara do Irã.
O Irã está para produzir uma bomba nuclear. Não podemos permitir isto. Portanto, vamos bombardeá-los até virarem destroços.
Benjamin Netanyahu diz em cada um de seus incontáveis discursos, incluindo seu discurso de abertura na sessão de inverno do Knesset. O mesmo para Ehud Barak. Todo comentarista que se dê ao respeito (alguém já viu um que não se dê ao respeito?) escreve sobre isso. A mídia amplifica o som e a fúria.
O Haaretz ilustrou sua imagem da frente com fotos dos sete mais importantes ministros (os "Sete da Segurança") mostrando três deles a favor do ataque, quatro contra.
Um provérbio alemão diz, "Revoluções que são anunciadas de antemão, não ocorrem". O mesmo vale para guerras.
Assuntos nucleares são sujeitos a censura militar muito rígida. Muito, muito rígida em verdade.
Mesmo assim, o censor parece estar sorrindo benignamente. Deixem os meninos, incluíndo o primeiro-ministro e o ministro da defesa (o chefe do censor) brincarem com seus joguinhos.
O respeitado antigo chefe de longa data do Mossad, Meir Dagan, publicamente preveniu contra o ataque, descrevendo-o como "a mais estúpida idéia" que ele jamais ouviu. Ele explicou que considerava seu dever prevenir contra ele, em vista dos planos de Netanyahu e Barak.
Na quarta-feira, houve um crível dilúvio de vazamentos. Israel testou um míssil que pode lançar uma bomba nuclear a mais de 4.800 Km, além de você sabe onde. E nossa força aérea acabou de completar exercícios na Sardenha, numa distância maior do que você sabe onde. E na quinta-feira, o Comando da Frente Metropolitana manteve exercícios de treinamentos por toda a Grande Tel Aviv, com sirenes soando por toda parte. Tudo isto parece indicar que todo este "oba-oba" é um complô. Talvez para assuster e deter os iranianos. Talvez para empurrar os americanos para ações mais extremas. Talvez em coordenação com os americanos de antemão. (Fontes britânicas, também, vazaram que a Marinha Real está treinando para apoiar um ataque americano ao Irã.)
É uma velha tática israelense agir como se estivesse ficando doido ("O patrão ficou doido" é um grito de rotina em nossas feiras, para sugerir que o vendedor de frutas está vendendo com prejuízo) Não vamos mais dar ouvidos aos Estados Unidos. Vamos, apenas, bombardear, bombardear e bombardear.
Bem, vamos ser sérios por um momento.
Israel não atacará o Irã. Ponto.
Alguns podem pensar que eu estou rumando para o limbo. Não deveria eu, pelo menos, adicionar "provavelmente" ou "quase certamente"?
Não, não vou. Eu repito categoricamente: Israel NÃO atacará o Irã.
Desde a aventura de Suez em 1956, quando o presidente Dwight D. Eisenhower lançou um ultimato que parou sua ação, Israel nunca empreendeu qualquer operação militar significativa sem obter o consentimento americano de antemão.
Os Estados Unidos são o único apoiador confiável de Israel no mundo (ao lado, talvez, de Fiji, Micronésia, as Ilhas Marshall e Palau). Destruir este relacionamento significa cortar nossa linha vital. Para fazer isto, você tem de estar mais do que, apenas um pouco doido. Você tem de ser um louco desvairado.
E mais ainda, Israel não pode travar uma guerra sem ilimitado apoio americano, porque nossos aviões e nossas bombas vêm dos Estados Unidos. Durante uma guerra, precisamos de suprimentos, partes sobressalentes, muitos tipos de equipamento. Durante a Guerra do Yom Kippur, Henry Kissinger tinha um "trem aéreo" nos suprindo na hora certa. E esta guerra provavelmente parecerá um piquenique em comparação com uma guerra contra o Irã.
Vamos dar uma olhada no mapa.
Isto, à propósito, sempre é recomendado antes de dar início a qualquer guerra.
A primeira característica que salta aos olhos é a estreiteza do Estreito de Hormuz, por onde, um em cada três barris dos suprimentos petrolíferos transportados pelo mar, flui. Quase toda a produção da Arábia Saudita, os Estados do Golfo, Iraque e Irã tem de passar por esta estreita linha.
"Estreito" é uma subestimação. A inteira largura desta via aquática é de cerca de 30 Km. Esta é quase a distância de Gaza até Beer Sheva, que foi atravessada, semana passada pelos primitivos foguetes da Jihad Islâmica.
Quando o primeiro avião israelense entrar no espaço aéreo iraniano, o estreito será fechado. A marinha iraniana está cheia de barcos lança-mísseis, mas eles não serão necessários. Mísseis baseados em terra serão o bastante.
O mundo já está cambaleando à beira de um abismo. A pequena Grécia está ameaçando cair e levar consigo grandes pedaços da economia mundial com ela. A eliminação de quase um quinto do suprimento de petróleo das indústrias nacionais levará a uma catástrofe difícil até de imaginar.
A abrir o estreito pela força exigirá uma grande operação militar (incluindo "colocar coturnos no terreno") que empalidecerá todas os infortúnios americanos no Iraque e Afeganistão. Poderão os Estados Unidos se permitirem isto? Poderá a OTAN? Israel, por si mesmo, não está na mesma liga.
Mas Israel estará muito envolvido na ação, ainda que apenas na ponta receptora.
Numa rara exibição de unidade, todos os chefes de serviços de Israel, incluindo os cabeças do Mossad e Shin Bet, estão publicamente opondo-se a idéia toda. Podemos apenas adivinhar por quê.
Eu não sei, sequer, se a operação é possível de todo. O Irã é um país muito grande, quase do tamanho do Alaska, e as instalações nucleares estão amplamente dispersas e em grande medida, subterrâneas. Mesmo com as bombas especiais de penetração profunda fornecidas pelos Estados Unidos, a operação poderá somente atrasar os esforços iranianos - tais como eles são - apenas por uns poucos meses. O preço pode ser alto demais para resultados tão magros.
E mais, é quase certo que no início de uma guerra, mísseis choverão sobre Israel - não só do Irã, mas também do Hezbollah e talves do Hamas. Não temos defesas adequadas para nossas cidades. A quantidade de morte e destruição será proibitiva.
Repentinamente, a mídia está cheia de histórias sobre nossos três submarinos, logo passando para cinco ou até mesmo seis, se os alemães forem compreensivos e generosos. É abertamente dito que estes nos darão as capacidades de um "segundo ataque" nuclear, se o Irã usar suas (ainda não-existentes) ogivas nucleares contra nós. Mas os iranianos podem também usar armas químicas e outras armas de destruição em massa.
E há o preço político. Há um monte de tensões no mundo islâmico. O Irã está longe de ser popular em muitas partes dele. Mas um assalto israelense contra um grande país muçulmano instantaneamente uniria sunitas e xiitas, do Egito e Turquia até o Paquistã e além. Israel poderia tornar-se uma aldeia numa selva em chamas.
Porém a conversa sobre guerra serve a muitos propósitos, incluindo os da política doméstica.
No último domingo, o movimento de protesto social irrompeu de novo. Após uma pausa de dois meses, uma massa de pessoas reuniu-se na Praça Rabin em Tel Aviv. Isto foi notável, porque neste mesmo dia, foguetes estavam chovendo em vilas próximas a Faixa de Gaza. Até agora, numa tal situação, manifestações sempre eram canceladas. Os problemas de segurança passam por cima de tudo o mais. Não desta vez.
Também, muitas pessoas acreditavan que a euforia do festival de Gilad Shalit tinha varrido o protesto da mente do público. Não varreu.
À propósito, algo notável aconteceu: a mídia, após alinhar-se com o movimento de protesto por meses, teve uma mudança de ânimo. Repentinamente, toda ela, incluindo o Haaretz, está metendo a faca nas suas costas. Como se por ordens, todos os jornais escreveram no dia seguinte que "mais de vinte mil" tomaram parte. Bem, eu estava lá e eu tenho alguma noção destas coisas. Haviam, pelo menos 100 mil pessoas lá, a maioria delas jovens. Eu mal podia mover-me.
O protesto não se consumiu por si mesmo, como garante a mídia. Longe disto. Mas qual método melhor para afastar as mentes das pessoas da justiça social do que falar sobre "perigo existencial"?
E mais, as reformas exigidas pelos manifestantes precisarão de dinheiro. Em vista da crise financeira mundial, o governo vigorosamente objeta a aumentar o orçamento público, por temor de prejudicar nosso índice de crédito.
Portanto, de onde poderia sair o dinheiro? Há apenas três fontes plausíveis: os assentamentos (quem se atreveria?), os ortodoxos (idem!) e o enorme orçamento militar.
Mas, à beira da mais crucial guerra em nossa história, quem tocaria nas forças armadas? Nós precisamos de cada shekel para comprar mais aviões, mais bombas, mais submarinos. Escolas e hospitais - ora essa! - tem de esperar.
Assim, Deus abençoe Mahmoud Ahmadinejad. Onde iríamos parar se não fosse ele?