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Mensagem
por Marino » Dom Ago 07, 2011 12:17 pm
Ainda vamos ler muito sobre o ocorrido.
Abaixo, duas matérias da Cantanhede:
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Brasília - Eliane Cantanhêde
Na defesa, não no ataque
BRASÍLIA - Militares e diplomatas são carreiras de Estado, com uma cultura de ordem, hierarquia, promoções por mérito e grupos que se movem em torno de um líder.
As coincidências param por aí. Na caserna convém falar alto, mas acatando ordens e batendo continência. No Itamaraty, é bom falar baixo, mas articular muito e, em caso de necessidade, solapar.
Há preconceito de parte a parte. Para diplomatas, militares são uns grosseirões. Para militares, diplomatas são escorregadios, intelectuais com trejeitos afeminados.
Nelson Jobim se encaixava melhor no feitio militar e até nas fardas de campanha com que se embrenhava com seu mais de 1,90 m por selvas e descampados. Celso Amorim, porém, pode surpreender.
Diplomata "três em um", pois passou com louvor pelas áreas de política, de cultura e de comércio, ele não tem nada de escorregadio nem usa punhos de renda.
Tal como Jobim, Amorim é ousado, afirmativo, falante e estratégico -pensa longe. E também é acusado, vez ou outra, de arrogância e autossuficiência. Não fala grosso, mas é estridente. Não tem 1,90 m, mas sabe bem ocupar espaços.
Oficiais dizem que "diplomata não gosta de guerra", mas quem, sem ser fanático, gosta? Os limites entre diplomacia e defesa estão cada vez mais curtos. Jobim vivia invadindo a seara de Amorim.
O problema da Defesa não era nem vai ser de falta de comando, mas sim de condições objetivas: sobram projetos, faltam verbas. A não ser que Dilma abra os cofres para suavizar o pouso do novo ministro.
No mais, Amorim dificilmente vai mexer nos acordos para a Comissão da Verdade, bem costurados por Jobim na dupla condição de ministro da Defesa e ex-presidente do Supremo.
O que deve preocupar Dilma não é a Defesa, mas o descontrole e a traição latente no Congresso. Mais do que militares e diplomatas, quem a ameaça são os políticos.
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Experiência e afago a Lula embasaram escolha de Amorim
Dilma atende às lógicas profissional e política ao nomear o ex-chanceler para comando do Ministério da Defesa
Noções de hierarquia e disciplina, pilares do Itamaraty, ajudaram presidente a optar por ministro de antecessor
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
NATUZA NERY
DE BRASÍLIA
A escolha do ex-chanceler Celso Amorim para o Ministério da Defesa, uma área cheia de peculiaridades, atendeu a duas lógicas: a política e a profissional.
Amorim tem status, é experiente e considerado ousado e nacionalista nas relações com os EUA. São qualidades caras aos militares.
Depois da queda de três ministros herdados do governo Lula -Antonio Palocci, Alfredo Nascimento e Nelson Jobim-, a presidente Dilma precisava também desfazer a intenção de que quer desmontar o time do antecessor.
Amorim foi um dos raros ministros a permanecer no mesmo cargo nos oito anos de Lula, autor do convite para Nelson Jobim continuar na Defesa com Dilma.
O ex-chanceler e Dilma nunca foram próximos quando colegas de ministério, mas, além do fator Lula, pesou a favor dele o fato de Defesa e Itamaraty terem várias intersecções: acordos bilaterais com os EUA, negociações na área nuclear e discussões sobre o mar territorial brasileiro e sobre a fronteira terrestre.
Contou também o perfil profissional e psicológico: Amorim é de uma instituição fortemente guiada pela hierarquia e pela disciplina, tal como a militar.
RESISTÊNCIAS
Um senão de militares a ele vem justamente da versão difundida em Brasília de que Amorim subverte a hierarquia em favor da "intuição".
A primeira embaixada do atual chanceler Antônio Patriota foi a de Washington, a principal do mundo, por um voluntarismo de Amorim.
O ex-chanceler não foi mantido no Itamaraty nem ganhou nenhum cargo no governo Dilma porque a presidente o considerava muito "altivo", falante, autossuficiente e voluntarioso.
Mas, agora, esses "defeitos" viraram qualidades na hora de escolher um comandante civil para os militares.
Na Marinha, não houve reações à saída de Jobim nem à chegada de Amorim. Na Aeronáutica, não há restrições.
Quando chanceler, ele viajou 597 vezes usando aviões e pilotos da FAB que o elogiam. "O principal instrumento de política externa são os aviões da FAB", declarou.
Amorim defendeu fortemente o comando brasileiro das operações de paz da ONU no Haiti, que garante treinamento e aumento de soldos para os militares.
As restrições a ele partem principalmente do Exército. Enquanto reclamam de "esquerdismo" -Amorim se filiou ao PT em 2010 e é próximo de Cuba, Venezuela e Irã, além de ter promovido a aproximação com a Líbia-, generais e subordinados não assimilam bem um diplomata mandando nas Forças.
O embaixador José Viegas caiu da Defesa com Lula justamente por incompatibilidade de estilo e de cultura com a caserna.
Jobim sempre sonhou ser chanceler, e Amorim já fora cogitado para a Defesa.
A preferência pelos caça Rafale, da francesa Dassault, continua. Além do gosto pelo poder e pela palavra, Jobim e Amorim são apelidados de francófilos. Para não dizer anti-americanos.
"A reconquista da soberania perdida não restabelece o status quo."
Barão do Rio Branco