Tenho trabalhado nos últimos 15 anos justamente como consultor de tecnologias para a indústria, e sei exatamente como isso funciona. As indústrias investem em tecnologia quando disputam mercados contra outras, e precisam criar diferenciais para seus produtos. Quando fatores outros (falta de escala de produção, custos internos elevados, condições de negócios ruins, burocracia, infra-estrutura inadequada, etc...) fazem com que por mais inovadores que sejam os produtos de um país eles não sejam competitivos, a indústria se volta para mercados protegidos (por distância e custos de transporte, barreiras alfandegárias, etc...) e pára de investir em inovação e consequentemente em pesquisa, passando a concentrar seus esforços em redução de custos. Isso gera uma queda muito acentuada na demanda por pesquisa e desenvolvimento (e consequentemente por pesquisadores). Se a situação continua por algum tempo os produtos fabricados se tornam totalmente defasados com relação aos disponíveis no mercado mundial, a base tecnológica disponível se perde e a indústria fecha ou na melhor das hipóteses se torna apenas uma unidade fabril para produtos de outras empresas.zengao escreveu:Sonho com o dia da nova imigração para o Brasil, não só de valorosos camponeses, mas também de grandes mentes. Isso seria o que nos faltaria para o quebra cabeça que é construir uma grande civilização.
O problema do Brasil é cultural. O empresariado busca lucro da maneira mais simples possível, sem correr risco e não buscando inovação.
Pego pelo meu exemplo mesmo. Só farei foguetes, quando me formar, aqui se me pagarem melhor que a frança, Russia, EUA, China, Irã, e mais tantos outros. E isso nunca vai acontecer no médio prazo porque apesar de ser uma industria em expansão e muito lucrativa envolve muito risco, sendo só o governo disposto a investir na mesma.
A fuga de cérebros acontece porque o cara ganha aqui um quinto do que ele ganharia la fora.
Deveria haver algum estimulo institucional à inovação na industria. Num conheço nenhum pais industrializado do mundo onde quem pesquisa é o estado. Não que o estado não tenha sua parte, é que ele sozinho não da conta. Aqui a industria quer tudo mastigado e se achar que existe 0,000001% de chance de dar errado não investe e continha com seu processo do século XIX. E se diminui seu mercado a culpa é do juros, do cambio, da China, custo Brasil.
Do jeito que ta é preferível que as industrias quebrem mesmo.
Este foi o processo que atravessaram e ainda estão atravessando os EUA, o Japão e os países da Europa (inclusive a Alemanha, que só não está em crise porque tem reservado para si o mercado protegido da UE, dentro do qual ela ainda é competitiva). Em algumas áreas os produtos ainda são relativamente competitivos (geralmente por absoluta falta de opções, como em microprocessadores para computadores, aviões civis, carros de altíssimo luxo, etc...), mas o grosso das empresas está encontrando dificuldades para competir devido aos custos internos e perdendo espaço para países como a Coréia do Sul e principalmente a China. Por os EUA estão deixando sua moeda derreter, os europeus estão muito preocupados com o valor do Euro, e todos falam em reduzir seus custos internos desmontando seus estados de bem-estar social ou reduzindo salários.
O Brasil em particular jamais chegou sequer ao estágio em que as empresas tentassem de fato competir no mercado internacional (com raríssimas excessões, como a Embraer). O enfoque sempre foi vender para um mercado nacional protegido, e para isso basta trazer produtos já desenvolvidos lá de fora para apenas fabricar aqui. As multinacionais instaladas no país vieram para fazer exatamente isso, e os empresários nacionais sempre pensaram exatamente assim. Por isso o nível de inovação em nossas empresas sempre foi muito baixo, e não havia (nem há) demanda por pesquisa e desenvolvimento, a menos que seja para aumento de produtividade e redução de custos. Nas condições atuais do país (ambiente de negócios péssimo, infra-estrutura precária, custos internos elevados, dificuldades de financiamento, moeda sobrevalorizada, etc...) qualquer produto brasileiro, por mais inovador que seja, terá extrema dificuldade de competir com o que é produzido lá fora, e assim de nada adiantará inundar o mercado com mestres e doutores brasileiros ou estrangeiros, as indústrias simplesmente não precisarão da grande maioria deles. Eles simplesmente darão aulas para formar novos acadêmicos que depois formarão novos acadêmicos e assim sucessivamente, sem que isso faça quase nenhuma diferença para o país (quem sabe poderemos até ganhar um prêmio Nobel ou dois, mas e daí?).
Uma ou outra áreas podem ser favorecidas (a pesquisa espacial e os ítens de uso militar, que são bancados pelo governo, ou alguns produtos de alta tecnologia agregada, como aviões sofisticados, equipamentos para exploração de petróleo em águas profundas e coisas assim), mas estas são áreas de baixa escala de produção mundial e pouco vão afetar as estatísticas econômicas do país como um todo. Para o restante das indústrias todos estes pesquisadores que serão formados ou trazidos de fora só farão alguma diferença se os fundamentos econômicos e gerenciais do país mudarem e muito para melhor, permitindo que as empresas vejam alguma chance de disputar mercados a nível mundial e tenham interesse em investir no desenvolvimento de novos produtos inovadores.
Isto é muito, muito mais difícil de fazer do que pagar bolsas de estudo ou complementar salários de doutores estrangeiros que vierem trabalhar aqui. Vamos ver se o governo terá a parcepção e a competência de perceber isso e fazer as mudanças que realmnete são necessárias caso o Brasil queira escapar do destino de ser uma nação de terceira classe produtora de commodities baratas.
Leandro G. Card