DIÁLOGO MILITAR COM OS EUA
Governo americano acena com transferências de tecnologia de armas e outros equipamentos militares
Publicada em 02/06/2011 às 23h18m
http://oglobo.globo.com/pais/mat/2011/0 ... 601261.asp
José Meirelles Passos
RIO - Estados Unidos e Brasil vão retomar nesta sexta-feira, em Brasília, o diálogo político-militar que estava interrompido há cinco anos. Os desafios de segurança no hemisfério - como as sofisticadas redes do crime organizado, o narcotráfico e o tráfico tanto de armas quanto de pessoas - e as maneiras de enfrentá-los em parceria serão discutidos por diplomatas e militares de ambos os países. Mas o secretário de Estado Assistente para Assuntos Político-Militares, Andrew J. Shapiro, vai colocar sobre a mesa um outro tema que, no fundo, é o que no momento mais interessa ao governo brasileiro: o acesso à tecnologia de armas e outros equipamentos militares dos EUA.
- Há no governo e no Congresso dos EUA um compromisso de se fazer uma robusta transferência de tecnologia ao Brasil, garantindo que os sistemas americanos sejam fornecidos de acordo com as necessidades brasileiras - afirmou Shapiro em entrevista ao GLOBO, nesta quarta-feira à noite, no Rio de Janeiro.
Autoridades do ministério da Defesa e do Itamaraty terão do outro lado da mesa Shapiro e representantes do Pentágono e também do Comando Conjunto das Forças Armadas americanas. Não se esperam acordos. Mas trocas de ideias para identificar "coisas nas quais possamos trabalhar em conjunto, como parceiros", disse Shapiro.
- Há muitas ideias erradas e impressões equivocadas sobre a transferência de tecnologia. Particularmente em se tratando da concorrência dos caças, é inquestionável o nosso compromisso pela transferência de tecnologia. Minha esperança é a de que possamos falar sobre os aspectos técnicos disso - acrescentou.
Segundo um funcionário do Itamaraty, a expectativa brasileira em relação ao "Diálogo Político-Militar EUA-Brasil" de hoje (o mais recente foi em 2006, em Washington) é a de o governo brasileiro obter "condições ótimas" em termos de acesso tecnológico:
- Não compramos mais apenas os equipamentos militares. Agora estamos interessados em pacotes tecnológicos - disse a fonte.
É Shapiro quem autoriza, ou não, as vendas de armas
Nesta quinta-feira, em discurso na Escola Superior de Guerra, no Rio, Shapiro afirmou que um pacote já aprovado pelo Congresso americano daria ao Brasil acesso expandido à tecnologia americana. E garantiu, sem dar detalhes, que a proposta americana "contém uma oferta sem precedentes para a liberação de tecnologia significativa ao Brasil".
- Posso dizer aos senhores que o índice de aprovação para pedidos de licenças, envolvendo a exportação de tecnologia para o Brasil, está acima de 90 por cento. Esse índice é, de fato, igual ao de outros parceiros íntimos dos EUA - afirmou Shapiro à platéia.
Ele chefia um birô no Departamento de Estado com ligação direta com o Pentágono. É ele quem autoriza as vendas de armas e equipamentos militares a outros países. A sua missão é a de "garantir que as prioridades militares dos EUA estejam alinhadas com as suas prioridades em política externa". Shapiro é o braço direito da secretária de Estado, Hillary Clinton, em assuntos de defesa há tempos: antes de assumir o atual posto, um ano atrás ele foi conselheiro dela nesse assunto ao longo de oito anos, no Senado.
O encontro de sta sexta-feira não resultará em acordos imediatos. Trata-se de uma troca de idéias sobre defesa que, segundo Shapiro, os EUA querem ter com mais frequência com o Brasil, uma vez que o país é "reconhecido como um poder global":
- Alguns especulam que os EUA devem ver a emergência do Brasil como um desafio à influência americana ao redor do mundo e nas Américas. Alguns ainda permanecem desconfiados de laços íntimos com os EUA. De nossa perspectiva, já passou da hora de irmos além dessas montagens falsas e suspeitas de uma era ultrapassada. A noção de que as ascensão do Brasil deve vir às custas dos EUA é reflexo de uma visão obsoleta do mundo - afirmou Shapiro, manifestando-se disposto a aprofundar a parceria, e a "colocar nos trilhos esse diálogo político-militar com o Brasil", com encontros a cada dois anos ou "quando surgir o desejo ou necessidade de um dos lados".
Ao longo de toda a entrevista Shapiro se esmerou em transmitir a sensação de que o governo de Barack Obama pretende, de fato, dar um novo rumo ao relacionamento entre ambos os países, buscando um engajamento mais profundo com o Brasil inclusive na área militar.
Suas palavras soavam como uma clara tentativa de apagar conceitos emitidos durante o governo passado, e que foram registrados em dezenas de telegramas oficiais enviados a Washington pela embaixada dos EUA. Como um de novembro de 2009, por exemplo, dizendo que "dentro da América do Sul o Brasil vê os Estados Unidos como um competidor, e permanece profundamente suspeito de nossos motivos e intenções"; e que, por isso, era difícil haver uma cooperação militar entre os dois países.