Aqui vai minha pequena contribuição. Espero conseguir um debate saudavel. Desculpem os erros. Escrevi correndo entre uma tarefa e outra.
Para entender o soldado brasileiro é preciso analisar a história militar brasileira.
Começa com achegada da corte portuguesa ao Brasil, porque antes não existia exército aqui nessas bandas. O que existia eram grupos (sem coesão) desarmados, sem instrução e desestruturados.
O atrito entre brasileiros e portugueses era constante. Então aparece a guarda nacional (1830). Ao contrário que se prega (preciso dizer quem?), o exército não se identificava com esse grupo. E os atritos continuaram, e a força continuava sem identidade.
Em 1850, com a criação da escola real começa o atrito entre os militares profissionais (não aristocráticos) e os militares formados na tropa. Os veteranos de batalha (tarimbeiros) contra os acadêmicos. Benjamin Constant e Deodoro eram exemplos desses dois tipos de militares. O que unia os dois grupos era a nossa já velha amiga marginalização da farda. Que naquele tempo já era bandeira da politicada.
Quando o currículo científico passou a dominar, nasceu a idéia da “superioridade militar”. É nesse ambiente que aparece o positivista (ordem e progresso) Benjamin Constant, que foi contratado pela escola.
Nascia o soldado-cidadão. Enquanto os republicanos espalhavam o caos na monarquia, o soldado cidadão, criado pelos positivistas, estava sendo doutrinado para a responsabilidade de manter a “ordem e o progresso”.
1889, fim da monarquia, disputa pelo poder entre militares. Eram as cobras criadas pelos positivistas começando a dar o bote e a hierarquia a disciplina indo pro esgoto. Junto com isso os problemas da federação. Estados formando exércitos particulares, e o exército cada dia mais defasado.
O exército na figura de Hemes da Fonseca inicia nova transformação. Começa a aparecer o soldado-profissional. O EB manda oficias a Prússia para servir naquele exército. Quando voltam os “novos turcos” iniciam uma luta para transformar o exército numa força profissional apolítica.
Outro movimento que aconteceu praticamente junto foi a missão francesa. O ministro da guerra, o civil Pandiá Calogeras acreditava que a educação militar que considerava um golpe a maior das traições contra a pátria tiraria o militar do cenário político.
A missão francesa transformou o militar num profissional da guerra, mas foi graças aos estudos dos problemas nacionais que os militares pela primeira vez chamaram a responsabilidade da defesa nacional para si. O militar concluiu que o exército só evoluiria se o país evoluísse. Dessa forma ao contrário do que se esperavam os militares passaram a pensar que o afastamento da política representava o colapso total da força.
Em 1930 os militares tomam o poder pela primeira vez através de golpe planejado. Era o começo da doutrina Goes Monteiro, e o surgimento do soldado corporação. O estado novo pregava um estado forte. E junto é claro surgiria um exército forte.
Goes Monteiro acreditava que a anarquia social (plantada pelos republicanos) estava influenciando a caserna. Que não poderia existir um exército disciplinado sem uma sociedade disciplinada. Dessa forma, a preocupação não era mais a “política no exército” e sim a “política do exército”.
Em 1935 o exército tomou aquele susto. As coisas não estavam tão sob controle como se achava. É quando surge o ódio contra os comunistas dentro da força.
Foi nessa época que o sarrafo para o oficialato do EB ficava muito alto. E o sgt começava a ser colocado num plano inferior na força. Era o exército moldando seus profissionais de acordo com os objetivos políticos da força. Ou seja, o militar é formado pela doutrina Goes Monteiro. Esse era o soldado corporação.
Em 1946 Castelo Branco tem um papel importante na mudança da doutrina francesa para a americana. Fim da era Vargas, mas o EB deixa de ser uma organização para ser uma instituição. E começa a surgir o profissional da segurança interna.
Em 48 tem inicio os cursos da ESG que passa direcionar toda doutrina do exército brasileiro. E a teoria da guerra interna toma conta da força. É o fim da crise de identidade do militar.
São esses militares formados em 35 que tomam o poder em 64. Nesse período, Médici reforça a doutrina de segurança interna e cria um monstro, ou como se costuma dizer: um golpe dentro do golpe. Essa doutrina cria um estado paralelo dentro da força que domina ate 1979, quando Figueiredo inicia uma transição.
Em 1985, apesar da constituição cidadã, o papel do militar não mudou muito. A idéia de tirar a elaboração da defesa das mãos dos militares e o fim da doutrina da defesa interna só aparece em 1996 com o PDN. É bom lembrar que nessa mesma época movimentos radicais no Brasil ganhavam força. E o mais interessante é que foi no governo (em 1999) que mais empregou o exército em operações internas desde a década de 60 que o ministério da defesa foi criado. Os ministros da defesa de lá pra ca acho que nem preciso dizer que foram uma droga.
Depois de 85, o EB formou 3 doutrinas de emprego da força (as 3 são o resumo dessa história toda). Tudo amparado pela constituição brasileira. Mas a força resistiu as mudanças da sociedade o quanto pode.
O militar brasileiro que iniciou sua carreira depois de 85 começou a pedir mudanças. Foi durante o arrocho do governo FHC que alguns começaram a apelar para justiça para resolver problemas simples do dia a dia da caserna. O regulamento da força era da década de 30 (inicio da doutrina Goes Monteiro). Para se ter uma idéia, o praça não podia ir para casa. Ir para casa depois do expediente era uma concessão.
Na minha opinião, o marco da mudança foi quando um grupo de militares que se sentiram prejudicados num aumento diferenciado dado pelo governo FHC ( o aumento foi praticamente só para os oficiais) foram para justiça. A justiça não só deu ganho de causa para esses militares como reverteu a situação de alguns que forma transferidos como retaliação, e anulou punições. Depois disso não teve problema que o militar não ia resolver na justiça. A força teve que se adequar, e os regulamentos sofreram as mudanças necessárias para se adequar a constituição brasileira.
Hoje, um coronel não comanda uma unidade se não cumprir os regulamentos e a lei. Porque ele não pune um recruta sem dar a ele seu direto constitucional de defesa. Um sgt não tira um serviço se não cumprir os regulamentos e a lei. Por isso, na minha opinião o militar brasileiro atual é um soldado que cumpre a lei. Quem faz isso esta comprometido com a força, quem não faz não tem futuro.